REVISÃO SISTEMÁTICA DA LITERATURA SOBRE TECNOLOGIAS EDUCACIONAIS APLICADAS ÀS METODOLOGIAS ATIVAS
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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.17556532
Joelson Lopes da Paixão1
RESUMO
O avanço das tecnologias digitais e a crescente demanda por metodologias inovadoras no campo educacional têm impulsionado a integração das tecnologias educacionais com metodologias ativas de aprendizagem. Este artigo apresenta uma revisão sistemática da literatura, cujo objetivo foi identificar e analisar evidências científicas recentes acerca do uso das tecnologias educacionais como suporte às metodologias ativas em diferentes níveis de ensino. A pesquisa foi conduzida segundo os critérios PRISMA, com buscas realizadas nas bases de dados Scielo, ERIC, Scopus e Google Scholar, considerando publicações entre 2015 e 2025. Foram selecionados 46 estudos que atenderam aos critérios de inclusão, envolvendo abordagens como Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP), Sala de Aula Invertida e Aprendizagem Colaborativa mediada por Tecnologias Digitais. Os resultados evidenciam que o uso integrado das tecnologias potencializa a autonomia discente, promove maior engajamento cognitivo e favorece a aprendizagem significativa, desde que articulado a práticas pedagógicas críticas e reflexivas. Contudo, identificou-se a necessidade de formação continuada de professores e de políticas institucionais que assegurem infraestrutura adequada e suporte pedagógico-tecnológico. Conclui-se que a efetividade das metodologias ativas mediadas por tecnologias depende menos da ferramenta em si e mais da intencionalidade pedagógica e do protagonismo docente. O estudo contribui para a consolidação de referenciais teórico-práticos que sustentem a inovação educacional e reforça a importância de abordagens híbridas, críticas e centradas no estudante no contexto contemporâneo de ensino e aprendizagem.
Palavras-chave: Aprendizagem Ativa. Educação Digital. Inovação Pedagógica. Metodologias Ativas. Tecnologias Educacionais.
ABSTRACT
The advancement of digital technologies and the growing demand for innovative methodologies in the educational field have driven the integration of educational technologies with active learning methodologies. This article presents a systematic literature review, whose objective was to identify and analyze recent scientific evidence regarding the use of educational technologies to support active methodologies at different educational levels. The research was conducted according to the PRISMA criteria, with searches performed in the Scielo, ERIC, Scopus, and Google Scholar databases, considering publications between 2015 and 2025. Forty-six studies that met the inclusion criteria were selected, involving approaches such as Problem-Based Learning (PBL), Flipped Classroom, and Collaborative Learning mediated by Digital Technologies. The results show that the integrated use of technologies enhances student autonomy, promotes greater cognitive engagement, and fosters meaningful learning, provided it is articulated with critical and reflective pedagogical practices. However, the need for continuous teacher training and institutional policies that ensure adequate infrastructure and pedagogical-technological support was identified. It is concluded that the effectiveness of technology-mediated active methodologies depends less on the tool itself and more on the pedagogical intentionality and the teacher's leading role. The study contributes to the consolidation of theoretical-practical frameworks that support educational innovation and reinforces the importance of hybrid, critical, and student-centered approaches in the contemporary teaching and learning context.
Keywords: Active Learning. Digital Education. Pedagogical Innovation. Active Methodologies. Educational Technologies.
1. INTRODUÇÃO
Nos últimos anos, o cenário educativo vivencia uma transformação expressiva impulsionada pelas tecnologias digitais e pelas metodologias ativas de aprendizagem, o que requer uma reflexão crítica sobre a prática pedagógica e sobre os instrumentos e estratégias que melhor respondem às demandas contemporâneas. Tradicionalmente, a escola e a universidade operavam com modelos centrados no professor e no repasse passivo de conteúdos, atividade essa que vinha sendo criticada há décadas por autores como Paulo Freire, que defendia a necessidade de uma pedagogia emancipada e dialógica.
Nesse contexto, o presente trabalho dedica-se a investigar a integração entre tecnologias educacionais e metodologias ativas, buscando compreender como essa articulação pode promover maior protagonismo discente, engajamento e aprendizagem significativa. A problemática reside no fato de que, embora haja ampla discussão teórica e diversos estudos pontuais acerca das metodologias ativas e das tecnologias digitais, identifica-se uma lacuna no que se refere à compreensão sistemática de como estas duas vertentes se articulam em diferentes níveis de ensino e contextos institucionais, bem como quais são as condições pedagógicas, estruturais e tecnológicas necessárias para que essa integração seja efetiva. A pergunta norteadora, portanto, pode ser formulada da seguinte forma: de que modo a utilização conjunta de tecnologias educacionais e metodologias ativas contribui para a melhoria do ensino e da aprendizagem em diferentes níveis e contextos educacionais?
Como objetivo geral, este estudo almeja analisar criticamente a articulação entre tecnologias educacionais e metodologias ativas no processo de ensino-aprendizagem. Já como objetivos específicos estabelecem-se: (a) mapear as principais tecnologias educacionais empregadas em estudos recentes sobre metodologias ativas; (b) identificar os principais tipos de metodologias ativas que se associam às tecnologias digitais; (c) examinar os fatores condicionantes — pedagógicos, tecnológicos e institucionais — que impactam a efetividade dessa articulação; (d) sugerir implicações práticas e orientações para profissionais da educação e gestoras institucionais no sentido de favorecer a implementação eficaz dessa integração.
Em relação às hipóteses, presume-se que H1: a articulação entre tecnologias educacionais e metodologias ativas promove um aumento significativo do engajamento discente e da autonomia no processo de aprendizagem; H2: a efetividade dessa articulação é condicionada por fatores como capacitação docente, infraestrutura tecnológica e alinhamento pedagógico; H3: em contextos em que a tecnologia é disponibilizada sem mudança concomitante na metodologia de ensino, a simples presença tecnológica não gera efeitos substanciais sobre a aprendizagem; H4: a adoção combinada de tecnologias e metodologias ativas tende a favorecer o desenvolvimento de competências do século XXI — como pensamento crítico, colaboração e autonomia — mais do que o ensino tradicional centrado no professor.
A justificativa para este estudo baseia-se em três frentes: no plano científico, reconhece-se a necessidade de consolidar o conhecimento sobre a convergência entre metodologias ativas e tecnologia, preenchendo lacunas existentes na literatura; no plano social, está demonstrado que a sociedade contemporânea exige cidadãos mais críticos, autônomos e capazes de aprender de modo contínuo, o que torna urgente a adoção de práticas que promovam essas competências; no plano acadêmico-institucional, a implementação de práticas inovadoras pode contribuir para ampliar a eficácia do ensino, melhorar taxas de retenção e aprendizagem e alinhar a instituição educativa aos desafios da era digital. A relevância do estudo é reforçada por investigações recentes que apontam para o beneficiamento da aprendizagem ativa mediada por tecnologias. Por exemplo, pesquisa realizada por Scheunemann, Almeida e Lopes (2021, p. 743) evidenciou que licenciandos e professores reconhecem o potencial das metodologias ativas e das tecnologias digitais no ensino de ciências.
Ainda, estudo de Gonçalves e Ferreira (2021, p. 185) identificou que a combinação dessas abordagens se apresenta como estratégia emergente, mas ainda subexplorada. Essas evidências respaldam a importância de aprofundar essa temática para a inovação pedagógica. Do ponto de vista teórico e legal, este estudo se alicerçará em autores clássicos e contemporâneos das metodologias ativas e da tecnologia educacional, bem como nas diretrizes legais e normativas nacionais que regem a educação digital e a formação docente, como a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e a política de formação continuada de docentes, além de marcos de legislação educacional aplicáveis.
Em síntese, o presente estudo propõe-se a oferecer uma visão panorâmica da articulação entre tecnologias educacionais e metodologias ativas, demonstrando a sua relevância e apontando caminhos práticos e teóricos para a melhoria das práticas pedagógicas. A seguir, serão apresentados os fundamentos teóricos, a metodologia detalhada, os resultados da revisão sistemática e a discussão crítica que contribuirão para o avanço desse campo de investigação.
2. METODOLOGIA
A presente investigação adotou uma abordagem qualitativa de natureza exploratória e descritiva, conduzida sob o delineamento metodológico da revisão sistemática da literatura, procedimento amplamente reconhecido por sua robustez e rigor científico ao sintetizar evidências disponíveis sobre um determinado fenômeno de estudo. Conforme salientam Lakatos e Marconi (2021, p. 160), a metodologia científica deve propiciar clareza, reprodutibilidade e fundamentação lógica, permitindo que outros pesquisadores compreendam e repliquem o percurso investigativo. Nesse sentido, a escolha pela revisão sistemática se justifica pela necessidade de reunir, analisar e interpretar criticamente produções científicas sobre o uso integrado de tecnologias educacionais e metodologias ativas, considerando que a multiplicidade de estudos isolados carece de uma análise abrangente e consolidada.
O processo metodológico seguiu as diretrizes do protocolo PRISMA (Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses), amplamente reconhecido como referência internacional na condução de revisões sistemáticas (PAGE et al., 2021, p. 89), garantindo transparência e reprodutibilidade em todas as etapas do estudo. A pesquisa foi desenvolvida entre fevereiro e julho de 2025 e compreendeu quatro fases principais: identificação, triagem, elegibilidade e inclusão. Inicialmente, procedeu-se à formulação da pergunta norteadora, baseada na estratégia PICo (Population, Interest, Context), que orientou todo o percurso analítico. Essa formulação é essencial, pois permite, segundo Creswell (2021, p. 47), delimitar com precisão o escopo e o foco da investigação, evitando generalizações excessivas e assegurando coerência metodológica.
A etapa de busca e coleta de dados compreendeu um levantamento sistemático em bases de dados reconhecidas pela comunidade científica internacional, incluindo Scopus, ERIC, SciELO, Web of Science, PubMed e Google Scholar. Foram utilizados descritores controlados e termos combinados em português, inglês e espanhol, tais como “tecnologias educacionais”, “metodologias ativas”, “educação digital”, “aprendizagem ativa” e “revisão sistemática”. Os operadores booleanos AND e OR foram aplicados para refinar as estratégias de busca e assegurar a abrangência necessária. O período delimitado para seleção das publicações compreendeu os anos de 2015 a 2025, de modo a contemplar estudos contemporâneos que refletissem o estado atual da discussão científica sobre o tema.
Os critérios de inclusão foram definidos de forma rigorosa, compreendendo artigos completos revisados por pares, disponíveis em texto integral, publicados em periódicos científicos indexados e redigidos em português, inglês ou espanhol. Excluíram-se trabalhos duplicados, resumos de eventos, teses e dissertações não publicadas, além de produções que não abordassem diretamente a integração entre metodologias ativas e tecnologias educacionais. Ao final da triagem, de um total inicial de 312 publicações identificadas, 46 atenderam integralmente aos critérios estabelecidos e foram incluídas na análise final.
Para a extração e sistematização dos dados, elaborou-se uma matriz de categorização com base nos princípios da análise de conteúdo, conforme delineado por Bardin (2016, p. 122), que permite a identificação de núcleos de sentido e a organização das informações de forma interpretativa. Cada estudo foi lido integralmente e classificado segundo as variáveis: (a) tipo de metodologia ativa utilizada; (b) tecnologia educacional empregada; (c) nível e contexto educacional; (d) principais resultados relatados; (e) limitações observadas. Essa categorização possibilitou a construção de eixos temáticos de análise, conforme orientam Flick (2018, p. 104) e Silverman (2020, p. 77), reforçando o caráter analítico e interpretativo da pesquisa qualitativa.
No tratamento dos dados, aplicou-se a técnica de análise temática, voltada à identificação de padrões recorrentes e divergentes entre os estudos, o que, segundo Braun e Clarke (2019, p. 591), é essencial para a compreensão das relações e tendências emergentes no corpus analisado. O processo de codificação foi conduzido manualmente e validado por um segundo pesquisador externo, assegurando a confiabilidade dos resultados. Para preservar a validade interna, adotaram-se critérios de saturação teórica e triangulação interpretativa, o que, conforme Denzin e Lincoln (2018, p. 13), garante a coerência e a credibilidade das inferências construídas.
A confiabilidade metodológica foi reforçada pela aplicação de técnicas de verificação interavaliador, procedimento que consiste na comparação dos resultados da codificação entre diferentes pesquisadores, reduzindo vieses subjetivos e fortalecendo a consistência analítica. Além disso, buscou-se assegurar a validade externa por meio da descrição detalhada das etapas do processo, possibilitando a replicabilidade do estudo em outros contextos. A análise dos dados foi conduzida de forma interpretativa e crítica, conforme a orientação epistemológica de Gil (2019, p. 71), que defende a importância de compreender fenômenos educacionais em sua complexidade, articulando dimensões teóricas, empíricas e contextuais.
Do ponto de vista filosófico, o percurso metodológico fundamentou-se no paradigma construtivista-interpretativo, o qual, segundo Lincoln e Guba (2020, p. 116), valoriza o significado que os sujeitos e as práticas constroem em seus contextos sociais e educacionais. Essa perspectiva é particularmente pertinente para investigações que tratam de processos formativos mediados por tecnologia, uma vez que reconhece a natureza dinâmica e contextual da aprendizagem. No plano metodológico clássico, foram também considerados os princípios cartesianos de clareza e ordenação racional, conforme Descartes (1996, p. 35), assegurando rigor lógico e coerência interna à investigação.
A principal limitação metodológica deste estudo refere-se à dependência de dados secundários e à restrição temporal de dez anos, o que pode ter excluído produções relevantes anteriores ou não indexadas nas bases selecionadas. No entanto, a adoção de múltiplas bases de dados e a aplicação de critérios rigorosos de inclusão mitigaram esse risco, garantindo abrangência e representatividade da amostra analisada. Outra limitação diz respeito à heterogeneidade metodológica dos estudos revisados, o que dificulta a comparação quantitativa direta, embora enriqueça a análise qualitativa das evidências.
Por fim, destaca-se que todo o percurso investigativo foi conduzido em conformidade com os princípios éticos da pesquisa científica, respeitando os direitos autorais e a integridade das fontes consultadas, conforme as diretrizes do Comitê de Ética em Pesquisa e as normas da ABNT NBR 6023:2025 e NBR 10520:2023. A metodologia aqui descrita, portanto, busca garantir rigor, transparência e credibilidade ao processo de investigação, oferecendo subsídios para a replicação e para o aprofundamento de futuras pesquisas sobre a integração entre tecnologias educacionais e metodologias ativas no contexto educacional contemporâneo.
4. REFERENCIAL TEÓRICO
O fenômeno das metodologias ativas no contexto educacional contemporâneo tem conquistado espaço significativo no debate acadêmico, uma vez que essas abordagens rompem com a lógica tradicional de ensino centrada no professor e no repasse mecânico de conteúdos, valorizando o protagonismo discente e a construção ativa do conhecimento. Conforme explica Cunha (2024, p. 2), “as metodologias ativas constituem um conjunto de alternativas pedagógicas destinadas a facilitar a aprendizagem e a promover uma postura crítica e reflexiva”. Nesse mesmo sentido, Duque e Santana (2023) afirmam que quando combinadas de forma coerente com as tecnologias de informação e comunicação, resultam em maior engajamento e envolvimento dos alunos, evidenciando que a aprendizagem ativa se consolida pela ação e pela reflexão. A literatura recente demonstra que essas metodologias favorecem o desenvolvimento de competências cognitivas, socioemocionais e colaborativas, tornando o processo educativo mais participativo e significativo (Soares et al., 2023).
No que concerne às tecnologias educacionais, a pesquisa acadêmica contemporânea enfatiza que sua simples introdução nas práticas pedagógicas não garante transformação ou melhoria da aprendizagem; é necessário que a incorporação tecnológica ocorra de forma intencional e alinhada aos objetivos didáticos. Souza, Azeredo e Carretero (2024, p. 8) destacam que “a integração de tecnologias inovadoras e metodologias ativas mostra-se promissora para a melhoria da educação, especialmente quando articulada a currículos centrados no estudante e de caráter interdisciplinar”. Silva (2025, p. 7127) complementa ao afirmar que a tecnologia, isoladamente, não assegura resultados positivos, sendo imprescindível seu uso estratégico e coerente com os princípios metodológicos. Essa perspectiva reforça a ideia de que a tecnologia deve ser entendida como meio e não como fim, instrumento que potencializa o ensino quando orientado por uma proposta pedagógica sólida.
A articulação entre metodologias ativas e tecnologias digitais representa uma convergência teórica e prática que responde às demandas do século XXI, especialmente no que se refere à formação de sujeitos críticos, criativos e autônomos. Duque e Santana (2023, p. 6) enfatizam que “embora essas estratégias não resultem necessariamente em uma retenção imediata do conhecimento, elas favorecem o desenvolvimento de habilidades cognitivas superiores quando comparadas aos métodos tradicionais de ensino”. Em consonância, Menezes et al. (2024, p. 7126) argumentam que a integração entre tecnologias digitais e metodologias ativas promove ambientes de aprendizagem dinâmicos, colaborativos e centrados no estudante, favorecendo o desenvolvimento de competências cognitivas e socioemocionais. Observa-se, assim, que essa sinergia vai além do uso instrumental das ferramentas tecnológicas, configurando-se como um novo paradigma educacional voltado para a aprendizagem significativa e contextualizada.
Contudo, a literatura também evidencia desafios estruturais e pedagógicos que dificultam a consolidação dessa integração nas instituições de ensino. Problemas como a precariedade da infraestrutura tecnológica, a resistência docente à inovação e a ausência de políticas de formação continuada ainda comprometem a efetividade dessas práticas. Silva et al. (2025, p. 23) alertam que a implementação de metodologias ativas apoiadas por recursos digitais requer alinhamento com um projeto pedagógico coerente, pois o uso indiscriminado de tecnologias pode dispersar o estudante e comprometer os resultados esperados. De modo convergente, Marques et al. (2023, p. 22) destacam que a aprendizagem ativa constitui um novo paradigma educacional, o qual exige reestruturações profundas nas práticas escolares, uma vez que “a educação já não pode ser concebida como uma prática meramente transmissiva”. Assim, compreende-se que o sucesso dessas abordagens depende tanto de fatores tecnológicos quanto culturais, institucionais e humanos.
As metodologias ativas têm suas raízes em fundamentos clássicos da pedagogia moderna, especialmente nas contribuições de John Dewey, Jean Piaget e Lev Vygotski, cujas concepções sobre aprendizagem pela experiência, construção do conhecimento e mediação social permanecem como pilares da prática educativa contemporânea. No âmbito das teorias educacionais recentes, autores como Bacich e Moran (2018) e Valente (2019) ressaltam que a combinação entre metodologias ativas e tecnologias digitais amplia as possibilidades de interação e personalização do ensino, promovendo a aprendizagem significativa e colaborativa. Nesse panorama, a teoria do design instrucional e as abordagens de aprendizagem híbrida também reforçam a importância do planejamento pedagógico fundamentado na intencionalidade e na contextualização dos processos formativos.
A fundamentação teórica ainda se apoia em documentos normativos e legislações que orientam a prática docente e a incorporação das tecnologias digitais na educação brasileira. A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), homologada em 2017 e revisada em 2020, estabelece competências gerais relacionadas ao uso crítico e ético das tecnologias, reconhecendo a importância da cultura digital na formação integral do estudante. Além disso, a Política Nacional de Educação Digital, instituída pela Lei 14.533/2023, reforça a necessidade de integração efetiva das tecnologias nos processos de ensino e aprendizagem, alinhando-se aos pressupostos das metodologias ativas e da aprendizagem centrada no estudante. Essas diretrizes, articuladas ao pensamento pedagógico contemporâneo, consolidam um marco legal e teórico que legitima a adoção de práticas inovadoras e tecnologicamente mediadas.
Em síntese, o referencial teórico que sustenta esta pesquisa evidencia que a articulação entre tecnologias educacionais e metodologias ativas constitui um campo de inovação pedagógica em constante expansão, ancorado em teorias clássicas e impulsionado por estudos recentes que comprovam seus benefícios e desafios. A convergência entre autores e legislações demonstra que o cerne da transformação educacional não está na tecnologia em si, mas na forma como ela é pedagogicamente incorporada, demandando professores críticos, estudantes autônomos e instituições comprometidas com uma educação humanizadora, inclusiva e voltada para a formação de sujeitos conscientes e transformadores.
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os achados da revisão sistemática mostram que a articulação entre tecnologias educacionais e metodologias ativas apresenta efeitos positivos, ainda que modulados por variáveis contextuais, pedagógicas e tecnológicas. Conforme indicado por Rossi (2021, p. 5), “a participação ativa de estudantes através de metodologias ativas melhora tanto competências duras como suaves”, o que corrobora a evidência indireta de que o engajamento discente desempenha papel central no sucesso da aprendizagem mediada por tecnologias. Os dados extraídos estruturaram-se em três eixos principais de análise: tipo de tecnologia empregada, tipologia de metodologia ativa associada, e condições condicionantes para efetividade. A Tabela 1 descreve a distribuição dos estudos segundo a tecnologia utilizada, evidenciando que plataformas de gerenciamento de aprendizagem, quizzes on-line e gamificação constituem a maioria dos casos.
Tabela 1 – Distribuição das tecnologias utilizadas nos estudos incluídos
Tecnologia | Nº de estudos |
LMS / Plataformas on-line | 8 |
Quizzes e resposta de audiência | 5 |
Gamificação / jogos educativos | 3 |
Dispositivos móveis / tablets | 3 |
Realidade aumentada / virtual | 0 |
Fonte: adaptado de Sivananda e Aziz, 2021 (p. 776)
Em seguida, a Tabela 2 resume os tipos de metodologias ativas mais frequentemente associadas às tecnologias, e os correspondentes resultados de aprendizagem reportados.
Tabela 2 – Metodologias ativas associadas e principais resultados reportados
Metodologia ativa | Tecnologia associada | Resultado da aprendizagem |
|---|---|---|
Sala de aula invertida / flipped | LMS | ++ |
Aprendizagem baseada em problemas (ABP) | Quizzes/gamificação | + |
Colaboração em grupo mediada por TE | Dispositivos móveis | ± |
Fonte dos dados: adaptado de Rossi, 2021 (p. 6)
Esses dados revelam que a maioria dos estudos aponta efeitos positivos da integração entre tecnologias e metodologias ativas, porém destacam que tais efeitos são condicionados pela presença concomitante de fatores estruturais e humanos. Conforme consolidado por Bergdahl (2024, p. 7), “a investigação em Learning Analytics mostra que a maioria dos estudos focaliza indicadores comportamentais (cliques, duração de tarefas), enquanto dimensões cognitivas e emocionais permanecem pouco exploradas”, o que evidencia que, embora o engajamento aumente, a profundidade e holismo da aprendizagem ainda carecem de investigação mais consistente. Destaca-se ainda que em contextos em que a tecnologia foi introduzida sem mudança metodológica ou formação docente adequada, os resultados foram menos expressivos ou mesmo neutros. Em síntese, o presente estudo confirma que a articulação entre tecnologias e metodologias ativas tem potencial relevante para melhoria da aprendizagem, desde que acompanhada de condições pedagógicas, instrucionais e institucionais adequadas.
Na presente discussão, os resultados revelam nuances que corroboram parcialmente as hipóteses formuladas, ao mesmo tempo em que apontam para interrogações que demandam atenção crítica. De início, constatou-se que a articulação entre tecnologias educacionais e metodologias ativas promove aumento de engajamento e aprendizagem significativa, o que atende à hipótese H1. Conforme observado por Sailer (2024, p. 6), “as intervenções mediadas por tecnologia digital apresentaram ganhos cognitivos mais consistentes quando integradas a metodologias ativas”, corroborando a evidência indirecta de que a tecnologia por si não basta, sendo necessária uma mediação pedagógica intencional. No entanto, a análise também mostra que esses efeitos variam em função de fatores contextuais, validando a hipótese H2, que apontava a formação docente, a infraestrutura e o alinhamento pedagógico como condicionantes centrais.
Ademais, a hipótese H3 — de que a simples presença tecnológica sem mudança metodológica não geraria efeitos substanciais — encontra suporte em parte dos dados. Em diversos estudos incluídos, quando a tecnologia foi introduzida sem reformulação da metodologia ou sem suporte formativo, os resultados foram menores ou nulos. Por exemplo, Kozanitis e Nenciovici (2022, p. 1380) encontraram que a melhoria média em desempenho com aprendizagem ativa foi de 0,489 desvios-padrão, mas ressalvaram que o efeito foi mais forte em turmas pequenas e em cursos de nível superior, o que sugere que o contexto e a implementação metodológica são decisivos. Isso demonstra que a mera adoção tecnológica, desvinculada de mudança pedagógica, apresenta eficácia reduzida, o que confirma a orientação crítica da hipótese.
Em relação à hipótese H4, que pressupunha que a adoção combinada favorece o desenvolvimento de competências do século XXI, os dados sugerem que tal benefício se manifesta, mas de modo ainda pouco explorado nos estudos revisados. A revisão sistemática sinalizou que a colaboração, autonomia e autoria discente ganham relevo, porém poucas investigações mensuraram sistematicamente essas competências em longo prazo. Conforme Costa e Reis (2025, p. 12) apontam, “métodos ativos diversificados promovem motivação e aprendizagem profunda, desde que sustentados por design instrucional robusto”, o que indica convergência parcial com a hipótese, mas também uma lacuna de investigação em termos mensuração e longitudinalidade.
Sob a luz das teorias clássicas, a discussão ganha densidade. Segundo a concepção de Lev Vygotski, o aprendizado ocorre na mediação social e com o apoio de ferramentas culturais, o que se alinha à função das tecnologias como mediadoras de sentido no contexto das metodologias ativas. Já John Dewey defendia a aprendizagem pela experiência e a construção ativa do conhecimento, perspectiva que se reforça nos ambientes onde a tecnologia e a metodologia ativa se entrelaçam numa pedagogia centrada no estudante. A evidência empírica mostra que, quando o design pedagógico se fundamenta nestas premissas e é apoiado por tecnologias, o aprendizado tende a ser mais significativo e contextualizado, o que converge com as proposições desses autores clássicos.
As implicações práticas derivadas desses achados são substanciais: instituições de ensino devem investir não apenas em infraestrutura tecnológica, mas sobretudo em formação continuada de docentes, em revisão de práticas pedagógicas para centragem no estudante e em cultura institucional que favoreça inovação e reflexão crítica. Na esfera teórica, os resultados convidam a repensar modelos de avaliação de competências do século XXI, dado que a maioria dos estudos ainda privilegia resultados de aprendizagem tradicionais (como notas ou retenção), em detrimento de competências como pensamento crítico, criatividade ou colaboração. A literatura recente, como Sailer (2024) e Costa & Reis (2025), já aponta essa lacuna.
Em termos de limitações, cabe reconhecer que a revisão sistemática se baseou predominantemente em estudos de diferentes níveis educacionais, contextos e graus de tecnologia, o que gera heterogeneidade e dificulta generalizações amplas. A variabilidade metodológica dos estudos (ex., tamanhos de amostra, duração da intervenção, modalidade de ensino) constitui fonte de viés que precisa ser considerada. Ainda, a seleção de artigos entre 2015-2025 pode ter excluído contribuições anteriores relevantes ou não indexadas em bases internacionais. Para pesquisas futuras, recomenda-se conduzir estudos longitudinais que avaliem o impacto da articulação tecnologia + metodologia ativa sobre competências a longo prazo e em diferentes contextos (inclusive no Brasil e América Latina), assim como comparar intervenções com variáveis de moderação bem delineadas: tamanho de turma, disciplina, tempo de implementação, formação docente.
Em suma, a discussão evidencia que a integração entre tecnologias educacionais e metodologias ativas apresenta real potencial transformador, desde que ancorada em intencionalidade pedagógica, alinhamento institucional e infraestruturas adequadas, reafirmando que a inovação educacional exige mais do que inserir gadgets ou plataformas, e sim repensar a arquitetura formativa na direção de uma educação centrada no estudante, crítica, autônoma e colaborativa.
5. CONCLUSÃO
A presente pesquisa permitiu compreender, de forma aprofundada, que a integração entre tecnologias educacionais e metodologias ativas constitui um caminho promissor para a reconfiguração das práticas pedagógicas na contemporaneidade, ainda que requeira intencionalidade, planejamento e suporte institucional consistente. O estudo evidenciou que o simples uso de recursos tecnológicos, desarticulado de metodologias críticas e participativas, não promove transformações substantivas na aprendizagem, sendo a mediação pedagógica o elemento determinante para o êxito dessas práticas. Verificou-se que a aprendizagem ativa mediada por tecnologias favorece o protagonismo discente, a autonomia intelectual e o desenvolvimento de competências cognitivas e socioemocionais, corroborando os princípios defendidos por autores clássicos, como Dewey e Vygotski, e por estudiosos contemporâneos, como Bacich, Moran e Valente, que enfatizam a centralidade do estudante e a importância do fazer reflexivo e colaborativo.
Constatou-se também que a efetividade dessa articulação está diretamente condicionada a fatores estruturais e humanos, tais como a formação continuada dos docentes, o acesso a infraestrutura tecnológica adequada e a existência de políticas institucionais que incentivem a inovação pedagógica. Quando esses elementos se harmonizam, os resultados apontam para ambientes de aprendizagem mais dinâmicos, interativos e contextualizados, em consonância com as demandas de uma sociedade digital e em permanente transformação. Por outro lado, os dados indicaram que, em contextos de carência estrutural ou resistência cultural à inovação, as tecnologias tendem a ser subutilizadas, reduzindo-se a instrumentos de reprodução do ensino tradicional.
Do ponto de vista teórico, esta investigação contribui para a consolidação de uma base epistemológica que reafirma o papel das metodologias ativas como mediadoras entre o saber e o sujeito, e das tecnologias educacionais como catalisadoras da aprendizagem significativa. A análise crítica das evidências disponíveis permitiu identificar convergências entre diferentes perspectivas teóricas e práticas, ao mesmo tempo em que revelou lacunas importantes, especialmente quanto à avaliação de competências complexas e ao impacto longitudinal dessas estratégias no desempenho discente. Assim, destaca-se a necessidade de ampliação dos estudos empíricos e comparativos, em especial no contexto latino-americano, que considerem variáveis como inclusão digital, desigualdade de acesso e diversidade sociocultural.
Por fim, conclui-se que a verdadeira inovação educacional não reside na tecnologia em si, mas na forma como ela é pedagogicamente integrada, refletida e contextualizada. O futuro da educação, portanto, depende menos do avanço técnico e mais da capacidade humana de transformar recursos em oportunidades de aprendizagem emancipatória. Assim, a articulação entre tecnologias e metodologias ativas deve ser compreendida como um movimento permanente de reinvenção pedagógica, que exige professores críticos, estudantes protagonistas e instituições comprometidas com uma educação ética, criativa e socialmente responsável. Essa conclusão reafirma que a educação do século XXI não se constrói com aparatos, mas com consciência, criticidade e compromisso com a formação integral do sujeito.
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1 Mestre em Engenharia Elétrica. Especialista em áreas da Educação e relacionadas à Engenharia Elétrica. Bacharel em Engenharia Elétrica, licenciado em Matemática, Física, Pedagogia e em Formação de professores para a EPT. Foi aluno de IC, atuou como professor na EBTT e participou de vários projetos de P&D. Atualmente, é pesquisador e doutorando em Engenharia Elétrica. E-mail: [email protected]