DIREITO INTERNACIONAL DO TRABALHO E LEGISLAÇÃO NACIONAL: UMA RELAÇÃO EM CONSTRUÇÃO

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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.15355064


Kevin Cristian Paulino Freires1
Micael Campos da Silva2
Francisco Damião Bezerra3


RESUMO
O presente trabalho insere-se no contexto do crescente diálogo entre o Direito Internacional do Trabalho e a legislação nacional brasileira, marcado por desafios relacionados à soberania jurídica e à necessidade de harmonização normativa frente às exigências internacionais. O estudo teve como objetivo analisar a relação entre as normas oriundas da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e o ordenamento jurídico interno, com foco na identificação de mecanismos de integração e nos principais obstáculos enfrentados nesse processo. A pesquisa adotou uma metodologia de cunho bibliográfico e de natureza qualitativa, com base em obras doutrinárias, tratados internacionais, legislações e documentos oficiais. Os resultados demonstram que, embora o Brasil tenha ratificado diversas convenções da OIT, sua aplicação prática ainda encontra entraves normativos, políticos e institucionais. Conclui-se que é necessária uma intensificação do diálogo entre os sistemas jurídicos e o fortalecimento de instrumentos que garantam a efetivação dos direitos trabalhistas em consonância com os parâmetros internacionais.
Palavras-chave: Direitos Humanos. Direito Internacional. Globalização. Legislação Trabalhista. Tratados Internacionais.

ABSTRACT
This study is part of the growing dialogue between International Labor Law and Brazilian national legislation, marked by challenges related to legal sovereignty and the need for normative harmonization in light of international requirements. The study aimed to analyze the relationship between standards originating from the International Labor Organization (ILO) and the domestic legal system, focusing on identifying integration mechanisms and the main obstacles faced in this process. The research adopted a bibliographic and qualitative methodology, based on doctrinal works, international treaties, legislation and official documents. The results demonstrate that, although Brazil has ratified several ILO conventions, their practical application still encounters normative, political and institutional obstacles. It is concluded that it is necessary to intensify the dialogue between the legal systems and strengthen instruments that guarantee the implementation of labor rights in accordance with international parameters.
Keywords: Human Rights. International Law. Globalization. Labor Legislation. International Treaties.

1 INTRODUÇÃO

O Direito Internacional do Trabalho configura-se como um ramo jurídico que visa à regulamentação das relações laborais em âmbito transnacional, sendo constituído principalmente por convenções, tratados e recomendações elaboradas por organismos internacionais, com destaque para a Organização Internacional do Trabalho (OIT), fundada em 1919. Dessa forma, sua origem está diretamente vinculada aos anseios de justiça social e proteção aos direitos humanos trabalhistas, especialmente no contexto pós-Primeira Guerra Mundial, quando se tornaram evidentes as necessidades de estabelecer parâmetros mínimos de dignidade e segurança no trabalho.

Além disso, a crescente globalização das relações econômicas e a intensificação da circulação de capitais e pessoas ampliaram os desafios de integração entre as normas internacionais e os sistemas jurídicos internos. No Brasil, esse cenário implica na necessidade de interpretar e aplicar as normas da OIT de maneira compatível com a Constituição Federal e a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o que exige um contínuo processo de diálogo e adaptação normativa.

Consoante a isso, pode-se citar, por exemplo, a Convenção nº 98 da OIT, que trata do direito de sindicalização e de negociação coletiva, e sua incorporação tardia ao ordenamento jurídico brasileiro. À exemplo disso, a dificuldade em implementar determinados preceitos dessas convenções revela um embate recorrente entre os compromissos internacionais assumidos pelo país e a manutenção da autonomia legislativa nacional.

Diante disso, o problema que se coloca é: como o Brasil tem desenvolvido a integração entre as normas do Direito Internacional do Trabalho e sua legislação interna, e quais são os principais obstáculos para a harmonização efetiva entre esses dois níveis normativos?

Diante do exposto, esta pesquisa se justifica pela crescente relevância do tema em virtude da constante ampliação de acordos internacionais e da exigência de compatibilização jurídica em cenários de tensão entre soberania nacional e compromissos transnacionais, sobretudo em um mundo cada vez mais interdependente em termos econômicos, sociais e jurídicos.

Dessa maneira, esta pesquisa é relevante por contribuir para o entendimento da dinâmica entre o Direito Internacional do Trabalho e a legislação nacional brasileira, evidenciando a necessidade de um sistema normativo que respeite os tratados ratificados sem comprometer os princípios constitucionais internos, e lançando luz sobre a construção de uma governança jurídica laboral mais justa e eficiente.

Desse modo, este trabalho objetiva analisar como se estabelece a relação entre as normas do Direito Internacional do Trabalho, especialmente as convenções da OIT, e a legislação trabalhista brasileira, observando as possibilidades, os desafios e os limites dessa articulação normativa no contexto da soberania jurídica do país.

Outrossim, quanto ao percurso metodológico, a pesquisa será conduzida a partir de uma abordagem qualitativa e de natureza bibliográfica, com levantamento e análise de obras doutrinárias, artigos científicos, legislações e documentos oficiais pertinentes ao tema, especialmente os produzidos pela OIT e pelo ordenamento jurídico brasileiro.

Além do mais, como percurso teórico, o trabalho será fundamentado em autores especializados em Direito Internacional do Trabalho e Direito do Trabalho nacional, bem como textos e relatórios oficiais da OIT, que permitirão um estudo aprofundado do diálogo entre os sistemas normativos em questão.

Ademais, a estrutura deste trabalho será dividida em quatro partes: a introdução, que apresenta os fundamentos iniciais da pesquisa; o segundo capítulo, que discutirá as convenções da OIT e sua contribuição para a formação do marco normativo interno; o terceiro capítulo, que abordará os desafios de harmonização jurídica entre normas transnacionais e a soberania nacional; e, por fim, as considerações finais, que trarão as sínteses, reflexões e possíveis encaminhamentos para futuras investigações.

2 AS CONVENÇÕES DA OIT E A FORMAÇÃO DO MARCO NORMATIVO INTERNO: CAMINHOS DE INTEGRAÇÃO E DIÁLOGO JURÍDICO

O processo de ratificação das convenções da OIT no Brasil compreende a adesão formal do Estado às normas internacionais elaboradas no âmbito da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Fundada em 1919 e incorporada como agência especializada da ONU em 1946, a OIT tem como objetivo estabelecer padrões internacionais para garantir condições dignas de trabalho (OIT, 2024). Conforme previsto na Constituição Federal de 1988, o processo de internalização desses tratados requer aprovação do Congresso Nacional, conforme o artigo 49, inciso I.

Ademais, a relação entre os instrumentos internacionais e o sistema jurídico brasileiro está intrinsecamente ligada à necessidade de harmonização das normas internacionais com a legislação nacional, especialmente com a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), criada pelo Decreto-Lei nº 5.452/1943 (BRASIL, 1943). A contextualização dessa temática revela que, embora o Brasil tenha ratificado várias convenções, a integração dessas normas no ordenamento jurídico interno nem sempre ocorre de forma imediata ou eficaz, o que pode gerar conflitos normativos e dificuldades de aplicação prática.

Com isso, podemos citar como exemplo a Convenção nº 182 da OIT, que trata das piores formas de trabalho infantil. Apesar de ratificada pelo Brasil, a sua efetiva implementação depende de políticas públicas e de fiscalização constante. Conforme Uchoa (2025), a adesão a essa convenção representou um avanço significativo na proteção dos direitos da infância, mas sua eficácia só se concretiza por meio da articulação entre as normas internacionais e os órgãos internos responsáveis por sua execução.

Além disso, os mecanismos de compatibilização visam tornar viável a aplicação dos tratados internacionais no âmbito interno, ajustando-os à realidade jurídica brasileira sem que haja violação à soberania nacional. Segundo Husek (2023), o Brasil adota o sistema dualista moderado, que exige a incorporação formal dos tratados internacionais para que produzam efeitos internos, mantendo, assim, a autonomia do ordenamento jurídico nacional.

Dessa maneira, a contextualização evidencia que essa compatibilização não se resume a aspectos formais, mas também envolve um processo hermenêutico, no qual o Poder Judiciário tem papel fundamental na interpretação conforme os direitos fundamentais e os princípios constitucionais. Piló (2025) argumenta que essa interpretação deve ser realizada à luz da segurança jurídica e da proteção dos direitos humanos.

Como exemplo, podemos mencionar a Convenção nº 98 da OIT, que trata do direito de sindicalização e de negociação coletiva. Apesar de estar incorporada ao ordenamento jurídico nacional, há desafios na sua efetiva aplicação em setores com histórico de precarização das relações de trabalho, o que demanda interpretações judiciais coerentes com o espírito da norma internacional.

Consoante a isso, é fundamental compreender o papel das instituições brasileiras, como o Poder Executivo, o Legislativo, o Judiciário, o Ministério Público do Trabalho e os sindicatos, na efetivação dos tratados internacionais de trabalho. A OIT (2024) destaca que a cooperação entre esses atores é essencial para garantir o cumprimento dos compromissos assumidos internacionalmente.

Diante disso, a atuação coordenada dessas instituições permite uma contextualização mais precisa da realidade brasileira no que tange à aplicação das convenções internacionais. Cabe ao Judiciário, por exemplo, interpretar as normas com base nos princípios internacionais; ao Executivo, garantir a fiscalização e execução das políticas; e ao Legislativo, revisar a legislação nacional para eliminar eventuais contradições.

Como por exemplo, destaca-se a atuação do Ministério Público do Trabalho na promoção de ações civis públicas com base em convenções da OIT, especialmente no combate ao trabalho infantil e ao trabalho análogo à escravidão, conforme discutido por Uchoa (2025). Tais iniciativas revelam a importância do papel institucional na defesa dos direitos trabalhistas no Brasil.

3 HARMONIZAÇÃO JURÍDICA EM TERRITÓRIOS EM TENSÃO: SOBERANIA NACIONAL E DESAFIOS DAS NORMAS TRANSNACIONAIS

O princípio da soberania nacional refere-se à autoridade suprema de um Estado para governar seu território sem interferências externas. A origem desse princípio remonta à Paz de Vestfália, em 1648, marco histórico que consolidou o sistema moderno de Estados soberanos. No campo do Direito Internacional, tal conceito é frequentemente confrontado quando normas transnacionais, como as convenções da OIT, pretendem ser incorporadas aos sistemas jurídicos internos.

Além disso, a soberania torna-se um ponto de tensão quando se trata da implementação das normas internacionais em países com sistemas jurídicos rígidos ou conservadores. Conforme Husek (2023), embora o Direito Internacional do Trabalho tenha natureza cooperativa e pretenda proteger direitos fundamentais, há resistência por parte de Estados que temem perder o controle sobre suas legislações internas. Essa tensão exige constante diálogo entre as instâncias internacionais e os ordenamentos nacionais.

À vista disso, observa-se o caso da Convenção nº 138 da OIT, que trata da idade mínima para o trabalho. Enquanto países como o Brasil ratificaram e integraram a norma à sua legislação (como previsto na CLT, BRASIL, 1943), outros ainda enfrentam impasses políticos e econômicos para cumprir tais exigências. Exemplificativamente, conforme destaca Uchoa (2025), a aplicação da convenção ainda encontra obstáculos significativos em regiões economicamente desfavorecidas.

Dessa forma, as tensões jurídicas surgem quando a norma internacional colide com dispositivos constitucionais ou leis infraconstitucionais de determinado Estado. A origem dessas disputas está, muitas vezes, na falta de mecanismos eficientes de recepção normativa e na ausência de vontade política para harmonizar legislações.

Outrossim, o processo de internalização das convenções da OIT depende de sua compatibilidade com os princípios jurídicos nacionais, sendo necessária a ratificação por parte dos parlamentos internos. Conforme Piló (2025), tais tensões exigem um equilíbrio delicado entre o respeito à soberania e o compromisso com os direitos humanos e sociais assegurados internacionalmente.

Como por exemplo, a aplicação da Convenção nº 29 da OIT, que combate o trabalho forçado, revelou embates em países que praticam formas disfarçadas de servidão por dívida. No Brasil, sua aceitação fortaleceu dispositivos legais de combate ao trabalho escravo contemporâneo, como os artigos 149 e 149-A do Código Penal. Contudo, em outros países, tal implementação ainda é negligenciada.

Ademais, os mecanismos de diálogo jurídico envolvem estratégias multilaterais de negociação, mediação e troca de experiências entre Estados, organismos internacionais e atores sociais. A origem desses mecanismos está relacionada ao fortalecimento institucional da OIT, cuja fundação em 1919 visava estabelecer um sistema permanente de concertação entre governos, trabalhadores e empregadores (OIT, 2024).

Dessa maneira, a cooperação internacional tornou-se fundamental para superar barreiras legislativas e culturais que impedem a efetivação de direitos trabalhistas básicos. Através da atuação tripartite, a OIT promove seminários, relatórios técnicos e ações conjuntas entre países signatários de suas convenções, favorecendo a integração normativa e o respeito aos direitos fundamentais do trabalho.

Como exemplo por, destaca-se a atuação da OIT no combate ao trabalho infantil por meio de parcerias com países da América Latina, como o Brasil. Segundo Uchoa (2025), tais projetos colaborativos contribuíram para a criação de políticas públicas mais eficazes, integrando as convenções internacionais à realidade local com base no diálogo entre saberes jurídicos e sociais.

4 CONCLUSÃO/CONSIDERAÇÕES FINAIS

Sendo assim, o presente trabalho teve como objetivo geral analisar como se estabelece a relação entre as normas do Direito Internacional do Trabalho, especialmente as convenções da OIT, e a legislação trabalhista brasileira, observando as possibilidades, os desafios e os limites dessa articulação normativa. Tal objetivo foi plenamente atingido, uma vez que a pesquisa permitiu identificar os mecanismos legais e institucionais de incorporação das normas internacionais no ordenamento jurídico nacional, além de apontar os pontos de convergência e de tensão entre a soberania legislativa do país e os compromissos assumidos internacionalmente.

Com isso, os principais resultados evidenciam que, apesar da existência de um marco normativo internacional consolidado e da participação ativa do Brasil nas instâncias da OIT, há lacunas significativas na implementação efetiva das convenções ratificadas. A análise revelou, por exemplo, que a compatibilização entre as normas internacionais e a legislação nacional ocorre de forma pontual e, muitas vezes, depende de interpretações jurídicas e decisões políticas que nem sempre favorecem a concretização dos direitos trabalhistas em sua plenitude.

Além do mais, a pesquisa contribuiu teoricamente ao promover uma reflexão crítica sobre a necessidade de uma maior aproximação entre os sistemas normativos, propondo o fortalecimento do diálogo jurídico entre o direito internacional e o direito interno. O estudo reforça a importância do Direito Internacional do Trabalho como instrumento de defesa da dignidade humana e da promoção de condições de trabalho justas e equitativas, além de destacar o papel estratégico da OIT como referência normativa global.

Ademais, não foram identificadas limitações significativas no desenvolvimento da pesquisa, considerando que a abordagem bibliográfica de natureza qualitativa permitiu um exame aprofundado e crítico do tema. A seleção criteriosa das fontes e o uso de referenciais teóricos sólidos garantiram a coerência e a abrangência do estudo. Dessa forma, os métodos adotados mostraram-se eficazes para alcançar os objetivos propostos e oferecer subsídios relevantes para o campo do Direito do Trabalho.

Diante do exposto, como sugestão para pesquisas futuras, recomenda-se o desenvolvimento de estudos empíricos que investiguem, de forma direta, como as decisões judiciais brasileiras vêm aplicando as convenções internacionais do trabalho no cotidiano forense. Também é pertinente explorar o papel dos sindicatos, do Ministério Público do Trabalho e de outras instituições na efetivação desses normativos. Aprofundar o entendimento sobre a recepção das normas internacionais nos tribunais regionais do trabalho e na jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho pode ampliar ainda mais a compreensão das práticas jurídicas relacionadas ao tema.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho. Decreto-Lei n. 5.452, de 1º de maio de 1943. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm. Acesso em: 09 abr. 2025.

HUSEK, C. R. Curso de direito internacional público. São Paulo: LTr, 2023.

ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO – OIT. A história da OIT. 2024. Disponível em: http://www.oit.org.br/content/hist%C3%B3ria. Acesso em: 14 nov. 2016.

PILÓ, X. C. A prisão em segunda instância: segurança jurídica à luz dos direitos fundamentais e do direito internacional. São Paulo: Conhecimento Livraria e Distribuidora, 2025.

UCHOA, E. A. Direito internacional do trabalho e as convenções da OIT no combate ao trabalho infantil no Brasil. Revista Tópicos, São Paulo, v. 3, n. 18, p. 1-16, 2025. Disponível em: https://revistatopicos.com.br/artigos/direito-internacional-do-trabalho-e-as-convencoes-da-oit-no-combate-ao-trabalho-infantil-no-brasil. Acesso em: 09 abr. 2025.


1 Doutorando em Ciências da Educação pela Facultad Interamericana de Ciencias Sociales (FICS). E-mail: [email protected]

2 Doutorando em Ciências da Educação pela Facultad Interamericana de Ciencias Sociales (FICS). E-mail: [email protected]

3 Doutorando em Ciências da Educação pela Facultad Interamericana de Ciencias Sociales (FICS). E-mail: [email protected]