INTEGRAÇÃO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL E SANITÁRIA NO CONTROLE DA DENGUE E A INFLUÊNCIA DE FATORES CLIMÁTICOS NOS CASOS DA DOENÇA NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO
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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10359337
Vinícius Sobreira do Prado¹
Orientadora: Ludmila Cunha Almeida
1.0 Introdução
1.1 Histórico da Educação Ambiental
Segundo BARRETO (2007), desde 1960 o mundo tem testemunhado um significativo desenvolvimento no campo da educação ambiental, que visa contribuir para a resolução dos problemas ambientais que se tornam cada vez mais evidentes.
LEONARDI (1997) afirma que nos anos 60, diversos grupos, entidades e algumas políticas governamentais começaram a preocupar-se com a educação ambiental. Em 1968, na Grã-Bretanha, surgiu o Conselho para educação ambiental e, na França e nos países nórdicos, no mesmo ano, foram aprovadas intervenções na política educacional, como normas, deliberações e recomendações que introduziram a educação ambiental no currículo escolar.
No ano de 1972, em Estocolmo, ocorreu a Conferência das Nações Unidas (ONU) sobre o Ambiente Humano, na qual foram produzidos três documentos. A Declaração sobre o Ambiente Humano, que abordou a importância da ciência, da tecnologia, da educação e da pesquisa, no sentido de promoverem a preservação ambiental, ofereceu orientações aos governantes de como agir de maneira ecologicamente correta para com o meio ambiente. O Plano de Ação Mundial, que ressaltou a importância de um Programa Internacional de Educação Ambiental, forneceu as bases para a constituição de uma Agenda Global de Ação Ambiental, o terceiro documento produzido na ocasião. Os três documentos tinham como eixo comum a incompatibilidade da proposta de desenvolvimento, já que a da tendência dominante era com o modelo capitalista vigente (CARVALHO, 2002).
O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), criado em 1973, reforçou a necessidade da educação e da formação ambiental em todas as atividades exercidas pelos organismos internacionais. A educação ambiental adquiriu relevância e vigência internacionais, tendo como méritos fundamentais o início da discussão do conceito de meio ambiente e, também, a necessidade de se estabelecer enfoques institucionais interdisciplinares para sua abordagem. Assim, em 1974, esses elementos comuns foram resumidos nos “Princípios de Educação Ambiental” estabelecidos pelo Seminário sobre Educação Ambiental, realizado em Jammi pela Comissão Nacional Finlandesa para a UNESCO, como apresentado a seguir (SGUAREZZI, 1997):
A educação ambiental é o componente de todo pensamento e de toda atividade da cultura, no mais amplo sentido da palavra; seu fundamento é a estratégia de sobrevivência da humanidade e de outras formas da natureza;
A estratégia de sobrevivência é um enfoque geral que requer conhecimentos das ciências naturais, tecnologia, história e sociologia; assim como os meios intelectuais para analisar e sintetizar esses conhecimentos a fim de criar modos de atuação;
Além da estratégia de sobrevivência, devem ser considerados aspectos como a qualidade de vida, as metas fixadas a este respeito e os meios com que conta a humanidade para alcançá-las;
A educação ambiental espera levar em consideração os princípios da ecologia no planejamento social, em diferentes atividades e na economia, nos planos nacionais e internacionais.
Em Belgrado, no ano de 1975, no Encontro Internacional sobre educação ambiental promovido pela Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) foi elaborada a Carta de Belgrado que preconizava a adoção de uma nova ética global e a necessidade da utilização de forma equilibrada dos recursos mundiais, proporcionando uma melhor qualidade de vida. Além da Carta de Belgrado foi criado o Programa Internacional de Educação Ambiental (PIEA), ressaltando que a esta prática educativa deveria ser contínua e multidisciplinar, voltada para os interesses nacionais, sem deixar de considerar as especificidades regionais (DIAS, 2010).
Reuniões foram realizadas em diversas cidades do mundo, inclusive em São Paulo, para discutir os problemas ambientais e as possíveis soluções. As conclusões foram publicadas em um livro “O Nosso Futuro Comum”, conhecido também como Relatório Brundtland de 1987, o qual forneceu subsídios temáticos para a reunião internacional realizada posteriormente, a Rio-92, ou como ficou conhecida no Brasil, a ECO-92 (REIGOTA, 2001).
O Relatório Brundtland propõe o conceito de desenvolvimento sustentável, definido como aquele que deve atender às necessidades e aspirações do presente, sem comprometer a possibilidade de atendê-las no futuro. Defende a superação da pobreza e o respeito aos limites ecológicos associados ao crescimento econômico como condições para se alcançar a sustentabilidade.
A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD) a ECO-92, representou um momento estratégico de rearticulação de regras, através de documentos elaborados para orientar o mundo, na adoção de um novo modelo de apropriação e gestão dos recursos naturais nas próximas décadas (CARVALHO, 2002).
Essa conferência trouxe importantes conquistas e avanços como a consolidação da ideia do desenvolvimento sustentável em larga escala, ficando comprovado na Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, também chamada de Carta da Terra; na Convenção sobre a Conservação da Biodiversidade, a qual foi assinada por todos os países presentes, exceto os Estados Unidos e a Austrália; e, a Agenda 21. Nesse evento, buscou-se examinar estratégias de desenvolvimento sustentável através de uma série de acordos e compromissos com diferentes governos do mundo (GUIMARÃES, 2004).
A Agenda 21 é o mais extenso e detalhado tratado que a comunidade internacional acordou para fazer face ao dilema entre o ser humano e a natureza, assim como para enfrentar o paradoxo entre evolução tecnológica e a crescente miséria social. Esse documento orienta as nações para um novo padrão de desenvolvimento para o século XXI, cujo alicerce é a sinergia da sustentabilidade ambiental, social e econômica (Figura 1) (AGENDA 21, 1996).
Na África do Sul, em agosto de 2002, ocorreu a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+10. Um dos objetivos desse evento era verificar os avanços nas metas e nos acordos determinados na Rio-92, tendo como referência a Agenda 21. No entanto, segundo (CAMARGO, 2003), observou-se que ainda prevaleceram os interesses comerciais e econômicos sobre os direitos humanos e a preservação ambiental. (TOZONI-REIS 2004) afirma que neste evento fez-se um balanço dos dez anos da Agenda 21, constatando-se a permanência da insustentabilidade do modelo econômico em curso.
No Brasil, em abril de 2006, ocorreu o V Congresso Ibero-Americano de Educação Ambiental, possuindo como aspecto relevante, segundo PÁDUA (2006), o movimento de revisão do Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global, lançado na Rio-92. Foram apresentados os princípios do documento original e sugerida a criação de um Conselho Internacional para se avaliar o que necessita ser atualizado.
O percurso histórico da educação ambiental evidencia que a transformação se encontra em curso e para mudar é necessário o compromisso com o meio ambiente e vontade de querer fazer.
1.2 Histórico da Educação Sanitária
Segundo MARCONDES (1964), em substituição à palavra “higiene”, surgiu nos Estados Unidos da América (EUA), em 1919, a expressão health education (“educação sanitária”).
No período de 1916 a 1942, a Fundação Rockfeller, instituição estadunidense, visando o controle das doenças tropicais com métodos de tratamento de baixo custo, atuou no Brasil e especialmente em alguns dos principais estados brasileiros. Um dos objetivos era o serviço de educação sanitária, que mostrava à população os benefícios das ações de saúde e a necessidade de observar as regras de higiene. Para os sanitaristas da época, nada mais eficaz do que a propaganda e a educação higiênica como ação profilática contra uma doença transmissível (OLIVEIRA, 2006).
Em 1924, no município de São Gonçalo, no estado do Rio de Janeiro, Carlos Sá e César Leal Ferreira criaram o primeiro Pelotão de Saúde em uma escola estadual. A educação deveria anular toda e qualquer oposição aos preceitos sanitaristas (LEVY et al., 1996).
As ideias da educação sanitária trazidas dos Estados Unidos da América para São Paulo, a partir de 1920, pelos professores Dr. Geraldo Horácio de Paula Souza e Dr. Francisco Borges Vieira, resultaram na redução do poder de polícia na saúde e na reforma dos serviços de saúde pública de São Paulo (PELICIONI e PELICIONI, 2007).
Dr. Geraldo Horácio de Paula Souza, então Diretor-Geral do Serviço Sanitário, criou, em 1925, a Inspetoria de Educação Sanitária e os Centros de Saúde do Estado de São Paulo, com a finalidade de promover uma consciência sanitária adquirida por meio da transmissão de conhecimentos sobre higiene e a cooperação em campanhas profiláticas (MARCONDES, 1964).
O Centro de Saúde seria uma aparelhagem, na qual o indivíduo sanitariamente ignorante e, por isso, potencialmente doente, entraria e apareceria saudável do outro lado (COSTA, 1999).
A Fundação do Ministério da Educação e Saúde, na década seguinte, reunindo estas duas funções paralelas, tinha condições de proporcionar aos administradores as oportunidades de conjugá-las e, consequentemente, prover um campo educacional extraordinário para o propósito de tornar a vida saudável (LEVY et al., 1996; TOZZONI, 2004).
Com o início do Estado Novo (1937), período de ditadura instaurado pelo governo de Getúlio Vargas, foram extintos os Centros de Saúde e criados os Institutos de Aposentadorias e Pensões para atender aos trabalhadores do setor produtivo (MARCONDES, 1964).
Para LEVY et al. (1996), a primeira grande transformação de mentalidade nas atividades da educação sanitária ocorreu em 1942, com a criação do Serviço Especial de Saúde Pública (SESP). Desde seu começo, o SESP reconheceu a educação sanitária como atividade básica de seus planos de trabalho, atribuindo aos diversos profissionais, técnicos e auxiliares de saúde, a responsabilidade das tarefas educativas, junto a grupos de gestantes, mães, adolescentes e à comunidade em geral. Foi o SESP que começou a preparar as professoras da rede pública de ensino como agentes educacionais de saúde.
De 1945 em diante, com a criação da Organização Mundial da Saúde (OMS), surgiram novas discussões sobre o processo saúde doença, destacando-se o conceito de saúde como o estado de mais completo bem-estar e não simplesmente ausência de doença. Embora o conceito de bem-estar fosse bastante amplo e pouco definido, constituiu-se em um avanço para o processo de transformação da educação sanitária (PELICIONI e PELICIONI, 2007).
A separação do Ministério da Educação e Saúde em duas instituições autônomas poderia ter propiciado o fortalecimento da área de Educação Sanitária, mas isto só ocorreu alguns anos depois, primeiro com Ruth Marcondes e posteriormente com Brito Bastos, quando aconteceu uma grande transformação, com a reformulação da estrutura do Serviço Nacional de Educação Sanitária e a integração das atividades de educação no planejamento das ações dos demais órgãos do Ministério da Saúde (LEVY et al., 1996).
Na década de 1990 teve início a implementação da estratégia do Programa Saúde da Família que, no contexto da política de saúde brasileira, deve contribuir para a construção e consolidação do SUS (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1997). Dentre os diversos espaços dos serviços de saúde, destaca-se os de atenção básica como um contexto privilegiado para desenvolvimento de práticas educativas em saúde. Isso devido à particularidade destes serviços, caracterizados pela maior proximidade com a população e a ênfase nas ações preventivas e promocionais. (VASCONCELOS, 2001). Dentre as funções de um médico de atenção básica, destacam-se: prestar atenção preventiva, curativa e reabilitadora, ser comunicador e educador em saúde (BRANDÃO, 2001; L’ABBATE, 1994; ALBUQUERQUE, 2004).
Segundo STOTZ (2005), entre aqueles que vêm de práticas tradicionais de trabalho, a entrada no Programa Saúde da Família evidencia alguns problemas relacionadas à formação: competências construídas com base em currículos inadequados e acríticos, despreparo dos profissionais para o enfrentamento compartilhado dos problemas na comunidade, dificuldade em estabelecer diálogos e parcerias, ignorância da importância dos referenciais teóricos e metodológicos para o estabelecimento de processos pedagógicos de fato efetivos.
Na crítica à própria formação, verifica-se a não valorização de práticas educativas como possibilidade de instaurar novas relações e processos no âmbito da saúde. É comum entre os profissionais de saúde a cultura de que não é preciso “aprender” a fazer educação em saúde, como se o saber clínico e a capacidade de falar de forma coloquial fossem suficientes para a implementação dessa prática (ALBUQUERQUE, 2004) a reflexão metodológica é tratada como algo desnecessário.
Segundo VALLA (1999), com esse raciocínio, é frequente encontrarmos atividades baseadas nas “palestras” prescritivas de hábitos e condutas, tratando a população usuária de forma passiva, transmitindo conhecimentos técnicos sobre as doenças e como cuidar da saúde, sem levar em conta o saber popular e as condições de vida dessas populações. Muitas vezes, a culpabilização do próprio paciente por sua doença predomina na fala do profissional de saúde, mesmo que este conscientemente até saiba dos determinantes sociais da doença e da saúde.
Embora representem concepções totalmente diferentes, a educação sanitária e a educação em saúde continuam a existir até os dias de hoje nas ações desenvolvidas por profissionais com variadas formações. Atividades educativas ainda tem caráter higienista, imperativo e de transmissão linear de conhecimentos, em um retorno histórico às raízes da educação em saúde e raramente com objetivos de autonomia e cidadania (VALLA, 1999; VASCONCELOS, 2001; ALVES, 2005; (PELICIONI e PELICIONI, 2007).
1.3 O que é a Dengue – Vetor
Dengue é hoje a principal doença re-emergente no mundo. As dificuldades de combater o mosquito Aedes aegypti, em grandes e médias cidades, são muitas. Há facilidades para sua proliferação e limitações para reduzir seus índices de infestação, geradas pela complexidade da vida urbana atual. Conhecendo bem o vetor, é possível prevenir epidemias de grandes dimensões por meio do aprimoramento da vigilância epidemiológica, e é possível e factível reduzir a letalidade da doença. A elaboração e execução de planos estratégicos de organização da assistência aos casos suspeitos de dengue têm mostrado, tanto em outros países, como em algumas cidades brasileiras, ser um instrumento muito útil na redução da letalidade. (TAUIL, 2001).
O vírus da dengue pertencente ao gênero flavivírus, família Flaviviridae, apresenta quatro sorotipos (1, 2, 3, 4). Fatores como a urbanização acelerada, facilidades de transporte entre regiões e falência dos programas de controle do A. aegypti favorecem o aumento da transmissão da dengue. (SCHATZMAYR, 2000; TAUIL 2001, 2002).
A proliferação do mosquito é feita pela postura de ovos pela fêmea em coleções de água parada onde posteriormente eles eclodem originando as larvas. O tempo decorrido entre a eclosão do ovo e o mosquito adulto é cerca de 10 dias, sendo influenciado por fatores como a temperatura, que acelera esse processo. O ovo do mosquito sobrevive por até um ano fora da água, aguardando condições ambientais favoráveis para se desenvolver (FIOCRUZ, 2008).
1.4 Sintomas
Por outro lado, os sintomas iniciais da dengue hemorrágico, apesar de semelhantes aos da dengue clássico (Tabela 1), podem evoluir rapidamente para manifestações hemorrágicas e choque. Os casos típicos da dengue hemorrágico são caracterizados por febre alta, fenômenos hemorrágicos, hepatomegalia e insuficiência circulatória. Nos casos graves, o choque ocorre entre o 3º e 7º dia de doença, geralmente precedido por dores abdominais. Sua duração é curta, podendo levar ao óbito em 12 a 24 horas ou à recuperação rápida após terapia apropriada. Um achado laboratorial importante da dengue hemorrágico é a trombocitopenia com hemoconcentração concomitante. A gravidade da dengue hemorrágico está relacionada à efusão do plasma, caracterizada por valores crescentes do hematócrito. (FIGUEIREDO, 2002; GUZMÁN, 2002; HARRIS, 2000)
1.5 Prevenção/Profilaxia
A melhor forma de se evitar a dengue é combater os focos de acúmulo de água, locais propícios para a criação do mosquito transmissor da doença (Figura 3). Para isso, é importante não acumular água em latas, embalagens, copos plásticos, tampinhas de refrigerantes, pneus velhos, vasinhos de plantas, jarros de flores, garrafas, caixas d´água, latões, cisternas, sacos plásticos e lixeiras, entre outros.