TECNOLOGIA E TRADIÇÃO: REFLEXÕES SOBRE A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E A EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA

PDF: Clique Aqui


REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.13990268


Augusto Everton Dias Castro1


RESUMO
Este artigo investiga, através de pesquisa bibliográfica, o potencial transformador da Inteligência Artificial (IA) na educação escolar indígena, com ênfase em cursos a distância e na revitalização linguística. Analisa-se como a IA pode personalizar a aprendizagem, aprimorar a gestão educacional, preservar e promover as línguas e culturas indígenas, enquanto enfrenta desafios técnicos e éticos. Abordam-se os desafios de implementação, incluindo questões éticas e infraestruturais, destacando a importância de uma abordagem sensível e colaborativa. O estudo de caso da parceria entre a Universidade de São Paulo, o Centro de Inteligência Artificial e a IBM Research ilustra a aplicação bem-sucedida da IA na documentação, vitalização e promoção de línguas indígenas, evidenciando a necessidade de cooperação entre acadêmicos, comunidades indígenas e tecnólogos. O artigo conclui que a IA pode enriquecer a educação indígena, promovendo aprendizagens personalizadas e sustentando a diversidade cultural, desde que aplicada de maneira ética, colaborativa e culturalmente integrada.
Palavras-chave: Inteligência Artificial. Educação Escolar Indígena. Práticas Educacionais.

ABSTRACT
This article investigates, through detailed bibliographic research, the transformative potential of Artificial Intelligence (AI) in indigenous school education, focusing particularly on distance learning and linguistic revitalization. It thoroughly analyzes how AI can personalize learning, significantly improve educational management, effectively preserve and actively promote indigenous languages and cultures, while facing complex technical and ethical challenges. The challenges of implementation are comprehensively addressed, including ethical and infrastructural issues, highlighting the importance of a sensitive, inclusive, and collaborative approach. The case study of the partnership between the University of São Paulo, the Artificial Intelligence Center, and IBM Research illustrates the successful application of AI in the documentation, revitalization, and promotion of indigenous languages, demonstrating the critical need for cooperation between academics, indigenous communities, and technologists. The article concludes that AI can enrich indigenous education, promoting personalized learning and sustaining cultural diversity, provided it is applied in an ethical, collaborative, culturally integrated, and respectful manner.
Keywords: Artificial Intelligence. Indigenous School Education. Educational Practices.

1 INTRODUÇÃO

A emergência da Inteligência Artificial (IA) tem redefinido os paradigmas em diversos setores da sociedade, e a educação emerge como um campo fértil para suas aplicações transformadoras (Vasconcelos, 2024). Este artigo explora a intersecção entre IA e a educação escolar indígena, particularmente no contexto da educação a distância (EAD), visando desvendar como as ferramentas de IA podem contribuir para a criação de experiências de aprendizagem mais eficazes e contextualizadas culturalmente para as comunidades indígenas.

O objetivo central deste estudo é investigar como a integração da IA nos cursos a distância pode ser articulada para fortalecer os processos educativos na educação escolar indígena, considerando as especificidades e necessidades dessas comunidades. Para tanto, realizou-se uma pesquisa bibliográfica abrangendo tanto literatura acadêmica quanto estudos de caso práticos, buscando insights sobre a aplicação bem-sucedida da IA em instituições de ensino que atendem populações indígenas.

A metodologia adotada neste trabalho é a pesquisa bibliográfica, que permite a construção de conhecimento baseada na análise de literatura existente sobre a inserção da IA na educação, com foco especial na sua aplicabilidade e impacto dentro do contexto educacional indígena. Este método possibilita uma análise crítica das vantagens, desvantagens e os desafios enfrentados por educadores e alunos no processo de incorporação da IA na educação escolar indígena, promovendo uma compreensão profunda sobre as potencialidades e limitações desta tecnologia emergente (Gil, 2010).

Ao longo do artigo, discutiremos os fundamentos da IA na educação, a relação entre a educação escolar indígena e as tecnologias digitais, a implementação da IA em cursos a distância e um estudo de caso exemplar de sucesso. Essa abordagem visa fornecer uma visão holística e aprofundada sobre como a IA pode ser empregada de maneira eficaz e sensível ao contexto cultural, contribuindo para uma aprendizagem significativa e relevante no âmbito da educação indígena.

2 FUNDAMENTOS DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO

A IA é um campo da ciência da computação que visa criar sistemas capazes de realizar tarefas que normalmente requerem inteligência humana, como percepção visual, reconhecimento de fala, tomada de decisão e tradução entre línguas. Na educação, a IA pode ser utilizada para personalizar o aprendizado, automatizar tarefas administrativas e proporcionar experiências de aprendizagem interativas e envolventes (Barbosa; Pinheiro, 2023).

O conceito de IA na educação não é recente. Desde os anos 1960, pesquisadores têm explorado como máquinas inteligentes podem ser utilizadas para fins educativos. Abeliuk e Gutiérrez (2021) discutem como os sistemas inteligentes de tutoria foram desenvolvidos para simular um tutor humano, adaptando-se às necessidades individuais dos alunos e fornecendo feedback personalizado.

A aplicação da IA na educação visa melhorar a eficiência e a eficácia do processo de ensino-aprendizagem. De acordo com Barbosa (2023), a IA pode facilitar experiências de aprendizagem personalizadas que se adaptam ao ritmo e ao estilo de aprendizagem de cada aluno, potencializando a retenção do conhecimento e o engajamento.

Um dos principais benefícios da IA na educação é a capacidade de proporcionar aprendizagem adaptativa. Sistemas inteligentes analisam o desempenho dos alunos em tempo real e ajustam o conteúdo, o nível de dificuldade e o ritmo das lições para atender às suas necessidades específicas. Essa abordagem centrada no aluno é destacada por Sousa e Gomes (2024), que enfatizam a importância de adaptar o ensino às necessidades individuais para melhorar os resultados de aprendizagem.

Além disso, a IA pode desempenhar um papel crucial na automação de tarefas administrativas e burocráticas, permitindo que educadores dediquem mais tempo ao ensino e menos tempo ao gerenciamento de processos. Cruz et al. (2023) afirmam que sistemas de IA podem ajudar na gestão de notas, na programação de aulas e na comunicação com os alunos, otimizando a administração educacional.

A análise de dados é outro domínio em que a IA está transformando a educação. Através da mineração de dados educacionais e da análise de aprendizado, é possível obter insights sobre as tendências de aprendizagem dos alunos, identificar áreas onde eles estão lutando e desenvolver estratégias de intervenção personalizadas. Essa abordagem é apoiada por Gontijo e Araújo (2021), que discutem como a análise de dados pode ser usada para melhorar o suporte aos alunos e o processo de tomada de decisão educacional.

No entanto, a implementação da IA na educação também apresenta desafios. Questões relacionadas à privacidade e à segurança dos dados dos alunos são de grande preocupação, assim como a necessidade de garantir que os sistemas de IA sejam éticos e não discriminatórios. Kaufman (2016) destaca a importância de abordar essas questões éticas para garantir que a IA seja usada de maneira responsável na educação.

O desenvolvimento profissional dos educadores é outro aspecto crucial para a integração efetiva da IA na educação. Os professores precisam de formação adequada para utilizar eficazmente as ferramentas de IA e para integrar as tecnologias inteligentes em suas práticas pedagógicas. Essa necessidade é enfatizada por Parreira, Lehmann e Oliveira (2021), que argumentam que o treinamento e o desenvolvimento profissional contínuo são essenciais para capacitar os educadores a aproveitar o potencial da IA.

Olhando para o futuro, a IA tem o potencial de revolucionar a educação, tornando-a mais personalizada, eficiente e acessível. Segundo Campelo e Xavier (2023), as inovações em IA continuarão a transformar o panorama educacional, oferecendo novas oportunidades para enriquecer a experiência de aprendizagem e superar as barreiras geográficas e socioeconômicas.

A integração da IA na educação é um campo promissor que oferece numerosas possibilidades para enriquecer e transformar o ensino e a aprendizagem. Ao abordar os desafios éticos, de privacidade e de desenvolvimento profissional, o setor educacional pode maximizar os benefícios da IA, proporcionando uma educação mais personalizada, eficiente e inclusiva.

3 A EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA E A TECNOLOGIA

A integração da tecnologia na educação escolar indígena representa um campo de possibilidades e desafios. A tecnologia, especialmente a IA, tem o potencial de transformar as práticas educacionais, tornando-as mais alinhadas às necessidades específicas das comunidades indígenas, ao mesmo tempo em que preserva e valoriza suas culturas e tradições.

A educação indígena, historicamente, tem sido marcada por processos de descolonização e busca pela autonomia cultural e pedagógica. Neste contexto, a tecnologia pode desempenhar um papel fundamental ao oferecer recursos que respeitam e incorporam os saberes tradicionais indígenas. Segundo Smith (1999), é crucial que as tecnologias educacionais sejam projetadas e implementadas de maneira a respeitar a autodeterminação e a diversidade cultural indígena.

A adoção de tecnologias digitais nas escolas indígenas pode facilitar o acesso a materiais educativos diversificados e culturalmente relevantes, contribuindo para uma educação mais significativa e contextualizada. Kaminski et al. (2019) enfatizam a importância de desenvolver currículos que reflitam as línguas, conhecimentos e filosofias indígenas, e a tecnologia pode ser uma aliada importante nesse processo.

No entanto, a implementação da tecnologia na educação indígena enfrenta barreiras significativas. Questões como falta de infraestrutura tecnológica adequada, acesso limitado à internet e a necessidade de formação técnica para educadores e alunos são desafios prementes. Estes aspectos são destacados por Andrade (2020), que ressalta a importância de superar tais obstáculos para que a tecnologia tenha um impacto positivo na educação indígena.

A formação de educadores é um ponto crítico para o sucesso da integração tecnológica. Os professores precisam não apenas de habilidades técnicas para usar eficazmente as ferramentas digitais, mas também de uma compreensão profunda de como integrar essas ferramentas de forma a complementar e enriquecer o ensino indígena. Pereira Junior, Mesquita e Batista (2024) apontam que a formação docente em contextos indígenas deve abordar tanto a competência tecnológica quanto a sensibilidade cultural.

O uso da IA na educação indígena pode oferecer soluções personalizadas que se alinham com as necessidades educacionais específicas dessas comunidades. Sistemas de aprendizado adaptativos, por exemplo, podem ser programados para respeitar e incorporar línguas e conhecimentos indígenas, proporcionando uma experiência de aprendizado que é ao mesmo tempo inclusiva e eficaz. Miller e Crookes (2023) sugerem que tais sistemas podem ajudar a criar ambientes de aprendizado que fomentam a inclusão e a diversidade cultural.

A colaboração entre comunidades indígenas, educadores e desenvolvedores de tecnologia é essencial para criar soluções de IA que sejam verdadeiramente eficazes e respeitosas. Segundo Costa e Webber (2023), a co-criação de tecnologias educacionais com as comunidades indígenas garante que as ferramentas desenvolvidas sejam não apenas tecnologicamente avançadas, mas também culturalmente pertinentes e aceitáveis.

Além disso, a tecnologia pode facilitar o acesso das comunidades indígenas a redes globais de conhecimento, permitindo o intercâmbio de informações e experiências com outros povos indígenas ao redor do mundo. Esta interconectividade pode fortalecer as lutas comuns por direitos e reconhecimento, além de enriquecer o processo educacional com perspectivas globais. Castells (1996) discute como as redes de informação globais podem contribuir para a autonomia e a resistência cultural das comunidades indígenas.

Por outro lado, é crucial garantir que a adoção de tecnologias na educação indígena não resulte na assimilação cultural ou na perda de identidade. A tecnologia deve ser utilizada de forma a reforçar os valores, línguas e conhecimentos indígenas, não substituí-los. Ferreira e Felzke (2021) enfatizam a importância de abordagens tecnológicas que fortaleçam as identidades culturais indígenas, em vez de diluí-las.

A integração da tecnologia e da IA na educação escolar indígena apresenta um potencial significativo para melhorar a qualidade e a relevância da educação oferecida a estas comunidades. No entanto, para que essa integração seja bem-sucedida, é essencial que ela seja conduzida de forma colaborativa, respeitosa e sensível às necessidades e valores culturais indígenas.

4 INSERÇÃO DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NOS CURSOS A DISTÂNCIA

A inserção da IA nos cursos a distância marca uma evolução significativa na educação online, promovendo ambientes de aprendizagem mais adaptativos e interativos. Essa integração tem o potencial de transformar o ensino e a aprendizagem, tornando-os mais personalizados e eficazes. A IA em cursos a distância pode ajudar a identificar padrões de aprendizagem, otimizar o conteúdo educacional e proporcionar suporte individualizado aos estudantes.

Um dos principais avanços proporcionados pela IA nos cursos a distância é a personalização do aprendizado. Sistemas inteligentes podem analisar o comportamento dos alunos, suas preferências e desempenho, adaptando o material didático de acordo com as necessidades de cada um. Essa abordagem é destacada por Zhou, Xu e Lee (2020), que enfatizam a capacidade da IA de criar percursos de aprendizagem personalizados que melhoram a eficiência e a eficácia educacional.

A IA também desempenha um papel crucial na análise de dados educacionais, oferecendo insights profundos sobre o processo de aprendizagem dos alunos. Esses dados podem ser utilizados para prever dificuldades de aprendizagem, identificar lacunas no conhecimento e ajustar estratégias pedagógicas. Lobo (2018) aponta que a análise de dados proporcionada pela IA pode melhorar a tomada de decisão educacional e aprimorar o suporte aos estudantes.

Além disso, a IA pode contribuir para a melhoria da interação e engajamento em cursos a distância. Chatbots e assistentes virtuais, por exemplo, podem oferecer suporte instantâneo e personalizado, respondendo a dúvidas e incentivando a participação dos alunos. Essa interação contínua ajuda a manter os estudantes motivados e engajados, como discutido por Graell (2023), que destacam o papel dos assistentes virtuais na promoção da interatividade e na redução da sensação de isolamento em cursos online.

A integração da IA em cursos a distância também enfrenta desafios, como a necessidade de infraestrutura tecnológica adequada, preocupações com a privacidade dos dados e a importância de garantir que as soluções de IA sejam inclusivas e acessíveis. Esses desafios são ressaltados por Selwyn (2017), que enfatiza a importância de abordar questões éticas e de equidade na implementação da IA na educação a distância.

Outro aspecto importante é o desenvolvimento de competências digitais tanto para educadores quanto para alunos, para que possam utilizar efetivamente as ferramentas de IA. A formação continuada e o suporte técnico são fundamentais para garantir que todos os envolvidos possam aproveitar as vantagens oferecidas pela tecnologia. Fonseca e Mattar (2017) argumentam que a capacitação em tecnologias digitais é essencial para maximizar o potencial da IA nos cursos a distância.

A inserção da IA nos cursos a distância representa uma evolução promissora na educação online, oferecendo oportunidades para personalizar a aprendizagem, melhorar o engajamento e otimizar o processo educacional. No entanto, para que seu potencial seja plenamente realizado, é crucial abordar os desafios técnicos, éticos e pedagógicos envolvidos.

5 APLICAÇÃO BEM-SUCEDIDA DA IA EM EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA: O CASO DA USP E O PROJETO DE REVITALIZAÇÃO LINGUÍSTICA

O projeto de IA para a revitalização das línguas indígenas brasileiras, desenvolvido pela Universidade de São Paulo (USP) em parceria com o Centro de Inteligência Artificial (C4AI) e a IBM Research, representa uma iniciativa pioneira que visa fortalecer, documentar e preservar as línguas indígenas ameaçadas de extinção. Este projeto não apenas reflete um avanço tecnológico significativo, mas também um esforço colaborativo para sustentar a diversidade cultural e linguística dos povos indígenas no Brasil.

A inserção da IA no contexto educacional indígena, especialmente em áreas como o Processamento de Linguagem Natural (PLN), oferece um vasto potencial para auxiliar em várias dimensões. Isso inclui a conversão de fala para texto e vice-versa, desenvolvimento de ferramentas de tradução, ampliação de vocabulário, e aprimoramento de programas de coleta e análise linguística. Essas tecnologias não apenas apoiam a preservação linguística, mas também facilitam o acesso e a produção de conhecimento nas línguas nativas (Bastos, 2011).

A relevância desse projeto estende-se além da tecnologia, adentrando o domínio da valorização e revitalização cultural. O objetivo é vitalizar as línguas, incentivando os jovens a aprender e usar ativamente seus idiomas nativos, e fortalecer as línguas em processo de desaparecimento através de documentação adequada. Este enfoque é crucial, considerando que algumas línguas indígenas possuem um número muito limitado de falantes, o que as coloca em risco iminente de extinção.

A colaboração com as comunidades indígenas é um aspecto fundamental do projeto. A abordagem de construção conjunta garante que as ferramentas de IA sejam desenvolvidas conforme as necessidades e desejos dos povos indígenas, promovendo um processo de empoderamento e aprendizagem mútua. Este método de trabalho reflete os princípios de uma pesquisa participativa, que, segundo Smith (1999), é essencial para garantir que os projetos de pesquisa respeitem e promovam os direitos e a soberania dos povos indígenas.

No contexto da Terra Indígena Tenondé Porã, o projeto visa explorar e desenvolver ferramentas de escrita e documentação linguística em colaboração com os estudantes e professores da comunidade. As oficinas semanais planejadas são projetadas para melhorar as habilidades de escrita em língua guarani mbya e facilitar a documentação linguística. Essa iniciativa é crucial para a preservação da língua e para fornecer aos jovens as ferramentas necessárias para manter viva sua herança cultural.

O uso de IA para apoiar a educação e a preservação linguística nas comunidades indígenas é uma estratégia inovadora que pode servir como modelo para outras iniciativas semelhantes. A tecnologia, quando utilizada de forma responsável e colaborativa, pode desempenhar um papel vital no suporte à diversidade cultural e na promoção da justiça educacional para povos indígenas, conforme discutido por Warschauer (2002) em suas análises sobre tecnologia e inclusão social.

Os esforços de desenvolvimento contínuo e capacitação comunitária dentro do projeto indicam um compromisso com a sustentabilidade e a autonomia das comunidades indígenas. Ao capacitar os membros da comunidade para que se envolvam ativamente na criação e no uso de ferramentas tecnológicas, o projeto promove uma forma de educação que é empoderadora e sustentável. Este enfoque é alinhado com as perspectivas de Freire (1970) sobre a educação como prática da liberdade, onde os processos educacionais devem visar à emancipação e à participação ativa dos envolvidos.

Além disso, o projeto da USP e C4AI destaca a importância de abordar as ameaças às línguas indígenas não apenas como um desafio linguístico, mas também como uma questão de direitos humanos e culturais. A ameaça de extinção de línguas indígenas está intrinsecamente ligada a questões mais amplas, como direitos territoriais, resistência cultural e identidade. A IA, neste contexto, surge como uma ferramenta potente para enfrentar esses desafios, oferecendo novas possibilidades para a preservação cultural e a afirmação da identidade indígena.

A iniciativa da USP e do C4AI ilustra o poder transformador da IA quando aplicada de maneira ética, colaborativa e culturalmente sensível. Este projeto não apenas contribui para a preservação das línguas indígenas, mas também reforça a importância de integrar as comunidades indígenas no desenvolvimento e aplicação de tecnologias, garantindo que as inovações tecnológicas beneficiem e reflitam a diversidade cultural e linguística da sociedade.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo explorou o impacto transformador da IA na educação escolar indígena, com um foco especial em cursos a distância e na revitalização linguística. Ao longo da discussão, ficou evidente que a IA oferece possibilidades significativas para personalizar a aprendizagem, otimizar processos educacionais e fortalecer as línguas e culturas indígenas. A pesquisa bibliográfica revelou que, embora existam desafios como a necessidade de infraestrutura adequada, privacidade de dados e questões éticas, o potencial da IA para enriquecer a educação indígena é notável.

O estudo de caso da iniciativa da USP em colaboração com o C4AI e a IBM Research ilustrou uma aplicação bem-sucedida de IA na preservação de línguas indígenas, mostrando que, com a abordagem correta, a tecnologia pode ser uma força poderosa para o bem cultural e educacional. Essa iniciativa destacou a importância da colaboração entre acadêmicos, comunidades indígenas e entidades tecnológicas para criar soluções que respeitem e promovam a diversidade cultural e linguística.

Conclui-se que a integração da IA na educação escolar indígena deve ser realizada com sensibilidade cultural, colaboração comunitária e uma abordagem ética para garantir que a tecnologia apoie e enriqueça as práticas educativas, em vez de ameaçar a identidade e autonomia indígenas. O futuro da educação indígena com o apoio da IA parece promissor, oferecendo caminhos inovadores para a aprendizagem personalizada e a preservação cultural. Para alcançar esse futuro, é essencial um compromisso contínuo com o desenvolvimento responsável e inclusivo de tecnologias educacionais que atendam às necessidades e aspirações das comunidades indígenas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABELIUK, A.; GUTIÉRREZ, C. Historia y evolución de la inteligencia artificial. Revista Bits de Ciência, n. 21, p. 14-21, 2021.

ANDRADE, F. Escolas do campo e infraestrutura: aspectos legais, precarização e fechamento. Educação em Revista, v. 36, e234776, 2020.

BARBOSA, C. R. D. A. C. Transformações no ensino-aprendizagem com o uso da inteligência artificial: revisão sistemática da literatura. RECIMA21-Revista Científica Multidisciplinar-ISSN 2675-6218, v. 4, n. 5, e453103, 2023.

BARBOSA, L. F.; PINHEIRO, C. R. Inteligência artificial no Brasil: avanços regulatórios. Revista de Informação Legislativa, v. 60, n. 240, p. 11-41, 2023.

BASTOS, H. P. P. Pesquisa interdisciplinar com e sobre a linguagem em ambiente digital: abordagens e técnicas auxiliares na análise e registro de textos. Encontro Nacional de Professores de Letras e Artes, 2011.

CAMEPELO, S. L.; XAVIER, E. S. A internet como direito social. LexCult: revista eletrônica de direito e humanidades, v. 7, n. 3, p. 84-107, 2023.

CASTELLS, M. The rise of the network society. Blackwell Publishers, 1996.

COSTA, R. D. A.; WEBBER, C. G. Inteligência Artificial no ensino: constructos orientativos para o desenvolvimento de tecnologias por professores. Contribuciones a las Ciencias Sociales, v. 16, n. 12, p. 29923-29943, 2023.

CRUZ, K. R.; TOLEDO, R. S.; OLIVEIRA, A. S. O.; MOREIRA, A. M.; GANDIN, L. R. A. IA na sala de aula: como a Inteligência Artificial está redefinindo os métodos de ensino. Rebena-Revista Brasileira de Ensino e Aprendizagem, v. 7, p. 19-25, 2023.

FERREIRA, F. G.; FELZKE, L. F. A inserção dos conhecimentos indígenas na escola: possibilidades por meio de um blog. Revista Brasileira de Educação Física e Esporte, v. 35, n. Especial, p. 107-114, 2021.

FONSECA, S. M.; MATTAR, J. Metodologias ativas aplicadas à educação a distância: revisão da literatura. Revista EDaPECI, v. 17, n. 2, p. 185-197, 2017.

FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. Continuum, 1970.

GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

GONTIJO, M. C. A.; ARAÚJO, R. F. Impacto acadêmico e atenção on-line de pesquisas sobre inteligência artificial na área da saúde: análise de dados bibliométricos e altmétricos. Encontros Bibli: revista eletrônica de biblioteconomia e ciência da informação, n. 26, 2021.

GRAELL, R. D. G. Chatbots e inteligencia artificial: aportes, innovaciones y aplicación en el desarrollo de sistemas de información empresarial. Visión Antataura, v. 7, n. 1, p. 132-147, 2023.

KAMINSKI, M. R.; RIBEIRO, R. G. T.; LÜBECK, M.; BOSCARIOLI, C. Tecnologias digitais para o ensino de matemática nas escolas indígenas: importância e dificuldades. e-Mosaicos, v. 8, n. 17, p. 98-113, 2019.

KAUFMAN, D. Inteligência artificial: questões éticas a serem enfrentadas. Abciber, São Paulo, v. 9, n. 8, p. 1-16, 2016.

LOBO, L. C. Inteligência artificial, o futuro da medicina e a educação médica. Revista Brasileira de Educação Médica, v. 42, p. 3-8, 2018.

MILLER, M.; CROOKES, G. A análise crítica de necessidades para línguas adicionais na educação indígena: um exemplo brasileiro. Perspectiva, v. 41, n. 1, 2023.

PARREIRA, A.; LEHMAN, L.; OLIVEIRA, M. O desafio das tecnologias de inteligência artificial na educação: percepção e avaliação dos professores. Ensaio: avaliação e políticas públicas em educação, v. 29, p. 975-999, 2021.

PEREIRA JUNIOR, L. D. S. P.; MESQUITA, L. S. A.; BATISTA, R. G. Desafios e avanços na educação escolar indígena no Brasil. Revista FAROL, v. 20, n. 20, p. 147-154, 2024.

SELWYN, N. Education and technology: Key issues and debates. Bloomsbury Academic, 2017.

SMITH, L. T. Decolonizing methodologies: Research and indigenous peoples. Zed Books, 1999.

SOUZA, M. M. L.; GOMES, A. V. O uso da Cultura Maker nas práticas de leitura e escrita nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: uma revisão sistemática da literatura. Revista Brasileira de Informática na Educação, v. 32, p. 98-119, 2024.

VASCONCELOS, L. Características da Educação a Distância no Brasil. 1. ed. Maringá: Viseu, 2024.

WARCHAWER, M. Technology and Social Inclusion: Rethinking the Digital Divide. MIT Press, 2002.

ZHOU, M.; XU, K.; LEE, J. The role of artificial intelligence in education: Opportunities and challenges. Artificial Intelligence Review, 2020.


1 Doutorando em Educação na Universidad Leonardo da Vinci. Mestre em Tecnologias Emergentes em Educação. E-mail: [email protected]