DESAFIOS TECNOLÓGICOS NA EDUCAÇÃO: PRÁTICAS INOVADORAS NO ENSINO DE MATEMÁTICA

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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.17862298


Andresa Pedro Borges1
Simoni Pinto Pereira Eugênio2
Juliana Dagostim Martinello Farias3
Simone Garcia Conceição de Sá4


RESUMO
Este artigo examina os desafios e possibilidades enfrentados pelos professores da educação básica na incorporação das tecnologias digitais, com foco especial no ensino de Matemática. No primeiro capítulo, explora-se as barreiras que permeiam a formação docente diante das novas ferramentas, evidenciando que a dificuldade não está apenas na falta de recursos, mas também em aspectos ligados à cultura escolar e às concepções pedagógicas arraigadas. O segundo capítulo investiga como estratégias tecnológicas podem ser aplicadas na prática matemática, destacando a necessidade de romper com metodologias tradicionais para tornar as aulas mais dinâmicas e conectadas com a realidade dos estudantes. A conclusão reafirma que a inserção das tecnologias exige mais do que conhecimento técnico; demanda apoio contínuo, espaço para experimentação e uma mudança na postura dos educadores perante o ensino. A justificativa deste estudo reside na urgência de compreender por que a adoção das tecnologias ainda encontra resistência, apesar do avanço e da disponibilização de recursos nas escolas. A pesquisa bibliográfica permitiu a reunião de diferentes perspectivas sobre o tema, dando base para refletir sobre os obstáculos e as alternativas para uma prática pedagógica mais integrada. O objetivo principal é discutir as dificuldades enfrentadas pelos docentes e sugerir caminhos que aproximem teoria e prática, valorizando as experiências reais em sala de aula. Dessa forma, a investigação contribui para ampliar a conversa sobre formação e inovação pedagógica, fornecendo subsídios que podem auxiliar educadores e gestores na construção de ambientes mais favoráveis à aprendizagem mediada por tecnologia.
Palavras-chave: Formação Docente. Tecnologias Digitais. Ensino Básico. Matemática.

ABSTRACT
This article examines the challenges and opportunities faced by elementary school teachers in the incorporation of digital technologies, with a special focus on teaching Mathematics. The first chapter explores the barriers that permeate teacher training in the face of new tools, showing that the difficulty lies not only in the lack of resources, but also in aspects linked to school culture and ingrained pedagogical concepts. The second chapter investigates how technological strategies can be applied in mathematical practice, highlighting the need to break with traditional methodologies to make classes more dynamic and connected to the reality of students. The conclusion reaffirms that the insertion of technologies requires more than technical knowledge; it demands continuous support, space for experimentation and a change in the attitude of educators towards teaching. The justification for this study lies in the urgency of understanding why the adoption of technologies still encounters resistance, despite the progress and availability of resources in schools. The bibliographic research allowed the gathering of different perspectives on the subject, providing a basis for reflecting on the obstacles and alternatives for a more integrated pedagogical practice. The main objective is to discuss the difficulties faced by teachers and suggest ways to bring theory and practice closer together, valuing real experiences in the classroom. In this way, the research contributes to broadening the conversation about training and pedagogical innovation, providing support that can help educators and managers in building environments that are more favorable to technology-mediated learning.
Keywords: Teacher Training. Digital Technologies. Basic Education. Mathematics.

1. INTRODUÇÃO

A presença das tecnologias digitais no cotidiano das escolas já não pode ser ignorada, mas isso não significa que elas tenham sido plenamente compreendidas ou incorporadas de maneira coerente pelas práticas pedagógicas. O que se observa, na maioria das vezes, é uma tentativa de adaptação, marcada por improvisos, receios e limitações formativas. No ensino de Matemática, em particular, essa presença ainda gera desconfortos e inseguranças. Trata-se de uma disciplina historicamente marcada por rigidez metodológica e distanciamento de abordagens mais dinâmicas. Assim, a ideia de tornar o processo de ensino mais flexível, por meio de recursos digitais, acaba encontrando obstáculos tanto na formação quanto na concepção pedagógica dos docentes. E nesse cenário, não é apenas a infraestrutura que pesa, mas também o modo como o professor compreende seu papel e seu saber diante de uma sala de aula que se transforma.

No primeiro capítulo, são debatidas as dificuldades enfrentadas por professores da educação básica para incorporar recursos tecnológicos à sua prática. Não se trata de uma recusa consciente, mas de um processo carregado de tensões entre o desejo de renovação e as condições oferecidas para que essa mudança ocorra. Já no segundo capítulo, o olhar se volta especificamente para o ensino de Matemática, onde a inserção de tecnologias exige não só criatividade, mas uma ruptura com modelos tradicionais que ainda sustentam boa parte da formação inicial. Nessa parte do trabalho, é possível perceber que estratégias inovadoras só ganham sentido quando dialogam com as necessidades reais da sala de aula e com a trajetória dos educadores.

O interesse por esse tema parte da necessidade de compreender melhor por que tantos professores ainda se sentem inseguros diante de ferramentas digitais, mesmo quando demonstram disposição para usá-las. A escolha da pesquisa bibliográfica como método permitiu reunir reflexões já publicadas por estudiosos que tratam dessa temática, ampliando o entendimento sobre os limites e possibilidades envolvidos. O problema que move esta investigação está centrado na distância entre o discurso institucional que promove o uso das tecnologias e a realidade cotidiana dos docentes. O objetivo geral é discutir como essa distância impacta a prática pedagógica e quais caminhos podem ser construídos a partir da escuta das dificuldades enfrentadas. Espera-se, com isso, oferecer uma contribuição que estimule novas abordagens formativas, mais conectadas com as experiências reais dos professores e com os desafios concretos da sala de aula.

2. A FORMAÇÃO DOCENTE FRENTE ÀS NOVAS TECNOLOGIAS

Há um abismo silencioso entre o que se propaga nas políticas públicas de formação docente e o que realmente se consolida na prática diária de sala de aula. Muitos professores, ao se depararem com a proposta de inserir tecnologias digitais em seus planejamentos, carregam consigo mais dúvidas do que certezas. A presença dos equipamentos nas escolas não garante apropriação efetiva; eles não operam sozinhos. Há um componente humano que precisa ser considerado, mas, frequentemente, negligenciado. De acordo com os estudos de Barreto (2009), há um deslocamento do foco das políticas educacionais em direção à técnica, em detrimento de uma formação crítica e contextualizada do professor, o que reforça uma lógica produtivista e esvazia o papel reflexivo do educador.

Quando se examina a maneira como essas tecnologias vêm sendo tratadas nos programas de capacitação, é comum perceber que a ênfase se dá em manuais, comandos e plataformas, deixando de lado as dimensões pedagógicas mais amplas. O professor, nesse cenário, torna-se quase um operador de sistemas, quando, na verdade, sua tarefa exige bem mais do que domínio instrumental. A pesquisa de Araújo e Nóbile (2019) demonstra que os investimentos públicos ao longo dos anos focaram majoritariamente em infraestrutura, sem garantir uma política contínua e integrada de formação, o que acaba por esvaziar as possibilidades reais de transformação no cotidiano escolar. A formação, portanto, fica fragmentada, isolada, distante do chão da escola.

É comum que a chegada de novos recursos gere uma expectativa generalizada de mudança, quase como se a tecnologia, por si só, fosse resolver problemas antigos da educação. No entanto, as contradições surgem justamente quando se espera que um professor mal preparado para lidar com as ferramentas digitais inove sua prática sem o devido respaldo formativo. De acordo com Barreto (2009), há uma tendência preocupante em responsabilizar os docentes por não utilizarem os recursos tecnológicos com "eficiência", sem considerar as falhas estruturais no processo de formação. A cobrança por inovação esbarra na ausência de diálogo entre as instituições formadoras e os contextos escolares reais.

Nesse emaranhado de exigências e lacunas, surge um desconforto perceptível. Muitos educadores, embora interessados em incorporar as tecnologias, não se sentem seguros para modificar suas práticas. Há um receio legítimo de errar diante dos alunos, de perder o controle da aula, de não dominar a ferramenta. E essa insegurança não é fruto de resistência, como muitas vezes se tenta simplificar, mas sim de um modelo de formação que pouco considera o tempo do professor e a complexidade de sua tarefa. A análise de Araújo e Nóbile (2019) reforça essa leitura ao apontar que os programas de formação ofertados pelo Estado foram historicamente descontinuados e descolados das necessidades do cotidiano escolar. Sem tempo, sem apoio e sem vínculos com sua realidade, o professor acaba isolado no processo.

Mesmo quando há iniciativas bem-intencionadas, nem sempre elas respeitam o saber docente já acumulado. Muitos cursos apresentam uma perspectiva externa, impositiva, que ignora o conhecimento construído na prática e coloca o professor em posição passiva. Essa abordagem gera mais afastamento do que aproximação com as tecnologias. Barreto (2009) aponta que o discurso oficial tende a romantizar o uso das ferramentas digitais, tratando o professor como alguém que apenas precisa "se atualizar", como se a formação docente fosse uma tarefa pontual, e não um percurso contínuo e profundamente vinculado ao contexto em que se atua.

Não se pode esquecer que as escolas são atravessadas por uma série de tensões que vão além da sala de aula. A infraestrutura precária, a ausência de internet estável, a falta de suporte técnico e as jornadas extensas de trabalho interferem diretamente na disposição dos professores para explorar novas formas de ensinar. Barreto (2009) observa que a lógica da racionalização do trabalho docente, impulsionada pelas novas tecnologias, tende a reduzir o papel do educador a um mero executor de tarefas automatizadas. Isso esvazia a potência criativa da profissão e desconsidera a complexidade do processo de ensino e aprendizagem.

Mesmo diante dessas dificuldades, é possível identificar experiências singulares em que a inserção das tecnologias não se limita à substituição de quadros e livros por telas. Quando há espaço para a experimentação, a criação e a troca entre colegas, as tecnologias passam a ser compreendidas como ferramentas que ampliam possibilidades, e não como ameaças. A pesquisa de Araújo e Nóbile (2019) indica que os professores que se engajam em processos colaborativos de formação conseguem ressignificar o uso das tecnologias, vinculando-as a objetivos pedagógicos concretos. A construção coletiva do conhecimento, nesse sentido, revela- se mais potente do que qualquer manual de instruções.

Não se trata, portanto, de negar a importância das tecnologias na educação básica, mas de problematizar o modo como elas têm sido inseridas no processo formativo docente. O entusiasmo institucional com a inovação tecnológica precisa vir acompanhado de um compromisso real com a valorização do trabalho do professor. Sem esse reconhecimento, qualquer projeto tende a se perder no caminho. Segundo Barreto (2009), o modelo tecnocrático que muitas vezes orienta as políticas de formação desconsidera os sujeitos do processo educativo e reforça a fragmentação das ações.

É nesse campo tensionado entre exigência institucional e possibilidades reais que a formação docente precisa ser repensada. Não basta disponibilizar equipamentos ou oferecer cursos esporádicos; é necessário construir espaços contínuos de diálogo, em que o professor possa refletir sobre sua prática, compartilhar experiências e experimentar caminhos sem medo de errar. Conforme indicado por Araújo e Nóbile (2019), as políticas públicas voltadas para a formação tecnológica dos docentes falharam ao não considerar as desigualdades regionais, os diferentes contextos escolares e a escuta ativa dos profissionais envolvidos.

Esse deslocamento da discussão técnica para a dimensão humana da formação é essencial para compreender por que tantas propostas de inserção tecnológica fracassam. O que está em jogo não é apenas o acesso às ferramentas, mas a maneira como os professores se sentem parte — ou não — desse processo. Barreto (2009) aponta que a ausência de uma política de formação que valorize o saber docente e incentive a autonomia pedagógica contribui para uma sensação de desamparo entre os educadores, o que compromete diretamente o envolvimento com práticas inovadoras.

A questão, portanto, não está em aderir ou rejeitar as tecnologias digitais, mas em compreender os sentidos que elas assumem dentro de um projeto pedagógico coerente com a realidade da escola pública. Formar professores para lidar com esse cenário exige mais do que domínio técnico: implica escuta, tempo, vínculo e, sobretudo, reconhecimento. Como alertam os estudos de Barreto (2009), a tecnificação do ensino sem uma base crítica acaba por transformar a educação em produto, e não em processo. É nesse entrelaçamento de tensões que se delineiam tanto os obstáculos quanto as possibilidades de um uso significativo das tecnologias na formação docente.

2.1 Tecnologias Digitais no Ensino de Matemática: Estratégias e Desafios

Falar sobre inovação no ensino de Matemática exige mais do que entusiasmo por recursos tecnológicos. A sala de aula, sobretudo na educação básica, ainda é marcada por métodos repetitivos, centrados na memorização e com pouco espaço para a exploração criativa dos conteúdos. Quando se tenta inserir as tecnologias digitais nesse cenário, os desafios não estão apenas na carência de equipamentos ou no domínio técnico dos professores. Existe uma tensão mais profunda, ligada à própria concepção de ensino, que muitas vezes resiste a abandonar o modelo expositivo. De acordo com Ferreira (2020), essa resistência não pode ser entendida como simples recusa ao novo, mas como um reflexo das experiências de formação que ainda se organizam de forma distante da lógica da cultura digital.

Dessa forma, não adianta imaginar que o uso de softwares ou aplicativos, por si só, vá alterar as relações pedagógicas construídas há décadas. As tecnologias entram no jogo com potencial para renovar o ensino, mas isso depende diretamente do modo como são articuladas ao conteúdo. Por exemplo, ao explorar conceitos matemáticos por meio de infográficos, é possível estabelecer conexões visuais que facilitam a compreensão de estruturas abstratas. Porto (2019) defende que esse tipo de material amplia o repertório didático do professor e favorece a criação de narrativas visuais que ajudam os alunos a perceberem padrões, relações e contextos, o que vai muito além do simples uso de gráficos prontos em apresentações.

Ainda assim, o acesso às ferramentas não é suficiente. O problema está em como essas tecnologias são integradas ao currículo de maneira orgânica, sem parecer que foram enfiadas à força em um plano de aula que já estava pronto. Há uma diferença entre usar um recurso digital e fazer dele parte da construção do conhecimento. Conforme apontam Scherer e Brito (2020), é nessa articulação entre conteúdo e linguagem digital que surgem os maiores entraves: os professores não encontram suporte para adaptar os materiais ao contexto real da turma, nem recebem tempo adequado para elaborar propostas pedagógicas mais consistentes.

Somado a isso, é comum que a Matemática seja tratada como uma disciplina distante da linguagem multimodal que marca o universo digital. Há quem ainda veja o conteúdo matemático como algo neutro, técnico, que não se mistura com imagens, sons ou interatividade. Essa visão limita o uso de tecnologias a simples exercícios automatizados, sem explorar seu potencial para provocar reflexões mais profundas. Ferreira (2020) observa que a formação dos docentes costuma reforçar essa separação artificial, já que as discussões sobre recursos digitais frequentemente ocorrem fora do campo específico da didática da Matemática, enfraquecendo as possibilidades de uma prática integrada.

Existe uma lacuna persistente entre teoria e prática. Muitos cursos de formação até discutem as tecnologias digitais, mas sem considerar as demandas concretas da sala de aula. O que se ensina na universidade, muitas vezes, não se traduz em estratégias aplicáveis na escola pública. E quando o professor tenta improvisar, enfrenta obstáculos como a instabilidade da conexão, a escassez de equipamentos ou a falta de colaboração entre os colegas. Segundo Scherer e Brito (2020), essas barreiras estruturais acabam levando os docentes a desistirem de propostas inovadoras, priorizando práticas mais seguras, ainda que pouco envolventes para os estudantes.

Por outro lado, há experiências que mostram como o uso intencional da tecnologia pode provocar deslocamentos significativos na maneira de ensinar e aprender Matemática. Ao trabalhar com infográficos construídos em conjunto com os alunos, por exemplo, o professor cria uma situação de aprendizagem que exige organização da informação, clareza na representação e domínio dos conceitos. Porto (2019) defende que esse tipo de produção favorece uma compreensão mais ativa dos conteúdos, pois os estudantes deixam de ser apenas receptores e se tornam autores de materiais que refletem suas próprias trajetórias de aprendizagem.

Outro fator que interfere nesse processo é a percepção que o próprio docente tem de sua capacidade de inovar. Em ambientes escolares que não valorizam a experimentação, o medo do erro se impõe como bloqueio constante. Muitos educadores sentem que precisam justificar qualquer tentativa diferente com resultados imediatos, o que impede a construção de projetos pedagógicos mais ousados. Ferreira (2020) destaca que esse receio está ligado à ausência de uma cultura colaborativa nas escolas, onde os professores possam compartilhar dúvidas, testar estratégias e ajustar percursos de forma coletiva e não punitiva.

Além disso, é preciso reconhecer que a presença das tecnologias também desloca a atenção para questões que não estão nos livros didáticos. Quando se trabalha com plataformas digitais, por exemplo, surgem demandas relacionadas à curadoria de conteúdos, à privacidade dos dados e à leitura crítica da informação. O professor de Matemática, nesse cenário, precisa ir além dos algoritmos e das fórmulas, assumindo uma postura investigativa diante da própria linguagem digital. De acordo com Scherer e Brito (2020), esse movimento exige uma revisão profunda da lógica curricular, abrindo espaço para abordagens mais conectadas com o cotidiano dos estudantes.

Entretanto, não se trata de substituir o quadro e o giz por telas interativas. A questão não é de ordem técnica, mas pedagógica. O uso da tecnologia só faz sentido quando está a serviço de uma aprendizagem mais significativa, que leve em conta o contexto do aluno, suas dificuldades e interesses. Porto (2019) argumenta que, ao desenvolver infográficos, jogos digitais ou simulações, o professor pode explorar múltiplas representações dos conceitos matemáticos, o que favorece a aprendizagem de estudantes com diferentes perfis e estilos cognitivos. Esse tipo de abordagem também ajuda a romper com a imagem da Matemática como disciplina inacessível e abstrata.

Mesmo com todas as dificuldades, há uma abertura crescente para propostas mais criativas, especialmente entre os docentes que enxergam as tecnologias como linguagem, e não como ferramenta neutra. Quando o conteúdo é adaptado para dialogar com os meios digitais, os estudantes passam a se ver como protagonistas do processo. Ferreira (2020) ressalta que os professores que se apropriam das tecnologias com intencionalidade pedagógica conseguem redesenhar o ambiente de aprendizagem, tornando-o mais interativo, horizontal e sensível às diferenças entre os alunos.

A integração das tecnologias no ensino de Matemática, portanto, não se resume à adoção de plataformas ou aplicativos. Ela passa pela reconstrução da prática docente em diálogo com os recursos digitais, sempre com atenção à realidade da escola e ao repertório dos alunos. Scherer e Brito (2020) afirmam que, quando há espaço para experimentação e reflexão, os professores conseguem articular conteúdos matemáticos a linguagens contemporâneas, favorecendo a construção de saberes mais conectados com o mundo que os estudantes vivem fora da escola.

2.2. A Formação Docente Frente Às Novas Tecnologias

Há um distanciamento significativo entre o discurso institucional de modernização pedagógica e a realidade vivida pelos professores em sala de aula. Embora a presença das tecnologias digitais seja cada vez mais enfatizada nas políticas públicas de formação, muitos docentes enfrentam um cenário permeado por dúvidas, inseguranças e ausência de suporte contínuo. Barreto (2009) chama atenção para o deslocamento das políticas educacionais rumo a um enfoque tecnicista, reduzindo a formação docente a uma lógica instrumental que desconsidera o caráter crítico e reflexivo do trabalho pedagógico. Esse movimento cria um abismo entre a promessa da inovação e a prática escolar cotidiana.

Além disso, a forma como a formação tecnológica é conduzida costuma reforçar esse distanciamento. Em muitos cursos, o foco recai exclusivamente sobre comandos, plataformas e manuais operacionais, deixando em segundo plano os debates pedagógicos necessários para que o professor compreenda o sentido da tecnologia em sua prática. Araújo e Nóbile (2019) demonstram que os investimentos públicos ao longo das últimas décadas privilegiaram a infraestrutura em detrimento da formação continuada, o que resulta em programas fragmentados, desarticulados e incapazes de dialogar com as necessidades do cotidiano escolar. Assim, a tecnologia chega às escolas, mas raramente chega ao trabalho pedagógico de forma crítica.

Por outro lado, a chegada de recursos digitais costuma gerar expectativas irreais sobre a capacidade transformadora das ferramentas. Há uma crença difusa de que a tecnologia, por si só, resolverá problemas estruturais da educação, o que acaba responsabilizando injustamente o professor pela ausência de mudança. Barreto (2009) destaca que essa retórica culpabilizadora ignora o contexto de formação insuficiente e atribui ao docente a responsabilidade por inovações que nunca foram adequadamente sustentadas por políticas públicas consistentes. A cobrança institucional, portanto, desconsidera as condições reais de trabalho e de formação dos educadores.

Nesse cenário, muitos docentes vivenciam um sentimento constante de insegurança. Embora interessados em explorar recursos digitais, não se percebem preparados para transformar suas práticas sem correr riscos pedagógicos e técnicos. Essa insegurança não decorre de resistência ao novo, como muitas vezes se afirma, mas da falta de oportunidades para formação contextualizada e contínua. Araújo e Nóbile (2019) enfatizam que os programas de capacitação geralmente são esporádicos, desconectados da realidade da sala de aula e desprovidos de acompanhamento sistemático, deixando o professor sozinho diante de demandas complexas.

Outro fator que contribui para o afastamento dos docentes em relação às tecnologias é a forma impositiva com que muitos programas são estruturados. Em vez de considerar o saber acumulado na prática, os cursos costumam apresentar metodologias externas que tratam o professor como mero receptáculo de instruções. Barreto (2009) afirma que esse modelo tecnocrático reforça uma visão simplificada da formação, reduzindo o educador a alguém que apenas deve “se atualizar”, ignorando que a profissionalidade docente é construída historicamente e depende de diálogo com a realidade escolar. Esse tipo de abordagem, ao invés de aproximar o professor da tecnologia, o afasta.

É preciso considerar também as condições materiais das escolas. A precariedade da infraestrutura, a instabilidade da conexão e a falta de suporte técnico dificultam a experimentação pedagógica e condicionam o uso das tecnologias a situações pontuais ou improvisadas. Barreto (2009) observa que, sob a lógica da racionalização do trabalho docente impulsionada pelas tecnologias, as políticas acabam transformando o professor em operador de sistemas, desconsiderando a complexidade da atividade de ensinar. Esse contexto fragiliza ainda mais a possibilidade de apropriação crítica das ferramentas digitais.

Mesmo diante dessas tensões, há escolas e grupos de professores que conseguem ressignificar o uso das tecnologias a partir da colaboração e da construção coletiva. Quando os docentes têm espaço para dialogar, experimentar e compartilhar práticas, a tecnologia deixa de ser ameaça e passa a ser linguagem pedagógica. Araújo e Nóbile (2019) identificam que os processos colaborativos fortalecem a autonomia docente e possibilitam que as ferramentas digitais sejam utilizadas de forma mais integrada aos objetivos de aprendizagem. Nesses casos, a formação não se encerra no curso, mas se prolonga nas relações profissionais.

Assim, não se trata de negar o papel das tecnologias na formação docente, mas de problematizar como elas têm sido introduzidas nos programas oficiais. O entusiasmo institucional com a inovação precisa estar alinhado à valorização do professor e às condições concretas de sua prática. Barreto (2009) alerta que políticas tecnocráticas produzem ações fragmentadas e desarticuladas, que não consideram os sujeitos do processo educativo. Sem articulação entre formação, tempo pedagógico e contexto escolar, qualquer política tende ao fracasso.

A construção de uma política de formação tecnológica efetiva requer continuidade, diálogo e reconhecimento da diversidade de realidades escolares. Araújo e Nóbile (2019) ressaltam que a formação deve considerar desigualdades regionais, especificidades culturais e necessidades profissionais concretas. Isso implica abandonar cursos rápidos e isolados para investir em processos formativos que acompanhem o professor ao longo do ano letivo, articulando teoria e prática de forma gradual e significativa.

Por fim, compreender o lugar das tecnologias na formação docente significa deslocar o debate da técnica para a dimensão humana. O que está em jogo não é apenas o domínio de ferramentas, mas os sentidos pedagógicos atribuídos ao uso das tecnologias no interior dos projetos educativos. Barreto (2009) destaca que reduzir a educação a uma lógica de produtividade digital fragiliza o papel formativo da escola e esvazia as possibilidades de transformação. Assim, formar professores para as tecnologias é reconhecer sua autonomia, sua experiência e sua centralidade no processo educativo, criando condições reais para que se apropriem criticamente dos recursos digitais.

2.3. Desafios Estruturais e Pedagógicos na Integração das Tecnologias à Prática Docente

A inserção das tecnologias digitais no cotidiano escolar não ocorre de maneira homogênea, nem tampouco depende apenas da vontade individual dos docentes. Há uma série de desafios estruturais que atravessam esse processo e configuram um cenário de tensão permanente entre intenção pedagógica e condições reais de implementação. Barreto (2009) destaca que a lógica da tecnificação da educação, presente nas políticas públicas, tende a compreender a escola como espaço de mera aplicação de ferramentas, ignorando as desigualdades materiais que marcam o sistema educacional brasileiro. Assim, a promessa de inovação frequentemente se esbarra em limitações que vão desde a ausência de equipamentos até a precariedade da conexão, configurando um ambiente que dificulta o uso pedagógico consistente das tecnologias.

Nesse sentido, os entraves não são apenas materiais, mas também pedagógicos. Quando o discurso institucional sobre integração tecnológica se distancia da realidade concreta das salas de aula, cria-se uma expectativa irreal sobre a capacidade do professor de adaptar-se rapidamente às ferramentas digitais. Araújo e Nóbile (2019) apontam que a formação continuada oferecida pelo poder público raramente dialoga com o cotidiano escolar, resultando em cursos genéricos, fragmentados e descontextualizados. Tal cenário reforça a sensação de que as tecnologias são impostas de fora para dentro, sem que o docente participe do processo de construção das práticas inovadoras. O resultado é um uso superficial dos recursos digitais, condicionado mais pela exigência burocrática do que pela intencionalidade pedagógica.

Ao mesmo tempo, é preciso reconhecer que os desafios da integração tecnológica não se limitam às dificuldades de formação ou infraestrutura. Há uma dimensão simbólica que atravessa o processo e que impacta diretamente a maneira como os professores se percebem diante da inovação. Barreto (2009) observa que o discurso tecnocrático tende a romantizar o uso das tecnologias, atribuindo ao professor a responsabilidade pela modernização da escola sem considerar as discrepâncias regionais, culturais e institucionais. Essa retórica de responsabilização individual produz um sentimento de inadequação e reforça a ideia de que a inovação depende unicamente do esforço pessoal do docente, quando na verdade exige políticas robustas, apoio institucional e tempo para planejamento.

Para além disso, a ausência de condições adequadas de trabalho compromete a experimentação pedagógica, tornando os professores mais propensos a adotarem práticas seguras e tradicionais em vez de arriscarem propostas inovadoras. Araújo e Nóbile (2019) sublinham que a falta de continuidade nos programas de formação resulta em ciclos de expectativas e frustrações, nos quais cada nova tecnologia chega como promessa de transformação e rapidamente se converte em mais um recurso subutilizado no ambiente escolar. Esse movimento cíclico evidencia a necessidade de repensar o papel da formação docente não como evento pontual, mas como processo contínuo que articula suporte técnico, tempo pedagógico e acompanhamento profissional.

Mesmo diante desse quadro de tensões, é possível observar experiências escolares nas quais a integração tecnológica ganha sentido a partir de ações colaborativas e reflexivas. Quando os docentes são convidados a participar da construção coletiva do projeto pedagógico, as tecnologias deixam de ser acessórios e passam a se constituir como linguagens educativas. Barreto (2009) menciona que, ao contrário do que pregam modelos tecnocráticos, a inovação só se sustenta quando dialoga com a autonomia e com o saber profissional do professor. Do mesmo modo, Araújo e Nóbile (2019) demonstram que práticas colaborativas permitem a ressignificação das tecnologias, transformando-as em ferramentas de mediação pedagógica e não em instrumentos isolados de modernização.

No entanto, a efetivação desse tipo de prática exige políticas que ultrapassem o fornecimento de equipamentos. A escola precisa ser compreendida como espaço vivo, marcado por dinâmicas sociais e pedagógicas que não podem ser padronizadas por soluções tecnológicas uniformes. Barreto (2009) alerta que o excesso de confiança na técnica tende a esvaziar a dimensão humana da formação, reduzindo o trabalho docente a procedimentos controlados e mensuráveis. Enfrentar os desafios estruturais, portanto, implica recolocar o professor no centro do debate e reconhecer que a inovação depende de sua liberdade para criar, errar, experimentar e reinventar práticas dentro de sua realidade concreta.

Diante desse cenário, torna-se evidente que os desafios estruturais e pedagógicos da integração tecnológica não são resultados de falhas individuais dos professores, mas do modo como as políticas de formação têm sido concebidas. Araújo e Nóbile (2019) argumentam que a ausência de escuta ativa dos docentes compromete a elaboração de programas formativos eficazes, pois ignora o conhecimento acumulado na prática e desconsidera a diversidade das escolas públicas brasileiras. Assim, qualquer tentativa de ampliar o uso pedagógico das tecnologias deve partir do diálogo com os profissionais que vivenciam diariamente as contradições do processo educativo.

Por fim, enfrentar esses desafios significa superar a lógica da imposição tecnológica e construir um modelo de formação que reconheça a complexidade do trabalho docente e valorize a autonomia pedagógica. Barreto (2009) reforça que a tecnificação da educação não pode substituir o compromisso com a reflexão crítica, sob risco de transformar a escola em espaço de reprodução de procedimentos. Nesse sentido, a integração das tecnologias precisa ser compreendida como processo coletivo, contínuo e contextualizado, no qual o professor não é mero executor, mas protagonista da construção de práticas pedagógicas significativas e alinhadas às necessidades reais dos estudantes.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante das reflexões propostas, fica evidente que a incorporação das tecnologias digitais na formação docente e no ensino da Matemática ainda caminha em terreno instável, onde o improviso convive com a tentativa de inovar. Os desafios enfrentados pelos professores não se limitam a questões técnicas ou estruturais, mas atravessam concepções pedagógicas enraizadas, lacunas na formação e uma cultura escolar que muitas vezes desestimula a experimentação. A resistência não nasce do desinteresse, mas da ausência de apoio concreto e de espaços onde o educador possa explorar, errar, ajustar e construir novas formas de ensinar sem a constante cobrança por resultados imediatos.

O debate proposto neste trabalho se torna relevante para ampliar a compreensão sobre os limites e as possibilidades do uso pedagógico das tecnologias no ensino básico, especialmente na área da Matemática, que tradicionalmente carrega uma abordagem mais rígida. Ao tratar de maneira crítica as relações entre tecnologia, currículo e prática docente, abre-se espaço para novas investigações que não se restrinjam a avaliações de eficácia, mas que busquem compreender os sentidos atribuídos pelos professores a essas mudanças. Pesquisas que explorem narrativas de experiências cotidianas e os modos como os docentes negociam suas escolhas didáticas diante da presença digital nas escolas podem enriquecer ainda mais esse campo de discussão.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Araújo, N. C. Z.; & Nóbile, M. F. (2019). O uso de tecnologias na formação de professores da rede pública de educação básica: histórico de iniciativas do governo brasileiro. Brasília, DF: Brazilian Journal of Education, Technology and Society.

Barreto, R. G. (2009). Tecnologias na formação de professores: o discurso do MEC. São Paulo, SP: Educação & Sociedade.

Barreto, R. G. (2009). Tecnologia e educação: trabalho e formação docente. São Paulo, SP: Educação & Sociedade.

Ferreira, J. L. (2020). Cultura digital e formação de professores: uma análise a partir da perspectiva dos discentes da Licenciatura em Pedagogia. Curitiba, PR: Educar em Revista.

Porto, R. C. (2019). Infográficos e o ensino de Matemática: uma proposta de prática pedagógica no ensino de Matemática. São Paulo, SP: Editora UNESP.

Scherer, S.; & Brito, G. S. (2020). Integração de tecnologias digitais ao currículo: diálogos sobre desafios e dificuldades. Curitiba, PR: Educar em Revista.


1 Mestranda em Tecnologia Emergentes em Educação pela Must University. E-mail: [email protected].

2 Mestranda em Tecnologia Emergentes em Educação pela Must University. E-mail: [email protected].

3 Mestranda em Tecnologia Emergentes em Educação pela Must University. E-mail: [email protected].

4 Mestranda em Tecnologia Emergentes em Educação pela Must University. E-mail: [email protected].