EFICIÊNCIA ENERGÉTICA COMO ESTRATÉGIA DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.18072541
Joelson Lopes da Paixão1
RESUMO
A intensificação das mudanças climáticas, associada ao aumento contínuo da demanda energética e à pressão sobre recursos naturais finitos, tem imposto desafios significativos aos modelos tradicionais de desenvolvimento econômico. Nesse contexto, a eficiência energética emerge como uma estratégia central para a promoção do desenvolvimento sustentável, ao articular crescimento econômico, redução de impactos ambientais e justiça social. O presente estudo tem como objetivo geral analisar a eficiência energética como instrumento estratégico de desenvolvimento sustentável, considerando suas dimensões técnica, econômica e socioambiental. Metodologicamente, adota-se uma abordagem qualitativa, de natureza exploratória e descritiva, fundamentada em revisão bibliográfica sistematizada de produções científicas nacionais e internacionais publicadas nos últimos dez anos, bem como em documentos técnicos de organismos multilaterais. Os resultados indicam que políticas públicas orientadas à eficiência energética contribuem de forma consistente para a redução das emissões de gases de efeito estufa, para o aumento da competitividade econômica e para a mitigação das desigualdades no acesso à energia. Evidencia-se, ainda, que a eficiência energética não se limita a soluções tecnológicas isoladas, mas demanda integração entre planejamento governamental, inovação industrial, comportamento do consumidor e regulação institucional. Conclui-se que a eficiência energética constitui um eixo estruturante para a transição a modelos sustentáveis de desenvolvimento, exigindo investimentos contínuos, governança integrada e alinhamento entre políticas energéticas e ambientais, de modo a assegurar benefícios duradouros às gerações presentes e futuras.
Palavras-chave: eficiência energética, desenvolvimento sustentável, políticas públicas, transição energética, sustentabilidade ambiental.
ABSTRACT
The intensification of climate change, combined with the continuous increase in energy demand and pressure on finite natural resources, has imposed significant challenges on traditional models of economic development. In this context, energy efficiency emerges as a central strategy for promoting sustainable development by articulating economic growth, reduction of environmental impacts, and social justice. This study has the general objective of analyzing energy efficiency as a strategic instrument for sustainable development, considering its technical, economic, and socio-environmental dimensions. Methodologically, a qualitative approach of an exploratory and descriptive nature is adopted, based on a systematic literature review of national and international scientific publications from the last ten years, as well as on technical documents from multilateral organizations. The results indicate that public policies oriented toward energy efficiency consistently contribute to the reduction of greenhouse gas emissions, to increased economic competitiveness, and to the mitigation of inequalities in access to energy. It is further evident that energy efficiency is not limited to isolated technological solutions but requires integration among government planning, industrial innovation, consumer behavior, and institutional regulation. It is concluded that energy efficiency constitutes a structural axis for the transition to sustainable development models, demanding continuous investments, integrated governance, and alignment between energy and environmental policies, to ensure lasting benefits for present and future generations.
Keywords: energy efficiency, sustainable development, public policies, energy transition, environmental sustainability.
1. INTRODUÇÃO
O debate contemporâneo sobre desenvolvimento sustentável tem sido progressivamente tensionado pela necessidade de compatibilizar crescimento econômico, preservação ambiental e bem-estar social, em um cenário marcado por crises climáticas recorrentes, instabilidade geopolítica e aumento expressivo da demanda global por energia. Desde a consolidação do conceito de desenvolvimento sustentável no Relatório Brundtland, observa-se a intensificação de esforços teóricos e práticos voltados à redefinição dos padrões de produção e consumo, sobretudo no setor energético, historicamente associado a elevados níveis de degradação ambiental e emissões de gases de efeito estufa. Nesse contexto, a eficiência energética passa a ocupar posição estratégica, não apenas como alternativa técnica para racionalização do uso de energia, mas como elemento estruturante de políticas públicas orientadas à sustentabilidade, conforme indicam estudos recentes da Agência Internacional de Energia (IEA, 2023) e da Organização das Nações Unidas (ONU, 2022).
A problemática central que orienta este estudo reside na persistente dissociação entre crescimento econômico e uso racional de recursos energéticos, especialmente em países em desenvolvimento, nos quais a expansão da infraestrutura energética frequentemente ocorre sem a incorporação sistemática de critérios de eficiência. Tal cenário suscita a seguinte pergunta norteadora: de que maneira a eficiência energética pode ser compreendida e operacionalizada como estratégia efetiva de desenvolvimento sustentável, capaz de conciliar desempenho econômico, redução de impactos ambientais e inclusão social. Essa indagação torna-se ainda mais relevante diante das metas globais estabelecidas no Acordo de Paris e nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, particularmente o ODS 7, que prevê o acesso universal à energia limpa, confiável e a preços acessíveis, associado à melhoria substancial da eficiência energética até 2030 (ONU, 2015).
Diante desse cenário, o objetivo geral deste artigo consiste em analisar a eficiência energética como estratégia de desenvolvimento sustentável, considerando seus fundamentos conceituais, seus impactos socioeconômicos e suas implicações ambientais. Como objetivos específicos, busca-se compreender a evolução do conceito de eficiência energética no âmbito das políticas de sustentabilidade; examinar a relação entre eficiência energética e mitigação das mudanças climáticas; analisar o papel das políticas públicas e dos instrumentos regulatórios na promoção da eficiência energética; e discutir os desafios e as perspectivas para a implementação de estratégias eficientes em contextos nacionais e internacionais.
Parte-se da hipótese de que a eficiência energética, quando integrada de forma sistêmica às políticas de desenvolvimento, contribui significativamente para a redução das emissões de carbono, para a otimização dos custos de produção e para o fortalecimento da segurança energética. Adicionalmente, pressupõe-se que a adoção isolada de tecnologias eficientes, sem articulação com políticas institucionais e mudanças comportamentais, tende a produzir resultados limitados, reforçando a necessidade de abordagens intersetoriais e de longo prazo, conforme apontam autores como Goldemberg e Lucon (2018) e Sovacool (2021).
A justificativa deste estudo é a crescente relevância da eficiência energética no cenário internacional e na lacuna ainda existente entre o reconhecimento teórico de sua importância e sua efetiva implementação em larga escala, especialmente em economias emergentes. Embora avanços tecnológicos tenham ampliado significativamente o potencial de eficiência em setores como indústria, transporte e edificações, persistem barreiras institucionais, econômicas e culturais que dificultam sua difusão, conforme evidenciado por relatórios do Banco Mundial (2021). Assim, a análise crítica desse tema mostra-se necessária para subsidiar decisões políticas e estratégias empresariais alinhadas aos princípios da sustentabilidade.
A relevância científica e social da presente pesquisa reside na contribuição para o aprofundamento do debate sobre a transição energética, ao enfatizar a eficiência não como medida complementar, mas como eixo central de um novo paradigma de desenvolvimento. Ao reduzir a intensidade energética das economias, torna-se possível dissociar crescimento econômico de degradação ambiental, promovendo maior resiliência frente às crises energéticas e climáticas. Ademais, a eficiência energética apresenta impactos diretos na redução da pobreza energética, ao diminuir custos para consumidores e ampliar o acesso a serviços essenciais, aspecto especialmente relevante em contextos de vulnerabilidade social.
Nesse sentido, a eficiência energética deve ser compreendida como uma estratégia transversal, que articula inovação tecnológica, governança pública, responsabilidade corporativa e engajamento social. Ao assumir essa perspectiva integrada, o desenvolvimento sustentável deixa de ser um discurso normativo e passa a constituir uma prática concreta, mensurável e alinhada às demandas do século XXI. Assim, o presente estudo busca contribuir para a consolidação de uma abordagem crítica e fundamentada sobre a eficiência energética, reafirmando seu papel estratégico na construção de sociedades mais justas, resilientes e ambientalmente responsáveis.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1. Fundamentos Conceituais da Eficiência Energética e Desenvolvimento Sustentável
A eficiência energética, entendida como “a relação entre a quantidade de energia empregada em uma atividade e aquela disponibilizada para sua realização” (EFICIÊNCIA ENERGÉTICA, 2025, p. 1), emerge da necessidade de racionalizar o uso de recursos energéticos finitos sem comprometer resultados econômicos ou serviços essenciais; nesse sentido, a eficiência energética não se reduz ao uso de tecnologias isoladas, mas constitui um conceito sistêmico que perpassa processos produtivos, infraestrutura urbana e padrões de consumo, de modo que “a utilização racional de energia, às vezes chamada simplesmente de eficiência energética, consiste em usar de modo eficiente a energia para se obter um determinado resultado” (EFICIÊNCIA ENERGÉTICA, 2025, p. 1), o que implica integração entre regimes técnicos, regulatórios e comportamentais. Essa concepção é coerente com as formulações contemporâneas de sustentabilidade, segundo as quais o desenvolvimento sustentável demanda a dissociação entre crescimento econômico e intensidade de uso de energia, em consonância com a visão de que eficiência energética é um “primeiro combustível” na transição para sistemas energéticos limpos e resilientes (IEA, 2025, p. 10). Ao se considerar as dimensões ecológicas, sociais e econômicas, torna-se evidente que a eficiência energética atua tanto na redução de perdas e desperdícios quanto na promoção de qualidade de vida e competitividade econômica, conforme demonstram as análises multidimensionais sobre energia e sustentabilidade que ressaltam a importância de políticas públicas integradas e instrumentos regulatórios para avançar nesse campo.
A literatura especializada alerta que, apesar de amplamente reconhecida, a adoção efetiva da eficiência energética enfrenta barreiras institucionais, técnicas e de financiamento, sobretudo em países em desenvolvimento; especificamente, pesquisadores destacam que “a eficiência energética no setor público brasileiro insere-se em um contexto marcado pela racionalização de recursos orçamentários, redução do impacto ambiental e modernização de práticas administrativas” (OLIVEIRA, 2025, p. 12), reforçando a ideia de que qualquer estratégia de sustentabilidade energética deve contemplar a governança e a capacitação institucional para superar entraves sistêmicos.
De forma indireta, a literatura indica que a eficiência energética pode ser compreendida como um vetor de inovação incremental e disruptiva, no qual técnicas como sistemas de gestão de energia, automação inteligente e integração com energias renováveis potencializam a redução do consumo específico de energia por unidade de produto ou serviço, em consonância com os parâmetros definidores da ISO 50001 para sistemas de gestão energética (ISO, 2018). Essa perspectiva é fundamental para reconciliar eficiência energética com o desenvolvimento sustentável, na medida em que fortalece a argumentação de que políticas orientadas à eficiência contribuem simultaneamente para a redução de emissões de gases de efeito estufa, redução de custos operacionais e promoção de justiça energética em contextos nacionais e supranacionais.
De maneira complementar, autores clássicos como Jevons (1865) já argumentavam que a eficiência no uso de recursos pode paradoxalmente levar a maior consumo agregado, fenômeno posteriormente denominado “paradoxo de Jevons”, o qual continua sendo referenciado em estudos contemporâneos para ilustrar que ganhos de eficiência isolados não garantem automaticamente redução total do consumo energético, exigindo políticas compensatórias que considerem efeitos de rebote (JEVONS, 1865, p. 113). Por extensão, Georgescu-Roegen (1971), em sua análise bioeconômica, enfatiza que qualquer modelo de desenvolvimento sustentável deve reconhecer as restrições termodinâmicas e materiais impostas pelos sistemas naturais, o que implica pensar eficiência energética como parte de uma estratégia que abranja inovação tecnológica, mudanças nos padrões de consumo e reconfigurações institucionais. Nesse sentido, a eficiência energética torna-se uma categoria não apenas técnica, mas profundamente política e econômica, exigindo articulação entre governos, setor privado e sociedade civil para ser incorporada de forma efetiva em agendas de longo prazo.
2.2. Políticas Públicas, Instrumentos Regulatórios e Perspectivas Internacionais Sobre Eficiência Energética
No plano das políticas públicas, a eficiência energética é reconhecida internacionalmente como um elemento central das estratégias de desenvolvimento sustentável e transição energética; em relatórios recentes da International Energy Agency (IEA), a eficiência é descrita como o “primeiro combustível”, porque “oferece algumas das opções de mitigação de CO2 mais rápidas e custo-efetivas disponíveis” (IEA, 2025, p. 22), o que reforça a visão de que sua implementação deve ser priorizada em políticas nacionais e internacionais. De modo indireto, tais relatórios demonstram que o progresso global em eficiência energética ainda está aquém das metas estabelecidas nos acordos climáticos internacionais, com melhorias anuais médias que não acompanham os objetivos de duplicação da eficiência até 2030, o que exige reforço de instrumentos regulatórios, financiamento público e privado e mecanismos de mercado que incentivem práticas econômicas mais eficientes.
No contexto brasileiro, o estabelecimento de marcos regulatórios como a Lei nº 10.295/2001, que institui a Política Nacional de Conservação e Uso Racional de Energia (PNCURE), ilustra a tentativa de institucionalizar a eficiência energética como vetor de sustentabilidade, determinando a promoção de programas de conservação de energia em diversos setores produtivos e de consumo (BRASIL, 2001, art. 2º). A lei, que estabelece princípios de utilização eficiente de energia elétrica e outros recursos energéticos, significa um avanço normativo importante, pois coloca a eficiência no centro do planejamento energético nacional, ainda que sua implementação efetiva dependa de instrumentos complementares, como regulamentos técnicos, incentivos fiscais e sistemas de monitoramento. De forma correlata, a Lei nº 9.478/1997, que regula as atividades petrolíferas no Brasil, ao estruturar o setor energético brasileiro, fornece um arcabouço legal a partir do qual políticas de eficiência podem ser articuladas com metas de redução de desperdícios e diversificação da matriz energética (BRASIL, 1997, art. 3º).
Além dessas legislações nacionais, iniciativas multilaterais e acordos internacionais têm desempenhado papel significativo na promoção da eficiência energética, como exemplifica o Pacto de Autarcas na União Europeia, que compromete autoridades locais e regionais a desenvolver Planos de Ação para as Energias Sustentáveis integrados à redução de emissões de CO2, incentivando estratégias territoriais de eficiência energética e energias renováveis (PACTO DE AUTARCAS, 2024, p. 3). Essa abordagem multinível indica que políticas públicas eficazes demandam coordenação entre diferentes níveis de governo e atores sociais, o que ecoa a literatura contemporânea que defende a integração de políticas climáticas, energéticas e de desenvolvimento urbano como condição para resultados sustentáveis.
Estudos empíricos demonstram que instrumentos como etiquetagem de eficiência energética, padrões mínimos de desempenho, incentivos financeiros para tecnologias eficientes e programas de educação energética são componentes cruciais das estratégias nacionais; especificamente, a literatura aponta que “a implantação de políticas públicas de apoio à eficiência energética contribui para a redução da intensidade energética da economia, aproxima a competitividade industrial de um modelo ambientalmente sustentável e diminui impactos ambientais diretos, como emissões de gases de efeito estufa” (ALVES, 2007, p. 45). De forma indireta, tal evidência reforça que abordagens isoladas de oferta ou demanda não são suficientes, sendo necessária uma política energética integrada que combine regulação, incentivos econômicos e governança participativa para alcançar os objetivos de sustentabilidade.
No plano internacional, documentos analíticos como o Energy Technology Perspectives da IEA mostram que a adoção de tecnologias eficientes aliada a políticas de inovação tecnológica é fundamental para “limitar o aumento da temperatura global e melhorar a segurança energética” (IEA, 2025, p. 15), reiterando que eficiência energética deve ser pensada como componente inseparável da transição para sistemas de baixo carbono. Essa perspectiva é complementada por estudos que demonstram como a intensificação da eficiência energética pode gerar ganhos econômicos e sociais substanciais, incluindo a criação de empregos verdes, redução de custos operacionais e melhoria da qualidade de vida nas áreas urbanas e rurais, consolidando seu papel como pilar estratégico do desenvolvimento sustentável.
Assim, a eficiência energética, além de fundamento técnico, constitui uma categoria teórica e prática essencial para compreender e orientar políticas de desenvolvimento sustentável contemporâneas, integrando normas nacionais, padrões internacionais e dinâmicas econômicas e sociais que moldam a transição energética global.
3. METODOLOGIA
A presente pesquisa adota uma abordagem qualitativa, de natureza exploratória e descritiva, orientada pela compreensão aprofundada da eficiência energética enquanto estratégia de desenvolvimento sustentável, considerando suas dimensões conceituais, normativas, socioeconômicas e ambientais. A opção pelo método qualitativo justifica-se pela complexidade do objeto investigado, o qual envolve múltiplas variáveis interdependentes, não redutíveis a mensurações exclusivamente quantitativas, exigindo análise interpretativa, crítica e contextualizada. Conforme destacam Lakatos e Marconi, a pesquisa qualitativa possibilita a compreensão dos fenômenos sociais “a partir do significado que as pessoas e os documentos atribuem a eles, permitindo captar relações, processos e estruturas que não se expressam numericamente” (LAKATOS; MARCONI, 2017, p. 269), perspectiva plenamente alinhada à problemática investigada neste estudo.
Do ponto de vista dos objetivos, a pesquisa caracteriza-se como exploratória e descritiva. É exploratória porque busca ampliar a familiaridade com o tema da eficiência energética no contexto do desenvolvimento sustentável, sistematizando conceitos, modelos teóricos e marcos normativos, especialmente em face das transformações recentes no cenário energético global. Gil esclarece que a pesquisa exploratória tem como finalidade “proporcionar maior familiaridade com o problema, tornando-o mais explícito ou construindo hipóteses” (GIL, 2019, p. 41), aspecto fundamental quando se pretende analisar um fenômeno multifacetado e em constante evolução. Simultaneamente, a investigação assume caráter descritivo, na medida em que se propõe a descrever, analisar e interpretar políticas públicas, instrumentos regulatórios e abordagens teóricas relacionadas à eficiência energética, sem a pretensão de interferir diretamente na realidade estudada, conforme orienta o mesmo autor ao afirmar que pesquisas descritivas visam “descrever as características de determinada população ou fenômeno ou o estabelecimento de relações entre variáveis” (GIL, 2019, p. 44).
Quanto aos procedimentos técnicos, optou-se pela pesquisa bibliográfica e documental, realizadas de forma sistemática e criteriosa. A pesquisa bibliográfica fundamentou-se na análise de livros, artigos científicos publicados em periódicos nacionais e internacionais de reconhecida relevância acadêmica, teses, dissertações e relatórios técnicos produzidos entre 2015 e 2025, sem prejuízo da incorporação de obras clássicas indispensáveis à compreensão histórica e epistemológica do tema. Severino destaca que a pesquisa bibliográfica constitui um procedimento básico e indispensável na produção do conhecimento científico, uma vez que “se realiza a partir do registro disponível, decorrente de pesquisas anteriores, em documentos impressos ou eletrônicos” (SEVERINO, 2016, p. 131), permitindo ao pesquisador dialogar criticamente com o estado da arte.
A pesquisa documental, por sua vez, concentrou-se na análise de leis, decretos, normas técnicas e documentos oficiais relacionados à política energética e à sustentabilidade, tais como legislações brasileiras, diretrizes internacionais e relatórios de organismos multilaterais. Esse tipo de procedimento mostrou-se essencial para compreender o arcabouço normativo que orienta a implementação da eficiência energética, bem como suas implicações institucionais e socioeconômicas. Segundo Vergara, a pesquisa documental diferencia-se da bibliográfica por utilizar “documentos que não receberam ainda um tratamento analítico ou que podem ser reelaborados de acordo com os objetivos da pesquisa” (VERGARA, 2016, p. 43), característica que reforça sua pertinência para investigações voltadas à análise de políticas públicas e estratégias de desenvolvimento.
O processo de seleção das fontes seguiu critérios de relevância temática, credibilidade institucional e atualidade, priorizando publicações indexadas em bases reconhecidas, como SciELO, Web of Science e Scopus, além de documentos oficiais de órgãos como a Agência Internacional de Energia e a Organização das Nações Unidas. As obras clássicas foram incluídas com base em sua contribuição teórica consolidada e recorrente na literatura científica sobre economia, energia e desenvolvimento. Essa combinação entre fontes contemporâneas e clássicas permitiu assegurar densidade teórica, rigor conceitual e consistência histórica à análise desenvolvida, conforme recomendam Lakatos e Marconi ao afirmarem que a fundamentação teórica deve articular “autores clássicos e atuais, de modo a sustentar criticamente o objeto de estudo” (LAKATOS; MARCONI, 2017, p. 183).
A análise dos dados ocorreu por meio de leitura analítica e interpretativa, com posterior categorização temática dos conteúdos selecionados. Inicialmente, realizou-se uma leitura exploratória, com o objetivo de identificar ideias centrais, conceitos recorrentes e abordagens predominantes sobre eficiência energética e desenvolvimento sustentável. Em seguida, procedeu-se à leitura seletiva e analítica, na qual os materiais foram examinados de forma mais aprofundada, buscando relações, convergências, divergências e lacunas teóricas. Severino destaca que a análise interpretativa consiste em “estabelecer relações entre as ideias do autor e os objetivos do pesquisador, situando o texto no contexto mais amplo da problemática investigada” (SEVERINO, 2016, p. 142), procedimento adotado de maneira sistemática ao longo deste estudo.
A etapa final da análise envolveu a síntese crítica dos dados, articulando os aportes teóricos, normativos e empíricos em um corpo argumentativo coeso e autoral. Essa síntese não se limitou à mera reprodução das ideias dos autores consultados, mas buscou problematizá-las à luz do contexto contemporâneo da transição energética e dos desafios do desenvolvimento sustentável, preservando a autonomia intelectual da pesquisa. Gil ressalta que a análise científica exige que o pesquisador vá além da descrição, promovendo “interpretações fundamentadas, capazes de explicar o fenômeno estudado” (GIL, 2019, p. 96), princípio que orientou a construção do texto analítico.
No que se refere à confiabilidade e à possibilidade de replicação do estudo, todos os procedimentos metodológicos foram descritos de forma detalhada, desde a definição do tipo de pesquisa até os critérios de seleção e análise das fontes. Essa transparência metodológica atende às exigências da pesquisa científica e permite que outros pesquisadores reproduzam o percurso investigativo, ajustando-o a diferentes contextos ou ampliando o escopo analítico. Vergara enfatiza que a clareza metodológica é condição essencial para a validade de um estudo, pois “permite avaliar a adequação dos métodos utilizados em relação aos objetivos propostos” (VERGARA, 2016, p. 61).
Dessa forma, a metodologia adotada revela-se adequada ao problema de pesquisa, aos objetivos estabelecidos e à natureza do fenômeno investigado, assegurando rigor científico, coerência interna e consistência analítica. Ao integrar abordagem qualitativa, pesquisa bibliográfica e documental e análise interpretativa crítica, o estudo constrói um percurso investigativo sólido, capaz de contribuir de forma relevante para o debate acadêmico sobre eficiência energética e desenvolvimento sustentável.
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados desta pesquisa evidenciam que a eficiência energética se consolida como um dos instrumentos mais consistentes para operacionalizar o desenvolvimento sustentável, sobretudo quando integrada a políticas públicas estruturadas, marcos regulatórios eficazes e estratégias institucionais de longo prazo. A análise do conjunto de obras teóricas, documentos oficiais e legislações examinadas demonstra convergência quanto ao reconhecimento da eficiência energética como vetor estratégico capaz de reduzir a intensidade energética das economias, mitigar emissões de gases de efeito estufa e ampliar a competitividade econômica, sem comprometer a oferta de serviços energéticos essenciais. Conforme destaca a Agência Internacional de Energia, “melhorias em eficiência energética representam a forma mais rápida e custo-efetiva de reduzir emissões e fortalecer a segurança energética” (IEA, 2023, p. 18), o que reforça empiricamente os pressupostos que orientaram esta investigação.
No plano dos achados conceituais, observa-se que a eficiência energética extrapola a noção restrita de economia de energia, sendo compreendida como uma estratégia sistêmica que articula tecnologia, comportamento social, governança e regulação. A literatura analisada indica que políticas bem-sucedidas de eficiência energética combinam padrões mínimos de desempenho, incentivos econômicos, mecanismos de informação ao consumidor e instrumentos de monitoramento contínuo. Goldemberg e Lucon afirmam que “a eficiência energética deve ser tratada como política de Estado, e não como ação pontual, pois seus benefícios se acumulam ao longo do tempo e atravessam diferentes setores da economia” (GOLDEMBERG; LUCON, 2018, p. 97). Esse entendimento é corroborado pelos dados analisados, que revelam maior efetividade em países que adotaram abordagens integradas e persistentes, especialmente nos setores industrial, de transportes e de edificações.
No que se refere aos impactos ambientais, os resultados apontam relação direta entre eficiência energética e redução de emissões de dióxido de carbono, especialmente em economias fortemente dependentes de combustíveis fósseis. Relatórios recentes do IPCC indicam que medidas de eficiência energética no uso final podem responder por até 40% do potencial global de mitigação necessário para limitar o aquecimento a 1,5 °C até meados do século, destacando que “a eficiência energética é uma das opções de mitigação com maior potencial e menor custo” (IPCC, 2022, p. 44). A análise crítica desses dados permite afirmar que a eficiência energética não apenas complementa a expansão das energias renováveis, mas atua como condição estruturante para que essa expansão ocorra de forma economicamente viável e ambientalmente eficaz.
No âmbito socioeconômico, os resultados demonstram que a eficiência energética contribui para a redução de custos operacionais em empresas e para a diminuição das despesas energéticas das famílias, com efeitos positivos sobre a renda disponível e a competitividade industrial. Estudos analisados indicam que investimentos em eficiência energética geram retorno econômico superior ao de muitas obras de expansão da oferta, além de criarem empregos locais e estimular cadeias produtivas relacionadas à inovação tecnológica. Segundo o Banco Mundial, “programas de eficiência energética bem desenhados podem gerar crescimento econômico, reduzir a pobreza energética e fortalecer a resiliência das economias” (BANCO MUNDIAL, 2021, p. 62). Esses achados dialogam diretamente com a hipótese central da pesquisa, ao evidenciar que a eficiência energética pode funcionar como mecanismo de inclusão social e justiça energética, sobretudo em contextos de desigualdade no acesso à energia.
A análise das políticas públicas brasileiras revelou avanços normativos importantes, como a instituição da Política Nacional de Conservação e Uso Racional de Energia pela Lei nº 10.295/2001, mas também evidenciou limitações na implementação e no monitoramento das ações previstas. Os resultados indicam que, embora o arcabouço legal exista, sua efetividade é comprometida por lacunas institucionais, fragmentação das políticas e insuficiência de mecanismos de avaliação de desempenho. Conforme observa Alves, “a simples existência de legislação não garante a eficiência energética, sendo indispensável a articulação entre instrumentos normativos, incentivos econômicos e capacidade institucional” (ALVES, 2007, p. 48). Essa constatação reforça a necessidade de fortalecimento da governança energética e de maior integração entre políticas ambientais, industriais e urbanas.
No plano internacional, os resultados demonstram que países que alcançaram maiores ganhos de eficiência energética adotaram políticas consistentes de longo prazo, com metas claras, financiamento adequado e participação ativa do setor privado. A União Europeia, por exemplo, estabeleceu metas vinculantes de eficiência energética e implementou sistemas rigorosos de etiquetagem e padrões mínimos de desempenho, o que resultou em redução significativa da intensidade energética nas últimas décadas. De acordo com a Comissão Europeia, “a eficiência energética é central para alcançar neutralidade climática e reduzir a dependência energética externa” (COMISSÃO EUROPEIA, 2023, p. 11). A análise comparativa desses casos evidencia que a eficiência energética deve ser compreendida como parte integrante das estratégias de soberania energética e segurança nacional.
Os achados também confirmam a relevância do debate teórico clássico sobre os limites da eficiência energética, especialmente no que se refere ao efeito rebote. A partir da leitura de Jevons, observa-se que “o aumento da eficiência no uso do carvão tende a aumentar, e não diminuir, o consumo total” (JEVONS, 1865, p. 123), argumento que permanece atual e relevante. A literatura contemporânea reconhece que ganhos de eficiência podem ser parcialmente anulados pelo aumento do consumo induzido pela redução de custos, o que reforça a necessidade de políticas complementares, como precificação do carbono e regulação da demanda. Nesse sentido, os resultados desta pesquisa corroboram a hipótese de que a eficiência energética, isoladamente, não é suficiente para garantir sustentabilidade, exigindo integração com instrumentos econômicos e mudanças nos padrões de consumo.
Outro resultado relevante diz respeito à dimensão cultural e comportamental da eficiência energética. A análise dos estudos indica que políticas baseadas exclusivamente em soluções tecnológicas tendem a apresentar resultados limitados quando não acompanhadas de estratégias de educação energética e engajamento social. Georgescu-Roegen já advertia que “o problema ecológico não é apenas técnico, mas profundamente econômico e cultural” (GEORGESCU-ROEGEN, 1971, p. 21), e os dados contemporâneos analisados reforçam essa perspectiva. A eficiência energética, nesse sentido, depende da incorporação de novos valores sociais relacionados ao consumo responsável, à racionalidade no uso dos recursos e à percepção da energia como bem comum.
A discussão dos resultados permite afirmar que a eficiência energética se apresenta como estratégia transversal, capaz de articular objetivos ambientais, econômicos e sociais, desde que inserida em um modelo de desenvolvimento orientado por planejamento de longo prazo, governança integrada e participação social. Os achados confirmam que países e regiões que tratam a eficiência energética como política estruturante obtêm benefícios cumulativos, enquanto abordagens fragmentadas tendem a produzir resultados pontuais e insuficientes. Conforme sintetiza Sovacool, “a transição energética bem-sucedida exige mais do que tecnologia, requer instituições fortes, políticas coerentes e mudanças sociais profundas” (SOVACOOL, 2021, p. 89).
Dessa forma, os resultados e a discussão apresentados sustentam a tese de que a eficiência energética constitui um dos pilares mais sólidos do desenvolvimento sustentável contemporâneo. Ao reduzir pressões sobre os recursos naturais, mitigar impactos ambientais, promover inclusão social e fortalecer a competitividade econômica, a eficiência energética demonstra potencial para reconfigurar o paradigma energético vigente. Todavia, os achados também evidenciam que esse potencial somente se concretiza quando a eficiência é compreendida como estratégia sistêmica, integrada e contínua, e não como solução técnica isolada. Essa constatação reforça a necessidade de avanços institucionais, políticos e culturais, de modo a consolidar a eficiência energética como eixo estruturante das agendas de sustentabilidade no século XXI.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente pesquisa permitiu compreender, de forma crítica e fundamentada, que a eficiência energética se configura como uma das estratégias mais consistentes e estruturantes para a promoção do desenvolvimento sustentável no contexto contemporâneo. A análise teórica, normativa e institucional realizada ao longo do estudo evidenciou que a eficiência energética transcende a lógica restrita da economia de insumos, assumindo um papel central na reorganização dos sistemas produtivos, na mitigação das mudanças climáticas e na promoção de maior equidade social no acesso à energia. Os achados confirmam que a racionalização do uso energético, quando orientada por políticas públicas integradas e planejamento de longo prazo, contribui significativamente para a redução da intensidade energética das economias, para a diminuição das emissões de gases de efeito estufa e para o fortalecimento da segurança energética.
Verificou-se que a eficiência energética apresenta elevada capacidade de gerar benefícios econômicos e sociais simultaneamente, ao reduzir custos operacionais, estimular a inovação tecnológica, criar empregos e mitigar a pobreza energética. Contudo, os resultados também demonstram que tais benefícios não se materializam de forma automática ou espontânea. A efetividade das estratégias de eficiência energética depende da articulação entre marcos regulatórios sólidos, instrumentos econômicos adequados, governança institucional eficaz e mudanças culturais nos padrões de consumo. Nesse sentido, confirmou-se a hipótese de que ações isoladas, centradas exclusivamente em soluções tecnológicas, tendem a produzir impactos limitados e, em alguns casos, podem ser neutralizadas por efeitos de rebote, conforme amplamente discutido na literatura clássica e contemporânea.
A análise do contexto brasileiro revelou avanços normativos relevantes, especialmente no que se refere à institucionalização da eficiência energética como diretriz da política energética nacional. Todavia, persistem desafios relacionados à implementação, ao monitoramento e à integração das políticas, indicando a necessidade de fortalecimento da capacidade estatal, de maior coordenação intersetorial e de ampliação dos mecanismos de avaliação de resultados. No plano internacional, observou-se que experiências bem-sucedidas reforçam a importância de metas claras, financiamento contínuo e participação ativa do setor privado e da sociedade civil, evidenciando que a eficiência energética deve ser compreendida como política de Estado e não como ação conjuntural.
Conclui-se, portanto, que a eficiência energética constitui um eixo estratégico indispensável para a construção de modelos de desenvolvimento sustentável, resilientes e socialmente justos. Ao permitir a dissociação entre crescimento econômico e degradação ambiental, a eficiência energética oferece uma resposta concreta às limitações dos modelos tradicionais de desenvolvimento, alinhando-se às exigências impostas pelas crises climáticas e energéticas do século XXI. Entretanto, para que seu potencial transformador seja plenamente alcançado, torna-se imperativo investir em governança integrada, inovação institucional e educação energética, assegurando que a eficiência seja incorporada de maneira sistêmica e permanente às agendas públicas e privadas. Assim, a eficiência energética afirma-se não apenas como instrumento técnico, mas como escolha política e ética fundamental para garantir sustentabilidade às gerações presentes e futuras.
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1 Mestre em Engenharia Elétrica. Especialista em áreas da Educação e relacionadas à Engenharia Elétrica. Bacharel em Engenharia Elétrica, licenciado em Matemática, Física, Pedagogia e em Formação de professores para a EPT. Foi aluno de IC, atuou como professor na EBTT e participou de vários projetos de P&D. Atualmente, é pesquisador e doutorando em Engenharia Elétrica. E-mail: [email protected]