OS HERÓIS INVISÍVEIS: A INFLUÊNCIA DOS PROFISSIONAIS NÃO GRADUADOS EM CUIDADOS PALIATIVOS

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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.13757017


Angela Pinto dos Santos1


RESUMO
Os cuidados paliativos têm como objetivo proporcionar qualidade de vida a pacientes com doenças graves, irreversíveis ou em final de vida, através de uma abordagem integral que considera aspectos físicos, emocionais, sociais e espirituais. Nesse contexto, a atuação de profissionais não graduados, como cuidadores, técnicos de enfermagem e auxiliares, torna-se essencial para garantir o cuidado humanizado e contínuo, muitas vezes preenchendo lacunas deixadas por profissionais com formação superior. Estes profissionais, frequentemente chamados de "heróis invisíveis", desempenham um papel crucial, mas subvalorizado, na assistência paliativa, oferecendo suporte direto ao paciente e à família em momentos de extrema vulnerabilidade.
Palavras-chave: cuidados paliativos, paciente, família, profissionais não graduados.

ABSTRACT
Palliative care aims to provide quality of life for patients with serious, irreversible illnesses or those at the end of life, through a comprehensive approach that considers physical, emotional, social and spiritual aspects. In this context, the work of non-graduate professionals, such as caregivers, nursing technicians and assistants, becomes essential to guarantee humanized and continuous care, often filling gaps left by professionals with higher education. These professionals, often called "invisible heroes", play a crucial but undervalued role in palliative care, offering direct support to patients and families in times of extreme vulnerability.
Keywords: palliative care, patient, family, non-graduate professionals.

Introdução

A área da saúde é composta por uma complexa rede de profissionais que trabalham em conjunto para garantir a prevenção, o tratamento e o cuidado dos pacientes. Dentro dessa estrutura, existe um grupo de profissionais que, embora desempenhem papéis essenciais, muitas vezes permanecem invisíveis aos olhos do público e, em alguns casos, até mesmo dentro das próprias instituições de saúde. Estes são os "heróis invisíveis", indivíduos cujas contribuições são fundamentais para o funcionamento do sistema de saúde, mas que raramente recebem o reconhecimento merecido.

Entre os heróis invisíveis estão os profissionais de suporte, como auxiliares e técnicos de enfermagem, pessoal de limpeza, assistentes administrativos, e trabalhadores de manutenção e outros. Esses profissionais são responsáveis por manter o ambiente hospitalar limpo, seguro e organizado, assegurando que as operações diárias ocorram sem interrupções. A literatura destaca que sem esses trabalhadores, o sistema de saúde simplesmente não funcionaria (OLIVEIRA et al., 2022), por exemplo, durante a pandemia de COVID-19, o papel dos profissionais de limpeza ganhou destaque, pois foram eles que garantiram a descontaminação dos ambientes hospitalares, protegendo tanto pacientes quanto profissionais de saúde (SILVA et al., 2021).

Cuidadores e técnicos de enfermagem também são exemplos de heróis invisíveis. Eles estão na linha de frente do cuidado direto ao paciente, realizando tarefas como administração de medicamentos, assistência na mobilidade e monitoramento de sinais vitais. Embora muitas vezes não recebam a mesma atenção que médicos e enfermeiros, sua presença é essencial para o bem-estar e recuperação dos pacientes. Estudos mostram que o trabalho desses profissionais é frequentemente subvalorizado, apesar de sua alta carga de trabalho e envolvimento emocional com os pacientes (CARVALHO et al., 2020).

Outro grupo de heróis invisíveis é composto por profissionais de saúde mental, como psicólogos e assistentes sociais, que trabalham nos bastidores para apoiar pacientes e suas famílias em momentos de crise. Eles ajudam a lidar com o estresse, a ansiedade e o trauma, proporcionando uma abordagem holística ao cuidado que muitas vezes passa despercebida. A saúde mental, que frequentemente não recebe a devida atenção dentro do sistema de saúde, torna-se um ponto crucial no cuidado integral, especialmente em cenários de alta complexidade, como os cuidados paliativos (MARTINS & SANTOS, 2021).

Os profissionais não graduados que atuam nos cuidados paliativos, como cuidadores e técnicos, são especialmente importantes. Eles lidam com pacientes em estágios avançados de doenças, proporcionando não apenas cuidados físicos, mas também apoio emocional tanto para os pacientes quanto para suas famílias. Apesar de sua contribuição essencial, muitas vezes esses profissionais enfrentam a falta de reconhecimento e oportunidades de formação contínua, o que pode impactar negativamente a qualidade dos cuidados prestados (FRANCO, 2023).

O reconhecimento dos heróis invisíveis na área da saúde é vital para o fortalecimento do sistema de saúde como um todo. Quando suas contribuições são reconhecidas e valorizadas, esses profissionais se sentem mais motivados e apoiados, o que pode resultar em melhor atendimento ao paciente. Segundo Oliveira (2021), a valorização de todos os níveis da equipe de saúde é fundamental para a construção de um ambiente de trabalho mais colaborativo e eficiente. Este artigo tem o objetivo de explorar o perfil desses profissionais, destacando suas características principais, os desafios que enfrentam e a importância de seu trabalho para a sustentabilidade dos cuidados paliativos no sistema de saúde.

Metodologia

A metodologia adotada neste estudo foi estruturada para garantir uma análise rigorosa e abrangente do perfil dos heróis invisíveis nos cuidados paliativos. A abordagem metodológica combinou estratégias qualitativas e de revisão da literatura para explorar detalhadamente as características desses profissionais, os desafios que enfrentam e a importância de seu trabalho para a sustentabilidade dos cuidados paliativos no sistema de saúde.

O objetivo principal deste estudo foi identificar e descrever o perfil dos heróis invisíveis nos cuidados paliativos. Especificamente, o estudo buscou explorar as características principais desses profissionais, identificar os desafios enfrentados no exercício de suas funções e avaliar a importância de suas contribuições para a eficácia e a sustentabilidade dos cuidados paliativos. Para alcançar esses objetivos, foram empregadas uma revisão sistemática da literatura sobre o tema, utilizando bases de dados acadêmicas como PubMed, Scopus e Scielo, para identificar estudos relevantes e atualizados que abordam o perfil, desafios e contribuições dos profissionais de cuidados paliativos.

Aspectos éticos

Por se tratar de um artigo baseado em revisão bibliográfica, não foi necessária a apreciação pelo Comitê de Ética em Pesquisa.

Revisão da Literatura

Os profissionais não graduados são responsáveis por diversas atividades fundamentais nos cuidados paliativos, como a higiene pessoal, a administração de medicamentos sob supervisão, a mobilização do paciente, o monitoramento de sinais vitais. Além disso, eles muitas vezes estabelecem uma conexão mais próxima e contínua com os pacientes, devido à sua presença constante no ambiente de cuidado. Essa proximidade permite que eles percebam mudanças sutis no estado de saúde do paciente que podem não ser imediatamente aparentes para os profissionais de saúde graduados (AMIN et al., 2022).

A literatura destaca que o papel desses profissionais vai além das tarefas técnicas; eles atuam como mediadores da comunicação entre a equipe médica e a família, fornecendo suporte emocional e ajudando a aliviar o sofrimento. Segundo Silva et al. (2021), os profissionais não graduados são frequentemente os primeiros a notar e responder às necessidades emocionais dos pacientes, criando uma ponte vital entre os cuidados clínicos e o conforto emocional.

A formação desses profissionais, ainda que limitada em comparação com a de profissionais graduados, é fundamental para a qualidade do cuidado prestado. Programas de capacitação que incluam aspectos técnicos, emocionais e éticos são essenciais para preparar esses trabalhadores para os desafios específicos dos cuidados paliativos (FRANCO, 2023). Conforme afirma Oliveira (2021), a capacitação contínua de profissionais não graduados em cuidados paliativos é crucial para garantir que eles possam atuar com competência e sensibilidade nas situações de fim de vida. Apesar de suas funções variadas, esses trabalhadores compartilham características cruciais que sustentam a qualidade e a eficiência dos serviços de saúde.

Uma das características mais marcantes dos heróis invisíveis nos cuidados paliativos é a empatia. Esses profissionais estão frequentemente em contato direto com pacientes em situações de extremo sofrimento físico e emocional. A empatia é essencial para entender as necessidades dos pacientes e de suas famílias, oferecendo apoio emocional e criando um ambiente de cuidado acolhedor e respeitoso (PESSINI, 2019). Neste mesmo sentido, Nascimento et al. (2020), aponta que a empatia dos profissionais de suporte nos cuidados paliativos é um dos pilares que sustentam a humanização do atendimento, garantindo um cuidado que vai além das necessidades físicas.

Trabalhar nos cuidados paliativos exige uma resiliência extraordinária, dado o contato constante com a finitude humana. Os heróis invisíveis, nesse campo, desenvolvem uma capacidade única de lidar com a morte e o sofrimento, oferecendo conforto e suporte tanto para os pacientes quanto para suas famílias, mesmo em momentos de grande desgaste emocional (ARRIEIRA et al., 2018). Essa resiliência é fundamental para manter a qualidade do cuidado, mesmo diante das circunstâncias mais desafiadoras.

Embora muitos dos heróis invisíveis não possuam formação superior, eles detêm habilidades técnicas específicas adquiridas por meio de treinamento especializado e experiência prática. Técnicos de enfermagem, por exemplo, desempenham tarefas vitais como a administração de medicamentos e o monitoramento de sinais vitais, enquanto cuidadores auxiliam pacientes em atividades diárias como mobilidade e higiene. Além disso, esses profissionais utilizam sua sensibilidade para adaptar os cuidados às necessidades individuais de cada paciente, reconhecendo a singularidade de cada trajetória de vida (SOUZA & ZAGO, 2019).

Os cuidados paliativos são inerentemente multidisciplinares, exigindo uma colaboração estreita entre médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais e outros profissionais de saúde. Os heróis invisíveis desempenham um papel crucial na facilitação dessa comunicação interdisciplinar, garantindo que as informações sejam compartilhadas de maneira eficaz e que o cuidado seja coordenado de forma a atender às necessidades complexas dos pacientes (SANTOS et al., 2021). A habilidade de trabalhar em equipe e comunicar-se eficientemente é uma característica indispensável desses profissionais.

Apesar de sua importância, os heróis invisíveis nos cuidados paliativos operam com uma discrição que muitas vezes faz com que suas contribuições passem despercebidas. Eles realizam suas tarefas com humildade, conscientes da importância de seu papel, mas sem buscar reconhecimento público. Essa humildade é acompanhada por um profundo senso de responsabilidade e dedicação ao bem-estar dos pacientes (ARANTES, 2017). Como observa Pessini (2019), a humildade desses profissionais é uma qualidade que lhes permite oferecer um cuidado genuíno, focado no paciente e em sua dignidade.

Apesar de suas contribuições inestimáveis, os heróis invisíveis enfrentam uma série de desafios, incluindo a falta de reconhecimento formal, baixos salários e escassas oportunidades de desenvolvimento profissional. Essa falta de valorização pode levar à desmotivação e ao esgotamento, afetando negativamente tanto o bem-estar dos profissionais quanto a qualidade dos cuidados prestados. É essencial que políticas de saúde e programas institucionais reconheçam e valorizem esses profissionais, proporcionando-lhes condições de trabalho dignas e oportunidades para o crescimento e o desenvolvimento contínuo (NASCIUTTI & MENEZES, 2020).

Considerações Finais

Os profissionais não graduados desempenham um papel indispensável nos cuidados paliativos, oferecendo suporte integral e humanizado a pacientes e suas famílias. Embora sua atuação seja frequentemente invisível ou subvalorizada, a influência que exercem na qualidade do cuidado é inegável. Portanto, é imperativo que políticas públicas e iniciativas de formação reconheçam e valorizem esses profissionais, garantindo que eles tenham o suporte necessário para continuar a desempenhar suas funções com excelência.

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1 Mestra em Bioética pela Universidad Europea del Atlántico, Especialização em Educação Inclusiva pela Universidade Castelo Branco – Rio de Janeiro/RJ, Especialização em Saúde do Idoso – Gestão e Assistência em Gerontologia pela Universidade Estácio de Sá – Rio de Janeiro /RJ, Especialização Internacional de Qualidade e Segurança do Paciente pela FIOCRUZ/RJ, Bacharel em Serviço Social pela Universidade Luterana do Brasil - ULBRA – Canoas/RS, Conteudista dos cursos da UFMA/EAD, Pesquisadora Bolsista CNPQ do Projeto CER Brasil e do projeto Programa Especial de Inclusão Social, Igualdade e Cidadania, Consultora da OPAS/OMS, Bolsista da FIOTEC/MS nas áreas do envelhecimento, oncologia pediátrica, pessoa com deficiência, saúde da pessoa idosa, atenção domiciliar e cuidados paliativos. E-mail: [email protected]. Link CV LATTES: http://lattes.cnpq.br/1391459345673848. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2140-6128