UTILIZAÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL JORNALÍSTICO NO ENSINO DE QUÍMICA: CASOS DE INTOXICAÇÃO POR METANOL NO BRASIL
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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.17429303
Francisco José Mininel1
Silvana Márcia Ximenes Mininel2
RESUMO
O presente trabalho utilizou notícias de diferentes fontes impressas ou online em sala de aula como recurso didático, analisando a compreensão dos conceitos da Química inerentes a atual contaminação de diversas pessoas com metanol ao tomarem bebidas destiladas no Brasil. Dessa forma, as reportagens veiculadas foram utilizadas em sala de aula de modo que os alunos relacionassem o tema da intoxicação com metanol aos conteúdos químicos inerentes ao tema, de modo que estes pudessem explicar o porque da intoxicação e porque o metanol era tão tóxico ao organismo humano. Notícias de fontes diversas foram utilizadas como recurso didático para as aulas de Química, buscando fazer com que os alunos compreendessem a relação entre a mídia, o cotidiano, os conceitos químicos inerentes às notícias, conceitos já estudados e a produção de conhecimento, proporcionando assim o desenvolvimento do conteúdo e aprendizagem significativa dos conceitos químicos de forma contextualizada. A prática se mostrou exitosa, uma vez que os alunos estavam bastante motivados a entender os efeitos do metanol no organismo humano em decorrência, inclusive, da exposição contínua do assunto pela mídia televisiva. Após o uso de notícias dentro da sala de aula, observou-se que ocorreu uma preocupação e um interesse em opinar mais firmemente sobre os assuntos apresentados de maneira mais consistente cientificamente.
Palavras-chave: Metanol. Intoxicação. Notícias. Conteúdos químicos. Cotidiano.
ABSTRACT
This study used news from various print and online sources in the classroom as a teaching resource, analyzing the understanding of chemistry concepts inherent to the current methanol contamination of many people when drinking distilled beverages in Brazil. Thus, the broadcast news reports were used in the classroom so that students could relate the topic of methanol poisoning to the chemical content inherent in the topic, thus explaining the causes of the poisoning and why methanol was so toxic to the human body. News from various sources was used as a teaching resource for chemistry classes, seeking to help students understand the relationship between the media, everyday life, chemical concepts inherent in the news, concepts already studied, and knowledge production, thus fostering content development and meaningful learning of chemical concepts in a contextualized manner. The practice proved successful, as students were highly motivated to understand the effects of methanol on the human body, including due to the continuous exposure of the topic on television. After using news in the classroom, it was observed that there was a concern and interest in expressing a more solid opinion on topics presented in a more scientifically sound manner.
Keywords: Methanol. Poisoning. News. Chemical content. Everyday life.
1. INTRODUÇÃO
A abordagem da contemporaneidade é uma busca pela melhoria da aprendizagem. Ao contextualizar o que é ensinado em sala de aula juntamente com os temas contemporâneos, espera-se aumentar o interesse dos estudantes durante o processo e despertar a relevância desses temas no seu desenvolvimento como cidadão. O maior objetivo dessa abordagem é que o estudante conclua a sua educação formal reconhecendo e aprendendo sobre os temas que são relevantes para sua atuação na sociedade. Assim, espera-se que a abordagem dos Temas Contemporâneos Transversais (TCTs) permita ao estudante compreender questões diversas, tais como cuidar do planeta, a partir do território em que vive; administrar o seu dinheiro; cuidar de sua saúde; usar as novas tecnologias digitais; entender e respeitar aqueles que são diferentes e quais são seus direitos e deveres como cidadão, contribuindo para a formação integral do estudante como ser humano, sendo essa uma das funções sociais da escola (BRASIL, 2019, p. 4).
Assim, é função das Ciências, ampliar e qualificar a participação das crianças, adolescentes e jovens nas práticas relativas ao trato com a informação e opinião, que estão no centro da esfera jornalística/midiática. Para além de construir conhecimentos e desenvolver habilidades envolvidas na escuta, leitura e produção de textos que circulam no dia a dia, o que se pretende é propiciar experiências que permitam desenvolver nos adolescentes e jovens a sensibilidade para que se interessem pelos fatos que acontecem na sua comunidade, na sua cidade e no mundo e afetam as vidas das pessoas, incorporem em suas vidas a prática de escuta, leitura e produção de textos pertencentes a gêneros da esfera jornalística em diferentes fontes, veículos e mídias, e desenvolvam autonomia e pensamento crítico para se situar em relação a interesses e posicionamentos diversos e possam produzir textos noticiosos e opinativos e participar de discussões e debates de forma ética e respeitosa (BRASIL, 2017, p. 138).
Neste trabalho, emprega-se a leitura crítica de textos publicados na imprensa, especialmente o caso atual de contaminação com metanol, tanto impressos quanto online, como alternativa para melhorar o aprendizado de Química no Ensino Médio, bem como incentivar o hábito de leitura, e também satisfazer a necessidade de conhecimento sobre por que o metanol adicionado nas bebidas destiladas causar intoxicação severa, cegueira e óbitos . Dessa forma, enfatizamos que a leitura de jornais no ambiente escolar desenvolve nos jovens o senso crítico, servindo como uma ponte entre os conteúdos dos programas escolares e a realidade do mundo ao seu redor.
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Um dos objetivos primordiais da Química é fazer com que os alunos adquiram conhecimentos que os auxiliem a compreender os fenômenos naturais e a aplicar tal aprendizado em benefício da sociedade, colaborando na formação de um jovem mais crítico e consciente de sua participação na construção de um mundo melhor para todos.
Porém, ainda é comum que a apresentação dos assuntos seja feita sem que seja valorizada sua relação com o cotidiano, podendo fazer com que os alunos não percebam a importância daquele conhecimento para a formação deles e isso pode gerar falta de interesse e de motivação para estudar Química (BRASIL, 2002; CARDOSO; COLINVAUX, 2000).
Neste contexto, a leitura de notícias de jornal pode ser um recurso didático útil para que o aluno se sinta parte integrante do mundo a sua volta, pois o ajuda a desenvolver pensamento crítico a respeito de sua posição no contexto social do seu tempo. Em particular, a notícia de jornal que trata de um assunto relacionado à Química pode mostrar ao aluno o sentido real do conhecimento apresentado na sala de aula, formando o cidadão por intermédio da contextualização do ensino (DA CONCEIÇÃO, 2018).
Segundo Merquior (2018) os alunos ao estudarem Química, passam a adquirir conhecimentos que os auxiliam a entender fenômenos naturais e aplicar o que aprenderam em prol da sociedade. Para que os alunos possam se aventurar na disciplina de Química, é necessário utilizar textos e exemplos da Química do cotidiano, proporcionando aos alunos debates e discussões possibilitando a troca de opiniões divergentes, socializando-se com o dia a dia da Química, (NOVAIS; BERTON, 2015).
O noticiário, seja o impresso em papel, seja o publicado em mídia digital, é um meio de comunicação de elevada disponibilidade nos dias atuais. Freitas e Ortiz (2009) dizem que, ao folhear as páginas do jornal, o aluno não está apenas lendo, mas também está conectando-se com a sociedade e com o seu próprio cotidiano.
Segundo Krug (2015) a leitura é responsável pela formação do individuo e, dessa forma, influi na análise da sociedade, no dia a dia e amplia de forma a variar as visões e interpretações sobre o mundo.
Anhussi (2009) coloca que os jornais impressos ou digitais em sala de aula, desde as séries iniciais, podem contribuir para uma formação voltada para a competente atuação do educando, possibilitando-lhe capacidade crítica e argumentos necessários para viver no espaço em que se insere.
Assim sendo, trabalhar com notícias impressas ou online são importantes para a formação dos alunos, fazendo com que eles conheçam a sociedade em que estão inclusos. Esse tipo de mídia é um diferencial para o desenvolvimento de concepções (VITO, 2013). Chioto (2008) acentua que o jornal possui um caráter inovador para educação, pois serve para “acordar a criticidade dos alunos”, dando diversas possibilidades de trabalho, fazendo com que ocorra uma relação do mundo com diversos assuntos.
3. METODOLOGIA
Para estruturar a sequência didática de maneira significativa e envolvente ao aluno, procura-se conhecer melhor as concepções prévias dos estudantes e envolvê-lo na temática transversal escolhida, ou seja, “os casos de intoxicação por metanol no Brasil” por meio de uma roda de conversa (Figura 1).
Uma roda de conversa bem-preparada e bem conduzida pelo professor faz com que os alunos se conheçam melhor, escutem-se e tenham acesso a realidades heterogêneas. Tal estratégia pode romper as barreiras física e hierárquica entre professor e alunos, como afirma a mesma autora: “estar num círculo pressupõe igualdade: não há ali ninguém inferior ou superior, apenas igual. Ele sugere envolvimento, acolhimento. Num círculo, além de estarmos, ‘somos’” (PIZZIMENTI, 2013, p. 13).
A roda de conversas será guiada por algumas questões, como as que seguem:
Vocês têm acompanhado o noticiário televisivo sobre os casos de intoxicação por metanol no Brasil?
Vocês já ouviram falar sobre a substância metanol? E sobre o etanol?
Vocês sabem para que serve o metanol? Como é produzido?
Vocês sabiam da toxicidade do metanol no organismo vivo?
Após esse momento de conversa, pressupõe-se que os alunos já estejam bastante envolvidos com o tema, pois relataram suas percepções sobre os casos noticiados e expuseram suas percepções acerca da problemática da intoxicação.
Dando continuidade, a turma será dividida em grupos. A sala possuía um total de 20 alunos. Dessa forma, montou-se 5 grupos com 04 alunos. A cada grupo será atribuída uma matéria jornalística com notícias sobre o problema de intoxicação de pessoas no Brasil pelo consumo de bebidas adulteradas com metanol (Tabela 1). O objetivo desta fase é que concentrem sua atenção na matéria jornalística, que será seu estudo de caso. As leituras serão feitas a partir dos sites no laboratório de informática ou através da notícia impressa, trazida previamente para a aula pela professora.
Tabela 1. Matérias jornalísticas e sites para consulta.
TÍTULO DA NOTÍCIA | FONTE |
Não enxergo nada, diz internada após beber caipirinha em bairro nobre de SP… | |
Origem de bebidas com metanol pode ser de pequenas fábricas clandestinas, mesmo que o Brasil tenha fechado 1 a cada 5 dias | |
Bebida com metanol: 14 estados têm suspeitas e 17 casos são confirmados. | |
Metanol em bebidas alcoólicas: veja o que se sabe até agora sobre casos de intoxicação. | |
Metanol: Entenda como é feita a análise de bebidas adulteradas. |
3.1. Percepções e Resumos dos Casos
Logo após a leitura individual dentro de cada grupo, os alunos terão aproximadamente dez minutos para conversar com os outros integrantes sobre suas percepções do caso lido. Em seguida, terão de preparar, em conjunto, um breve e objetivo resumo do que leram para contar seu caso aos demais grupos. Tal produção será guiada pelas seguintes perguntas apresentadas pelo professor: O quê? Quem? Como? Quando? Onde? Por quê? O objetivo desse processo é a indução de algumas características do gênero jornalístico em estudo, contudo, os alunos ainda não as teriam formalizadas; primeiramente, aprenderiam pelo uso e, posteriormente, elas seriam descritas.
É de grande importância que se destaque o papel ativo também do professor durante todo o processo, no entanto, não como o detentor do conhecimento, e sim como um mediador que conduzirá todas as etapas da sequência didática. É por meio dessas estratégias indutivas que o professor articulará a dedução do objeto do conhecimento e o desenvolvimento das habilidades propostas.
Nesse processo, os aprendizes foram estimulados a pensar, conceituar e construir conhecimentos, interagindo com colegas e professor, além de vivenciarem diferentes valores pessoais e atitudes. Tais estratégias configuram, em parte, um dos modelos nos quais encontramos um exemplo de metodologia ativa.
Na sequência, os grupos terão aproximadamente cinco minutos para relatar os casos explorados aos demais estudantes. Para isso, terão o resumo guiado do passo anterior, que facilitará a narrativa. Essa etapa exige extensa intervenção do professor para a organização da fala de cada grupo e para pontuar o que de fato está na matéria jornalística e o que são juízos de valor dos alunos. Ao separar os fatos dos juízos de valor dos narradores (alunos), o professor começará outro processo indutivo-dedutivo sobre um dos aspectos do gênero jornalístico: a imparcialidade, pois não se pode perder de vista o objetivo específico da sequência didática. Por outro lado, as conversas, discussões, análises e relatos estão contextualizados no tema transversal que encabeça este projeto: intoxicação por metanol.
Nesta parte, o protagonismo da aula também se destaca nas mãos do professor, pois ele precisa formalizar o que é e quais são as características do gênero trabalhado. Por meio de algum recurso visual eletrônico e da lousa, o professor topicalizará e explicará alguns aspectos:
O que é o texto jornalístico.
Estrutura do gênero (pauta – apuração – redação – edição).
A linguagem jornalística (clara – simples – imparcial – objetiva).
Organização e redação da notícia (lide – pirâmide invertida – texto informativo).
Após a explicação e a formalização na lousa entre cada item acima, o professor exemplificará todos os aspectos citados em outra matéria jornalística relacionada ao tema transversal, pois um dos objetivos deste passo é a consolidação do que fora induzido e deduzido nos passos anteriores. Os estudantes farão os registros em seus cadernos e a interação ocorrerá por meio de perguntas do professor aos alunos, e vice-versa. Durante esse processo, após os exemplos demonstrados pelo professor, os alunos terão de reconhecer tais aspectos nos textos dos casos explorados por eles. Não será um desafio árduo, pois o corpus de análise já lhes é conhecido e parte desses aspectos lhes foi induzida antes da formalização.
3.1.2. Produção e Publicação de uma Notícia Científica Relacionada aos Aspectos Químicos da Contaminação do Organismo Vivo com Metanol (Interconexão da Notícia com a Química)
Nesta última parte da sequência didática, os alunos colocarão em prática as habilidades desenvolvidas durante o processo. Dessa forma, cada um dos grupos pesquisará fatos relacionados a problemas de contaminação com metanol e sua interação biológica no organismo vivo (metabolização). A partir da escolha da pauta e apuração dos fatos, escreverão uma pequena matéria jornalística aplicando as características do gênero e adequarão a linguagem para uma mídia digital na qual farão a publicação. O professor acompanhará a produção da notícia e, antes da publicação, trabalhará com a edição (correção) dos textos juntamente com os alunos. A combinação de metodologias ativas com tecnologias digitais móveis é hoje estratégica para a inovação pedagógica. As tecnologias ampliam as possibilidades de pesquisa, autoria, comunicação e compartilhamento em rede, publicação, multiplicação de espaços e tempos; monitoram cada etapa do processo, tornam os resultados visíveis, os avanços e as dificuldades (BACICH; MORAN,2018).
Fonte: Os autores.
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
O primeiro momento da aula foi então, uma Roda de Conversa, onde a partir da mediação da professora, os alunos iam manifestando suas concepções prévias a respeito do tema “intoxicação por metanol”. As perguntas dirigidas serviram de ponto de partida para que a professora pudesse ir aprofundando o assunto (Figuras 2, 3, 4 e 5) . Os dados abaixo indicam para a professora, os próximos passos a serem seguidos. Portanto, subsidiou a professora ajudando a organizar o trabalho pedagógico por meio de etapas que se conectam, permitindo guiar o aluno de forma lógica e progressiva, utilizando recursos jornalísticos para tornar o ensino mais interativo e dinâmico.
Figura 2. Vocês têm acompanhando o noticiário televisivo sobre os casos de intoxicação por metanol no Brasil?
Figura 3. Vocês já ouviram falar sobre a substância metanol? E sobre o etanol?
Figura 4. Vocês sabe para que serve o metanol? Como é produzido?
Figura 5. Vocês sabiam da toxicidade do metanol no organismo vivo?
A sala contava com um total de 20 alunos, portanto a partir da análise gráfica percebe-se que a grande maioria (98%) tem acompanhado atentos os noticiários televisivos sobre a problemática de intoxicação do metanol no Brasil. Esse fato revela que a notícia tem despertado interesse dos jovens em relação aos casos notificados de intoxicação das pessoas ao tomarem bebidas destiladas. Ainda, a totalidade dos alunos (100%) sabem o que é o etanol, uma vez que também é o álcool que os familiares utilizam para abastecimento dos automóveis, portanto um álcool bastante conhecido, presente no cotidiano dos estudantes.
Ao contrário, o metanol não tem a mesma visibilidade do etanol, dessa forma, a grande maioria não tem conhecimento sobre o mesmo, ou seja, 90% dos alunos não conhecem esse álcool. Uma parcela significativamente menor (10%) indica ter conhecimento sobre o metanol, indicando lembrarem-se de assuntos anteriores tratados nas aulas de Química, onde o mesmo fora apresentado pelo professor. Alguns alunos disseram já ter lido matérias sobre o metanol e que o mesmo era tóxico.
A maioria indica também que não sabiam para que servia o metanol e nem como era produzido (90%). Em relação ao etanol, os alunos indicam a sua produção a partir da cana de açúcar, portanto, novamente um álcool bastante conhecido pois está largamente presente no cotidiano dos alunos.
Em relação à toxicidade do metanol no organismo, somente 10% relatam já ter ouvido falar, porém a maioria não sabia sobre o perigo de ingestão do metanol.
A leitura, discussão e elaboração de resumos das matérias jornalísticas selecionadas (Tabela 1) foram importantes também para despertar da curiosidade sobre os efeitos dos diferentes tipos de álcool no organismo, bem como buscar o entendimento sobre a toxicidade do metanol. Esse momento foi importante também, pois a professora pôde apresentar o gênero textual notícia, seus aspectos estruturais, a linguagem utilizada e a relevância deste gênero para a sociedade de leitores, bem como tratar questões de intencionalidade quando se produz uma notícia, a importância das imagens e da escolha do título para o texto.
Partindo, então dos apontamentos feitos pelos alunos e dos conhecimentos prévios anteriormente detectados, a professora pôde construir a Sequência Didática que irá nortear o trabalho com a turma. Assim, essa prática didática, de acionar o conhecimento prévio e utilização dos apontamentos feitos pelos alunos ao lerem as notícias selecionadas, não é apenas uma escolha que reflete a escuta do professor, é muito mais que isso. O conhecimento prévio e relatos nas discussões possibilita a relação do aluno com o que será ensinado e deve ser aproveitado pelo professor, no decorrer do processo.
A sequência didática aqui desenhada não segue à risca um modelo específico de Metodologia Ativa e, sim, ideias de Metodologias Ativas que se fundem com um propósito de inovação. Valorizam-se também estratégias de métodos mais tradicionais como a exposição por parte do professor; no entanto, é importante destacar que essa abordagem precisa ser interativa e, nessa sequência didática, ela acontece com o propósito de formalização de alguns aspectos do objeto do conhecimento desenvolvido, após a indução e dedução de habilidades previamente contextualizadas. Assim sendo, para um entendimento maior dos alunos em relação ao tema e sobre as diferenças de interação dos dois tipos de álcool no organismo, o professor preparou uma série de slides para explicação do processo de interação e etanol e do metanol no organismo vivo. Porém, antes de entrar no assunto metanol propriamente dito, iniciou a aula a partir da exposição sobre o metabolismo do etanol, uma vez que esse é o álcool mais conhecido pelos estudantes. Assim, projetou um slide indicando a formação de acetato na mitocôndria (Figura 6).
Fonte: Os autores.
Na exposição oral, explicou que por meio dessa via apresentada no slide 2 (Figura 7), a maior parte do álcool ingerido é metabolizada no fígado, onde o etanol sofre a ação da enzima álcool desidrogenase, mais precisamente da classe 1 de ADH, a mais abundante nas células hepáticas, convertendo-o em acetaldeído, esta substância por sua vez caracteriza-se pelo caráter toxicológico acentuado mesmo quando sintetizada em pequenas quantidades. Quando convertida em acetaldeído, o mesmo sofre a ação de outra enzima denominada aldeído desidrogenase que possui grande afinidade pelo tóxico acetaldeído (responsável por promover ao organismo quadros de náuseas e vômitos) e irá transformá-lo em acetato, este que foi formado no fígado destina-se à corrente sanguínea onde será captado e utilizado em outros tecidos, como por exemplo: coração e músculo esquelético onde será transformado em acetil CoA pela enzima acetil CoA sintase, entrando no ciclo de Krebs com o objetivo de formar ATP entre outros produtos.
Fonte: (www.kufunda.net)
Os alunos manifestaram grande interesse em saber por que o metanol era tão tóxico, podendo matar ou cegar as pessoas. Dessa forma, a professora explica, utilizando uma notícia veiculada na internet onde falava que até 24 horas: o fígado fabrica o veneno e os olhos sofrem primeiro (Figura 8).
Fonte: https://www.medway.com.br/conteudos/intoxicacao-por-metanol-aumento-de-casos-fisiopatologia-e-abordagem-clinica/
Com a progressão, surgem os sintomas mais característicos. “O fígado funciona como um laboratório: ele tenta transformar o metanol em água eliminável, mas nesse caso o resultado são produtos muito piores, como formaldeído e ácido fórmico”, explica Indianara Brandão, médica hematologista da Faculdade de Medicina do ABC e diretora da Clínica First (Figura 9).
Fonte: Os autores.
O ácido fórmico é altamente tóxico porque inibe a produção de energia nas mitocôndrias das células. Tecidos que demandam mais energia — como os nervos e a retina — são os primeiros a sofrer. Entre 12 e 24 horas após a ingestão, é comum aparecer visão borrada, fotofobia e até a sensação de enxergar pontos luminosos, descrita como “chuva de pixels”.
“O nervo óptico sofre duplamente: pela falta de energia das mitocôndrias e também pela degeneração das fibras nervosas e da bainha protetora, o que pode levar à perda visual irreversível em pouco tempo”, afirma Igor Mochiutti, infectologista do Hospital Metropolitano Lapa. Além disso, instala-se a acidose metabólica, uma condição em que o sangue fica excessivamente ácido. Isso leva a respiração acelerada, fraqueza, confusão mental e sobrecarga no coração e nos pulmões.
A partir do diálogo professor-alunos, percebia-se claramente que os alunos começavam a diferenciar os efeitos provocados pelos produtos finais da metabolização do etanol e do metanol. Dessa forma, a explicação e os slides preparados pela professora foram bastante elucidativos (Figura 10).
Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Metanol_y_etanol.PNG
Uma outra pergunta frequente feita pelos estudantes referia-se ao processo químico de identificação de metanol em bebidas alcoólicas. Partindo do interesse dos alunos, as professora trouxe para a sala uma reportagem veiculada na Revista Veja, conforme dados do site https://vejasp.abril.com.br/cidades/unesp-criou-tecnica-barata-e-pratica-para-identificar-metanol-em-bebidas/ .
Nesse momento, os alunos já começam a entender com maior clareza a diferença entre a metabolização do etanol e do metanol no organismo vivo. A principal diferença no metabolismo do etanol e do metanol está na toxicidade dos seus produtos finais. Enquanto o etanol é metabolizado em ácido acético (acetato), que o corpo utiliza para gerar energia, o metanol é convertido em formaldeído e depois em ácido fórmico, substâncias altamente tóxicas que podem causar acidose metabólica, danos ao nervo óptico (levando à cegueira) e falência de órgãos.
Em uma das reportagens, os jornalistas colocam que em 2022, pesquisadores do Instituto de Química da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) desenvolveram um método rápido, prático e barato para identificar a existência metanol em gasolina, etanol, em gasolina, etanol, cachaça, vodca e uísque. O estudo indica ainda que a técnica não precisa de uma mão de obra especializada ou laboratórios altamente equipados para a análise, já que todo o processo pode ser realizado em campo. Com a alta nos casos de intoxicação por metanol em bebidas alcoólicas adulteradas e falsificadas, a técnica poderia atuar como forma de prevenção. Segundo a Unesp, somente agora com os casos, começaram a surgir interessados no produto. A instituição também informa que eventuais empresas que quiserem atuar na produção do teste podem entrar em contato direto com a Agência Unesp de Inovação, responsável pela transferência da tecnologia.
O trabalho teve eficácia de 100% nas análises realizadas na pesquisa e foi concluído com a geração da patente da nova tecnologia pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), atestando o ineditismo do produto. Na época, o estudo apontou que o custo da nova técnica da Unesp devia girar em torno de R$ 15,00, segundo estimativas dos pesquisadores. Além disso, seria o único método seria o único método capaz de quantificar o teor de metanol com precisão de forma mais rápida.
O processo para determinar a concentração de metanol em amostras de gasolina, etanol ou de bebidas alcoólicas destiladas é feito em apenas duas etapas. Larissa Modesto, autora principal da invenção, explica que, primeiramente, é preciso adicionar um tipo específico de sal na substância que será analisada. Caso o metanol esteja presente na amostra, ele será transformado em formol. Na sequência, basta adicionar à mistura um ácido capaz de gerar mudanças na coloração da solução.
O tempo total para as reações são de 15 minutos no caso do etanol e das bebidas alcoólicas e 25 minutos no caso da gasolina. Após esse tempo, a mistura está pronta para ser classificada. Observando a cor que se formou ao final dos procedimentos, os especialistas conseguem identificar a olho nu se determinada amostra possui mais metanol que o permitido (Figura 11).
Mistura final na cor verde – Sem quantidades significativas de metanol.
Mistura final com tom verde amarronzado – Presença de 0,1% a 0,4% de metanol.
Mistura final na cor marrom – Presença de 0,5% a 0,9% de metanol
Mistura final na cor roxo – Presença de 1% a 20% de metanol
Fonte: https://vejasp.abril.com.br/cidades/unesp-criou-tecnica-barata-e-pratica-para-identificar-metanol-em-bebidas/
Mistura final na cor azul marinho – Metanol 50% a 100% (Figura 12).
Fonte: https://vejasp.abril.com.br/cidades/unesp-criou-tecnica-barata-e-pratica-para-identificar-metanol-em-bebidas/
Para finalizar a Sequência Didática (SD), os alunos nos diferentes grupos, elaboraram notícias sobre a contaminação por metanol. Foi interessante observar que os alunos mostraram desenvoltura na escrita, bem como, a utilização dos termos científicos aprendidos durante a realização das atividades (leituras das reportagens, slides apresentados pela professora e discussões em sala). Dessa forma, a utilização de textos jornalísticos nas aulas de Química pode auxiliar no envolvimento dos alunos nas atividades escolares e motivá-los no processo de ensino-aprendizagem, propiciando maior participação.
Além disso, a utilização da leitura e produção de textos possibilitou que os alunos desenvolvessem habilidades e competências que viabilizaram a interpretação dos processos tecnológicos e naturais que estão presentes em seu cotidiano (SOUZA & SOUZA, 2005).
5. CONSIDERAIS FINAIS
O trabalho aqui apresentado tem como principal objetivo tornar significativa a aprendizagem ao aluno. Sendo assim, a proposta procura entender quem é o aluno contemporâneo, quais são suas necessidades, por quais meios esse aluno se comunica e o que pode fazer a diferença em suas relações socioemocionais. As notícias de jornais possibilitam aos alunos a se atualizarem sobre acontecimentos do seu dia a dia, além de utilizá-los para relacionar eles com os conteúdos estudados durante as aulas, sempre visando a realidade. Os conteúdos utilizados nos jornais são de grande valor, desse modo quando utilizado pelos professores podem ajudar e muito nas estratégias para o processo de ensino dos alunos. Os conteúdos jornalísticos estão presentes no cotidiano de diversas formas e trazem conhecimentos acadêmicos de forma aplicável.
Observou-se grande interesse no tema proposto, “os casos de intoxicação por metanol no Brasil”. Verificou-se que as reportagens lidas chamou a atenção dos alunos e possibilitaram maior participação, pois as notícias jornalísticas estavam mais próximas de seus cotidianos e propiciaram a aproximação e apropriação dos conceitos químicos abordados.
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BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Temas Contemporâneos Transversais na BNCC: contexto histórico e pressupostos pedagógicos. Brasília, DF: MEC, 2019.
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CARDOSO, S. P.; COLINVAUX, D. Explorando a motivação para estudar Química. Revista Química Nova, São Paulo, v. 23, n. 3, p. 401-403, 2000.
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DA CONCEIÇÃO, Marnise de Almeida Nabuco; MERQUIOR, Douglas Marcelo. Uso de notícias de jornal nas aulas de Química do Ensino Médio. Revista de Educação, Ciências e Matemática, v. 8, n. 1, 2018.
FREITAS, J. J.; ORTIZ, J. O jornal em sala de aula de educação de jovens e adultos: informação e cidadania. Curitiba: Aymará, 2009.
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PIZZIMENTI, C. Trabalhando valores em sala de aula: histórias para rodas de conversa − Educação Infantil, Ensino Fundamental I e II, Ensino Médio. Petrópolis: Vozes, 2013.
SOUZA, R. R.; SOUZA, P. H. . Textos com erros conceituais e o Ensino de Física. In: V Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências, 2005, Bauru. Atas ... ENPEC, 2005.
VITO, C. A. O uso do jornal em sala de aula. Conference Paper - XI Congresso Nacional de Educação, EDUCERE, 2013.
1 Docente do Curso Superior de Farmácia da Universidade Brasil, Campus de Fernandópolis-SP. Doutor em Química pelo Instituto de Química UNESP, Campus de Araraquara-SP. E-mail: [email protected]
2 Docente do Curso Superior de Farmácia da Universidade Brasil, Campus de Fernandópolis-SP. Mestre em Química (PPGQUIM/UNESP - Araraquara-SP). E-mail: [email protected]