A EXPERIMENTAÇÃO NO ENSINO DE QUÍMICA: DESAFIOS PARA AS ATIVIDADES PRÁTICAS NA VISÃO DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA NO INTERIOR DE GOIÁS

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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.13990397


Waleska Cristina Pereira Braga Neto1
Diego Arantes Teixeira Pires2


RESUMO
O presente trabalho tem como temática a experimentação no Ensino de Química, incluindo as condições dos laboratórios e os principais obstáculos para as aulas práticas, na visão de professores da Educação Básica. Aulas em laboratório, vivências práticas e experiências químicas são exemplos de práticas que deveriam extrapolar o cotidiano comum da sala de aula. A Química é uma Ciência experimental, e a teoria e a prática deveriam ser indissociáveis no ensino dessa disciplina. É inimaginável o Ensino de Químicas sem atividades experimentais. Com isso, visando compreender a realidade das aulas práticas de Química nas escolas públicas do município de Luziânia-GO, realizou-se uma pesquisa qualitativa, do tipo estudo de caso, para investigar, com professores da Educação Básica, as condições dos Laboratórios de Química ou Laboratórios de Ciências nas escolas, e os principais obstáculos para a realização de aulas práticas. Utilizou-se questionário como instrumento para coleta dos dados. Notou-se que muitas escolas públicas não possuem Laboratórios de Química ou Ciência no interior de Goiás, mesma a legislação indicando a obrigatoriedade desses espaços. Além disso, os professores também apontaram a falta de recursos, falta de materiais e currículos extensos como os principais obstáculos para realizar aulas práticas na disciplina de Química.
Palavras-chave: Ensino de Química. Experimentação. Laboratórios.

ABSTRACT
The present work focuses on experimentation in Chemistry teaching, including the conditions of laboratories and the main obstacles to practical lessons, from the perspective of Basic Education teachers. Laboratory classes, hands-on experiences, and chemical experiments are examples of practices that should extend beyond the common classroom routine. Chemistry is an experimental science, and theory and practice should be inseparable in the teaching of this subject. It is unimaginable to teach Chemistry without experimental activities. With this in mind, aiming to understand the reality of practical Chemistry classes in public schools in the municipality of Luziânia-GO, a qualitative case study was conducted to investigate, with Basic Education teachers, the conditions of Chemistry or Science Laboratories in schools, and the main obstacles to conducting practical lessons. A questionnaire was used as a data collection instrument. It was noted that many public schools in the interior of Goiás do not have Chemistry or Science Laboratories, even though legislation mandates the existence of these spaces. Additionally, teachers also pointed to a lack of resources, materials, and extensive curricula as the main obstacles to conducting practical lessons in Chemistry.
Keywords: Chemistry Teaching. Experimentation. Laboratories.

1 INTRODUÇÃO

1.1 Perspectivas para o Ensino de Química

A Química é uma disciplina essencial no currículo escolar, ao possibilitar aos alunos a compreensão dos fenômenos naturais e das interações entre os diversos materiais do mundo ao nosso redor. Contudo, o ensino de Química apresenta desafios específicos e não é sempre uma tarefa simples. A Química, como área do saber, está mais presente na vida cotidiana do que muitos imaginam. A pergunta frequente dos alunos, "por que devemos aprender algo que não vamos usar?", representa um desafio a ser enfrentado. Quando os conceitos de Química são relacionados com situações cotidianas, como a produção de alimentos, questões ambientais e o desenvolvimento de medicamentos, os alunos passam a perceber a importância dessa disciplina em suas vidas (Barbosa, 2016).

Hofstein e Lunetta (1982) destacam que a contextualização, especialmente por meio de atividades práticas em laboratório, pode tornar o aprendizado da Química mais significativo e motivador. Essas práticas auxiliam os estudantes a verem a aplicação prática da Química em seu dia a dia, o que contribui para o aumento do engajamento e da compreensão. Como afirmam Uhmann e Zanon (2013, p.10), “A distância entre o conceito e o concreto é a questão a que volto quando penso em linguagem em sala de aula. Os conceitos devem estar ligados a um determinado fato, mas não o são, o que cria um problema”.

Conforme Wartha (2011), é fundamental interpretar os conceitos químicos em seus diferentes níveis de representação (macroscópico, submicroscópico e simbólico) de maneira que estejam perfeitamente conectados ao longo da instrução, para que os alunos possam desenvolver seus próprios modelos explicativos. Além disso, é crucial ressaltar a evolução da Química e os desafios que ela impõe. Incorporar a filosofia da Química no ensino pode fornecer suporte teórico e humanizar o conteúdo, tornando-o mais relevante para os interesses dos alunos e as demandas sociais (Barbosa, 2016).

Outro ponto importante no ensino da Química é a interdisciplinaridade, que ainda é um obstáculo nas aulas. Ao permitir que os alunos tenham uma visão mais abrangente e integrada das ciências, a interdisciplinaridade desempenha um papel essencial. A Química está intrinsecamente conectada a disciplinas como Física, Biologia e Matemática, e explorar essas conexões enriquece a aprendizagem (Stefanidou; Skordoulis, 2014).

Ao estudar Química, é fundamental entender que muitos fenômenos químicos estão relacionados a princípios da Física. Por exemplo, ao discutir a cinética Química, é necessário compreender conceitos como energia e velocidade, abordados na Física. Essa compreensão auxilia os alunos a entenderem melhor os mecanismos das reações químicas, como as colisões moleculares e o impacto da energia nas transformações (Stefanidou; Skordoulis, 2014), além de ajudar os estudantes a não terem uma visão fragmentada das ciências.
Da mesma forma, a Química e a Biologia estão interligadas. O estudo da bioquímica, por exemplo, revela as reações químicas que ocorrem em organismos vivos, como o metabolismo e a estrutura de moléculas biológicas. A compreensão desses processos químicos auxilia na compreensão de sistemas biológicos e áreas como a farmacologia e a biotecnologia (Stefanidou; Skordoulis, 2014).

Explorando as conexões entre Química, Física e Biologia, os alunos conseguem perceber como essas disciplinas se inter-relacionam, proporcionando uma visão mais completa da ciência. Essa abordagem integrada torna o ensino de Química mais contextualizado e relevante. A interdisciplinaridade, portanto, pode estimular o pensamento crítico, a resolução de problemas e o desenvolvimento de habilidades de pesquisa, preparando os estudantes para lidar com desafios que exigem uma abordagem multidisciplinar. Entretanto, o ensino de Química ainda é muito fragmentado e pouco interdisciplinar, evidenciando conexões superficiais com outras áreas.

Outro obstáculo no ensino de Química está relacionado às estratégias pedagógicas, que ainda são pouco variadas e se baseiam predominantemente no uso de quadro e giz. Segundo Araújo (2015), variações nas estratégias de ensino, como, por exemplo, o uso de recursos audiovisuais, como vídeos e imagens, podem ajudar a ilustrar conceitos abstratos e tornar o ensino de Química mais acessível e envolvente. Além disso, a realização de atividades práticas podem permitir que os alunos experimentem a ciência de forma concreta, aplicando os conceitos aprendidos em situações reais.

1.2 Experimentação no Ensino de Química

As atividades experimentais desempenham um papel crucial no ensino de Química, proporcionando diversos benefícios que enriquecem a experiência de aprendizagem dos estudantes (Pires, 2024). Um dos maiores benefícios dessas atividades é desenvolver habilidades práticas e cognitivas (Pires, 2024). Durante os experimentos, os alunos são incentivados a praticar a observação detalhada, a coleta precisa de dados e a interpretação de resultados. Essas habilidades são valiosas não apenas para a Química, mas também para diversas áreas da vida, como a resolução de problemas cotidianos e o pensamento crítico (Soares, 2023; Pires, 2024).

Além disso, os experimentos ajudam a tornar mais concretos os conceitos abstratos de Química. Os alunos têm a oportunidade de visualizar, manusear e interagir com substâncias e reações químicas, tornando a aprendizagem mais tangível e acessível. A experimentação auxilia na transição do nível microscópico (invisível) para o macroscópico (visível), etapa fundamental na assimilação do conhecimento químico (Melo, 2019). Isso permite conectar a teoria à prática, auxiliando os estudantes a entender como os conceitos químicos se aplicam no mundo real, o que pode tornar o aprendizado mais relevante e significativo, uma vez que os alunos reconhecem a utilidade da Química em suas vidas. Ademais, as atividades experimentais incentivam a curiosidade e o interesse dos estudantes, já que, ao participarem de experimentos, eles frequentemente se tornam mais engajados e motivados ao explorar e descobrir por conta própria, criando um ambiente de aprendizado dinâmico e estimulante (Pires, 2024).

A ausência de experiência prática em laboratório pode resultar em uma compreensão superficial dos conceitos químicos. Como destaca Chassot (2010), a aprendizagem dos alunos pode ser empobrecida se a Química for ensinada apenas em uma sala de aula teórica. Sem a oportunidade de realizar experimentos e observar reações químicas diretamente, os alunos podem ter dificuldades em compreender completamente o conteúdo. Assim, a experimentação é essencial para oferecer uma compreensão mais profunda e completa da Química.

Em um país onde muitos estudantes nunca tiveram acesso a um laboratório de ciências, pode parecer contraditório questionar a validade das aulas práticas, especialmente considerando que a maioria das escolas não possui esses espaços. De fato, há quem defenda que muitos dos problemas no ensino de ciências resultam da ausência de laboratórios. Para esses defensores, a melhoria na qualidade do ensino depende de equipar as escolas com laboratórios e capacitar os professores para utilizá-los adequadamente (Borges, 2002). No entanto, mesmo em países onde o ensino experimental é amplamente disseminado, há debates contínuos sobre a eficácia dos laboratórios em promover o aprendizado desejado, mantendo a discussão ativa por anos (Borges, 2002).

Dessa discussão, parece haver um consenso de que o uso do laboratório no formato tradicional é desaconselhado, devido ao impacto negativo sobre a aprendizagem dos alunos. No modelo tradicional de laboratório, os estudantes realizam atividades práticas baseadas em observações e medições de fenômenos previamente definidos pelo professor (Borges, 2002). Geralmente, os alunos trabalham em pequenos grupos e seguem um roteiro pré-determinado. O objetivo pode ser testar uma lei científica, ilustrar conceitos aprendidos em aulas teóricas, descobrir ou formular uma lei sobre um fenômeno específico, ver na prática o que foi aprendido na teoria ou aprender a usar algum instrumento ou técnica laboratorial. Não se pode ignorar certos méritos desse tipo de atividade, como o trabalho em pequenos grupos, que permite a cada aluno interagir com os equipamentos e dividir responsabilidades e ideias. Além disso, o ambiente mais informal do laboratório contrasta com a formalidade das aulas teóricas, o que pode auxiliar a dinamizar as aulas.

Entretanto, existem diferentes tipos de experimentação, sendo a experimentação investigativa uma abordagem essencial no contexto científico-educacional. As atividades práticas podem ser classificadas como: empírico-indutivista, demonstrativas, ilustrativas, investigativas, conceituais e técnicas (Leite, 2018). Na experimentação investigativa, os alunos são encorajados a participar ativamente do processo científico, promovendo não só a aquisição de conhecimento, mas também o desenvolvimento de habilidades de pesquisa e análise crítica, conectando teoria e prática (Leite, 2018).

Conforme Leite (2018), a abordagem investigativa destaca a importância de estimular a curiosidade e a autonomia dos estudantes. Segundo o mesmo autor, a experimentação vai além de uma simples atividade prática, sendo também um meio de desenvolver o pensamento crítico e uma compreensão mais profunda dos conceitos científicos.

Por outro lado, a falta de recursos, infraestrutura e orientação adequada podem representar obstáculos significativos para a realização de aulas práticas de Química, como discutido por Gilbert e Justi (2002). Além disso, eles reforçam que "não basta apenas ter laboratórios; é importante que eles sejam bem equipados e adequados para as atividades propostas" (Gilbert; Justi, 2002, p. 146). Assim, uma infraestrutura adequada e a capacitação de professores são fatores essenciais para garantir a eficácia das atividades experimentais no ensino de Química.

1.3 Os Laboratórios de Química no Brasil

Nunes (2022) analisa a relação entre a infraestrutura das escolas, conforme o censo escolar de 2017, e o desempenho dos alunos na Prova Brasil. Um dos elementos de infraestrutura examinados foram os laboratórios de ciências. Segundo os dados apresentados, apenas 22,7% das escolas públicas no país possuem esse tipo de laboratório. A situação se torna mais grave ao observar a distribuição de laboratórios por regiões: no Norte, apenas 9,1% das escolas têm laboratórios de ciências, no Nordeste esse percentual é de 11,4%, no Centro-Oeste é de 20,8%, no Sudeste de 30,9% e no Sul de 44,5%. Embora a infraestrutura no Sul e Sudeste seja ligeiramente melhor, menos da metade das instituições de ensino públicas ainda carece de um espaço dedicado a aulas práticas de ciências da natureza. Essa realidade reflete no desempenho dos alunos, que é mais baixo nas regiões com infraestrutura escolar mais deficiente.

Conforme Nunes (2022), a infraestrutura mínima necessária para um laboratório de Química deve incluir os requisitos básicos de segurança e a disponibilidade dos materiais necessários para as aulas. Seria benéfico que houvesse, pelo menos, um técnico capacitado para auxiliar no manuseio dos equipamentos e materiais durante as atividades. Um laboratório não se resume apenas a um espaço físico; é fundamental ter também uma infraestrutura adequada.

Nunes (2022) também destaca a importância de entender o papel dos laboratórios e das aulas práticas no processo de ensino-aprendizagem da Química, ressaltando a necessidade de atenção e investimento nesse espaço. Para abordar esse problema, os autores sugerem, além de investimentos públicos, o desenvolvimento de projetos interdisciplinares e a capacitação dos professores para atuarem nesse ambiente.

Apesar do crescente debate sobre a utilização do laboratório no ensino prático de Química, a realidade nas escolas muitas vezes contrasta com as conclusões desses estudos. Muitas escolas sequer possuem um laboratório, e alguns professores acreditam que a utilização do laboratório pode ser complexa e difícil de gerenciar, especialmente devido ao grande número de alunos por sala e à rigidez dos currículos (Silva, 2019). Dessa forma, mesmo quando há um laboratório disponível, o professor pode optar por não o utilizar.

As atividades práticas são fundamentais para proporcionar uma compreensão mais profunda e duradoura dos conceitos de Química, além de tornar a disciplina mais envolvente e motivadora para os alunos. É importante reconhecer que a falta de recursos, tanto em infraestrutura quanto em materiais, é uma questão significativa. Os laboratórios de Química precisam de instrumentos e substâncias específicas, e nem todas as escolas têm acesso a esses recursos. Uma alternativa viável pode ser a realização de experimentos com materiais simples e de baixo custo, a fim de contornar a escassez de laboratórios e reagentes (Silva, 2019).

Nesse contexto, este trabalho planeja investigar a presença e as condições dos Laboratórios de Química e/ou Laboratórios de Ciências nas escolas públicas do Município de Luziânia-GO. Também visa compreender, na perspectiva dos professores, quais são os principais obstáculos para a não realização de atividades práticas no ensino de Química.

2 METODOLOGIA

O presente trabalho apresenta uma metodologia qualitativa de pesquisa, do tipo estudo de caso (Gil, 2017). A pesquisa qualitativa é uma abordagem concentrada na compreensão e na interpretação de determinados fenômenos estudados (Gil, 2017). Ao contrário da pesquisa quantitativa, que se baseia em dados numéricos e estatísticas, a pesquisa qualitativa visa explorar as experiências, percepções e significados de um determinado tema (Gil, 2017). Um estudo de caso é uma abordagem concentrada na investigação de um caso específico, que pode ser uma pessoa, um grupo, uma organização, um evento ou um fenômeno. Esse método envolve a coleta de dados, buscando compreender o contexto e os detalhes do caso em questão (Gil, 2017).

Os participantes da pesquisa foram professores de Química do Ensino Médio e professores de Ciências do novo ano do Ensino Fundamental. A escolha dos participantes ocorreu pelo contato dos mesmos com os autores do trabalho. Para a coleta de dados, utilizou-se um questionário, com perguntas objetivas e dissertativas (Gil, 2017). Os dados coletados por meio de questionários são frequentemente estruturados, facilitando a análise qualitativa. Além disso, pode ser útil ao procurar identificar padrões, tendências ou relações nos dados.

Para as perguntas objetivas, os resultados foram analisados em porcentagens, e para as perguntas dissertativas, realizou-se uma análise interpretativa, em que as respostas foram agrupadas por tópicos, seja pelo número de repetições do tópico ou pela importância do mesmo (Gil, 2017). As respostas do questionário foram comparadas com resultados de outros trabalhos da literatura.

Nesse sentido, realizou-se uma pesquisa com 15 professores de Química do Ensino Médio ou de Ciências do nono ano do Ensino Fundamental, todos de escolas públicas e todos do Município de Luziânia-GO. Todos participaram de forma voluntária e anônima. Os professores foram convidados a responderem um questionário, observável no Quadro 1.

Quadro 1: Perguntas do questionário aplicado aos professores de Química e Ciências.

1. Qual o seu vínculo empregatício com a instituição? ( ) Servidor público ( ) Contrato de trabalho.

2. Licenciado em Química? ( ) Sim ( ) Não

3. Possui alguma Pós-Graduação? ( ) Sim ( ) Não

4. A instituição que você trabalha atualmente possui laboratório de Química ou Laboratório de Ciências? ( ) Química ( ) Ciências ( )Ambos ( ) Outros.

5. Qual a frequência das aulas de Química no laboratório? ( ) 1 vez por semana ( ) De 15 em 15 dias ( ) 1 vez por mês ( ) 1 vez por bimestre ( ) 1 vez por semestre ( ) 1 vez por ano ( ) Não utilizo laboratório.

6. Você acha que o Laboratório de Química contribui para o processo de ensino-aprendizagem dos conteúdos da disciplina? Justifique.

7. A estrutura do laboratório de Química (física e de recursos) atende as necessidades práticas das aulas? ( ) Sim ( ) Não

8. Quais são os principais desafios para a realização das atividades experimentais em suas aulas? Sua resposta.

Fonte: próprios autores (2023).

3 RESULTADOS E DISCUSSÕES OU ANÁLISE DOS DADOS

Inicialmente, visamos conhecer o perfil dos participantes, fizeram-se três perguntas relacionadas ao vínculo empregatício com a instituição em que trabalham e à formação (perguntas 1, 2 e 3 do questionário). Os resultados indicaram que 60% dos entrevistados são servidores públicos efetivos, enquanto 40% possuem contrato temporário de trabalho. Nota-se, no município de Luziânia, um excesso de professores temporários nas escolas. Essa dinâmica pode influenciar diretamente a educação local. A presença significativa de servidores públicos pode proporcionar estabilidade, mas a contratação de professores também pode trazer flexibilidade e adaptabilidade ao ambiente educacional. É essencial examinar como essa distribuição impacta especificamente a qualidade do ensino em Luziânia e se as diferentes modalidades de contratação atendem às necessidades da comunidade escolar. Um ponto positivo dessa distribuição em Luziânia é a diversidade no corpo docente, proporcionando flexibilidade e variedade de experiências pedagógicas. No entanto, um ponto negativo pode ser a possível falta de estabilidade, especialmente se os contratos não forem renovados consistentemente, o que poderia afetar a continuidade e o desenvolvimento a longo prazo do ambiente educacional. Esse excesso de professores temporários no município de Luziânia já havia sido observado por Silva (2015), e continua até hoje, podendo trazer prejuízo para a qualidade das aulas e também a continuidade e a previsibilidade de trabalhos e projetos.

Em seguida, indagamos se os entrevistados eram profissionais licenciados em Química, e obteve-se um índice de 80% de profissionais licenciados e 20% não licenciados. É interessante notar que, entre os licenciados em Química, todos possuíam pós-graduação na área. Nota-se que ainda há profissionais não licenciados atuando em sala de aula, o que novamente pode interferir na qualidade do ensino. Silva (2015) já indicava a presença de professores não licenciados dando aulas de Química em Luziânia, o que pode interferir negativamente na qualidade do ensino. De 2015 até atualmente, o número de professores não licenciados em sala de aula diminuiu, mas ainda é uma realidade que atrapalha a educação.

Prosseguindo com a pesquisa, direcionamos perguntas objetivas para coletar dados sobre a existência de laboratórios de química e/ou ciências nas instituições onde os entrevistados trabalham (pergunta 4). Os resultados revelaram que 54% das instituições possuem Laboratório de Química ou Laboratório de Ciências, enquanto 46% das instituições não têm nenhum laboratório.

Segundo Nunes (2022), o estado que apresenta o maior número de escolas públicas com Laboratórios de Ciências/Química é o Paraná, com 55% das escolas. Nos demais estados, o quantitativo variou entre 4 e 36%. Notou-se que o município de Luziânia apresenta uma porcentagem de laboratório nas escolas públicas maior que a média nacional, de 22,7%, e ficando bem próximo aos números do melhor estado. Entretanto, segundo Nunes (2022), existem legislações que indicaram a obrigatoriedade de todas as escolas públicas possuírem um laboratório de Ciências, fato ainda bem longe de ser alcançado por Luziânia. Nunes (2022) ainda indica a importância dos laboratórios e das aulas práticas para o ensino de Ciências, e a ausência de laboratórios nas escolas pode trazer um grande prejuízo educacional.

Para os profissionais que usam laboratórios de Química ou Ciência, investigamos a frequência das aulas ministradas nesses espaços (pergunta 5). Constatou-se que 54% dos participantes não utilizam o laboratório. Como 46% dos professores não possuem laboratórios na escola, um professor que possui laboratório na escola optou por não realizar nenhuma aula de Química no Laboratório. Dos que usam o laboratório para as aulas de Química, 6,7% utilizam a cada 15 dias, 6,7% o utilizam uma vez por bimestre, 13,4% o utilizam uma vez por mês, e 20,1% uma vez ao ano.

Mesmo nas escolas que possuem um laboratório, notou-se uma baixa frequência para o uso desse espaço nas aulas de Química ou Ciências. Nunes (2022) e Silva (2019) já destacam a importância das aulas práticas para as aulas de Química, visto que é uma ciência experimental, e mesmo assim, os laboratórios ainda são pouco utilizados. E qual seria o motivo para a baixa frequência do uso dos laboratórios? Leite (2018) e Silva (2019) indicam possíveis obstáculos para as ausências de aulas nos laboratórios, como a deficiência dos laboratórios, inadequação dos espaços para as aulas experimentais, grande curricular, escassez tempo disponibilizado, trânsito de alunos no laboratório, montagem dos experimentos, escassez de roteiros adequados, formação dos professores, dentre outros motivos.

Em seguida, exploramos questões discursivas com o intuito de obter percepções dos profissionais sobre a contribuição do laboratório de Química para o processo de ensino-aprendizagem dos conteúdos da disciplina (pergunta 6). Dentre as 15 respostas analisadas, 8 indicaram que o laboratório de Química pode sim auxiliar no processo de ensino-aprendizagem, justificando a correlação e importância de unir teoria e prática, como pode ser notado em alguns dizeres: “Sim, muito. Aliar prática à teoria é um modo eficaz para fazer com que o aluno construa o conhecimento” (professor 2), “Contribui porque a química é uma ciência experimental, sendo indispensável a prática para seu efetivo aprendizado” (professor 4) e “Com certeza. Aliar a prática a teoria estudada em sala de aula auxilia na construção do conhecimento” (professor 14). Leite (2018), Silva (2019) e Pires (2024) já indicam a importância da indissociabilidade da teoria e prática para o ensino de Química, visto a natureza dessa ciência. Com isso, notou-se que a maioria dos professores indica a grande importância da relação teoria-prática.

Percebeu-se que todos os respondentes concordam que o laboratório desempenha um papel relevante nesse processo. Essa consonância entre a percepção expressa na pergunta e os resultados da pesquisa de Hofstein (1982), Borges (2002) e Nunes (2022), que fortalecem a ideia de que o laboratório de Química é amplamente reconhecido como benefício para o aprendizado dos conteúdos da disciplina.

Entretanto, notou-se que alguns professores indicam uma visão simplista e empírico-indutivista em relação às atividades práticas, quando indicam que as atividades práticas são importantes para provar, na prática, a teoria (Silva, 2019). Tais indicações podem ser notadas em algumas falas, como: “Sim, coloca em prática os conceitos teóricos e estimula o interesse do aluno pelo conteúdo” (professor 6), “Contribui muito, pois as aulas práticas para os alunos são avaliadas de forma positiva. Conseguimos na prática aplicar a teoria estudada” (professor 9) e “Sim, porque pode mostrar na prática a teoria aplicada em sala” (professor 13). As atividades práticas devem ir muito além do que apenas provar, na prática, a teoria estudada (Silva; 2019).

Em seguida, indagou-se sobre a avaliação da infraestrutura dos laboratórios (pergunta 7). A expressiva resposta de 80% dos professores indica uma insatisfação com a infraestrutura dos laboratórios, destacando um desafio significativo na oferta de condições ideais para o ensino prático.

A LDB (Brasil, 1996), ao preconizar a busca pela qualidade da educação, ressalta a importância de instalações apropriadas, equipamentos adequados e recursos que promovam o pleno desenvolvimento dos estudantes. Diante disso, a insatisfação manifestada na pesquisa sugere a necessidade urgente de intervenções e investimentos para melhorar a infraestrutura dos laboratórios, garantindo que esteja, em conformidade não apenas com as expectativas da comunidade escolar, mas também com as normativas educacionais do país. Esse alinhamento é essencial para proporcionar uma experiência educacional prática e efetiva, contribuindo para o alcance dos objetivos educacionais preconizados pela LDB (Brasil, 1996) em Luziânia.

Para a oitava pergunta do questionário, indagaram-se quais os principais desafios e obstáculos para a realização de atividades experimentais nas aulas. Um dos temas mais respondidos foi a falta de laboratório, como na fala do professor 5: “Não ter laboratório no Colégio”. Essa resposta já era esperada, visto que quase metade das escolas não possui laboratórios. Silva (2019) indica que a falta de laboratório pode ser um obstáculo para as aulas práticas, mas que existem maneiras de tentar contornar esse problema, como, por exemplos, realizar atividades práticas em simuladores computacionais, vídeos, filmes, horta na escola, visitas técnicas, dentre outros.

Outra categoria bastante citada, com indicação de 9 professores dentre os 15, foi a falta de materiais, como reagentes e vidrarias, como pode ser visto nas respostas de alguns professores: “Apesar dos investimentos recentes e das aquisições, a falta de materiais e equipamentos em geral, representam um desafio” (professor 6), “Laboratório sem equipamentos e reagentes” (professor 8) e “Falta de laboratório, de equipamentos e reagentes” (professor 10). A deficiência de reagentes e vidrarias também é um dos obstáculos para a inserção da experimentação no ensino de Química, conforme apontado por Silva (2019). E uma alternativa para tal problema seria a utilização de experimentos com materiais simples e de baixo custo, encontrados no cotidiano do aluno, como, por exemplo, balas de menta e refrigerantes (Pires, 2013). Entretanto, conforme indicado pela LDB (Brasil, 2019), é importante que o espaço escolar tenha instalações apropriadas, equipamentos adequados e recursos que promovam o pleno desenvolvimento dos estudantes, incluindo os laboratórios de ciências. E as secretarias educacionais devem ser cobradas.

Os desafios enfrentados na realização de atividades experimentais nas aulas são diversos. Um dos obstáculos primordiais é a carência de material e espaço físico adequado para as aulas práticas, evidenciando a necessidade de investimentos em recursos e infraestrutura.

Além disso, a falta de reagentes emerge, conforme indicado pelos professores 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 10, 11 e 12, como uma preocupação significativa, afetando diretamente a qualidade e a variedade das experiências propostas. Essa limitação pode comprometer a capacidade dos educadores de proporcionar uma abordagem abrangente e enriquecedora no ensino experimental.

A falta de tempo, problemas curriculares e números de alunos por turma também foram apontados como obstáculos, como nas falas: “Laboratório com pouca estrutura, poucos reagentes. Falta de tempo para planejar aulas experimentais” (professor 3), “Material e tempo” (professor 7) e “Outro problema é a inadequação da disciplina na grade curricular. A aula prática é de 50 minutos para cada turma contendo quase 40 alunos” (professor 2). Problemas como grade curricular, escassez de tempo e trânsito do grande número de alunos pelo laboratório também foram apontados por Silva (2019) para justificar a não realização de aulas práticas no Ensino da Química.

Diante desses desafios, torna-se crucial uma abordagem integrada que envolva investimentos em recursos, priorização da segurança dos alunos e estratégias eficazes de gestão do tempo. Essas medidas são essenciais para viabilizar um ambiente propício ao ensino experimental, garantindo uma experiência rica e efetiva. De acordo com Nunes (2022), existem desafios significativos para a realização de atividades práticas em sala de aula, e isso está relacionado ao baixo financiamento para recursos pedagógicos. Em suma, os desafios não se limitam à falta de laboratórios, mas também à necessidade de recursos pedagógicos para promover práticas diversificadas e atender às demandas educacionais diversas.

A experimentação no ensino de Química desempenha um papel crucial no processo educacional, proporcionando aos alunos a oportunidade de vivenciar a ciência de forma prática e significativa. A superação dos desafios apresentados nesta pesquisa requer um esforço conjunto de gestores educacionais, legisladores e comunidade acadêmica, visando proporcionar uma educação de qualidade, que promova o interesse e a compreensão dos alunos.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em Luziânia-GO, os professores enfrentam diversos desafios para a realização de atividades experimentais em suas aulas. A falta de recursos materiais, como reagentes, vidrarias e equipamentos, é mencionada como um dos principais obstáculos. Além disso, a falta de tempo para planejar as aulas experimentais e a falta de pessoal especializado, como técnicos de laboratório, também são apontados como dificuldades.

Esses resultados ressaltam a necessidade de investimentos na infraestrutura das instituições de ensino, com a disponibilização de recursos materiais e humanos adequados para o desenvolvimento de atividades práticas em Química. Além disso, é importante que sejam criadas políticas públicas que valorizem o ensino de Química e promovam a formação e capacitação dos professores nessa área.

Em conclusão, os laboratórios de Química são essenciais para o ensino dessa ciência, oferecendo experiências práticas enriquecedoras. Porém, a falta de recursos adequados representa um desafio significativo em Luziânia-GO. Investimentos e ações são necessários para superar esses obstáculos e garantir uma educação de qualidade. Algumas sugestões incluem investimentos em infraestrutura, capacitação de professores e parcerias com empresas e universidades. Estas ações podem ser implementadas integradamente para melhorar o ensino de Química na região.

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1 Discente do Curso Superior de Licenciatura em Química do Instituto Federal de Goiás, Campus Luziânia. e-mail: [email protected]

2 Docente do Curso Superior de Licenciatura em Química do Instituto Federal de Goiás (IFG), Campus Luziânia. Mestre em Química (UnB) e Doutor em Química (UnB). e-mail: [email protected]