METODOLOGIAS ATIVAS LÚDICAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10345934


Eva Elpidio de Oliveira¹


RESUMO
As crianças brincam de forma natural, o que faz parte de seu desenvolvimento biológico. Assim, espera-se que a escola desenvolva metodologias ativas capazes de potencializar a motivação natural das crianças como estratégia de ensino. Por meio de revisão bibliográfica associada a pesquisa por meio da coleta de dados utilizando formulário semiestruturado junto aos professores, buscou-se responder ao problema em estudo: de que forma as metodologias ativas praticadas na educação infantil podem ser desenvolvidas por meio de atividades lúdicas? O objetivo foi identificar a possibilidade de problematizar as atividades lúdicas na educação infantil, descrever a importância da relação afetiva para adentrar o universo infantil, destacar a importância de captar o ponto de vista da criança na ludicidade. Conclui-se que os professores permitem que as crianças brinquem como forma de diversão entre as atividades propostas, mas é escasso o uso intencional das brincadeiras como forma de problematizar a realidade infantil e conduzir à aprendizagem.
Palavras-chave: Brincadeiras.Faixa etária. Educação infantil. Jogos. Ludicidade.
 
ABSTRACT
Children play naturally, which is part of their biological development. Thus, it is expected that the school develops active methodologies capable of enhancing the children's natural motivation as a teaching strategy. Through a bibliographic review associated with research through data collection using a semi-structured form with the teachers, we sought to answer the problem under study: in which way the active methodologies practiced in early childhood education can be developed through playful activities? The objective was to identify the possibility of problematizing playful activities in early childhood education, to describe the importance of the affective relationship to enter the children's universe, to highlight the importance of capturing the child's point of view in play. It is concluded that teachers allow children to play as a form of entertainment among the proposed activities, but the intentional use of games as a way of problematizing children's reality and leading to learning is scarce.
Keywords: Jokes. Age group. Child education. Games. Playfulness.
 

1. INTRODUÇÃO

As crianças brincam de forma natural, o que faz parte de seu desenvolvimento físico, social e mental. Por meio das brincadeiras, a criança descobre o mundo, se relaciona com outras crianças e com os adultos e forma vínculos sociais. É nas brincadeiras que a criança testa suas teorias e amadurece suas ações, por isso é natural que uma criança cometa erros e corra ricos, pois está experimentando as coisas que a rodeiam. Nesse processo de descobertas, todo tipo de brincadeira entra em cena: jogos, cantigas, danças, simulação de lutas, encenações dentre outras formas de interagir com as coisas e com as pessoas. A criança brinca sozinha, interagindo com outras crianças, com adultos e com animais. Essa propensão natural para brincar pode ser usada com intencionalidade no processo de ensino.

A escola proporciona o ambiente ideal para que as crianças possam exercer de forma plena sua criatividade: é um ambiente extra familiar, de convívio coletivo com outras crianças da mesma faixa etária, supervisionado por adultos, sem riscos para a criança. Ou seja, espera-se que na escola a criança possa brincar de forma livre, criativa e produtiva. As brincadeiras infantis na escola podem ocorrer de forma permissiva ou intencional conduzida. Permissiva é quando a escola percebe as brincadeiras como forma ociosa de diversão para as crianças, e permite que elas brinquem para descontrair entre uma e outra atividade. Intencional conduzida é quando as brincadeiras fazem parte do processo de ensino e são planejadas como estratégias para alcançar os objetivos da escola.

Ao perceber que as crianças têm interesses que são orientados por suas necessidades individuais de desenvolvimento, interação e socialização, a escola pode desenvolver atividades diretamente ligadas a esses interesses, transformando a escola em um ambiente de aprendizagem ativa. As metodologias ativas se caracterizam por envolver o educando no processo de sua própria educação, a partir de motivações que já estão nele. Dessa forma, espera-se que as metodologias ativas de ensino e aprendizagem praticadas na educação infantil, estejam fortemente ligadas às atividades lúdicas, que estão no centro do interesse das crianças nessa faixa etária.

O problema em estudo é: de que forma as metodologias ativas praticadas na educação infantil podem ser desenvolvidas por meio de atividades lúdicas? O objetivo geral é identificar a possibilidade de problematizar as atividades lúdicas na educação infantil. Pretende-se ainda descrever a importância da relação afetiva para adentrar o universo infantil, destacar a importância de captar o ponto de vista da criança na ludicidade e discutir a condução de metodologias ativas centradas na ludicidade.

A pesquisa é relevante por analisar bibliografias que destacam a importância das atividades lúdicas para o desenvolvimento infantil, apresentando assim oportunidades para que os professores adentrem esse universo de brincadeiras e jogos de forma intencional e estratégica, transformando as brincadeiras infantis em estratégias de ensino de forma ativa e natural.Nesse sentido, considerou-se relevante discutir as condicionalidades para que a problematização ocorra de forma efetiva e pesquisar, junto a professores, a percepção deles a respeito dessa oportunidade. O percurso metodológico consiste na revisão bibliográfica associada a pesquisa por meio da coleta de dados junto aos professores utilizando formulário semiestruturado. A revisão bibliográfica teve como finalidade fundamentar os conceitos e embasa a discussão. Os dados coletados permitiram verificar se a escola percebe e pratica a problematização a partir de atividades lúdicas na educação infantil.

2. REFERENCIAL TEÓRICO

O uso de metodologias ativas na educação infantil tornou-se um imperativo conforme a compreensão do processo ensino aprendizagem transferiu a centralidade do ensino do professor para o escolar. Dessa forma, a presença de atividades que envolvem o estudante na construção do próprio conhecimento faz parte da maioria dos planos de ensino.Isso aponta a importância de discutir atividades lúdicas como instrumento de problematização, o que será abordado na revisão bibliográfica e na pesquisa com professores.

2.1 Problematização a partir do lúdico no ensino infantil

Para as crianças, as atividades lúdicas são muito mais que brincadeiras. Trata-se de um recurso natural para compreender o mundo, testar e ampliar a compreensão da realidade, testar seus limites e vivenciar novas experiências. As brincadeiras e jogos são maneiras com as quais as crianças se relacionam com os colegas, adultos e com o ambiente. Quando uma criança se depara com algo desconhecido ou intrigante, costuma elaborar brincadeiras para processar as novas informações, o que é um processo natural de problematização da aprendizagem (KIYA, 2014).Mesmo sendo natural na criança, a problematização das atividades lúdicas pode ser conduzida intencionalmente por um adulto, tendo boa aceitação por parte da criança, que considera o adulto como parceiro de brincadeiras. Para conseguir penetrar no universo lúdico infantil, o adulto precisa compreender e aceitar as regras impostas pela criança, inserindo-se no processo de construção do conhecimento elaborado pela própria criança (CORRÊA, 2019). 

2.2 A importância da relação afetiva na ludicidade

Algumas características do professor contribuem para a aceitação da criança em seu universo lúdico. Crianças não brincam com pessoas que se impõem sobre elas. É preciso construir um vínculo afetivo. O uso da afetividade na educação fundamental é essencial para que o professor possa usar atividades lúdicas como estratégia de ensino (TÁPIAS, 2018).Afetividade e cognição são aspectos indissociáveis, principalmente durante os estágios de desenvolvimento infantil sensório-motor e pré-operacional. Para Vygotsky e Wallon essa possui um caráter social, sendo que dentro dessa concepção o educador exerce o papel principal de mediador desses dois aspectos, cabe a esse profissional interrelacionar em sua práxis pedagógica emoção, prazer, desejo a razão e por sua vez ao aspecto cognitivo (FERREIRA, 2010).

Uma relação afetiva entre professor e aluno, principalmente durante seus primeiros contatos com o ambiente de ensino é a base para que o educando estabeleça um elo com o saber. Através do afeto, do carinho e do contato com o professor a criança se sente mais à vontade, segura e agregada ao meio, isso proporciona motivação, prazer, diálogo e segurança, o que facilita o processo de desenvolvimento da aprendizagem (PEREIRA, 2017). Durante a infância é preciso que o ser se sinta amado, cuidado, isso lhe dá segurança para explorar o mundo que o cerca. Se a criança recebe atenção, carinho por parte do adulto ela reproduzirá o que recebe. Não existe educação mais eficaz do que o exemplo. É nessa relação que a criança descobrirá sentimentos como amor, a paz, a solidariedade, a felicidade, e aprenderá a lidar com aqueles que incomodam, como a angústia, a tristeza, a frustração, entre outros (KONKIEWITZ, 2013).

É importante que a relação estabelecida entre professor e aluno seja intimamente marcada pelo afeto e a empatia, pois o vínculo formado entre educador e educando se torna um elo entre ensino e aprendizagem, desempenhando a função mediadora de conhecimento. Uma criança sente-se insegura, perdida, receosa em suas primeiras experiências escolares. Conforme percebe que pode exercer na escola as atividades que já realizava em casa, e que tem a parceria de colegas e professor, liberta-se para exercer suas atividades lúdicas (GATELLI, 2017).

No momento em que ela entra em contato com um mundo novo e diferente, antes desconhecido, não possui capacidade psicológica, emocional e cognitiva para lidar com a descoberta, resultando no sentimento de desconforto, perda, insegurança entre outros, sendo necessária assim a intervenção do profissional. O envolvimento afetivo transforma esse momento em algo agradável e proporciona situações para o processo de adaptação da criança ao meio e ao novo contexto, permitindo que o professor possa participar como parceiro nas atividades da criança (HOHMANN, 2019).

O acolhimento, o carinho, a demonstração de sentimentos são muito importantes para a formação infantil. Nessa fase uma das formas mais efetivas de comunicação são as expressões por meio de emoções: o choro, o sorriso, as birras. Em toda atitude a criança está querendo comunicar algo. Compreender essas situações é fundamental para que o professor tenha êxito em seu trabalho diário (ANTUNES, 2005). A figura do professor é importante para que os alunos se sintam mais seguros, proporcionando dessa maneira um ambiente de aprendizado tranquilo. A afetividade é um processo de construção constante que acontece na rotina da sala de aula, através da postura do educador, bem como no dinamismo de seu trabalho e nas interações entre sujeitos. Conforme interage com os alunos, o professor torna-se parte de suas brincadeiras (SCHROEIDER, 2019).

Considerando a definição de Wallon de que a afetividade consiste na “capacidade do ser humano de ser afetado positiva ou negativamente tanto por sensações internas como externas”, é possível compreender que o afeto recebido ou que deixa de ser oferecido à criança durante o processo de ensino impacta sobre esse processo. Os autores pesquisados apontam algumas consequências da presença ou ausência do afeto por parte dos professores. Uma dessas consequências pode ser observada na própria estrutura emocional da criança. A criança está em processo de formação não somente do ponto de vista intelectual, mas no ser como um todo. Está em fase de crescimento físico, aprendizagem, descoberta do mundo, formação psicológica, formação emotiva, formação de valores (FERREIRA, 2010).

Em todos esses aspectos a relação da criança com o meio e com as demais pessoas impacta de modo positivo ou negativo. A formação da estrutura emocional da criança tem estreita relação com o afeto que ela recebe de suas referências, ou seja, dos adultos que participam de seu processo formativo. Na escola, essa referência é o professor (ANTUNES, 2005).A formação do comportamento ético e moral da criança tem relação estreita com o afeto e autonomia que essa criança recebe em seu processo formativo. Uma criança que vive sob constante vigilância, sob pressão, em regime excessivamente autoritário e vazio de afetos, não conseguirá desenvolver um comportamento ético e moral. Assim, para sentir-se segura e envolver-se de forma positiva nas brincadeiras, uma criança precisa do afeto, capaz de gerar a sensação de segurança (LA TAILLE, 2006).

O comportamento ético e moral se constrói a partir de escolhas e decisões da pessoa, tomadas a partir de suas relações com outras pessoas. Dessa forma, em suas relações com as demais, a criança constrói seu próprio conjunto de valores. Assim, em vez de exercer autoridade pala força e imposição, o professor pode influenciar por meio do afeto, concedendo liberdade de decisão e escolha às crianças, proporcionando um ambiente de autonomia onde seja possível construir a personalidade (LA TAILLE, 2006).Ao perceber que é alvo de afeto, a criança passa a desejar a harmonia, pois percebe que assim receberá ainda mais afeto. Ao contrário disso, quando percebe que é alvo de vigilância e controle, passa a desejar a ausência de quem controla para que assim possa exercer sua autonomia, praticando atos contrários aos impostos por quem exerce o controle (ANTUNES, 2005).

A afetividade é indispensável à formação da personalidade, uma vez que é fundamental para traduzir a dimensão psíquica, fazendo com que criança possa se relacionar com o meio. Personalidade é mais que comportamento. Trata-se da estrutura da pessoa, suas escolhas, seus valores, suas crenças, sua relação com as demais pessoas, seu temperamento, seu caráter. Dessa forma, receber ou não afeto na escola pode produzir adultos com bom ou mau caráter (LA TAILLE, 2006). A afetividade é indissociável à cognição, ou seja, só ocorre aprendizagem em um ambiente afetivo. O afeto tem relação direta com o desenvolvimento da criança. Dessa forma, uma escola que promove o relacionamento afetivo dos professores para com os alunos e dos alunos entre si proporcionará um ambiente propício à aprendizagem (SANTOS, 2019).

Em muitas situações, os professores desenvolvem a prática de exercer autoridade por meio da imposição de comportamentos, em uma tentativa de manter a ordem em sala de aula. Com isso, conseguem amedrontar as crianças, que temendo represálias, permanecem em silêncio e se comportam da forma como o professor deseja. Essa prática não contribui para a aprendizagem, pois o silêncio e o comportamento das crianças em resposta à imposição de um adulto não constroem nelas a aceitação das regras impostas nem estimula a ludicidade construtiva (LA TAILLE, 2007).Dessa forma, um ambiente onde o afeto é substituído pelo autoritarismo produz crianças que rejeitam a autoridade. Mesmo aparentando ordem e bom comportamento, as crianças tendem a fazer o contrário do que é ensinado por professores autoritários. No entanto, quando recebem afeto, desejam colocar em prática não somente na sala de aula, mas em toda sua vida o que recebem de seus professores (ANTUNES, 2019).

O afeto ou a ausência dele ocorre nos planos horizontais e verticais. Para agir afetivamente com seus alunos, o professor precisa estar afetivamente saudável. Precisa trabalhar suas emoções, conhecer sua potencialidade, ter segurança de si mesmo. Precisa ter saúde psíquica. Assim, quando proporciona um ambiente afetivo, impacta seus alunos, que por sua vez agem de modo afetivo com os demais colegas, completando o ciclo (SALTINI, 2008).Essa reflexão aponta que os treinamentos de professores, as sessões de planejamento, os encontros pedagógicos devem focar nas relações humanas e no conhecimento das pessoas do que nas técnicas e conteúdos educativos. Espera-se de todo professor que ele conheça as técnicas educativas, pois passou por um processo de formação. Evidentemente, rever e pensar suas práticas de forma permanente é desejável, mas não é tudo (ARMOND, 2019).

As escolas devem contar com apoio psicológico, com pedagogos focados nas relações de afetividade, capazes de promover um ambiente afetivo entre os próprios professores. Um professor que vive sob pressão, que tem medo de seus superiores no ambiente escolar, dificilmente conseguirá proporcionar afeto a seus alunos. Poderá exercer domínio autoritário, mas dificilmente terá afeto a oferecer (WOSZAK, 2019).Verifica-se que os componentes afetivos exercem uma enorme importância no desenvolvimento cognitivo do indivíduo. Ao adentrar a escola, os alunos levam consigo a experiência do lar, com todas as implicações da diferença entre a forma de cuidado e afeto apresentada pela família. O professor precisa compreender tais relações e posicionar-se de forma a compensar ou manter a afetividade recebida pelo aluno em sua casa (BATISTA, 2019). 

2.3 Metodologias ativas nas atividades lúdicas

A ideia de que a aprendizagem está centrada nas necessidades práticas do aluno ganhou força a partir da primeira metade do século XX com John Dewey, considerado um filósofo pedagogista norte americano. Ao perceber que a educação americana estava em risco, Dewey lançou as bases do que seria posteriormente denominado Educação Progressista, apontando que a aprendizagem só ocorre efetivamente quando atende aos anseios do aluno e quando é partilhada (BRANCO, 2014). Posteriormente, os conceitos apresentados por Dewey foram aplicados em forma de métodos educativos, como o Método do Arco de Maguerez e o Método Paulo Freire, ambos voltados inicialmente para a educação de adultos, para a educação profissional e para o ensino superior, mas que posteriormente foram adaptados para o ensino fundamental e para a educação infantil. Variações desses métodos são utilizadas atualmente em todas as formas de educação, incluindo jogos de todos os tipos, brincadeiras e outras atividades lúdicas (LINO, 2017).

Figura 1 – Fluxo de aplicação do Arco de Maguerez

Fonte: BORDENAVE (1998).

Maguerez desenvolveu um método de problematização diante do desafio de ensinar francês a imigrantes, sem ter domínio da língua original deles. Diante do desafio, procurou pontos de contato culturais, como objetos e eventos cotidianos, e com base nesses pontos, obteve sucesso no processo de ensino. O método de Maguerez consiste basicamente em buscar problemas na realidade do aluno por meio de observação, descrever os problemas a partir de seus pontos chave, teorizar, levantar hipóteses de solução e aplicar as soluções aos problemas do aluno. Tudo isso com participação ativa do próprio aluno (BERBEL, 2012). Paulo Freire, ao desenvolver um método para a educação de adultos, teve como foco promover a libertação e a autonomia do aluno a partir da educação, por isso recorria a metodologias ativas buscando associar o ensino às necessidades básicas do aluno. No Brasil, Freire passou a ser considerado um teórico da educação baseada em problemas, com forte influência na educação de adultos e na educação infantil, já que trabalhou com métodos intensivos de alfabetização (MOTA, 2018; SILVA, 2016).

As metodologias ativas de educação consistem, portanto, no envolvimento do aluno de forma ativa no processo de aprendizagem. O aluno não fornece apenas o problema a ser resolvido, mas participa ativamente na resolução do próprio problema. Uma tendência nas metodologias ativas é a gamificação, termo construído a partir da palavra games (jogos em inglês) que no Brasil costuma restringir-se aos jogos eletrônicos. No entanto, o uso de jogos ou brincadeiras na educação básica envolve todas as formas de atividades lúdicas, desde os jogos de tabuleiros, brincadeiras espontâneas, atividades físicas e jogos eletrônicos (SILVA, 2019).

2.4 Condução da problematização do lúdico

A aprendizagem por meio de atividades lúdicas é natural na criança. Afinal, brincar para aprender e simular a realidade por meio de brincadeiras e jogos faz parte não somente das crianças humanas, mas de diversas espécies de animais. Filhotes de animais brincam, simulam combates, disputam de forma lúdica os relacionamentos com outros filhotes e com adultos como forma de interpretar o meio e adaptar-se a ele (HANSEN, 2007). Devido a isso, as crianças humanas brincam naturalmente como forma de simular a realidade tendo como objetivo interpretá-la. Aquilo que em educação é denominado de metodologias ativas de aprendizado, ocorre de forma natural com as crianças há milênios. Compreender esse processo e apropriar-se dele com o objetivo de obter resultados mais efetivos no processo educativo, no entanto, é algo recente, que vem sendo objeto de estudo da psicopedagogia e de outros ramos das ciências, como a neuropsicologia (FAHEL, 2017).

Além de ser relevante para a educação de forma geral, o uso de atividades lúdicas permite identificar e conduzir processos educativos com crianças portadoras de síndromes que limitam suas funções cognitivas. É nesse campo que se torna ainda mais relevante a contribuição da psicopedagogia e da neuropsicologia. O uso de atividades lúdicas é um importante instrumento de diagnóstico, tratamento e socialização de crianças com limitações (PONCIANO, 2019). As crianças brincam, com ou sem a participação dos adultos. Apropriar-se das brincadeiras por meio de instrumentação proporcionada pela pedagogia e pela compreensão do universo da criança consiste em excelente oportunidade para agregar efetividade ao processo educativo. Formação de rotinas, afetividade, utilização de metodologias ativas são algumas formas de induzir ou apropriar-se das brincadeiras infantis com finalidade educativa. Além de conduzir de forma intencional as brincadeiras, o professor pode inserir-se no mundo lúdico espontâneo das crianças (OLIVEIRA, 2019).

O universo lúdico da criança é bem mais amplo que as brincadeiras. As crianças reúnem em um mesmo plano a realidade e a fantasia, por isso, as brincadeiras são, do ponto de vista infantil, coisas sérias. Por isso, é comum ver crianças chorando ou em pânico quando algo ocorre de forma inesperada durante uma brincadeira. Elas não conseguem distinguir a brincadeira da realidade, exatamente porque é brincando que testam e vivenciam a realidade. As brincadeiras são, para a criança, um procedimento heurístico, uma vez que é brincando que investigam e compreendem a realidade (PINHEIRO, 2019).

Ao contar histórias, por exemplo, o professor conduz a criança por uma viagem ao imaginário. As histórias são reais para as crianças. Por mais fantasiosas que pareçam ao professor. Assim, o domínio de técnicas para a contação de histórias torna-se um excelente instrumento de ensino, uma vez que estimula a fantasia e imaginação das crianças (RIGUET, 2019). Por meio das histórias, é possível problematizar a realidade e introduzir conceitos importantes, que as crianças não poderiam compreender sem os recursos lúdicos. Quando conduz adequadamente a contação de histórias, o professor pode aplicar, de forma espontânea, os princípios do Arco de Maguerez no ensino de habilidades e competências que pretende desenvolver na criança (MAZERINO, 2019; BERBEL, 2012). 

Assim que a criança finaliza a alfabetização e letramento, já pode inserirse no universo da leitura. Estimulada pela contação de histórias, a criança estará ansiosa por dominar a leitura, para escolher e acessar em livros suas próprias histórias. Mesmo dominando a leitura, a criança ainda recorre à fantasia para a compreensão da realidade (MESQUITA, 2019). Assim, os heróis e vilões que encontra nos livros, filmes e histórias de quadrinhos parecem bem reais para as crianças. Os quadrinhos acrescentam nova dimensão às histórias, devido à presença de ilustrações. O professor pode problematizar o ensino a partir dos quadrinhos, com elevado índice de sucesso (PEREIRA, 2019).

As artes são, ao mesmo tempo, objeto e instrumento de ensino, por representarem a realidade a partir do imaginário. Inicialmente, recursos da arte, como massas de modelar, lápis coloridos, produção e narrativa de histórias, musicalidade, artes cênicas e outras parecem ser apenas recursos didáticos para o ensino de habilidades e competências. No entanto, a arte é em si mesma um objeto de ensino. As crianças, em seus momentos lúdicos, cantam, interpretam as histórias que ouvem, imitam os adultos, improvisam instrumentos musicais, desenham e brincam por horas. Conduzir esse processo de forma intencional amplia as possibilidades educativas (SILVA, 2019; NOGUEIRA, 2019).

Entre as artes, a música é uma que mais despertam o interesse das crianças. Cantar, ouvir canções, tocar instrumentos musicais simples como tambores, chocalhos e apitos, são atividades que atraem o interesse de praticamente todas as crianças. A música e a musicalidade estão presentes em todas as culturas humanas, com fortes vínculos com religião e espiritualidade. Assim, o uso da música na educação impacta sobre uma característica básica da mente humana, o que pode ser usado como recurso educativo. As histórias podem ser contadas e cantadas. A encenação das histórias deve sempre ser acompanhada por música. As crianças devem ter acesso a instrumentos musicais simples, capazes de produzir ritmo ou melodias. A música pode ser usada para problematizar conteúdos mais complexos que se deseja ensinar (ALBUQUERQUE, 2019).

Além de proporcionar a imersão lúdica, as artes são representações culturais, folclóricas e sociais. Enquanto brincam, cantam, pintam e ouvem histórias, as crianças devem ser levadas a compreender e respeitar a diversidade cultural da sociedade onde vivem. Além disso, elementos culturais podem ser usados para fortalecer o uso da arte como instrumento de ensino. Festas típicas, tradições familiares, folclore e outras manifestações culturais podem ser usadas como formas de integração das manifestações lúdicas à educação. As próprias brincadeiras possuem fortes traços culturais e folclóricos que devem ser explorados (SANTOS, 2019).

O movimento cultural, por exemplo, é uma forma de expressão artística que pode ser explorada na gesticulação no ato de contar histórias, na encenação de histórias, nas danças, nas peças teatrais, em brincadeiras de roda, em jogos diversos, como corridas, alongamentos, pular cordas, lutas marciais e outras formas de atividades físicas. Os alunos podem ser estimulados a exercer a criatividade nesses movimentos, encenando e problematizando a realidade. A observação das manifestações artísticas permite conhecer muita coisa do mundo subjetivo ou mesmo das relações familiares do aluno (OLIVEIRA, 2019; SANCHES, 2019).

Além disso, ao brincar e desenvolver atividades artísticas, a criança desenvolve suas habilidades motoras. O fortalecimento dos músculos da mão e da face, por exemplo, facilita o desenvolvimento da coordenação motora, o que facilita a aprendizagem da leitura e da escrita. Atividades que permitem o manuseio de objetos, como esculturas com massa de modelar, pintura com lápis colorido, cânticos e gritos durante jogos ajudam a fortalecer estruturas necessárias a outras habilidades que serão desenvolvidas na escola. Alongamentos, corridas, atividades aeróbicas, brinquedos que exigem escaladas ou superação de obstáculos contribuem para o desenvolvimento físico e motor (DELFINO, 2019).

As brincadeiras são o suporte para a problematização da realidade no ensino de crianças. Por isso, conceitos teóricos, como o ensino de matemática, química física e outras ciências são facilmente assimilados pelas crianças quando introduzidos de forma lúdica. Há uma grande quantidade de jogos desenvolvidos especificamente para a aprendizagem de matemática, normalmente jogos de tabuleiro ou de cartas. Mas os conceitos de matemática podem ser introduzidos por meio de brincadeiras de rodas, educação física, contação de histórias, artes e muitas outras formas (LUIZ, 2019).

Aprender brincando é uma forma de aproveitar a motivação natural da criança. Toda criança brinca, em essência, para aprender. Quando conceitos abstratos são apresentados de forma lúdica, a criança demonstra interesse e se esforça para dominá-los. Alguns professores fazem essa ligação entre o lúdico e o ensino de forma natural e intuitiva. No entanto, todo professor devidamente capacitado pode desenvolver habilidades para ensinar com o apoio de atividades lúdicas. O ensino a partir de brincadeiras reduz a austeridade das informações abstratas, o que contribui para a facilitação do ensino (SANTOS, 2019).

A alfabetização e o letramento são atividades consideradas altamente complexas na educação de crianças. Tanto que é nessa fase que as crianças apresentam a maior dificuldade de aprendizagem, o que pode gerar transtornos para o futuro escolar, além de traumas difíceis de serem superados. No entanto, por meio de atividades lúdicas, que envolvem brincadeiras e jogos, o movimento do abstrato para o concreto pode ocorrer de forma suave, o que facilita até mesmo o processo de alfabetização. Alfabetizar a partir do lúdico pode acelerar e facilitar a alfabetização, fazendo dessa atividade algo prazeroso para a criança e para o professor (COSTA, 2019).

Brincar é um ato tão importante para a criança que diversos autores se dedicam à produção de estudos sobre a associação entre brincadeiras e educação. Martim (2019) apresenta a importância dos jogos e brincadeiras para a educação infantil, apresentando uma série de práticas desenvolvidas nesse sentido. Antunes (2019) destaca que brincar é importante para a educação infantil, pois possibilita o encontro entre o mundo subjetivo da criança e os propósitos objetivos da escola. Silva (2019) afirma que as brincadeiras contribuem para a educação infantil por uma série de fatores, principalmente por facilitar a integração entre o aluno e o ambiente escolar. Novais (2019) aponta o ato de brincar e as brincadeiras intencionalmente elaboradas e conduzidas como importante técnica de ensino na educação infantil.

Os jogos e as brincadeiras estão integrados à rotina escolar, principalmente na educação infantil, pré-escolar. No entanto, em algumas situações, os professores relutam em manter as atividades lúdicas como instrumento de ensino, dedicando-se a leituras áridas e rotinas de pouco interesse para as crianças, principalmente no ensino de ciências como a matemática, química, física e línguas (FERREIRA, 2019). Torna-se, portanto, necessário resgatar as atividades lúdicas como instrumento fundamental para a prática docente, como recurso didático capaz de facilitar a problematização dos conteúdos mais austeros a partir do interesse das crianças (PRADO, 2019). Afinal, as práticas lúdicas rompem com a austeridade do ambiente escolar, humanizam o professor, aproximam o professor do aluno e fazem com que a educação faça sentido para as crianças, tornando-se algo agradável (CAMPOS, 2019). 

Para que todos esses fatores se tornem realidade na prática docente, é necessário que a escola se estruture a partir de uma proposta de pedagogia lúdica. Isso envolve a formação profissional do professor e a educação permanente, capaz de levar o professor a repensar sua prática pedagógica. A escola precisa ambientar-se para o lúdico e envolver toda sua equipe nesse propósito, o que requer o desenvolvimento de um projeto político pedagógico focado nas atividades lúdicas. Feito isso, será possível problematizar a realidade dos alunos a partir de atividades lúdicas (MELLO, 2019).

3. PERCURSO METODOLÓGICO 

Visando identificar a percepção dos professores de educação infantil a respeito do uso de atividades lúdicas na educação, foi aplicado questionário aos professores, usando o aplicativo Google Forms, devido ao isolamento social em função da pandemia de COVID-19. Os professores receberam o link do formulário hospedado em rede, se identificaram e responderam aos questionamentos. As respostas apresentadas são analisadas a seguir. As perguntas foram intencionalmente mescladas de forma que muitas respostas parecem fazer sentido, exigindo dos participantes reflexão sobre a prática pedagógica no ato das respostas.Foi garantido o anonimato dos participantes, uma vez que toda a análise ocorre a partir de gráficos gerados pelo Google Forms. Os participantes foram esclarecidos a respeito do objetivo da pesquisa e apresentaram consentimento ao preencher o formulário de pesquisa e postar sua participação. Os dados foram mantidos para revisão posterior.

Gráfico 1 – Percepção sobre a finalidade do uso de brincadeiras ou jogos no ensino fundamental

A maior parte dos participantes, 76%, respondeu que se trata de uma atividade completamente integrada ao processo de ensino, resposta que está em concordância com os autores pesquisados na fundamentação teórica. Isso aponta que atividades lúdicas não meros entretenimentos, pausas para brincadeiras ou estratégias para aliviar a tensão durante o ensino. Apesar disso, uma parcela considerável, 16% dos professores, afirmou perceber nas atividades lúdicas todas essas contribuições, sem focar na função pedagógica. Somente 4% optaram pelas demais respostas (SILVA, 2019; SANTOS, 2018).Tal posicionamento aponta que há uma percepção importante dos professores a respeito das atividades lúdicas como parte do processo de ensino, mas ainda há professores que percebem no lúdico somente uma forma de distrair os alunos para aliviar a tensão das demais atividades(WOSZAK, 2019).

Gráfico 2 – Usode brincadeiras ou jogos com os alunos como parte do processo de ensino

 

Percebe-se que 76% dos professores utilizam as atividades lúdicas como estratégia de ensino, integradas ao método de trabalho. Para esses professores, o lúdico é parte essencial da aula, pois entendem que as brincadeiras consistem na forma natural de aprendizagem das crianças (SANTOS, 2019). Percebe-se também que 12% dos professores consideram as atividades lúdicas como forma de distração a ser usada quando os alunos se cansam das aulas, o que aponta a dissociação entre atividades lúdicas e estratégias de ensino. Outro percentual idêntico, de 12%, afirma compreender a importância das atividades lúdicas, mas admite não as usar. Esses professores demonstram, em sua resposta, que entendem e desejam aplicar atividades lúdicas, mas não o fazem por razões já percebidas na pesquisa, como falta de treinamento, falta de planejamento, falta de oportunidade dentre outras causas.

Gráfico 3 – Conhecimento e utilização das metodologias ativas no processo de ensino e aprendizagem por parte dos professores
 

Observa-se que 88% dos professores afirmam conhecer e utilizar as metodologias ativas em sala de aula. Um percentual menor, de 8% afirma não entender bem as metodologias ativas e por isso não as utilizar, enquanto 4% afirmam conhecer, mas não ter oportunidade de usar na escola onde trabalha. Percebeu-se na análise bibliográfica que o uso de metodologias ativas facilita o processo de problematização do conteúdo a ser ensinado e das motivações dos alunos, uma vez que as brincadeiras são inerentes ao universo da criança, permitindo a conexão entre componentes curriculares de elevada abstração e universo de interesse natural das crianças (SILVA, 2019; PINHEIRO, 2019).

Gráfico 4 – Percepção sobre o uso de atividades lúdicas como estratégia de metodologias ativas.

 

Percebe-se que 72% dos professores integram as atividades lúdicas e as metodologias ativas, problematizando os conteúdos curriculares por meio de brincadeiras e jogos. No entanto, 20% dos professores nunca perceberam a possibilidade de problematizar a partir do lúdico, apesar de apresentarem interesse em desenvolver essa prática. 4% dos professores consideram o uso de atividades lúdicas uma habilidade que se aplica somente ao estilo pessoal de alguns professores e outros não cogitam usar problematização a partir do lúdico na educação infantil, considerando tal prática aplicável somente no ensino superior (PONCIANO, 2019).

Percebe-se nessa questão alguns problemas discutidos na pesquisa. O primeiro é a associação das atividades lúdicas a estilos pessoais de ensino. Essa percepção aponta que muitos professores não se consideram aptos a brincar e jogar com as crianças, pois não se sentem capazes de dominar tais atividades, mesmo atuando em turmas de educação infantil. Isso aponta a necessidade de capacitar os professores em relação ao tema, uma vez que dissociar o ensino do universo lúdico da criança limita consideravelmente as possibilidades educativas (PRADO, 2019).

Gráfico 5 – Conhecimento e utilizaçãodo Arco de Maguerez em sala de aula

Percebe-se que 80% dos professores não conhecem o Arco de Maguerez, uma estratégia de problematização amplamente utilizada no ensino médio e superior, que pode ser empregada como metodologia ativa para problematizar com o uso de atividades lúdicas no ensino fundamental (BERBEL, 2012). Um pequeno percentual, de 12% dos professores, afirma conhecer e utilizar sempre que possível a estratégia, e 4% afirmam respectivamente que conhecem, mas não usam ou não percebem a associação da estratégia com as atividades lúdicas.Um percentual considerável de professores afirma que conhece a problematização, conhece o Arco de Maguerez mas não percebe relação disso com as brincadeiras infantis. Isso mostra o hiato entre teoria e prática, apontando que os professores podem estar gastando tempo e energia para tentar problematizar conteúdos que desejam desenvolver sem considerar a motivação natural das crianças para a brincadeira como ponto de contato. Dessa forma, quando empregam as brincadeiras, jogos, musicalidade, artes nas aulas não o fazem sob uma perspectiva pedagógica (ALBUQUERQUE, 2019; ANDRADE, 2018). 

Gráfico 6 – Momento do ensino fundamental em que as atividades lúdicas são mais apropriadas.

Percebe-se que a maioria dos professores, 76%, considera as atividades lúdicas importantes em todas as fases do ensino fundamental. Um percentual importante de 12% afirma que as atividades lúdicas são adequadas conforme o tipo de aula, 8% associam essas atividades à faixa etária dos alunos e 4% afirmam que são importantes somente nos primeiros quatro anos do ensino fundamental. O condicionamento das atividades lúdicas ao tipo de aula ou à faixa etária aponta para uma percepção segmentada do sentido de atividade lúdica, com tendência para interpretar essas atividades do ponto de vista de brincadeiras não educativas. Autores como ANTUNES (2019) e CAMPOS (2019) consideram as atividades lúdicas como parte do processo educativo e não como atividades de lazer.

Gráfico 7 – Disciplinas ou atividades nas quais o uso de metodologias ativas é mais comum.
 

A problematização por meio de metodologias ativas é usada de forma geral por 56% dos professores. Uma parcela importante, que corresponde a quase um terço dos professores, usa as metodologias ativas para “animar” as aulas, não como instrumento para aprofundar e consolidar o ensino. 12% não conseguem usar as metodologias ativas e 4% usam em disciplinas que consideram mais complexas. Percebe-se que quase a metade dos professores não entendem ou não conseguem usar as metodologias ativas como parte do processo educativo, nem mesmo percebem a relação entre metodologias ativas e atividades lúdicas na educação infantil, ao contrário do que BALDINO (2011) e COLOMBO e BERBEL (2007) apontam como pontos básicos para a educação.

Gráfico 8 – Efeitos percebidos ao utilizar as metodologias ativas nas aulas

Percebe-se que muitos professores estão preocupados com o V. de conteúdo a serem apresentados em suas aulas, sem se importarem de fato com o envolvimento dos alunos e a qualidade da aprendizagem. 56% usam as metodologias ativas para tornar as aulas mais interessantes e dinâmicas, 20% percebem que problematizar promove a integração entre o ensino e a vida prática, 16% focam na diversão e brincadeira sem perceber sua propriedade pedagógica e 8% consideram as atividades lúdicas ou metodologias ativas como atraso para o calendário escolar. Isso contrasta com a percepção de CORRÊA (20199) e COSTA (2019) que apresentam as atividades lúdicas como importantes para todas as atividades escolares, inclusive para a alfabetização.

Gráfico 9 – Percepção sobre o uso atividades lúdicas como estratégia de avaliação da aprendizagem

Aparentemente em contradição com a resistência dos professores a atividades lúdicas demonstrada nas questões anteriores, 88% dos professores percebem as atividades lúdicas como importantes no processo de avaliação da aprendizagem (FAJARDO, 2017; FERREIRA, 2019). Um pequeno percentual de 8% apresenta preocupação com a cola dos alunos durante as atividades lúdicas e 4% acreditam que alguns alunos irão se acomodar, contando com os colegas para resolverem suas atividades. Essa pergunta questiona a percepção dos professores a respeito da avaliação como parte do processo de ensino, não como atividade isolada do processo. 

Gráfico 10 – Forma de manutenção da diversidade das atividades lúdicas

O questionário apresentado aos professores aponta em várias respostas obtidas que falta treinamento e intencionalidade para o uso de atividades lúdicas como parte do processo educativo, principalmente para integrar o lúdico às metodologias ativas. Quando essas atividades são usadas, acabam sendo fruto da iniciativa e criatividade dos professores, não de um processo intencional. É o que se percebe nessa última questão. 48% dos professores apontam que buscam inspiração para o uso de metodologias ativas na internet, ou seja, procuram atividades prontas para adaptar a suas aulas, em vez de desenvolver atividades específicas para a necessidade de seus alunos, como respondem 40% dos professores (SILVA, 2019).

Observa-se que 12% dos professores improvisam conforme a situação percebida em sala de aula. O improviso é importante, desde que em linhas gerais seja previsto no planejamento da aula, o que não parece ser o caso. Além disso, destaque-se que nenhum professor percebeu a importância de incluir os alunos na proposição e elaboração de problemas sobre a própria realidade, como ocorre no uso do arco de Maguerez. Assim, perde-se a função natural das brincadeiras e jogos já existente nos alunos, colocando o professor como centro produtivo do processo educativo, privando o aluno de sua expressão lúdica espontânea (GATELLI, 2017; MELLO, 2019; NOVAIS, 2019; WOSZAK, 2019).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa foi realizada conforme os objetivos propostos e foram encontradas respostas para os principais questionamentos levantados na fase de problematização do tema em estudo. Algumas constatações importantes foram alcançadas com a aplicação do questionário aos professores. Uma delas é a necessidade de fortalecer a formação do professor de educação infantil, para que perceba a necessidade de atender às características inerentes às crianças, sendo assim capazes de atuar de forma ativa e assertiva para esses alunos. Apesar da percepção geral de que o professor não é um mero transmissor de conhecimentos, na prática muitos professores centralizam o processo em si mesmos e ignoram o papel da criança e da coletividade na construção de seu próprio conhecimento.

Percebe-se ainda a necessidade de promover capacitação de professores para o planejamento e execução das aulas. Muitos professores são naturalmente criativos, o que facilita a integração de atividades lúdicas ao ensino e a utilização de metodologias ativas tendo como ponto de partida atividades lúdicas. No entanto, boa parte dois professores não possuem tais habilidades naturais, e precisam ser capacitados e instrumentalizados por meio de oficinas, seminários, planejamento coletivo, ações transversais propostas no projeto político pedagógico da escola, troca de informações com os colegas em ações coletivas de planejamento.

Além da formação e qualificação, percebe-se a necessidade de reciclagem constante dos conhecimentos, uma vez que a rotina escolar tende a reduzir o professor a um cumpridor de metas, tirando da escola sua função formadora. Os professores precisam ser constantemente provocados, para que não se rendam ao pragmatismo dos calendários escolares. Precisam questionar e refletir sobre sua prática, inovado sempre na forma de relacionamento com os alunos. Precisam verificar se suas atividades rotineiras estão em conformidade com suas convicções teóricas. Percebe-se que quando provocados, os professores demonstram conhecer o que deveriam fazer, mas na prática se afastam dessas convicções.

A rotina escolar acaba levando muitos professores a perceber os alunos como objeto de trabalho, como uma massa a ser formatada por meio da escola. Perde-se a pessoalidade dos relacionamentos. Em muitos casos, as crianças são um fardo a ser suportado, não pessoas a serem amadas e educadas. Perde-se o envolvimento afetivo com as crianças e com o processo de ensino. Para trabalhar com crianças é necessário gostar de crianças. A afetividade é necessária para que o professor compreenda o universo das crianças e consiga imergir nesse universo, transformando o modo de pensar da criança em ponto de apoio para a aplicação das metodologias ativas.

No mundo pós-moderno, as pessoas buscam respostas prontas, fórmulas replicáveis capazes de levar a resultados efetivos, facilidades. Na educação infantil é necessário fugir dessas fórmulas, pois cada criança exige do professor um olhar específico. Evidentemente, há princípios capazes de nortear os eixos de ações principais, mas o desenvolvimento de aulas capazes de integrar o lúdico às metodologias ativas exige criatividade e iniciativa. Um dos fatores que resultam na baixa qualidade do uso de metodologias ativas é a necessidade de programar rapidamente as aulas sem ter tempo para desenvolver atividades realmente associadas à realidade dos alunos.

A pesquisa não tem a pretensão de esgotar o tema, pelo que algumas questões como a relação entre a afetividade e as atividades lúdicas foi tratada de forma introdutória. Da mesma forma, não foi aprofundada a relação entre metodologia ativas e atividades lúdicas. Não foram apresentados modelos práticos de atuação. Dessa forma, espera-se que a pesquisa contribua para novos trabalhos, capazes de aprofundar conteúdos tratados de forma periférica ou tangencial no presente trabalho.

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¹ Mestre em Ciências da Educação pelo Instituto de Graduação e Pós-Graduação de Goiás - IPOS.