CONTAMINAÇÃO INVISÍVEL

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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.12614821


Danielle de Almeida Carvalho
Bianca Dieile da Silva
Érika Pereira de Lucena
Isabela de Paula de Faria
Júlia Carvalho Grijó


RESUMO
O objetivo deste estudo foi mostrar alguns impactos que o uso de plásticos e microplásticos podem causar na saúde humana e na saúde ambiental. Os polímeros sintéticos proveniente do petróleo – plásticos – são produtos de baixo custo, facilmente moldáveis e resistentes, com vida útil longa e, portanto, podendo ser utilizados para produção de diversos materiais. A estimativa de produção mundial foi de 400 milhões de toneladas no ano de 2020. A Norma ISO/TR 21960:2020 descreve os microplásticos como uma partícula sólida, insolúvel em água e com tamanho de 1μm (0,01mm) a 1000μm (1mm). São uma ameaça invisível pois o seu pequeno tamanho, invisível a olho nu, dificulta a visualização, sendo prejudicial ao meio ambiente em geral. É um desafio que todo o planeta enfrenta, pois já foi descoberta, em estudos científicos, a presença de microplásticos em locais distantes da civilização, como em nuvens no Monte Fuji, no gelo da Antártida, nos pontos mais profundos da Terra (Fossas Abissais), no ponto mais alto da Terra (Monte Everest) e no ponto mais remoto da Terra (Ponto Nemo). Já foi observado também como estão presentes em todos os ambientes naturais e podem entrar na nossa cadeia alimentar de diversas formas. Já foram observados em vários órgãos do corpo humano como cérebro, fígado, rins, pulmões, coração, intestino, e estudos demonstram de as micropartículas são capazes de atravessar a barreira placentária e contaminar também o leite materno humano. Desta forma, são contaminantes ambientais emergentes de alta relevância pois além de causarem danos podem adsorver outros contaminantes perigosos e biomagnificarem na cadeia alimentar. Repensar o consumo, avaliando a substituição e/ou a redução do uso de plástico se torna urgente. Ainda são incipientes no país (e no mundo) uma regulamentação que reduza efetivamente os riscos para a saúde humana e ambiental destes resíduos que, ao se degradarem no ambiente, se tornam microplásticos. Assim, o desenvolvimento de novos estudos que podem auxiliar os mecanismos de controle e monitoramento, e que sejam de fácil acesso, são muito importantes.
Palavras-chave: Microplásticos. Poluentes Ambientais. Poluição plástica.

ABSTRACT
The objective of this study was to show some impacts that the use of plastics and microplastics can have on human health and environmental health. Synthetic polymers from petroleum – plastics – are low-cost, easily moldable and resistant products, making their useful life long and, therefore, they can be used to produce various materials. The estimated global production was 400 million tons in 2020. The ISO/TR 21960:2020 standard describes microplastics as a solid particle, insoluble in water and with a size of 1μm (0.01mm) to 1000μm (1mm). They are an invisible threat because their small size, invisible to the naked eye, makes it difficult to see, and is harmful to the environment in general. It is a challenge that the entire planet faces, as scientific studies have already discovered the presence of microplastics in places far from civilization, such as in clouds on Mount Fuji, ice in Antarctica, in the deepest points of the Earth (Abyssal Trenches), at the point highest point on Earth (Mount Everest) and the most remote point on Earth (Point Nemo). As they are present in all natural environments and can enter our food chain in different ways. They have already been observed in various organs of the human body such as the brain, liver, kidneys, lungs, heart, intestine, and studies show that the microparticles are capable of cross the placental barrier and contaminating human breast milk. Therefore, they are emerging environmental contaminants of high relevance because, in addition to causing damage, they can adsorb other dangerous contaminants and biomagnify in the food chain. Rethinking consumption, evaluating replacement and/or reduction of plastic consumption becomes urgent. Regulations that effectively reduce the risks to human and environmental health of these wastes, which, when degraded in the environment, become microplastics, are still incipient in the country (and in the world). Therefore, the development of new studies that can assist control and monitoring mechanisms, and that are easily accessible, are very important.
Keywords: Microplastics. Environmental Pollutants. Plastic pollution.

1 INTRODUÇÃO

Os polímeros sintéticos provenientes do petróleo – plásticos – são produtos de baixo custo, facilmente moldáveis e resistentes, o que tornam sua vida útil longa, e, portanto, eles podem ser utilizados para produção de diversos materiais. Podem ser reprocessados e moldados para usos distintos a partir da reciclagem, ou ainda reutilizados para outras finalidades.

Aproximadamente 160 milhões de toneladas de plástico produzidos mundialmente no ano de 2020 foram destinados à fabricação de produtos de uso único. Levando em consideração a estimativa de produção mundial de 400 milhões de toneladas no ano de 2020, cerca de 40% foram para elaboração de embalagens em geral (Bila, Pereira e Silva, 2019. Brito, 2020).

Em tamanho macro (igual ou maior que 25mm) ou meso (entre 5 e 25mm), quando não encaminhados adequadamente para reutilização ou reciclagem, os plásticos têm seu destino final no ambiente, contrariando o artigo n° 47 da lei nº 12.305/2010 que refere sobre a política nacional de resíduos sólidos em aterros sanitários, rios e oceanos, onde, a partir da exposição das condições ambientais como foto-oxidação, fatores térmicos e variações marítimas, sofrem a quebra das suas partículas pelos fatores físicos e químicos a que foram expostos e se tornam microplásticos secundários (Olivatto et al., 2018; Teotônio, 2020).

A Norma ISO/TR 21960 de 2020, intitulada “Plastics Environmental Aspects – State of Knowledge and Methodologies”, descreve os microplásticos como uma partícula sólida, insolúvel em água e com tamanho de 1μm (0,01mm) a 1000μm (1mm). As partículas entre 1 e 5mm são consideradas como microplásticos grandes.

Os microplásticos primários são os que já saem da indústria para utilização em tamanho micro, medindo entre 1mm e 5mm. São usualmente comuns em esfoliantes físicos corporais e faciais, sabonetes, xampus, entre outros produtos. Assim, após o seu uso, são carreados para a estação de tratamento de esgoto (ETE) onde passam direto pelos filtros de contenção, por serem de tamanhos menores que o diâmetro dos filtros disponíveis nas estações atualmente, ou ainda seguindo para lançamento in natura de maneira ilegal. Nas duas hipóteses, chegam ao seu destino nos rios e oceanos onde os dejetos são despejados (Bila, Pereira e Silva, 2019).

Além da contaminação aquática, também existe a contaminação terrestre, visto as práticas agrícolas que utilizam o lodo dos esgotos como fertilizante, o qual além de resíduos biológicos contém sedimentado em si as fibras sintéticas e micropartículas provenientes dos resíduos domésticos e da contaminação do ar, proveniente da degradação dos pneus (Caixeta, Caixeta e Menezes Filho, 2018).

O plástico quando disposto em micropartícula no ambiente interage com ele de forma adsorvente, conectando-se com partículas de metais contaminantes e hidrocarbonetos perigosos para a saúde humana e para a saúde animal, pois por serem coloridos são facilmente confundidos com alimento por peixes menores e tartarugas por exemplo, que, ainda que herbívoros, consomem plânctons com polímeros bioacumulados na sua superfície. Da mesma forma, os animais terrestres estão expostos a essa contaminação em sua alimentação a partir de folhas. Seguindo a cadeia alimentar, os animais maiores que se alimentam dos menores levam adiante o processo contaminatório (Caixeta, Caixeta e Menezes Filho, 2018).

Já para o ser humano, a contaminação pode ocorrer pela alimentação proveniente de frutos do mar, bem como de animais terrestres, aves, frutas, legumes e verduras adubadas com sedimentos contaminados, além do consumo de água que passou por estações de tratamento de água (ETA) e inalação de partículas do desgaste de pneus.

A exposição humana aos micropoluentes ambientais aumenta a cada dia devido à degradação de produtos plásticos dispostos incorretamente no ambiente, por falta de coleta seletiva adequada e/ou pela utilização de produtos de higiene pessoal, de limpeza, de jateamento de pressurizadores, entre outros, contendo partículas em tamanho menores que 5mm.

As estações de tratamento de água (ETA) brasileiras, atualmente, não possuem técnicas de remoção de partículas de plástico eficazes em sua totalidade para que a água possa ser diretamente consumida por humanos, bem como ser utilizada no preparo de alimentos. Os plásticos são produtos provenientes do petróleo e contêm diversos componentes químicos prejudiciais à saúde, além de conter os demais compostos adsorvidos durante seu processo de descarte inicial até que ocorra sua ingestão (Teotônio, 2020).

Assim, o objetivo deste estudo foi mostrar alguns impactos que o uso de plásticos e microplásticos pode causar na saúde ambiental e na saúde humana.

2 MICROPLÁSTICOS NO MEIO AMBIENTE

Os microplásticos (MP), partículas menores que 1mm, são uma ameaça invisível para o meio ambiente. Seu pequeno tamanho, invisível a olho nu, dificulta a visualização, sendo prejudicial ao meio ambiente em geral incluindo os compartimentos ambientais e toda a biota aquática, terrestre e aérea.

É um desafio que todo o planeta enfrenta, pois já foi descoberta em estudos científicos a presença de microplásticos em locais distantes da civilização, como em nuvens no Monte Fuji, gelo na Antártida, nos pontos mais profundos da Terra (Fossas Abissais), no ponto mais alto da Terra (Monte Everest) e no ponto mais remoto da Terra (Ponto Nemo).

O estudo de Wang et al. (2023) analisou a presença de microplásticos em amostras de água das nuvens no cume do Monte Fuji, no Japão, a 1300–3776 m de altitude. A análise foi realizada através de infravermelho com transformada micro-Fourier. Pode ser observada a presença de nove tipos de microplásticos diferentes, incluindo polietileno, polipropileno, tereftalato de polietileno, polimetilmetacrilato, poliamida 6, policarbonato, copolímero de etileno-propileno ou liga de polietileno-polipropileno, poliuretano, e resina epóxi, com concentrações médias variando de 6,7 a 13,9 peças por litro, indicando a presença de poluição por plásticos em nuvens de grande altitude. Essa contaminação pode influenciar nas mudanças climáticas de formas pouco conhecidas, pois podem interferir na maneira como ocorre por exemplo a formação das nuvens, o que modificaria a dinâmica do clima.

O estudo de Aves et al. (2022) analisou amostras de neve de 19 locais na região da Ilha Ross, na Antártida. Os pesquisadores isolaram as partículas suspeitas e confirmaram a sua composição química usando espectroscopia de infravermelho com transformada micro-Fourier (µFTIR). Conseguiram identificar microplásticos em todas as amostras de neve da Antártica em uma concentração média de 29 partículas por litro, sendo as fibras o morfotipo mais comum e o tereftalato de polietileno (PET) o polímero mais comum. Para investigar as fontes, as trajetórias reversas da massa de ar foram executadas a partir do momento da amostragem. Estes indicam potencial transporte de longo alcance de até 6.000 km, assumindo um tempo de residência de 6,5 dias. Este estudo contribui para o crescente corpo de literatura sobre os microplásticos como um tipo de poluente transportado pelo ar de forma onipresente, estabelecendo sua presença inclusive na Antártica.

O estudo de De Coen (2024) mostrou que os microplásticos são um dos multifatores do estresse climático que os oceanos terrestres estão sofrendo. Os oceanos cobrem 70% do planeta, sendo responsáveis pela possibilidade de vida. Os resultados preliminares do estudo mostraram que os microplásticos, além de impactarem na flora e na fauna marinha, também contribuem para o estresse oceânico que abrange o aquecimento, a acidificação, a desoxigenação e as ondas de calor marinhas. Eles também interagem frequentemente com os sistemas biológicos afetando a alimentação, a nutrição e a dinâmica populacional marinha.

O estudo de Peng et al. (2020) relatou a presença de microplásticos em sedimentos das fossas abissais, as regiões mais profundas conhecidas do planeta, localizadas no Oceano Pacífico (4900m - 10.890m). O estudo mostrou a presença das micropartículas na quantidade média de 71,1 itens por kg de peso seco de sedimento. A descoberta dos contaminantes em profundidades tão remotas, levando em consideração que a velocidade de afundamento deles é muito lenta, sugere que há processos em cascata, transportando os microplásticos desde áreas terrestres e oceânicas, depois por águas intermediárias, chegando nos pontos mais profundos do oceano. O estudo propõe que as fossas abissais podem ser o sumidouro final para uma proporção significativa dos microplásticos descartados no oceano, e que a acumulação nesse ambiente pode ter grandes consequências para os frágeis ecossistemas do fundo do mar.

O estudo de Napper et al. (2020) mostrou que o Monte Everest não é mais um ambiente intocado. Resíduos têm se acumulado na montanha, e em sua grande parte compostos de plástico. A pesquisa detectou a presença de microplásticos na neve em concentração média de aproximadamente 30 MP por litro, e na água do riacho em concentração média de aproximadamente 1 MP por litro, em vários locais que antecederam e incluíram a Varanda (8.440 m.a.s.l), e a maioria era fibrosa. Isso caracteriza a poluição por microplásticos (MP) perto do topo da montanha mais alta da Terra e pode ilustrar as implicações para o meio ambiente e para as pessoas que vivem abaixo. Quando a sociedade começa a explorar áreas remotas, a gestão ambiental deve centrar-se em minimizar as fontes de poluição por MP.

O estudo de Tanhua et al. (2018) encontrou, em média, 26 partículas de microplástico por litro de amostras de água do mar coletadas perto do Ponto Nemo, por navios que participaram da Volvo Ocean Race. O Ponto Nemo está localizado a mais de 1.600 km de distância de três ilhas equidistantes, incluindo a Ilha de Páscoa, sendo considerado o ponto no oceano mais distante da terra em qualquer direção, chamado oficialmente de o pólo oceânico da inacessibilidade. Ele fica dentro de uma corrente chamada Giro do Pacífico Sul, que afasta águas ricas em nutrientes, tornando-o uma das partes mais sem vida do oceano. O estudo preliminar aponta que o ponto mais remoto do planeta está poluído.

Todas essas descobertas mostram a necessidade de uma ação internacional imediata em relação aos microplásticos que estão presentes desde os pontos mais altos dos continentes até os pontos mais longínquos e distantes do oceano, mostrando que a sua distribuição já afeta todos os lugares do nosso planeta.

3 MICROPLÁSTICOS NO CORPO HUMANO

Os microplásticos estão presentes em todos os ambientes naturais e podem entrar na nossa cadeia alimentar de diversas formas. A população humana aumenta a cada ano e, com ela, aumenta o consumo de itens feitos de plástico. O aumento do consumo aumenta a necessidade de diminuir o custo e a resistência de embalagens, garrafas, sacolas, recipientes para produtos de higiene pessoal, entre outros. Neste contexto, o plástico foi a solução para a substituição do vidro, da madeira, dos metais e de outros materiais mais custosos para indústria e, consequentemente, para o consumidor final (Lima et al., 2019; Olivatto et al., 2018).

Novos estudos são de fundamental importância para a saúde pública, pois já foi observada, em estudos científicos anteriores, a presença de microplásticos em vários órgãos do corpo humano como cérebro, fígado, rins, pulmões, coração, intestino; e estudos demonstram que as micropartículas são capazes de atravessar a barreira placentária e contaminar também o leite materno humano.

O estudo de Garcia et al. (2024) mostrou que os microplásticos presentes em alimentos e na água para consumo humano podem se espalhar através do corpo partindo do intestino para o cérebro. Os achados do estudo sugerem que a exposição aos microplásticos pode levar a alterações metabólicas nesses tecidos, indicando potenciais efeitos sistêmicos. As evidências indicaram que as partículas de MPs conseguem atravessar a barreira intestinal, entrando na circulação linfática e sistêmica, podendo levar ao acúmulo em tecidos como pulmões, fígado, rins e cérebro.

O estudo de Garcia et al. (2024) utilizou um modelo em ratos com o objetivo de obter uma visão crítica das implicações potenciais para a saúde. As descobertas indicaram que o poliestireno consumido por via oral ou microesferas de polímeros mistos podem se acumular em tecidos como o cérebro, o fígado e os rins. O estudo verificou também a presença de alterações metabólicas que foram dependentes da concentração e do tipo de polímero no cólon, fígado e cérebro após exposição.

O estudo de Marfella et al. (2024) observou amostras excisadas de placa carotídea retiradas de pacientes com desfecho primário de infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral ou morte por qualquer causa que apresentavam evidência de MPs em placa, e comparou com amostras de pacientes não apresentavam evidência de MPs. As análises para verificar a presença de MPs foi com o uso de pirólise – cromatografia gasosa – espectrometria de massa, análise de isótopos estáveis e microscopia eletrônica. Também foram avaliados os Biomarcadores inflamatórios através de ensaio imunoenzimático e de ensaio imuno-histoquímico.

O estudo observou que dos 304 pacientes incluídos no estudo, 257 pacientes completaram o acompanhamento médio de 33,7±6,9 meses. O polietileno foi detectado na placa da artéria carótida de 150 pacientes (58,4%), com nível médio de 21,7±24,5 μg por miligrama de placa; 31 pacientes (12,1%) também apresentavam quantidades mensuráveis de cloreto de polivinila, com nível médio de 5,2±2,4 μg por miligrama de placa. Polietileno foi detectado na artéria carótida deles. A sua presença em depósitos de gordura nas artérias levanta questões sobre o potencial papel dessas partículas no aumento de casos e no desenvolvimento de doenças cardiovasculares. Neste estudo, pacientes com placa na artéria carótida, nos quais foram detectadas MNPs, apresentaram maior risco de infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral ou morte por qualquer causa cardíaca do que aqueles nos quais não foram detectadas MNPs (Marfella et al., 2024).

O estudo de Amato-Lourenço et al. (2021) verificou a presença de microplásticos em tecidos pulmonares humanos obtidos em autópsias. Foram observadas partículas poliméricas (n=33) e fibras (n=4) em 13 das 20 amostras de tecido. Os microplásticos estão presentes no ar e podem ser inalados por humanos, mas ainda não se sabe quais são todos os efeitos deletérios que podem causar no sistema respiratório.

Este estudo observou que todas as partículas poliméricas tinham tamanho menor que 5,5 µm e as fibras variavam de 8,12 a 16,8 µm. Os polímeros mais frequentemente determinados foram o polietileno e o polipropileno. Os resultados deletérios para a saúde podem estar relacionados às características heterogêneas desses contaminantes no sistema respiratório após a inalação (Amato-Lourenço et al., 2021).

O estudo de Zhao, Liu e Xu (2023) avaliou o impacto que os MPs podem causar no intestino de pessoas com doença inflamatória intestinal (DII). A revisão bibliográfica do estudo revelou que os microplásticos poderiam ser um dos fatores que promovem o desenvolvimento da DII e podem causar inflamação intestinal grave.

A doença inflamatória intestinal (DII) é um problema de saúde pública e o número de pacientes com DII crônica ou aguda, incluindo doença de Crohn e colite ulcerosa (CU), vêm aumentando. Como o microambiente intestinal dos pacientes com DII está danificado, os MPs podem induzir lesões intestinais significativas e exacerbar o desenvolvimento de patologia intestinal nesses indivíduos. Os dados do estudo mostram que os MPs podem danificar a barreira intestinal e a estrutura da flora, aumentando o número de partículas microplásticas que podem passar pelo muco intestinal e pelas camadas de células epiteliais. Em última análise, a ação combinada de múltiplos fatores induz uma resposta inflamatória imunológica mais grave (Zhao, Liu e Xu, 2023).

Um estudo piloto de Schwabl et al. (2019) examinou as fezes de 8 voluntários saudáveis da Europa e da Ásia para verificar a presença, os tipos e as quantidades de MPs que humanos podem ingerir involuntariamente. Foram encontrados microplásticos em todas as 8 amostras de fezes dos voluntários, de 9 tipos diferentes, sendo o polipropileno (PP – presentes em embalagens de manteiga, de sorvetes, em tecidos, entre outras) e o polietileno (PE – presentes em sacolas de supermercados; embalagens de panificação, congelados; embalagem automática de alimentos e produtos industriais como leite e água; garrafas térmicas e outros produtos térmicos; frascos de cosméticos, medicamentos e alimentos; mangueiras e tubulações para água; entre outras) encontrados em maiores quantidades, sugerindo que os humanos ingerem involuntariamente MPs de várias fontes.

O estudo de Ragusa et al. (2021) coletou seis placentas humanas, de mulheres puérperas com gravidez fisiológica e analisou as amostras através de Microespectroscopia Raman para avaliar a presença de microplásticos. Foram encontrados 12 fragmentos MPs (variando de 5 a 10 μm de tamanho), com formato esférico ou irregular, em 4 placentas (5 no lado fetal, 4 no lado materno e 3 nas membranas corioamnióticas). Todas as partículas eram pigmentados; três foram identificados como polipropileno e nos outros nove fragmentos foi possível identificar apenas os pigmentos, todos utilizados em revestimentos artificiais, tintas, adesivos, gesso, tintas para dedos, polímeros e cosméticos e produtos de higiene pessoal. Este foi o primeiro estudo que revelou a presença de partículas artificiais na placenta humana e atravessando essa barreira, mostrando que uma vez dentro do corpo humano, essas partículas podem atingir os tecidos da placenta em todos os níveis, inclusive atravessando. Vale ressaltar que foram analisadas pequenas porções de placentas (~23g em relação a um peso total de ~600g), deixando a hipótese de que o número de MPs em toda a placenta é muito maior.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os microplásticos estão presentes em todos os ambientes, em todos os compartimentos ambientais e dentro do corpo humano. Podem entrar na nossa cadeia alimentar de várias formas, involuntariamente, sendo excretados em pequena quantidade, enquanto uma parte circula no organismo atingindo vários órgãos.

Os impactos da exposição mista a MPs na função tecidual através do metabolismo permanecem amplamente inexplorados, demonstrando a necessidade de mais estudos in vitro e in vivo. Os resultados de estudos anteriores mostram que há uma mobilidade dos MPs dentro e entre os tecidos biológicos após a exposição. Desta forma, é necessário enfatizar a importância de compreender o seu impacto metabólico.

São contaminantes ambientais emergentes de alta relevância pois, além de causarem danos, podem adsorver outros contaminantes perigosos e biomagnificarem na cadeia alimentar.

Desta forma, repensar os hábitos de consumo, avaliando a substituição e/ou a redução do uso de plástico se torna urgente. Ainda são incipientes no país (e no mundo) uma regulamentação que reduza efetivamente os riscos para a saúde humana e ambiental destes resíduos que, ao se degradarem no ambiente se tornam microplásticos. Assim, o desenvolvimento de novos estudos que podem auxiliar os mecanismos de controle e monitoramento, e que sejam de fácil acesso, são muito importantes.

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