O PAPEL CRUCIAL DAS FUNDAÇÕES DE APOIO ÀS IFES E ICTS: POTENCIALIDADES E CONTRIBUIÇÕES PARA O AVANÇO CIENTÍFICO E TECNOLÓGICO

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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.12731525


Bianca Veloso de Lacerda Abreu1


RESUMO
O presente artigo explora a importância central das fundações de apoio às Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) e às Instituições Científicas e Tecnológicas (ICTs) no contexto do avanço científico e tecnológico. As fundações desempenham um papel crucial ao facilitar e promover atividades de pesquisa, extensão e inovação tecnológica, conectando as IFES e ICTs com o setor produtivo e a sociedade em geral. Este estudo destaca suas potencialidades como agentes facilitadores de projetos colaborativos, capazes de impulsionar a competitividade e a sustentabilidade das instituições de pesquisa. Além disso, discute suas contribuições para o desenvolvimento de soluções inovadoras e a transferência de tecnologia, enfatizando o impacto positivo na economia e na qualidade de vida da população. O trabalho também aborda os desafios enfrentados por essas fundações, como a captação de recursos e a gestão eficiente, ressaltando a necessidade de políticas públicas e estratégias institucionais que fortaleçam seu papel no ecossistema de inovação nacional.
Palavras-chave: Fundação de apoio. IFES. ICTS. Inovação. Dispensa de Licitação.

ABSTRACT
This article explores the central importance of foundations supporting Federal Higher Education Institutions (IFES) and Scientific and Technological Institutions (ICTs) in the context of scientific and technological advancement. Foundations play a crucial role in facilitating and promoting research, extension and technological innovation activities, connecting IFES and ICTs with the productive sector and society in general. This study highlights their potential as facilitators of collaborative projects, capable of boosting the competitiveness and sustainability of research institutions. It also discusses their contributions to the development of innovative solutions and technology transfer, emphasizing their positive impact on the economy and the population's quality of life. The paper also addresses the challenges faced by these foundations, such as fundraising and efficient management, highlighting the need for public policies and institutional strategies to strengthen their role in the national innovation ecosystem.
Keywords: Support foundation. IFES. ICTS. Innovation. Dispensation of Bids.

Introdução

No cenário contemporâneo, marcado pela rápida evolução científica e tecnológica, as Instituições Federais de Ensino (IFES) e as Instituições Científicas e Tecnológicas (ICTs) desempenham um papel vital no desenvolvimento do conhecimento e na inovação. A pesquisa, o ensino e a extensão são pilares fundamentais dessas instituições, que atuam como motores do progresso científico e social. Contudo, para que essas atividades sejam realizadas de forma eficaz, é indispensável um suporte robusto, tanto em termos administrativos quanto financeiros. É nesse contexto que as fundações de apoio se destacam, emergindo como parceiras estratégicas essenciais.

As fundações de apoio, criadas com o propósito de fortalecer a estrutura administrativa e financeira das IFES e ICTs, desempenham funções cruciais que vão além da mera gestão de recursos. Elas facilitam a captação de financiamentos externos, promovem a inovação por meio da gestão eficiente de projetos, e garantem a transparência e a legalidade nos processos administrativos. Essas entidades, ao fornecerem um suporte robusto, permitem que as instituições se concentrem em suas missões principais: a produção de conhecimento, a formação de profissionais qualificados e a contribuição para o desenvolvimento social e econômico do país.

Neste texto argumentativo, exploraremos detalhadamente a importância das fundações de apoio às IFES e ICTs, ressaltando suas potencialidades e contribuições para o avanço científico e tecnológico. Analisaremos como essas fundações atuam como catalisadoras de projetos de grande impacto, viabilizando pesquisas inovadoras e promovendo a integração entre a academia e o setor produtivo. Além disso, discutiremos como o apoio administrativo e financeiro oferecido por essas fundações é fundamental para a sustentabilidade e a eficiência das iniciativas acadêmicas e científicas, contribuindo significativamente para a transformação social e a redução das desigualdades.

Ao final, busca-se demonstrar que as fundações de apoio não apenas suplementam as capacidades das IFES e ICTs, mas são indispensáveis para que essas instituições alcancem todo o seu potencial, consolidando-se como pilares do desenvolvimento sustentável e da inovação no Brasil.

Na pesquisa, será empregada uma abordagem explicativa, teórica e descritiva, com predominância do método dedutivo, através de revisão bibliográfica em artigos, livros e legislações, com foco especial naqueles disponibilizados em meio online, por meio da rede mundial de computador, que propiciaram a reflexão crítica do tema.

1. Arcabouço Legislativo e Conceito

Na esfera federal, o arcabouço legislativo das fundações de apoio pode ser encontrada nas Leis nº 8.958/1994, nº 10.973/2004 e nos Decretos nº 7.423/2010, nº 8.240/2014 e nº 8.241/2014, que a regulamentam.

O marco legal das fundações de apoio, consolidado pela Lei nº 8.958/1994, cuidou de estabelecer parâmetros sobre as relações entre as fundações e as respectivas IFES e ICTs, e traduz a sua finalidade principal, qual seja: apoiar as atividades das Instituições Federais, atuando como instrumentos de fomento ao ensino, à pesquisa, extensão e desenvolvimento, bem como de facilitação do processo de interação instituição pública-empresa.

O então Ministro da Educação, Murílio Hingel, ao encaminhar sua exposição de motivos ao Presidente da República na época, Itamar Franco, da minuta do projeto da Lei nº 8.958/94, assim se manifestou: (COÊLHO; COÊLHO, 2006)

“Neste contexto, as Fundações de Apoio cumprem funções específicas, especializando-se no conhecimento de políticas de atuação e procedimentos das agências de fomento, nacionais e internacionais, no assessoramento à elaboração de projetos compatíveis com essas fontes e gerenciamento de recursos obtidos, com administração individualizada para cada projeto. Constituem, assim, o meio eficaz e as condições especiais de trabalho, imprescindíveis às IFES – Instituições Federais de Ensino Superior, que poderão, dedicadas às atividades-fim, participar e contribuir efetiva e sistematicamente para o desenvolvimento científico e tecnológico do País.”

O art. 1º da Lei nº 8.958/1994 estabelece o seguinte:

Art. 1o  As Instituições Federais de Ensino Superior - IFES e as demais Instituições Científicas e Tecnológicas - ICTs, de que trata a Lei nº 10.973, de 2 de dezembro de 2004, poderão celebrar convênios e contratos, nos termos do inciso XIII do caput do art. 24 da Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, por prazo determinado, com fundações instituídas com a finalidade de apoiar projetos de ensino, pesquisa, extensão, desenvolvimento institucional, científico e tecnológico e estímulo à inovação, inclusive na gestão administrativa e financeira necessária à execução desses projetos. (Redação dada pela Lei nº 12.863, de 2013)

No mesmo sentido, a Lei nº 10.973/2004, conhecida como “Lei de Inovação”, pois dispõe sobre incentivos à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo, considera fundação de apoio[2] a criada com a finalidade de dar apoio a projetos de pesquisa, ensino e extensão, projetos de desenvolvimento institucional, científico, tecnológico e projetos de estímulo à inovação de interesse das ICTs, registrada e credenciada no Ministério da Educação e no Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.

Em alguns julgados, o Tribunal de Contas da União (TCU), já se manifestou sobre a necessidade do projeto apoiado pela fundação de apoio observar o prazo determinado e se enquadrar como projeto de apoio a pesquisa, ensino, extensão ou desenvolvimento institucional, científico e tecnológico, em obediência ao disposto no artigo 1º da Lei nº 8.958/1994, a saber:

4. Por diversas vezes este Tribunal manifestou-se no sentido de ser ilegal a contratação de fundação de apoio a pesquisa, ensino, extensão ou desenvolvimento institucional, científico e tecnológico de interesse da respectiva Instituição Federal de Ensino Superior – IFES contratante, nos termos do que estabelece a Lei nº 8.958/1994.
5. Com efeito, a transferência de recursos à fundação de apoio deve estar vinculada a projeto específico, com prazo determinado, previamente aprovado e voltado às mencionadas atividades, a ser aferido mediante efetiva melhoria de desempenho da universidade, o que, no caso vertente, não restou comprovado, conforme constatou a unidade técnica. (Acórdão 4.190/2010, 2ª Câmara, rel. Min. José Jorge).

Pode-se destacar quatro características principais das fundações de apoio, previstas na Lei nº 8.658/94. A primeira delas está contida no artigo 1º, e é a sua definição como sendo aquelas fundações instituídas com a finalidade de dar apoio a projetos de ensino, pesquisa e extensão e de desenvolvimento institucional, científico e tecnológico, de interesse das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) e demais Instituições Científicas e Tecnológicas (ICTs).

A segunda característica, conforme artigo 2º, é a determinação para que as fundações de apoio sejam constituídas na forma de fundações de direito privado, sem fins lucrativos, e regidas pelo Código Civil e por estatutos. Também estarão sujeitas à fiscalização pelo Ministério Público, nos termos do Código Civil e do Código de Processo Civil, à legislação trabalhista e ao prévio registro e credenciamento no Ministério da Educação e no Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, renovável a cada 5 (cinco) anos.

A terceira é a permissão expressa às IFES e demais ICTs de celebrar convênios e contratar as fundações de apoio, nos termos do inciso XIII do artigo 24 da Lei nº 8.666/93, com dispensa de licitação e por prazo determinado.

A quarta característica é a aplicação dos princípios constitucionais da Administração Pública às fundações de apoio, como o da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, economicidade e eficiência.

De acordo com o Portal do Ministério da Educação, as Fundações de Apoio serão regidas pelo Código Civil Brasileiro e sujeitam-se, portanto, à fiscalização do Ministério Público, nos termos do Código Civil e do Código de Processo Civil, à legislação trabalhista e, em especial, ao prévio registro e credenciamento nos Ministérios da Educação e do Ministério da Ciência e Tecnologia, renovável bienalmente. Ademais, estas fundações não são criadas por lei nem mantidas pela União. O credenciamento prévio junto aos Ministérios da Educação e da Ciência e Tecnologia é requerido em razão da relação existente entre as instituições federais e as fundações de apoio ser de fomento ao desenvolvimento de projetos de ensino, pesquisa e extensão. Às Fundações de Apoio, cabe a função de dar suporte administrativo e finalístico aos projetos institucionais das IFEs e das ICTs. (MEC, 2012)

De acordo com o Decreto nº 7.423/2010, que regulamenta a Lei nº 8.958/1994, as relações entre a fundação de apoio e a instituição apoiada para a realização dos projetos institucionais devem ser formalizadas por meio de contratos, convênios, acordos ou ajustes individualizados, com objetos específicos e prazo determinado, vedado o uso desses instrumentos com objeto genérico.[3]

Para Edmir Netto de Araújo[4], os convênios se diferenciam dos contratos, pois nestes “as vontades são antagônicas, se compõem, mas não se adicionam, delas resultando uma terceira espécie (vontade contratual, resultante e não soma)”. Já nos convênios, “como nos consórcios, as vontades se somam, atuam paralelamente, para alcançar interesses e objetivos comuns”.

Por tal motivo, nos convênios não há partes opostas, mas sim partícipes ou participantes. Di Pietro[5] (2018), aponta outra diferença importante entre os instrumentos: a inexistência de contraprestação nos convênios. Para Hely Lopes Meirelles, enquanto “no contrato as partes têm interesses diversos e opostos; no convênio os partícipes têm interesses comuns e coincidentes”. (MEIRELLES, 2006)

A Lei nº 8.958/94 também estabelece, em seu artigo 3º-A, que na execução de convênios, contratos, acordos ou ajustes envolvendo recursos públicos, as fundações de apoio são obrigadas a prestar contas dos recursos aplicados aos entes financiadores, submeter-se ao controle de gestão pelo órgão máximo da instituição apoiada, e, ainda, submeter-se ao controle finalístico pelo órgão de controle governamental competente.

É importante observar no art. 4º, §2º da Lei nº 8.958/94, que “os recursos provenientes de convênios, contratos, acordos e demais ajustes que envolvam recursos públicos gerenciados pelas fundações de apoio deverão ser mantidos em contas específicas abertas para cada projeto.”  

2. A Importância das Fundações de Apoio às IFES e ICTs

As Fundações de Apoio surgiram com o propósito de oferecer uma alternativa para proporcionar um certo grau de flexibilidade e um mínimo de agilidade e autonomia às atividades de ensino, pesquisa, extensão, desenvolvimento institucional, científico, tecnológico e estímulo à inovação das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) e as demais Instituições Científicas e Tecnológicas (ICTs).

As fundações desempenham um papel fundamental na captação de recursos, gestão administrativa e promoção de parcerias estratégicas que impulsionam a pesquisa, o desenvolvimento científico e tecnológico no Brasil. Para Marçal Justen Filho, a fundação de apoio é “o meio jurídico tanto para a transferência para a sociedade de certas utilidades que existem no âmbito das instituições em questão como também uma via para que a própria sociedade promova o suporte para atividades acadêmicas, pedagógicas, científicas e de pesquisa”. (JUSTEN FILHO, 2021)

Por ser uma instituição jurídica de direito privado, possui algumas prerrogativas, tais como: (i) autonomia administrativa; (ii) autonomia financeira; (iii) flexibilidade na realização de projetos; (iv) possibilidade de contratação de pessoal pelo regime celetista; e (v) recursos financeiros privados.

Uma Instituição Federal seja de Educação ou Ciência e Tecnologia tem como principal finalidade a produção, disseminação e aplicação do conhecimento científico e tecnológico, destacando-se em conduzir pesquisas em diversas áreas do conhecimento. A educação aliada à inovação possibilita a transformação social, diminuindo as desigualdades e promovendo o desenvolvimento da comunidade. As unidades acadêmicas, científicas e tecnológicas contribuem para essa missão investigativa captando recursos de órgãos externos, e auxiliam as instituições públicas federais no cumprimento de seu compromisso social, na captação de recursos e na gestão mais ágil e flexível dos mesmos.

A discussão sobre o papel das fundações de apoio às Instituições Federais de Ensino Superior (IFEs) e Instituições Científicas e Tecnológicas (ICTs) é crucial para compreender o avanço científico e tecnológico em nossa sociedade contemporânea. Estas fundações desempenham uma função estratégica ao facilitar parcerias, captar recursos e promover a integração entre setores público e privado, permitindo a realização de projetos de pesquisa e desenvolvimento que impactam diretamente o progresso econômico, social e tecnológico do país.

O maior objetivo dos instituidores das fundações públicas é fazer uso da autonomia administrativo-financeira que estas possuem, inerentes às pessoas jurídicas de direito privado, para agilizar e flexibilizar a realização de projetos utilizando o grande potencial existente nas IFES e nas ICTs, para obter recursos suplementares em outras fontes que não o Tesouro Nacional, visando suprir a carência de recursos públicos para a sua manutenção, investimentos e desenvolvimento de suas atividades, bem como estimular a participação de pesquisadores por meio de bolsas e outras formas de pagamentos aos participantes dos projetos.

Uma das principais funções das fundações de apoio é auxiliar as IFES e ICTS na captação de recursos financeiros. Isso inclui desde a gestão de editais públicos e privados até a busca por patrocínios e parcerias com o setor empresarial. Esses recursos são essenciais para financiar projetos de pesquisa, infraestrutura laboratorial, bolsas de estudo e desenvolvimento de novas tecnologias. Elas facilitam o acesso a financiamento inicial através de programas de fomento, editais específicos para startups e parcerias com investidores privados e públicos interessados em apoiar inovações tecnológicas.

Ademais, também assumem a responsabilidade pela gestão administrativa e financeira dos recursos obtidos, garantindo transparência, eficiência e conformidade com as normas e regulamentos vigentes. As fundações de apoio suporte na elaboração de projetos, na prestação de contas e na execução de atividades relacionadas aos recursos captados. Além de captar recursos, as fundações de apoio promovem a formação de parcerias estratégicas entre academia, setor produtivo e governo. Essas parcerias são fundamentais para o desenvolvimento de projetos colaborativos que integram conhecimento científico e tecnológico com demandas e oportunidades do mercado.

3. Dispensa de Licitação

Primeiramente, cumpre esclarecer que, a Constituição Federal de 1988 determina, via de regra, que o administrador público tem o dever de licitar para contratar serviços, obras, compras ou alienações. conforme determina a Constituição Federal, a saber:

XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações. 

Vale lembrar que, licitação na clássica formulação de MEIRELLES (2006), é:

“é o procedimento administrativo mediante o qual a Administração Pública seleciona a proposta mais vantajosa para o contrato de seu interesse. Como procedimento, desenvolve-se através de uma sucessão ordenada de atos vinculantes para a Administração e para os licitantes, o que propicia igual oportunidade a todos os interessados e atua como fator de eficiência e moralidade nos negócios administrativos.”

Contudo a obrigatoriedade de se proceder à licitação pública comporta exceções, hipóteses em que o procedimento licitatório será dispensável ou inexigível, a depender da situação concreta apresentada.

Sobre a dispensa, JUSTEN FILHO (1998), vai dizer o seguinte:

Nos casos de dispensa de licitação, os pressupostos de competição estão presentes e, teoricamente, seria incabível submeter a contratação a um procedimento prévio de seleção. Porém, a lei eliminou a obrigatoriedade e licitação, por reputar inconveniente sua efetivação. Avaliando os benefícios (possíveis) e os prejuízos (inevitáveis) que poderiam concretizar-se em virtude do desenvolvimento do procedimento licitatório, o legislador permitiu a contratação direta. Em tais hipóteses, a autorização legal para a contratação direta deriva da previsão do legislador de prejuízos superiores aos potenciais benefícios. Quando se trata de dispensa, o legislador tomou a si a tarefa de discriminar os casos de contratação direta. Por isso, a dispensa de licitação depende de previsão explícita em lei, cujo rol é exaustivo e não pode ser ampliado. Já nos casos de inexigibilidade, o legislador reconheceu a impossibilidade de promover um elenco exaustivo, por ser logicamente impossível antever todas as situações em que ocorrerá a inviabilidade de competição. Por isso, ainda que a lei indique situações de inexigibilidade, o rol normativo tem natureza exemplificativa. Nesse sentido, toda a doutrina se manifestou, como se pode ver em Celso Antônio Bandeira de Mello, Carlos Pinto Coelho Motta, Carlos Ari Sundfeld, Diógenes Gasparini e Toshio Mukai.”

O artigo 1º da Lei nº 8.958/94 prevê que as IFES e ICTs poderão celebrar convênios e contratos com as fundações de apoio, nos termos do inciso XIII do caput do artigo 24 da Lei nº 8.666/93, desde que seja por prazo determinado e que as fundações sejam instituídas de acordo com a finalidade de apoiar projetos de ensino, pesquisa, extensão, desenvolvimento institucional, científico e tecnológico e estímulo à inovação, in verbis

Art. 24 É dispensável a licitação:
(...)
XIII - na contratação de instituição nacional sem fins lucrativos, incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional, científico ou tecnológico, desde que a pretensa contratada detenha inquestionável reputação ético-profissional;

A Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos – Lei nº 14.133/2021), que revogou a Lei nº 8.666/93, dispôs de forma similar em seu artigo 75, XV, também permitindo às IFES e ICTs contratarem as fundações de apoio, com dispensa de licitação, a saber:

XV - para contratação de instituição brasileira que tenha por finalidade estatutária apoiar, captar e executar atividades de ensino, pesquisa, extensão, desenvolvimento institucional, científico e tecnológico e estímulo à inovação, inclusive para gerir administrativa e financeiramente essas atividades, ou para contratação de instituição dedicada à recuperação social da pessoa presa, desde que o contratado tenha inquestionável reputação ética e profissional e não tenha fins lucrativos; (Grifos do autor)

4. Casos de Sucesso e Exemplos Práticos

Em resumo, os casos de sucesso e exemplos práticos destacam como as fundações de apoio desempenham um papel fundamental na transformação de conhecimento científico em benefícios tangíveis para a sociedade e na promoção do avanço tecnológico e econômico do Brasil. Eles ilustram a importância das parcerias estratégicas, da gestão eficiente de projetos e do apoio ao empreendedorismo científico como elementos essenciais para o desenvolvimento nacional.

O artigo 1º, parágrafo 3º-A, da Lei nº 8.958, de 1994, estabelece que a Fiocruz, na condição de ICT, poderá celebrar convênio ou contrato com a fundação de apoio, abrangendo o apoio a projetos de produção e fornecimento de vacinas, medicamentos e outros insumos e serviços para a saúde.

A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), vinculada ao Ministério da Saúde, é reconhecida pela sociedade brasileira e mundialmente como a mais destacada instituição de ciência e tecnologia em saúde da América Latina, em razão da sua capacidade de colocar a ciência, a tecnologia, a inovação, a educação e a produção tecnológica de serviços e insumos estratégicos para promoção da saúde e desenvolvimento social, bem como para gerar e difundir conhecimento científico e tecnológico[6].

Nesse contexto, no âmbito da saúde, a Fiocruz, como instituição apoiada, celebrou convênio[7] com a Fundação para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico em Saúde (Fiotec), fundação de apoio, cujo objeto é apoiar a ICT na execução de seus projetos de ensino, pesquisa, extensão; de desenvolvimento institucional, científico, cultural e tecnológico; de estímulo à inovação; e de produção e fornecimento de vacinas, medicamentos e outros insumos e serviços para a saúde, inclusive na gestão administrativa e financeira necessária à execução desses projetos[8], respeitadas as regras do Decreto nº 7.423, de 2010, que regulamenta a Lei nº 8.958/94.

A partir do referido convênio, fica previsto que a Fiocruz e a Fiotec, visando a realização dos projetos institucionais de que tratam o artigo 1º da Lei nº 8.958/1994, o §1º do artigo 6º do Decreto nº 7.423/2010, a Lei nº 10.973/2004 e o Decreto nº 9.283/2018, poderão formalizar contratos, convênios, acordos ou outros ajustes previstos em lei, com objeto específico e vigência estabelecida com base no período previsto para a execução do projeto.

Tal convênio teve um relevante papel durante o enfrentamento da pandemia de Covid-19, por exemplo, possibilitando o apoio pela FIOTEC no monitoramento e avaliação de vulnerabilidades sociais e territoriais relacionadas direta ou indiretamente à doença no Distrito Federal, por meio de um convênio firmado entre o Instituto de Pesquisa e Estatística do Distrito Federal (IPEDF) em parceria com a Fiocruz Brasília e a Fiotec. Na oportunidade, o diretor-presidente do IPEDF, Jean Lima[9], ressaltou ser necessário afirmar a “importância da evidência científica como instrumento de política pública, pois não é possível fazer política pública sem dados. O envolvimento da sociedade, dos gestores e das instituições de pesquisa faz com que essas políticas deem certo”.

Um exemplo prático derivado desse instrumento, e que reflete a importância da parceria entre ICT e fundação de apoio em prol da população brasileira, pode ser observado, ainda, pela realização de Chamada Pública do Plano de Enfrentamento à Covid-19 nas Favelas do Rio de Janeiro. Segundo o Diretor Executivo da Fiocruz, Juliano de Carvalho Lima[10]:

“Esse é um projeto que foi lançado no momento mais crítico da pandemia de Covid-19 e mostrou resultados. Apesar da Covid-19 ser um risco menor no momento, é fundamental mantermos a parceria com as organizações sociais das favelas porque novas demandas de saúde surgiram nesses territórios no momento pós pandemia. E são essas organizações que atuam na ponta e sabem das reais demandas da população mais vulnerabilizada. (...)”

Outro exemplo mais recente que também é reflexo do referido convênio, foi um outro convênio decorrente do primeiro, firmado entre a Prefeitura de Niterói e a Fiocruz, em 27 de março de 2024, por intermédio de sua fundação de apoio, a Fiotec, para a elaboração do Programa de Educação Climática do município, com participação ampla da sociedade, das empresas, do poder público, de instituições de educação, de todos[11].

A Fiotec também é parte de um projeto desenvolvido pela Fiocruz Pernambuco que investe, entre outras frentes, no diagnóstico de alta complexidade da leishmaniose visceral (LV), doença infecciosa que pode acometer pessoas e animais. A fundação de apoio é responsável pela aquisição de insumos utilizados na produção de testes rápidos de triagem, além de atuar na contratação dos profissionais que desenvolvem as pesquisas.[12]

Pode-se perceber, portanto, que a colaboração entre academia e indústria facilitada pelas fundações de apoio possibilita o desenvolvimento conjunto de novos produtos, processos e serviços inovadores. A verdade é que as parcerias estratégicas facilitadas pelas fundações de apoio são essenciais para impulsionar a inovação, fortalecer a competitividade industrial e promover o desenvolvimento sustentável no Brasil.

O fortalecimento dessas instituições é essencial para garantir um desenvolvimento sustentável e competitivo em um cenário global cada vez mais complexo e exigente. Elas representam um modelo eficaz de colaboração entre academia, setor produtivo e governo, com potencial para gerar impactos positivos significativos na economia e na sociedade como um todo.

Considerações Finais

Em conclusão, o modelo de fundações de apoio revelou-se vitorioso no esforço de dotar as Instituições Federais e Ensino Superior (IFES) e as Instituições Científicas e Tecnológicas (ICTS) de um braço flexível que desempenham um papel essencial no panorama científico e tecnológico do Brasil, ao facilitarem parcerias estratégicas, captarem recursos financeiros e promoverem a gestão eficiente de projetos, essas entidades fortalecem a capacidade de pesquisa e inovação do país. Suas contribuições vão além da mera administração de recursos; elas criam um ambiente propício à colaboração entre academia, indústria e governo, fomentando o desenvolvimento de soluções tecnológicas e científicas que impactam diretamente a sociedade.

As fundações de apoio desempenham um papel estratégico ao estabelecerem pontes entre as IFES, ICTS e o setor produtivo, viabilizando a transferência de conhecimento e tecnologia para aplicações práticas. Este estudo buscou explorar como essas fundações não apenas complementam, mas também potencializam as capacidades das instituições acadêmicas, científicas e tecnológicas, desempenhando um papel crucial e multifacetado no apoio às IFES e ICTs, e, consequentemente, contribuindo de maneira significativa para o avanço científico e tecnológico do Brasil.

Portanto, é imprescindível fortalecer e apoiar continuamente essas fundações, reconhecendo seu potencial transformador e seu papel fundamental na construção de uma sociedade mais desenvolvida, inovadora e competitiva no cenário global.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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_______. Decreto nº 7.423, de 31 de dezembro de 2010. Regulamenta a Lei no 8.958, de 20 de dezembro de 1994, que dispõe sobre as relações entre as instituições federais de ensino superior e de pesquisa científica e tecnológica e as fundações de apoio, e revoga o Decreto no 5.205, de 14 de setembro de 2004. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/decreto/d7423.htm#:~:text=DECRETO%20N%C2%BA%207.423%2C%20DE%2031,14%20de%20setembro%20de%202004.> Acesso em: 01 jul. 2024.

_______. Decreto nº 8.240, de 21 de maio de 2014. Regulamenta os convênios e os critérios de habilitação de empresas referidos no art. 1º-B da Lei nº 8.958, de 20 de dezembro de 1994. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/decreto/d8240.htm. Acesso em 03 jul. 2024.

_______. Decreto nº 8.241, de 21 de maio de 2014. Regulamenta o art. 3º da Lei nº 8.958, de 20 de dezembro de 1994, para dispor sobre a aquisição de bens e a contratação de obras e serviços pelas fundações de apoio. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/decreto/d8241.htm. Acesso em: 03 jul. 2024.

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MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo. 14ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006.


1 Advogada. Mestranda em Estudos Marítimos (Linha de Pesquisa: Política, Gestão e Logística em Ciência, Tecnologia e Inovação no Ambiente Marítimo) pela EGN. Pós-Graduada em Licitações e Contratações Públicas pela Faculdade CERS e em Direito Público e Privado pela EMERJ. Extensão em Compliance pela FGV. Graduada em Direito pela UCAM. E-mail: [email protected]

2 Art. 2º, VII da Lei nº 10.972/2004.

3 Art. 8º, caput e Parágrafo único, do Decreto nº 7.423, de 31 de dezembro de 2010.

4 Citado por DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. Ed. GenMétodo. 31ª ed. 2018. Item 8.11.

5 Op. Cit.

6 Disponível em: < https://portal.fiocruz.br/perfil-institucional>. Acesso em 02 jun. 2024.

7 O instrumento de convênio atual celebrado entre os partícipes encontra-se disponível em: < https://www.fiotec.fiocruz.br/documentacao/476-convenio-fiocruz-x-fiotec-145-2022/file>. Acesso em: 02 jul. 2024.

8 Mais sobre esta fundação de apoio disponível em: < https://www.fiotec.fiocruz.br/institucional/sobre-nos>. Acesso em 02 jul. 2024.

9 Disponível em: https://ipe.df.gov.br/ipedf-lanca-sala-de-cooperacao-social-digital-em-parceria-com-a-fiocruz-e-fiotec/. Acesso em 04 jul. 2024.

10 Disponível em: < https://www.fiotec.fiocruz.br/noticias/projetos/8181-fiocruz-convoca-novos-projetos-para-promocao-da-saude-nas-favelas-do-rio>. Acesso em: 03 jul. 2024.

11 Disponível em: < https://niteroi.rj.gov.br/2024/03/27/prefeitura-de-niteroi-firma-convenio-com-a-fiocruz-para-elaboracao-do-programa-de-educacao-climatica-do-municipio/>. Acesso em: 03 jul. 2024.

12 Disponível em: https://www.fiotec.fiocruz.br/noticias/projetos/8510-projeto-de-combate-a-leishmaniose-visceral-tem-apoio-da-fiotec. Acesso em 04 jul. 2024.