O USO DE METODOLOGIAS ATIVAS DE APRENDIZAGEM NO ENSINO DE MATEMÁTICA
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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.17556518
Joelson Lopes da Paixão1
RESUMO
A adoção de metodologias ativas no ensino da Matemática tem se mostrado uma alternativa eficaz para superar práticas tradicionais centradas na memorização e na repetição mecânica, favorecendo a construção significativa do conhecimento e o protagonismo do estudante. Este artigo apresenta uma revisão sistemática da literatura cujo objetivo foi identificar, analisar e sintetizar as principais evidências científicas publicadas entre 2015 e 2025 sobre a aplicação das metodologias ativas no ensino da Matemática em diferentes níveis educacionais. A pesquisa foi conduzida segundo o protocolo PRISMA, com buscas realizadas nas bases SciELO, Scopus, ERIC, Google Scholar e Web of Science, utilizando os descritores “metodologias ativas”, “ensino da Matemática”, “aprendizagem significativa” e “inovação pedagógica”. Dos 214 estudos inicialmente identificados, 38 atenderam aos critérios de inclusão. Os resultados indicam que estratégias como Aprendizagem Baseada em Problemas, Sala de Aula Invertida, Gamificação e Aprendizagem Colaborativa promovem ganhos significativos na compreensão conceitual, no raciocínio lógico e na resolução de problemas matemáticos, além de aumentar o engajamento e a motivação dos estudantes. Observou-se também que a integração das tecnologias digitais potencializa a aplicação das metodologias ativas, tornando o ensino mais dinâmico e contextualizado. Entretanto, os estudos destacam desafios relacionados à formação docente, à resistência institucional e à limitação de recursos pedagógicos e tecnológicos. Conclui-se que a efetividade das metodologias ativas no ensino da Matemática depende da intencionalidade pedagógica, do domínio teórico-metodológico dos professores e do apoio institucional contínuo, sendo recomendada a ampliação de pesquisas empíricas que explorem seus impactos em contextos diversos da educação básica e superior.
Palavras-chave: Aprendizagem Significativa. Ensino da Matemática. Inovação Pedagógica. Metodologias Ativas. Tecnologias Educacionais.
ABSTRACT
The adoption of active methodologies in Mathematics teaching has proven to be an effective alternative to overcome traditional practices centered on memorization and mechanical repetition, favoring the meaningful construction of knowledge and student agency. This article presents a systematic literature review whose objective was to identify, analyze, and synthesize the main scientific evidence published between 2015 and 2025 on the application of active methodologies in Mathematics teaching at different educational levels. The research was conducted according to the PRISMA protocol, with searches performed in the SciELO, Scopus, ERIC, Google Scholar, and Web of Science databases, using the descriptors "active methodologies," "Mathematics teaching," "meaningful learning," and "pedagogical innovation." Out of 214 studies initially identified, 38 met the inclusion criteria. The results indicate that strategies such as Problem-Based Learning, Flipped Classroom, Gamification, and Collaborative Learning promote significant gains in conceptual understanding, logical reasoning, and mathematical problem-solving, in addition to increasing student engagement and motivation. It was also observed that the integration of digital technologies enhances the application of active methodologies, making teaching more dynamic and contextualized. However, the studies highlight challenges related to teacher training, institutional resistance, and limitations in pedagogical and technological resources. It is concluded that the effectiveness of active methodologies in Mathematics teaching depends on pedagogical intentionality, teachers' theoretical-methodological mastery, and continuous institutional support, and it is recommended to expand empirical research that explores their impacts in diverse contexts of basic and higher education.
Keywords: Meaningful Learning. Mathematics Teaching. Pedagogical Innovation. Active Methodologies. Educational Technologies.
1. INTRODUÇÃO
O ensino da Matemática no Brasil e no mundo tem sido alvo de constantes debates e reformulações, especialmente diante das transformações sociais, tecnológicas e pedagógicas que caracterizam o século XXI. Historicamente, o ensino dessa disciplina foi marcado por práticas expositivas e pela ênfase na memorização de fórmulas e procedimentos, muitas vezes dissociados do cotidiano dos estudantes. Essa abordagem tradicional, embora tenha garantido a transmissão sistemática de conteúdos, revelou-se insuficiente para promover a compreensão conceitual e o desenvolvimento do pensamento crítico e lógico, competências fundamentais para a formação integral do sujeito. Diante desse contexto, as metodologias ativas emergem como alternativas capazes de reconfigurar a dinâmica da sala de aula e de reposicionar o estudante como protagonista de sua própria aprendizagem. Segundo Bacich e Moran (2018, p. 27), “as metodologias ativas colocam o aluno no centro do processo educativo, incentivando-o a participar de forma crítica e colaborativa na construção do conhecimento”. Assim, no ensino da Matemática, essas metodologias assumem papel decisivo, pois a aprendizagem requer experimentação, diálogo, resolução de problemas e reflexão sobre o erro, elementos que só se manifestam plenamente em contextos de prática ativa.
A problemática que motiva este estudo decorre da constatação de que, embora exista consenso na literatura sobre a relevância das metodologias ativas para o ensino, ainda há lacunas quanto à sistematização das evidências sobre sua aplicação específica na área da Matemática. Muitos docentes, mesmo reconhecendo seu potencial, enfrentam dificuldades na implementação dessas estratégias, seja por carência de formação, seja por limitações estruturais ou por culturas escolares resistentes à inovação. Assim, a pergunta norteadora deste trabalho é: de que forma as metodologias ativas têm sido aplicadas e avaliadas no ensino da Matemática, e quais são seus principais impactos sobre a aprendizagem e o engajamento discente?
O objetivo geral deste estudo é analisar criticamente as produções científicas publicadas entre 2015 e 2025 que abordam o uso das metodologias ativas no ensino da Matemática, buscando compreender suas contribuições, desafios e perspectivas. Os objetivos específicos consistem em: (a) identificar as metodologias ativas mais recorrentes nas pesquisas sobre ensino de Matemática; (b) examinar as estratégias tecnológicas e pedagógicas que potencializam sua aplicação; (c) avaliar os impactos dessas metodologias na aprendizagem e no desenvolvimento de competências matemáticas; e (d) discutir os desafios e limitações relatados nos estudos analisados, a fim de propor recomendações para futuras investigações e práticas educacionais.
Parte-se das hipóteses de que: H1 – as metodologias ativas promovem uma aprendizagem mais significativa e contextualizada na Matemática, ao estimular a autonomia, a argumentação e a resolução de problemas; H2 – o uso de recursos digitais e colaborativos amplia a eficácia dessas metodologias, tornando o processo mais interativo; H3 – a formação docente e o suporte institucional são variáveis determinantes para a efetividade das práticas ativas; e H4 – a resistência às mudanças pedagógicas e a falta de infraestrutura tecnológica ainda constituem barreiras à consolidação dessas estratégias.
A justificativa deste estudo encontra respaldo tanto no plano científico quanto social e educacional. No âmbito científico, justifica-se pela necessidade de reunir e analisar criticamente as evidências empíricas sobre o ensino da Matemática mediado por metodologias ativas, promovendo um panorama atualizado da produção acadêmica. No campo educacional, responde às demandas da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que enfatiza o desenvolvimento do raciocínio lógico, da argumentação e da resolução de problemas como competências essenciais para o ensino da Matemática (BRASIL, 2018). A relevância social decorre da constatação de que o domínio da linguagem matemática é fundamental para a inserção crítica e autônoma na sociedade contemporânea, caracterizada pela presença constante de dados, algoritmos e raciocínios quantitativos.
Estudos recentes reforçam essa necessidade. Para Valente (2019, p. 53), “a aprendizagem ativa em Matemática permite que o aluno compreenda o porquê dos procedimentos, e não apenas o como realizá-los”, destacando o papel da ação e da reflexão no processo de aprender. De forma convergente, Menezes et al. (2024) apontam que as metodologias ativas potencializam a aprendizagem significativa ao favorecer a contextualização de conceitos e o desenvolvimento de habilidades cognitivas superiores, quando aplicadas de modo planejado e intencional. Assim, a presente pesquisa busca preencher uma lacuna na literatura ao sintetizar, de modo sistemático, as evidências científicas sobre o uso de metodologias ativas no ensino da Matemática, consolidando uma base de conhecimento que oriente a prática docente e contribua para a inovação pedagógica.
O referencial teórico que sustenta este trabalho apoia-se em autores clássicos e contemporâneos, como Dewey, Piaget, Vygotski, Moran e Valente, e fundamenta-se em diretrizes educacionais nacionais, como a BNCC e a Política Nacional de Educação Digital (Lei 14.533/2023), que reconhecem a importância da integração entre metodologias inovadoras e tecnologias digitais na formação do estudante. Dessa forma, esta introdução apresenta o contexto, a relevância e os objetivos que norteiam a investigação, cuja análise busca oferecer subsídios teórico-práticos para o aprimoramento das práticas docentes em Matemática, fortalecendo uma educação crítica, inclusiva e centrada na aprendizagem significativa.
2. METODOLOGIA
A presente pesquisa caracteriza-se como uma revisão sistemática da literatura, abordagem metodológica que permite reunir, organizar e analisar criticamente as evidências disponíveis sobre determinado fenômeno de estudo, garantindo transparência, reprodutibilidade e rigor científico. Conforme Lakatos e Marconi (2021, p. 156), “o método científico deve assegurar a precisão das informações e a possibilidade de verificação por outros pesquisadores”, o que justifica a escolha deste delineamento para examinar o uso das metodologias ativas no ensino da Matemática. O percurso metodológico adotado baseou-se nas diretrizes do protocolo PRISMA (Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses), amplamente utilizado em revisões educacionais por assegurar critérios padronizados de seleção e análise (PAGE et al., 2021, p. 89).
A pesquisa foi desenvolvida entre fevereiro e agosto de 2025 e compreendeu quatro etapas fundamentais: (1) definição da pergunta norteadora e dos critérios de inclusão e exclusão; (2) busca nas bases de dados; (3) triagem e elegibilidade dos estudos; e (4) análise e síntese qualitativa das evidências. A questão que guiou o estudo foi: como as metodologias ativas têm sido aplicadas no ensino da Matemática e quais impactos têm produzido na aprendizagem dos estudantes? Essa formulação, fundamentada no modelo PICo (Population, Interest, Context), possibilitou o delineamento preciso do objeto investigativo, conforme recomenda Creswell (2021, p. 47), que destaca a importância da clareza conceitual e da coerência teórico-metodológica nas revisões sistemáticas.
As buscas foram realizadas nas bases de dados SciELO, Scopus, ERIC, Google Scholar e Web of Science, considerando artigos publicados entre 2015 e 2025. Foram utilizados descritores controlados em português, inglês e espanhol: “metodologias ativas”, “ensino da Matemática”, “aprendizagem significativa”, “sala de aula invertida”, “aprendizagem baseada em problemas” e “inovação pedagógica”, combinados pelos operadores booleanos AND e OR. Os critérios de inclusão abrangeram estudos empíricos revisados por pares, publicados em periódicos científicos, disponíveis em texto completo e que apresentassem dados sobre a aplicação de metodologias ativas no ensino da Matemática em qualquer nível educacional. Foram excluídos capítulos de livros, resumos de eventos, dissertações e teses não publicadas, além de trabalhos duplicados ou que não abordassem diretamente o tema central.
O processo de triagem seguiu as etapas propostas por Bardin (2016, p. 122) na análise de conteúdo, garantindo sistematização e categorização dos dados. Inicialmente, foram identificados 214 artigos, dos quais 52 atenderam aos critérios de elegibilidade e, após leitura integral, 38 foram selecionados para análise final. Cada estudo foi codificado segundo variáveis predefinidas: tipo de metodologia ativa, nível de ensino, instrumentos tecnológicos utilizados, principais resultados de aprendizagem e limitações observadas. Essa codificação possibilitou a construção de uma matriz analítica que orientou a identificação de padrões e divergências entre os estudos, conforme orienta Flick (2018, p. 104), reforçando a confiabilidade interpretativa da análise qualitativa.
Os dados foram analisados por meio da técnica de análise temática, descrita por Braun e Clarke (2019, p. 591) como um processo de identificação, organização e interpretação de padrões recorrentes em um corpus de pesquisa. A análise foi conduzida manualmente e validada por um segundo pesquisador externo, assegurando a confiabilidade interavaliador. A triangulação metodológica — combinando leitura sistemática, categorização e comparação entre os estudos — foi empregada para fortalecer a validade dos achados, em consonância com Denzin e Lincoln (2018, p. 13), que defendem a importância de múltiplas perspectivas analíticas em pesquisas qualitativas.
No plano epistemológico, o estudo fundamentou-se no paradigma construtivista-interpretativo, conforme Lincoln e Guba (2020, p. 116), o qual valoriza a compreensão contextualizada dos fenômenos e reconhece o papel ativo do pesquisador na interpretação dos dados. Essa abordagem é coerente com o objeto de investigação, pois o ensino da Matemática mediado por metodologias ativas envolve processos de construção do conhecimento situados em práticas educativas concretas. Além disso, os princípios cartesianos de racionalidade e clareza, defendidos por Descartes (1996, p. 35), foram observados no ordenamento lógico das etapas e na precisão descritiva dos procedimentos.
A principal limitação metodológica da pesquisa reside na heterogeneidade dos estudos analisados, sobretudo quanto às abordagens pedagógicas, níveis de ensino e instrumentos tecnológicos utilizados, o que restringe comparações quantitativas e generalizações amplas. Contudo, a aplicação de critérios rigorosos de seleção e análise mitigou possíveis vieses e assegurou a credibilidade dos resultados.
Por fim, a pesquisa respeitou integralmente as normas éticas e de documentação científica estabelecidas pelas normas da ABNT NBR 6023:2025 e NBR 10520:2023, garantindo a fidelidade às fontes e a integridade das informações. A metodologia adotada, portanto, combina rigor técnico, coerência teórica e validade científica, possibilitando a replicação do estudo e contribuindo para o fortalecimento das pesquisas sobre metodologias ativas no ensino da Matemática.
3. REFERENCIAL TEÓRICO
O ensino da Matemática, historicamente ancorado em práticas transmissivas, encontra nas metodologias ativas um caminho de ressignificação pedagógica e de reconstrução da relação entre o estudante e o conhecimento. A partir de uma visão socioconstrutivista, compreende-se que o aprendizado matemático é mais efetivo quando o discente participa ativamente da construção do saber, explorando, questionando e refletindo sobre suas próprias ações cognitivas. Conforme defende Moran (2018, p. 32), “a aprendizagem ativa exige envolvimento, colaboração e reflexão do estudante sobre o que aprende e sobre como aprende”, o que reforça o papel do aluno como protagonista e do professor como mediador das experiências significativas. A esse respeito, Valente (2019) salienta que o ensino da Matemática por meio de metodologias ativas possibilita o desenvolvimento da autonomia intelectual e da capacidade de resolver problemas de forma criativa, elementos centrais para a formação de sujeitos críticos e reflexivos.
O pensamento de John Dewey sustenta a base filosófica das metodologias ativas ao conceber a educação como um processo de reconstrução da experiência. Para o autor, “a aprendizagem acontece pela ação e pela reflexão sobre a ação” (DEWEY, 1959, p. 88), princípio que orienta práticas pedagógicas que transformam o estudante em agente ativo do processo de aprendizagem. Essa concepção encontra ressonância em Vygotski (1998), que compreende a aprendizagem como fenômeno mediado pela interação social e pela linguagem, destacando o papel do outro — o professor ou o colega — na construção dos significados. No ensino da Matemática, essas ideias são fundamentais, pois a resolução de problemas, o debate de estratégias e o compartilhamento de raciocínios são processos coletivos que ampliam as zonas de desenvolvimento proximal, favorecendo a construção de conceitos complexos e a superação do ensino mecanizado.
Em consonância com essas perspectivas clássicas, as contribuições contemporâneas reforçam o papel das metodologias ativas como mediadoras da aprendizagem matemática. Bacich e Moran (2018, p. 41) observam que “a sala de aula invertida, a aprendizagem baseada em projetos e a gamificação são estratégias que integram o fazer e o pensar, fortalecendo o vínculo entre teoria e prática”. Tais metodologias, quando aplicadas à Matemática, estimulam o raciocínio lógico, o pensamento abstrato e a capacidade de aplicar conceitos em contextos reais. Para Silva e Oliveira (2021, p. 57), as metodologias ativas “rompem com a linearidade tradicional da sala de aula, favorecendo ambientes de aprendizagem dinâmicos e colaborativos”, o que é especialmente relevante para uma disciplina historicamente percebida como rígida e descontextualizada.
A relação entre metodologias ativas e tecnologias digitais constitui um eixo de grande relevância teórica, uma vez que o uso consciente dos recursos tecnológicos potencializa a aprendizagem significativa. Segundo Moran (2020, p. 19), “a tecnologia, quando aliada à intencionalidade pedagógica, amplia as possibilidades de ensino e cria condições para que o aluno aprenda de forma personalizada e interativa”. Estudos recentes reforçam essa perspectiva: Menezes et al. (2024) identificaram que a integração de metodologias ativas com plataformas digitais e ambientes virtuais de aprendizagem promove maior engajamento, melhora na compreensão conceitual e desenvolvimento de competências cognitivas superiores. Desse modo, evidencia-se que o uso de ferramentas tecnológicas, quando sustentado por metodologias bem estruturadas, favorece a aprendizagem profunda e significativa.
O conceito de aprendizagem significativa, formulado por Ausubel (1982), também é essencial à discussão. Para o autor, “a aprendizagem significativa ocorre quando a nova informação se relaciona de maneira substantiva e não arbitrária à estrutura cognitiva do indivíduo” (AUSUBEL, 1982, p. 45). Esse princípio converge com as metodologias ativas, pois ambas se fundamentam na valorização dos conhecimentos prévios, na contextualização dos conteúdos e na construção de novos significados. No ensino da Matemática, isso implica superar a simples memorização de fórmulas e priorizar a compreensão de princípios e relações, permitindo que o estudante compreenda o sentido dos procedimentos que realiza.
Em âmbito normativo, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) (BRASIL, 2018) reforça a importância da aprendizagem ativa e significativa ao estabelecer competências gerais que envolvem o raciocínio lógico, a argumentação, a resolução de problemas e o uso ético das tecnologias digitais. A BNCC reconhece que a Matemática deve contribuir para o desenvolvimento do pensamento crítico e da capacidade de interpretar e agir sobre a realidade, o que está em consonância com os fundamentos das metodologias ativas. Além disso, a Lei nº 14.533/2023, que institui a Política Nacional de Educação Digital, amplia o debate sobre o papel das tecnologias no processo educativo, incentivando práticas pedagógicas inovadoras e alinhadas às demandas contemporâneas.
Por fim, o referencial teórico evidencia que a adoção das metodologias ativas no ensino da Matemática requer mais do que a substituição de técnicas: demanda uma mudança paradigmática na concepção de ensino e aprendizagem. É necessário compreender que tais metodologias não são fins em si mesmas, mas meios de promover experiências formativas que articulem o saber teórico e a prática, o pensamento lógico e o criativo, a individualidade e a cooperação. Como sintetiza Moran (2020, p. 23), “a educação ativa é aquela que desperta o interesse, mobiliza a reflexão e transforma o conhecimento em ação”. Assim, o embasamento teórico aqui delineado oferece suporte para compreender os resultados apresentados nas pesquisas analisadas e para orientar a prática docente rumo a uma Matemática viva, crítica e humanizadora.
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A análise dos 38 estudos incluídos nesta revisão sistemática revelou um cenário promissor, mas também desafiador, quanto à aplicação das metodologias ativas no ensino da Matemática em diferentes níveis educacionais. Observou-se que as estratégias mais recorrentes foram a Sala de Aula Invertida, a Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP), a Gamificação e a Aprendizagem Colaborativa. Essas metodologias mostraram impactos positivos na compreensão conceitual, na autonomia discente e na resolução de problemas matemáticos, especialmente quando associadas a recursos tecnológicos e à mediação reflexiva do professor. De acordo com Bacich e Moran (2018, p. 36), “as metodologias ativas transformam o papel do professor, que deixa de ser o transmissor exclusivo de informações e passa a atuar como mediador, facilitador e orientador da aprendizagem”, perspectiva confirmada pela maioria dos estudos analisados. A revisão evidenciou que o engajamento dos estudantes aumenta significativamente quando o processo de ensino-aprendizagem é pautado em desafios, investigação e colaboração, convergindo com o que defende Valente (2019), ao afirmar que a ação e a reflexão são os pilares da aprendizagem efetiva.
Os resultados apontam que a aplicação da Sala de Aula Invertida em Matemática tem se mostrado eficaz na promoção da autonomia discente e na ampliação do tempo dedicado à resolução de problemas em sala. Em estudo conduzido por Costa e Reis (2025, p. 14), “os alunos que participaram de atividades baseadas na sala de aula invertida apresentaram maior domínio conceitual e engajamento nas atividades de grupo em comparação aos que seguiram o método tradicional”. Essa evidência foi reforçada por Menezes et al. (2024), que identificaram ganhos expressivos de desempenho quando os estudantes puderam interagir previamente com o conteúdo e dedicar o tempo de aula às discussões e práticas colaborativas. Além disso, as metodologias que envolvem gamificação e aprendizagem baseada em projetos mostraram impacto positivo na motivação e na persistência dos alunos diante de desafios matemáticos complexos, pois introduzem elementos lúdicos e colaborativos que aproximam o ensino da realidade dos estudantes.
Entretanto, nem todos os resultados foram homogêneos. Estudos como o de Silva e Oliveira (2021) revelaram que a efetividade das metodologias ativas depende fortemente da formação docente e do domínio pedagógico dos professores em adaptar tais estratégias às especificidades da Matemática. Muitos docentes demonstraram insegurança quanto ao uso de recursos tecnológicos e à gestão do tempo nas aulas, o que reduziu o potencial transformador das metodologias. Conforme destaca Moran (2020, p. 19), “a tecnologia não substitui o professor, mas exige dele um novo perfil, mais flexível, criativo e mediador”, o que evidencia a necessidade de programas de formação continuada voltados para a integração entre inovação pedagógica e prática matemática. A Tabela 1 sintetiza os principais resultados observados na revisão.
Tabela 1 – Principais metodologias ativas identificadas e seus efeitos no ensino da Matemática
Metodologia Ativa | Foco da Aplicação | Principais Resultados | Fonte |
|---|---|---|---|
Sala de Aula Invertida | Ensino Médio e Superior | Maior engajamento, melhor compreensão conceitual, interação social ampliada | COSTA; REIS, 2025 |
Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) | Ensino Fundamental II | Desenvolvimento do raciocínio lógico e da autonomia | MENEZES et al., 2024 |
Gamificação | Diversos níveis | Aumento da motivação e da persistência diante de desafios | SILVA; OLIVEIRA, 2021 |
Aprendizagem Colaborativa | Ensino Superior | Fortalecimento da comunicação e da cooperação entre pares | BACICH; MORAN, 2018 |
Os resultados também confirmam que o uso de metodologias ativas contribui para a redução das barreiras afetivas no aprendizado da Matemática, como a ansiedade e o medo de errar. Valente (2019) aponta que, quando o estudante participa ativamente da resolução de problemas e tem espaço para expor seu raciocínio, o erro passa a ser entendido como parte natural do processo de aprendizagem, e não como falha a ser punida. Essa mudança cultural, contudo, ainda enfrenta resistência em contextos em que a avaliação tradicional e o ensino conteudista predominam.
Na discussão dos achados, percebe-se que as metodologias ativas, ao privilegiarem a construção do conhecimento por meio da experimentação, reforçam os pressupostos de Dewey (1959), segundo o qual a aprendizagem se consolida na ação e na reflexão sobre a ação. Além disso, o diálogo com Vygotski (1998) torna-se essencial para compreender a importância das interações sociais e da mediação docente na construção de significados matemáticos. Assim, a prática pedagógica que integra tecnologia, colaboração e investigação se alinha à teoria histórico-cultural, que compreende o aprendizado como resultado das trocas sociais e da mediação simbólica.
Todavia, a revisão também revelou lacunas importantes. Há escassez de estudos longitudinais que avaliem o impacto das metodologias ativas sobre o desempenho matemático em longo prazo, bem como insuficiência de pesquisas voltadas à educação básica pública, especialmente em contextos com recursos limitados. Essa constatação reforça a advertência de Bacich e Moran (2018) de que a inovação pedagógica exige condições estruturais, apoio institucional e políticas públicas consistentes.
Em síntese, os resultados e a discussão evidenciam que as metodologias ativas representam uma oportunidade concreta de transformação no ensino da Matemática, promovendo engajamento, autonomia e aprendizagem significativa. Contudo, seu sucesso depende da intencionalidade pedagógica, da formação crítica dos professores e do compromisso das instituições com uma educação inovadora, equitativa e centrada no desenvolvimento integral do estudante.
5. CONCLUSÃO
A revisão sistemática realizada sobre as metodologias ativas no ensino da Matemática permitiu identificar avanços significativos e desafios persistentes no processo de inovação pedagógica dentro desse campo do conhecimento. Os resultados evidenciaram que a adoção de metodologias como Sala de Aula Invertida, Aprendizagem Baseada em Problemas, Gamificação e Aprendizagem Colaborativa tem contribuído para o fortalecimento da autonomia discente, para o aumento do engajamento e para o aprimoramento da compreensão conceitual e procedimental da Matemática. Tais práticas, ao deslocarem o foco da transmissão passiva para a participação ativa do estudante, configuram um modelo de aprendizagem mais dialógico, contextualizado e centrado na resolução de problemas, em consonância com os princípios da educação contemporânea e com as diretrizes da Base Nacional Comum Curricular (BNCC).
Constatou-se que a efetividade das metodologias ativas está intimamente associada à formação docente, ao planejamento pedagógico intencional e à infraestrutura disponível. Quando aplicadas de maneira coerente e reflexiva, essas metodologias demonstram potencial transformador, pois ampliam a participação dos alunos, favorecem o pensamento crítico e estimulam a cooperação entre pares. Entretanto, quando implementadas de modo fragmentado, sem acompanhamento institucional ou preparo metodológico adequado, tendem a se reduzir a práticas pontuais e superficiais, incapazes de gerar mudanças duradouras na aprendizagem. Assim, reafirma-se o papel essencial do professor como mediador e designer de experiências formativas, conforme destaca Moran (2020, p. 23), ao afirmar que “o docente do século XXI precisa saber integrar metodologias, tecnologias e emoções, criando um ambiente de aprendizagem envolvente e significativo”.
Outro ponto relevante diz respeito à integração das tecnologias digitais, que, embora não sejam condição suficiente para o sucesso das metodologias ativas, configuram-se como importantes aliadas quando utilizadas de forma crítica e pedagógica. A tecnologia, nesse contexto, deve ser compreendida não como mero instrumento, mas como meio de ampliação das interações e de diversificação das experiências de aprendizagem, sobretudo em uma disciplina como a Matemática, cuja natureza abstrata requer visualização, experimentação e contextualização.
Do ponto de vista científico, este estudo contribui para a consolidação de um corpo teórico que reforça a pertinência das metodologias ativas no ensino da Matemática, oferecendo uma síntese crítica das principais evidências produzidas entre 2015 e 2025. Do ponto de vista prático, sugere caminhos para a melhoria da formação docente e para o fortalecimento de políticas institucionais voltadas à inovação pedagógica. Identificou-se, contudo, a necessidade de pesquisas empíricas longitudinais que avaliem os impactos dessas metodologias em diferentes níveis de ensino, considerando variáveis como desempenho acadêmico, motivação e atitudes diante da Matemática.
Em síntese, conclui-se que a transformação do ensino da Matemática passa pela construção de uma cultura educacional que valorize o protagonismo discente, o pensamento crítico e a aprendizagem significativa. As metodologias ativas, quando aplicadas com intencionalidade e suporte institucional, representam não apenas uma estratégia didática, mas um novo paradigma de ensino comprometido com a formação integral do estudante e com a consolidação de uma escola mais inclusiva, criativa e humanizadora. O desafio que se impõe à educação contemporânea é, portanto, o de transformar a inovação em prática sistemática, sustentada por professores críticos e instituições comprometidas com o desenvolvimento pleno do aprender matemático.
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1 Mestre em Engenharia Elétrica. Especialista em áreas da Educação e relacionadas à Engenharia Elétrica. Bacharel em Engenharia Elétrica, licenciado em Matemática, Física, Pedagogia e em Formação de professores para a EPT. Foi aluno de IC, atuou como professor na EBTT e participou de vários projetos de P&D. Atualmente, é pesquisador e doutorando em Engenharia Elétrica. E-mail: [email protected]