O RECONHECIMENTO DA PROTEÇÃO DE DADOS COMO DIREITOS FUNDAMENTAIS: UMA ANÁLISE À LUZ DOS IMPACTOS DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 115/2022
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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.14010301
Guilherme Depes de Paiva1
José Augusto Rodrigues de Paiva
RESUMO
O estudo investiga os impactos da Emenda Constitucional nº 115/2022 no reconhecimento dos direitos de proteção de dados como fundamentais, explorando sua influência na sociedade líquida de Bauman. O objetivo é analisar como a emenda redefine a comunicação em um ambiente fluido e com forte presença da internet, e sua relação com a dignidade humana. Os objetivos específicos incluem investigar a sociedade líquida, a fluidez da comunicação, o papel da dignidade como ampliadora dos direitos fundamentais e as implicações jurídicas, sociais e éticas da proteção de dados. A metodologia é bibliográfica, com análise qualitativa e crítica da literatura. Espera-se que o estudo avance o conhecimento acadêmico sobre o tema e ofereça subsídios para a implementação da Emenda Constitucional nº 115/2022. A conclusão ressalta a importância do diálogo entre sociedade, setor privado e governo para garantir a eficácia dos direitos de proteção de dados e a preservação dos princípios constitucionais do Estado Democrático de Direito.
Palavras-chave: Proteção De Dados, Direitos Fundamentais, Emenda Constitucional Nº 115/2022.
ABSTRACT
The study investigates the impact of Constitutional Amendment 115/2022 on the recognition of data protection rights as fundamental, exploring its influence on Bauman's liquid society. The aim is to analyze how the amendment redefines communication in a fluid environment with a strong internet presence, and its relationship with human dignity. The specific objectives include investigating the liquid society, the fluidity of communication, the role of dignity as an amplifier of fundamental rights and the legal, social and ethical implications of data protection. The methodology is bibliographical, with a qualitative and critical analysis of the literature. It is hoped that the study will advance academic knowledge on the subject and provide support for the implementation of Constitutional Amendment 115/2022. The conclusion emphasizes the importance of dialogue between society, the private sector and the government to guarantee the effectiveness of data protection rights and the preservation of the constitutional principles of the Democratic Rule of Law.
Keywords: Data Protection, Fundamental Rights, Constitutional Amendment No. 115/2022.
1 INTRODUÇÃO
O reconhecimento da proteção de dados como direitos fundamentais constitui um marco significativo no desenvolvimento dos regimes jurídicos contemporâneos, especialmente à luz da Emenda Constitucional nº 115/2022. Esta emenda, ao conferir status constitucional aos direitos de proteção de dados, sinaliza uma mudança paradigmática na abordagem do Estado em relação à privacidade e à segurança da informação. Neste contexto, uma análise abrangente dos impactos dessa emenda se faz imperativa, considerando não apenas suas implicações legais, mas também suas repercussões sociais, políticas e econômicas (Furtado et al., 2022).
A consagração dos direitos de proteção de dados como fundamentais representa um reconhecimento da importância intrínseca da privacidade e da autodeterminação informativa na sociedade contemporânea. Sob essa ótica, a Emenda Constitucional nº 115/2022 confere um arcabouço normativo robusto para a proteção dos dados pessoais, reconhecendo sua relevância não apenas no contexto das relações individuais, mas também no âmbito das políticas públicas, da segurança nacional e do desenvolvimento econômico (Furtado et al., 2022).
No entanto, a consagração dos direitos de proteção de dados como fundamentais também suscita desafios significativos, especialmente no que se refere à harmonização desses direitos com outros valores constitucionais, como a liberdade de expressão, o direito à informação e a segurança pública. A complexidade dessas questões exige uma abordagem cuidadosa e equilibrada por parte dos órgãos legislativos, judiciais e executivos, a fim de garantir a eficácia dos direitos de proteção de dados sem comprometer outros valores e interesses igualmente importantes para a sociedade. Além disso, a Emenda Constitucional nº 115/2022 também implica a necessidade de adaptação e modernização das estruturas institucionais e dos mecanismos de governança relacionados à proteção de dados. Isso inclui a implementação de políticas públicas eficazes, a criação de autoridades reguladoras especializadas, o fortalecimento dos sistemas de segurança da informação e a promoção da educação digital e a conscientização sobre a importância da proteção de dados pessoais (De Souza; Acha, 2022).
No plano internacional, a consagração dos direitos de proteção de dados como fundamentais coloca o Brasil em consonância com as tendências globais em matéria de governança da internet e proteção da privacidade. Isso pode fortalecer a posição do país como um parceiro confiável em questões relacionadas à segurança cibernética, ao comércio eletrônico e à cooperação internacional em matéria de proteção de dados (Scheuermann et al., 2023).
Em suma, o reconhecimento da proteção de dados como direitos fundamentais, à luz da Emenda Constitucional nº 115/2022, representa um avanço significativo na consolidação do Estado Democrático de Direito e na promoção dos valores constitucionais no contexto digital. No entanto, os desafios e as complexidades inerentes a essa mudança exigem uma abordagem multifacetada e colaborativa, que envolva não apenas os poderes constituídos, mas também a sociedade civil, o setor privado e a comunidade acadêmica. Apenas por meio de um diálogo amplo e inclusivo será possível garantir a efetiva proteção dos direitos de proteção de dados, preservando ao mesmo tempo os demais princípios e valores que fundamentam nossa ordem jurídica e social.
2 SOCIEDADE LÍQUIDA E A FLUIDEZ DA COMUNICAÇÃO
A análise da sociedade líquida e da fluidez da comunicação nos leva a uma reflexão profunda sobre as dinâmicas sociais e as interações humanas na era digital. Zygmunt Bauman, em suas obras, descreve a sociedade contemporânea como líquida, caracterizada pela falta de estruturas sólidas e pela instabilidade das relações sociais. Nesse contexto, a comunicação adquire uma natureza fluida, moldada pela constante mutação das tecnologias e pela rapidez com que as informações são compartilhadas e consumidas. Essa fluidez da comunicação desafia os modelos tradicionais de interação e colaboração, abrindo espaço para novas formas de expressão e engajamento (Trevizan et al., 2023).
Na sociedade líquida descrita por Bauman, as fronteiras entre o público e o privado, o local e o global, o real e o virtual tornam-se cada vez mais difusas. Isso se reflete na maneira como comunica-se e se relacionamos uns com os outros, onde as conexões digitais muitas vezes substituem ou complementam as interações face a face. Essa fluidez da comunicação cria novas possibilidades de conexão e participação, mas também traz consigo desafios significativos em termos de privacidade, segurança e confiabilidade das informações. (Trevizan et al., 2023)
Um aspecto importante da fluidez da comunicação na sociedade líquida é a rapidez com que as informações são compartilhadas e disseminadas nas redes sociais e outras plataformas online. Enquanto isso oferece oportunidades para a disseminação rápida de notícias e ideias, também aumenta o risco de desinformação, rumor e manipulação. A capacidade de discernir entre informações verdadeiras e falsas torna-se, portanto, uma habilidade crucial em um ambiente comunicativo fluido e em constante mudança. (Bauman, 2007)
Além disso, a fluidez da comunicação na sociedade líquida também levanta questões sobre a autenticidade e a profundidade das interações humanas. À medida que torna-se mais dependentes de dispositivos digitais para nos conectar com os outros, corremos o risco de perder a conexão emocional e a empatia que são fundamentais para relacionamentos saudáveis e significativos. A comunicação online, muitas vezes caracterizada pela brevidade e pela superficialidade, pode minar a qualidade e a profundidade das relações interpessoais, criando uma sensação de desconexão e alienação (Morais; Souza, 2018).
No entanto, apesar dos desafios colocados pela fluidez da comunicação na sociedade líquida, também há oportunidades significativas para o engajamento cívico, a expressão criativa e a construção de comunidades online. As redes sociais e outras plataformas digitais oferecem espaços para compartilhar experiências, trocar ideias e mobilizar pessoas em torno de causas comuns. Ao mesmo tempo, é importante reconhecer os limites e as limitações dessas plataformas, garantindo que sejam usadas de forma ética e responsável para promover o bem comum e o progresso social (Costa, 2009).
A análise do reconhecimento da proteção de dados como direitos fundamentais, à luz dos impactos da Emenda Constitucional nº 115/2022, revela nuances cruciais que permeiam a compreensão da comunicação em um contexto jurídico em constante evolução. O advento dessa emenda constitucional marcou um marco significativo no panorama legal, reconhecendo explicitamente a importância dos dados pessoais como um atributo inalienável dos indivíduos em sociedades contemporâneas impregnadas pela tecnologia. Nesse sentido, compreender os desdobramentos desse reconhecimento implica uma incursão profunda na intersecção entre os direitos fundamentais e a proteção de dados, ressaltando sua relevância no contexto comunicativo (Costa, 2009).
Em primeiro plano, é imperativo destacar que a proteção de dados emerge como um elemento central na salvaguarda da privacidade e da dignidade humana. A evolução tecnológica e a proliferação de sistemas de informação têm exposto os indivíduos a um escrutínio sem precedentes, suscitando preocupações sobre a manipulação e o uso indevido de informações pessoais. Nesse contexto, a Emenda Constitucional nº 115/2022 desempenha um papel crucial ao elevar a proteção de dados ao status de direito fundamental, conferindo-lhe a mesma proteção jurídica concedida a liberdades civis e políticas tradicionais (Favero et al., 2022).
Além disso, a compreensão da comunicação no âmbito da proteção de dados demanda uma análise cuidadosa dos princípios e diretrizes que regem a coleta, o processamento e a disseminação de informações pessoais. A transparência, a finalidade, a minimização de dados e a responsabilidade tornam-se pilares fundamentais para garantir uma comunicação ética e respeitosa dos direitos individuais. Nesse sentido, a Emenda Constitucional nº 115/2022 não apenas reconhece a importância desses princípios, mas também estabelece uma base jurídica sólida para sua aplicação efetiva, assegurando a integridade e a confiança nas relações comunicativas (Simeão, 2022).
Ademais, a interseção entre proteção de dados e direitos fundamentais lança luz sobre a necessidade premente de conciliar interesses conflitantes em uma sociedade cada vez mais conectada digitalmente. Enquanto o avanço tecnológico promete inovações e conveniências sem precedentes, também acarreta riscos significativos para a privacidade e a autonomia individual. Nesse contexto, a Emenda Constitucional nº 115/2022 representa um avanço legislativo crucial ao estabelecer limites claros para a atuação do Estado e de entidades privadas na coleta e no uso de dados pessoais, garantindo assim uma comunicação justa e equitativa. Assim, a análise dos impactos da Emenda Constitucional nº 115/2022 sobre a compreensão da comunicação revela não apenas os desafios inerentes à proteção de dados, mas também as oportunidades para fortalecer os fundamentos democráticos de uma sociedade. Ao reconhecer os dados pessoais como direitos fundamentais, abre-se espaço para um diálogo mais amplo e inclusivo sobre as políticas de privacidade e as práticas comunicativas responsáveis, promovendo assim uma cultura de respeito mútuo e proteção dos direitos humanos (Souza, 2022).
A liquidez social descrita por Bauman reflete-se na forma como as relações humanas são construídas e mantidas na era digital. As interações online, marcadas pela efemeridade e pela falta de fronteiras claras entre o público e o privado, desafiam os conceitos tradicionais de identidade e intimidade. Nesse contexto, a proteção de dados adquire uma importância ainda maior, atuando como um escudo contra a fragmentação e a manipulação da identidade pessoal em um ambiente permeado pela fluidez e pela superficialidade das conexões virtuais.
Além disso, a análise da sociedade líquida à luz da proteção de dados lança luz sobre os paradoxos e as contradições inerentes a essa era da hiperconectividade. Enquanto a tecnologia promete facilitar a comunicação e a troca de informações, também suscita preocupações sobre a privacidade e a autonomia individuais. A Emenda Constitucional nº 115/2022 busca enfrentar esses desafios ao reconhecer a proteção de dados como um direito fundamental, estabelecendo assim um equilíbrio delicado entre os benefícios da inovação tecnológica e os imperativos éticos da privacidade e da dignidade humana (Souza, 2022).
Ademais, a liquidez social descrita por Bauman ressalta a importância da proteção de dados como um mecanismo de empoderamento individual em um mundo cada vez mais dominado por grandes corporações e algoritmos opacos. A capacidade de controlar e gerenciar nossas próprias informações pessoais não apenas preserva nossa autonomia e liberdade, mas também desafia as estruturas de poder assimétricas que permeiam a sociedade líquida. Nesse sentido, a Emenda Constitucional nº 115/2022 representa não apenas um avanço jurídico, mas também um movimento em direção a uma sociedade mais justa e equitativa, onde todos os indivíduos têm o direito de moldar sua própria narrativa digital (Souza, 2022).
Assim, a análise da sociedade líquida à luz da proteção de dados sugere que a Emenda Constitucional nº 115/2022 é apenas o primeiro passo em direção a uma compreensão mais profunda e abrangente dos desafios éticos e sociais impostos pela revolução digital. À medida que navega-se por esse mar de incertezas e possibilidades, é imperativo que permanecer vigilantes na defesa dos direitos fundamentais e na promoção de uma cultura de respeito mútuo e responsabilidade compartilhada. A proteção de dados, nesse contexto, emerge como um farol de esperança em meio à turbulência da sociedade líquida, guiando-nos em direção a um futuro mais justo, transparente e humano (Souza, 2022).
A concepção de fluidez em Bauman permeia não apenas as relações sociais, mas também a estrutura e o funcionamento da sociedade contemporânea como um todo. Segundo o pensador polonês, vivemos em uma era marcada pela liquidez, onde as fronteiras entre o sólido e o fluido, o permanente e o transitório, tornam-se cada vez mais tênues. Essa fluidez se manifesta de maneira particularmente evidente no contexto das relações humanas e da comunicação, onde a rapidez e a efemeridade das interações online desafiam os conceitos tradicionais de identidade e intimidade (Bauman, 2017).
A sociedade líquida descrita por Bauman é caracterizada pela volatilidade e pela falta de estabilidade nas relações sociais. As conexões digitais, embora ofereçam a ilusão de proximidade e conexão constante, muitas vezes carecem da profundidade e da autenticidade das interações humanas face a face. Essa superficialidade das relações online reflete não apenas a fluidez das identidades digitais, mas também a fragilidade dos laços sociais em uma era dominada pela velocidade e pela superficialidade (Rabelo, 2013).
A fluidez descrita por Bauman também se estende ao campo da comunicação, onde a proliferação de informações e a fragmentação dos espaços públicos tornam cada vez mais difícil distinguir entre o verdadeiro e o falso, o relevante e o irrelevante. Nesse contexto, a proteção de dados emerge como um mecanismo crucial para garantir a integridade e a confiabilidade das informações que circulam na esfera pública, protegendo assim os cidadãos contra a manipulação e o controle indevido por parte de interesses maliciosos (Sá; Godoy, 2015).
Além disso, a fluidez das relações sociais e da comunicação também levanta questões sobre a privacidade e a autonomia individuais em um mundo cada vez mais interconectado. A Emenda Constitucional nº 115/2022 busca abordar essas preocupações ao reconhecer a proteção de dados como um direito fundamental, garantindo assim que os indivíduos tenham o controle sobre suas próprias informações pessoais e possam determinar como e quando esses dados são compartilhados e utilizados (Costa, 2009).
No entanto, a fluidez descrita por Bauman não é apenas um fenômeno negativo, mas também abre espaço para novas possibilidades e formas de interação social e comunicação. A tecnologia digital, apesar de suas falhas e desafios, também oferece oportunidades para a expressão criativa, o engajamento cívico e a construção de comunidades virtuais baseadas em interesses comuns. Nesse sentido, a proteção de dados não deve ser vista como uma restrição à inovação tecnológica, mas sim como um mecanismo para garantir que essa inovação ocorra dentro de limites éticos e respeitosos dos direitos individuais (Sá; Godoy, 2015).
A concepção de fluidez da comunicação, à luz das ideias de Zygmunt Bauman, lança uma luz penetrante sobre a dinâmica da interação humana na era digital. Bauman descreve a sociedade contemporânea como líquida, onde as relações sociais são caracterizadas pela instabilidade e pela efemeridade. Nesse contexto, a comunicação assume uma natureza fluida, moldada pela constante mutação das plataformas digitais e pela rapidez com que as informações são compartilhadas e consumidas. Essa fluidez da comunicação desafia os conceitos tradicionais de tempo e espaço, criando novas formas de interação e colaboração que transcendem as fronteiras geográficas e culturais (Bauman, 2017).
No entanto, a fluidez da comunicação também traz consigo desafios significativos, especialmente no que diz respeito à confiabilidade e à veracidade das informações que circulam na internet. A proliferação de notícias falsas e desinformação é um reflexo direto da fluidez da comunicação, onde as fronteiras entre o verdadeiro e o falso muitas vezes se tornam turvas. Nesse contexto, o fortalecimento da internet como um espaço de comunicação democrático e transparente torna-se uma prioridade urgente, exigindo medidas eficazes para combater a disseminação de informações falsas e proteger a integridade do discurso público. (Bauman, 2017)
Uma abordagem para fortalecer a internet como um espaço de comunicação confiável e seguro envolve o fortalecimento das instituições e dos mecanismos de governança da rede. Isso inclui a promoção de padrões éticos e práticas responsáveis por parte das plataformas digitais, bem como a implementação de regulamentações eficazes para combater o discurso de ódio, a incitação à violência e outras formas de abuso online. Além disso, é essencial investir em educação digital e alfabetização midiática para capacitar os usuários a discernir entre informações verdadeiras e falsas e a participar de forma construtiva no debate público (Simeão, 2022).
O fortalecimento da internet como um espaço de comunicação também requer a proteção dos direitos fundamentais dos usuários, incluindo o direito à privacidade e à liberdade de expressão. A Emenda Constitucional nº 115/2022 desempenha um papel crucial nesse sentido, ao reconhecer a proteção de dados como um direito fundamental e estabelecer limites claros para a coleta, o processamento e o uso de informações pessoais na internet. Ao garantir que os indivíduos tenham o controle sobre suas próprias informações online, essa emenda constitucional fortalece a confiança na internet como um espaço de comunicação seguro e respeitoso dos direitos individuais. (Souza, 2022).
Assim, o fortalecimento da internet como um espaço de comunicação democrático e inclusivo requer uma abordagem holística e colaborativa, envolvendo governos, empresas, sociedade civil e usuários individuais. Somente por meio de uma cooperação eficaz e do compromisso com valores fundamentais como transparência, responsabilidade e respeito pela diversidade, podemos garantir que a internet continue a ser um motor de progresso e desenvolvimento humano. Em última análise, ao abraçar a fluidez da comunicação e ao fortalecer os alicerces éticos e jurídicos da internet, podemos construir um futuro digital mais justo, equitativo e sustentável para todos (Morais; Souza, 2018).
A análise da sociedade líquida e da fluidez da comunicação nos leva a uma reflexão profunda sobre as dinâmicas sociais e as interações humanas na era digital. Zygmunt Bauman, em suas obras, descreve a sociedade contemporânea como líquida, caracterizada pela falta de estruturas sólidas e pela instabilidade das relações sociais. Nesse contexto, a comunicação adquire uma natureza fluida, moldada pela constante mutação das tecnologias e pela rapidez com que as informações são compartilhadas e consumidas. Essa fluidez da comunicação desafia os modelos tradicionais de interação e colaboração, abrindo espaço para novas formas de expressão e engajamento (Trevizan et al., 2023).
Na sociedade líquida descrita por Bauman, as fronteiras entre o público e o privado, o local e o global, o real e o virtual tornam-se cada vez mais difusas. Isso se reflete na maneira como os indivíduos se comunicam e se relacionam uns com os outros, onde as conexões digitais muitas vezes substituem ou complementam as interações face a face. Essa fluidez da comunicação cria novas possibilidades de conexão e participação, mas também traz consigo desafios significativos em termos de privacidade, segurança e confiabilidade das informações (Trevizan et al., 2023).
Um aspecto importante da fluidez da comunicação na sociedade líquida é a rapidez com que as informações são compartilhadas e disseminadas nas redes sociais e outras plataformas online. Enquanto isso oferece oportunidades para a disseminação rápida de notícias e ideias, também aumenta o risco de desinformação, rumor e manipulação. A capacidade de discernir entre informações verdadeiras e falsas torna-se, portanto, uma habilidade crucial em um ambiente comunicativo fluido e em constante mudança (Bauman, 2017).
Além disso, a fluidez da comunicação na sociedade líquida também levanta questões sobre a autenticidade e a profundidade das interações humanas. À medida que torna-se mais dependentes de dispositivos digitais para nos conectar com os outros, corremos o risco de perder a conexão emocional e a empatia que são fundamentais para relacionamentos saudáveis e significativos. A comunicação online, muitas vezes caracterizada pela brevidade e pela superficialidade, pode minar a qualidade e a profundidade das relações interpessoais, criando uma sensação de desconexão e alienação (Simeão, 2022).
No entanto, apesar dos desafios colocados pela fluidez da comunicação na sociedade líquida, também há oportunidades significativas para o engajamento cívico, a expressão criativa e a construção de comunidades online. As redes sociais e outras plataformas digitais oferecem espaços para compartilhar experiências, trocar ideias e mobilizar pessoas em torno de causas comuns. Ao mesmo tempo, é importante reconhecer os limites e as limitações dessas plataformas, garantindo que sejam usadas de forma ética e responsável para promover o bem comum e o progresso social (Simeão, 2022).
Em última análise, o exame da sociedade líquida e da fluidez da comunicação nos desafia a repensar nossas concepções de identidade, relacionamentos e participação na era digital. Ao reconhecer as oportunidades e os desafios apresentados pela comunicação fluida, podemos trabalhar para construir uma sociedade mais justa, inclusiva e conectada, onde todos tenham a oportunidade de se expressar, se conectar e contribuir para o bem-estar coletivo.
3 A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ENQUANTO ELEMENTO AMPLIADOR DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS: EM PAUTA, A TEORIA DAS DIMENSÕES
A dignidade da pessoa humana, como elemento ampliador dos direitos fundamentais, representa um eixo central no desenvolvimento teórico e prático dos direitos humanos contemporâneos. Tal conceito não apenas fundamenta a base ética e jurídica das legislações nacionais e internacionais, mas também atua como um prisma através do qual as diversas dimensões dos direitos fundamentais são ampliadas, reinterpretadas e efetivadas. A teoria das dimensões dos direitos fundamentais, proposta inicialmente por Karel Vasak, oferece um arcabouço teórico que permite compreender a evolução histórica e funcional desses direitos, proporcionando uma análise mais profunda e intrincada de como a dignidade humana permeia e expande cada uma dessas dimensões (Sarlet, 2007).
A primeira dimensão dos direitos fundamentais, também conhecida como direitos de primeira geração, engloba os direitos civis e políticos. Esses direitos emergiram com as revoluções burguesas do século XVIII, sendo marcados pelo ideário liberal que enfatizava a liberdade individual e a proteção contra abusos do Estado. Neste contexto, a dignidade da pessoa humana é entendida como a base inalienável sobre a qual se erigem os direitos à vida, à liberdade, à propriedade e à segurança. A dignidade, nesse âmbito, garante que cada indivíduo seja tratado como um fim em si mesmo, nunca como um meio para fins alheios, resguardando, assim, a sua autonomia e integridade moral e física (Padilha; Bertoncini, 2016).
Ao avançarmos para a segunda dimensão, ou direitos de segunda geração, que abarcam os direitos econômicos, sociais e culturais, a dignidade da pessoa humana adquire uma conotação ainda mais expansiva. Esses direitos surgem no contexto das lutas sociais e trabalhistas do século XIX e início do século XX, refletindo a necessidade de garantir condições materiais mínimas para a realização plena da dignidade humana. Direitos como educação, saúde, trabalho digno e previdência social não são meros benefícios estatais, mas exigências éticas e jurídicas para a concretização da dignidade humana em sua plenitude. A ideia central aqui é que sem o atendimento dessas necessidades básicas, a liberdade e a igualdade proclamadas pelos direitos de primeira geração tornam-se vazias e ineficazes (Padilha; Bertoncini, 2016).
A terceira dimensão dos direitos fundamentais, identificada com os direitos de solidariedade ou fraternidade, surge no contexto pós-Segunda Guerra Mundial e da descolonização, abrangendo direitos difusos e coletivos, como o direito ao meio ambiente saudável, ao desenvolvimento e à paz. Neste espectro, a dignidade da pessoa humana transcende o indivíduo, projetando-se sobre a coletividade e as gerações futuras. A proteção ambiental, por exemplo, é um reflexo da compreensão de que a dignidade humana não pode ser plena em um ambiente degradado que compromete a saúde e o bem-estar das gerações presentes e futuras. Assim, a dignidade atua como um imperativo ético que orienta a ação coletiva em prol da preservação e melhoria das condições de vida para todos (Cambi; Padilha, 2016).
A quarta dimensão dos direitos fundamentais, frequentemente associada aos avanços tecnológicos e à era da informação, inclui direitos como a proteção de dados pessoais e a privacidade na internet. Neste cenário, a dignidade humana enfrenta novos desafios e exigências, adaptando-se às realidades de um mundo cada vez mais interconectado e digitalizado. A proteção da dignidade aqui implica assegurar que as inovações tecnológicas respeitem e promovam os direitos humanos, prevenindo abusos e garantindo a autonomia e a integridade dos indivíduos em um ambiente virtual (Sarlet, 2013).
Finalmente, a emergente quinta dimensão dos direitos fundamentais, que abrange os direitos à democracia participativa e à governança global, coloca a dignidade da pessoa humana no centro das discussões sobre participação cidadã e a eficácia das instituições democráticas. A dignidade, nesse sentido, exige que as estruturas de governança sejam inclusivas, transparentes e responsivas, permitindo que todos os indivíduos possam participar ativamente dos processos decisórios que afetam suas vidas e comunidades (Bittar, 2019).
A dignidade da pessoa humana, enquanto elemento ampliador dos direitos fundamentais, demanda uma análise mais detalhada das interseções entre esses direitos e as diferentes esferas da vida social, política e econômica. Uma perspectiva particularmente rica é a análise interdisciplinar que considera o impacto da dignidade humana nos diversos campos do saber, como a sociologia, a filosofia, a economia e o direito. A partir dessa abordagem, é possível perceber como a dignidade humana funciona como um catalisador de mudanças estruturais e sistêmicas, impulsionando a construção de um arcabouço normativo mais inclusivo e protetivo. (Padilha; Bertoncini, 2016).
Na sociologia, por exemplo, a dignidade humana é vista como um pilar fundamental para a coesão social e o desenvolvimento de um sentido de pertença e reconhecimento. Sociedades que respeitam e promovem a dignidade de seus membros tendem a ser mais coesas e resilientes, capazes de enfrentar desafios coletivos com maior solidariedade e cooperação. A dignidade humana, nesse contexto, atua como um princípio organizador que molda as interações sociais e fortalece os laços comunitários, promovendo uma cultura de respeito mútuo e valorização da diversidade. Este aspecto sociológico da dignidade é crucial para a efetivação dos direitos fundamentais, pois cria um ambiente propício para o florescimento dos indivíduos em todas as suas potencialidades (Bittar, 2019).
No campo da filosofia, a dignidade humana tem sido objeto de intensa reflexão, particularmente no que tange à sua natureza intrínseca e suas implicações éticas. Filósofos como Immanuel Kant, por exemplo, argumentaram que a dignidade é uma qualidade inalienável de todo ser humano, derivada da sua capacidade de racionalidade e autonomia moral. Esse entendimento filosófico tem profundas implicações para os direitos fundamentais, pois sustenta a ideia de que todos os indivíduos devem ser tratados com igual respeito e consideração, independentemente de suas circunstâncias pessoais ou sociais. A dignidade humana, assim concebida, fornece uma base ética sólida para a formulação e interpretação dos direitos fundamentais, orientando a ação legislativa e judicial em direção à proteção e promoção da autonomia e integridade dos indivíduos (Silva; Carvalho, 2017).
A economia também oferece perspectivas valiosas para a compreensão do papel da dignidade humana na ampliação dos direitos fundamentais. Do ponto de vista econômico, a dignidade está intimamente ligada à justiça distributiva e à garantia de condições materiais mínimas para uma vida digna. Políticas econômicas que promovem a igualdade de oportunidades e a redistribuição justa dos recursos são essenciais para a realização da dignidade humana e, por conseguinte, dos direitos fundamentais. A dignidade econômica implica não apenas a ausência de pobreza extrema, mas também a provisão de oportunidades para que todos os indivíduos possam desenvolver suas capacidades e contribuir para o bem-estar coletivo. Esse enfoque econômico ressalta a importância de políticas públicas inclusivas que assegurem o acesso universal a bens e serviços essenciais, como educação, saúde, moradia e trabalho digno. (Da Cruz et al., 2021).
No âmbito jurídico, a dignidade da pessoa humana tem sido progressivamente incorporada como um princípio fundamental nas constituições e tratados internacionais de direitos humanos. A jurisprudência de diversos tribunais, incluindo cortes constitucionais e a Corte Europeia de Direitos Humanos, tem reiterado a centralidade da dignidade humana na interpretação e aplicação dos direitos fundamentais. A dignidade, nesse contexto, serve como um critério normativo que guia a avaliação da compatibilidade das leis e práticas estatais com os padrões internacionais de direitos humanos. Essa abordagem jurídica da dignidade humana reforça a necessidade de um sistema jurídico que não apenas reconheça formalmente os direitos fundamentais, mas que também atue de forma proativa na sua efetivação e proteção contra violações (Bittar, 2019).
Além dessas perspectivas disciplinares, é fundamental considerar as novas demandas e desafios que surgem em um mundo globalizado e tecnologicamente avançado. A dignidade humana, enquanto princípio ampliador dos direitos fundamentais, deve ser continuamente reinterpretada à luz das transformações sociais e tecnológicas. Questões emergentes como a inteligência artificial, a biotecnologia e as mudanças climáticas exigem uma reflexão renovada sobre o que significa respeitar e promover a dignidade humana em contextos novos e complexos. A regulação ética das tecnologias emergentes, por exemplo, deve assegurar que o desenvolvimento tecnológico seja compatível com os valores fundamentais de dignidade, privacidade e autonomia. Da mesma forma, as respostas às crises ambientais devem ser informadas por um compromisso com a dignidade humana, garantindo que as políticas ambientais não apenas mitiguem os impactos (Bittar, 2019).
4 A PROTEÇÃO DOS DADOS COMO UMA NOVEL DIMENSÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
A proteção dos dados pessoais tem se consolidado como uma dimensão emergente e crucial dos direitos fundamentais, especialmente à luz dos avanços tecnológicos e do crescimento exponencial do fluxo de informações na era digital. Este contexto tem levado a um movimento global de regulamentação e proteção dos dados pessoais, culminando em legislações robustas em diversas jurisdições. No Brasil, a promulgação da Emenda Constitucional nº 115/2022 marca um ponto de inflexão significativo neste cenário, ao elevar a proteção de dados pessoais ao status de direito fundamental. Este avanço legislativo não apenas reforça o compromisso do país com a proteção da privacidade e da dignidade dos indivíduos, mas também impõe novos desafios e responsabilidades tanto para o setor público quanto para o privado (Scheuermann et al., 2023)
A Emenda Constitucional nº 115/2022 insere explicitamente a proteção de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, no rol dos direitos e garantias fundamentais da Constituição Federal de 1988. Este movimento é uma resposta às crescentes preocupações com a privacidade e a segurança dos dados em um ambiente cada vez mais interconectado e vulnerável a práticas abusivas de coleta, processamento e compartilhamento de informações. A inclusão deste direito na Constituição reforça a centralidade da privacidade e da autodeterminação informativa como elementos essenciais da dignidade humana, ampliando o espectro dos direitos fundamentais tradicionais e adaptando-os às exigências da sociedade contemporânea (Souza; Acha, 2022)
A proteção dos dados pessoais deve ser compreendida dentro do contexto mais amplo dos direitos de quarta geração, que envolvem direitos relacionados à tecnologia, informação e comunicação. A Emenda Constitucional nº 115/2022, ao reconhecer a proteção dos dados como direito fundamental, coloca o Brasil em consonância com tendências internacionais, como o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (GDPR) da União Europeia. Este alinhamento normativo é crucial para a inserção do Brasil no cenário global de proteção de dados, facilitando a cooperação internacional e a harmonização regulatória, além de promover a confiança dos cidadãos e empresas no tratamento responsável e ético de suas informações pessoais (Scheuermann et al., 2023).
Um dos aspectos mais complexos e intrigantes deste novo direito fundamental é a sua interseção com outros direitos e garantias constitucionais. A proteção de dados pessoais interage de maneira dinâmica com direitos como a liberdade de expressão, a privacidade, a inviolabilidade das comunicações e o direito ao acesso à informação. Este entrelaçamento exige uma abordagem equilibrada e ponderada por parte dos legisladores e do Judiciário, a fim de evitar conflitos e assegurar a harmonização entre os diversos direitos fundamentais. A implementação prática deste direito implica na criação de mecanismos eficientes de controle e fiscalização, como a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), cuja função é garantir a aplicação correta e justa da legislação de proteção de dados, prevenindo abusos e assegurando a transparência e a responsabilização no tratamento de informações pessoais. (Furtado et al., 2022)
A Emenda Constitucional nº 115/2022 também traz à tona a necessidade de uma cultura de proteção de dados no Brasil, o que requer um esforço conjunto de educação e conscientização. Empresas, órgãos públicos e cidadãos precisam estar cientes de suas responsabilidades e direitos em relação ao tratamento de dados pessoais. A adoção de boas práticas e a implementação de políticas de segurança da informação são essenciais para a proteção efetiva dos dados, prevenindo vazamentos e usos indevidos que podem resultar em danos significativos à privacidade e à dignidade dos indivíduos. A promoção de uma cultura de proteção de dados é um desafio contínuo que envolve não apenas a criação de normas e regulamentos, mas também a mudança de comportamentos e atitudes em relação ao tratamento das informações pessoais (Furtado et al., 2022).
Além disso, a proteção de dados pessoais como direito fundamental impõe novas exigências para o desenvolvimento tecnológico e a inovação. Tecnologias emergentes, como a inteligência artificial, a internet das coisas (IoT) e o big data, devem ser desenvolvidas e implementadas de maneira a respeitar os princípios de proteção de dados. Este imperativo ético e legal exige que empresas e desenvolvedores adotem uma abordagem de "privacy by design", incorporando medidas de proteção de dados desde as fases iniciais de desenvolvimento de produtos e serviços. A conformidade com as normas de proteção de dados não deve ser vista como um obstáculo à inovação, mas como uma oportunidade para fortalecer a confiança dos usuários e criar soluções tecnológicas que respeitem a privacidade e a autonomia dos indivíduos (Franco, 2022).
A Emenda Constitucional nº 115/2022 também tem implicações significativas para o campo da governança e da transparência pública. O tratamento de dados pessoais pelo setor público deve ser conduzido com rigor e responsabilidade, assegurando que as informações coletadas e processadas pelos órgãos governamentais sejam utilizadas exclusivamente para fins legítimos e em conformidade com os princípios de necessidade, adequação e proporcionalidade. A proteção de dados no setor público é crucial para a construção de uma relação de confiança entre o Estado e os cidadãos, promovendo a transparência e a accountability nas ações governamentais (Ribeiro, 2024).
A Emenda Constitucional nº 115/2022, ao constitucionalizar a proteção dos dados pessoais, insere-se num contexto de transformação profunda nas relações entre indivíduos, empresas e o Estado, marcado pela digitalização e pelo uso massivo de tecnologias de informação. Essa nova dimensão dos direitos fundamentais não só reflete a necessidade de resguardar a privacidade dos cidadãos, mas também responde aos desafios impostos pela economia digital, que depende cada vez mais do processamento e da análise de grandes volumes de dados. Neste cenário, a proteção de dados pessoais emerge como um pilar fundamental para a garantia de um ambiente digital seguro, justo e respeitoso dos direitos humanos (Scheuermann et al., 2023).
Uma das perspectivas cruciais para entender a importância da proteção de dados pessoais é a questão da segurança cibernética. Em um mundo onde ataques cibernéticos se tornam mais sofisticados e frequentes, a segurança dos dados pessoais é uma preocupação central. A Emenda Constitucional nº 115/2022 impõe a necessidade de robustas medidas de segurança para proteger os dados contra acessos não autorizados, vazamentos e outros tipos de violações. Essas medidas incluem desde a implementação de tecnologias avançadas de criptografia até políticas rigorosas de gestão e governança de dados. A segurança cibernética, portanto, é intrinsecamente ligada à proteção dos dados, pois a integridade, confidencialidade e disponibilidade das informações são essenciais para a confiança digital (Scheuermann et al., 2023).
Além disso, a proteção dos dados pessoais tem implicações significativas para os direitos econômicos e sociais. No mercado de trabalho, por exemplo, a coleta e o processamento de dados pessoais pelos empregadores devem respeitar a privacidade dos funcionários, evitando discriminação e abusos. A regulamentação de dados pessoais pode proteger trabalhadores de práticas invasivas, como a vigilância constante ou o uso indevido de informações pessoais para decisões de contratação e promoção. Da mesma forma, no setor de saúde, a proteção de dados sensíveis é vital para assegurar a confidencialidade das informações médicas, garantindo que os pacientes possam acessar cuidados de saúde de qualidade sem medo de que seus dados sejam mal utilizados (Scheuermann et al., 2023).
A Emenda Constitucional nº 115/2022 também fortalece a proteção dos consumidores, um aspecto crucial em uma economia digitalizada. Com a crescente dependência do comércio eletrônico e dos serviços digitais, os dados dos consumidores são constantemente coletados e analisados para fins de marketing e personalização de serviços. A regulamentação da proteção de dados garante que os consumidores tenham controle sobre suas informações pessoais, podendo exercer seus direitos de acesso, correção e exclusão de dados. Isso não só protege a privacidade dos consumidores, mas também promove um mercado mais transparente e competitivo, onde as empresas são incentivadas a adotar práticas éticas e responsáveis no tratamento dos dados (Furtado et al., 2022).
Outro aspecto relevante é a proteção de dados no contexto dos direitos das crianças e adolescentes. A coleta e o processamento de dados de menores de idade devem ser realizados com um cuidado especial, respeitando sua vulnerabilidade e a necessidade de um ambiente seguro para seu desenvolvimento. A Emenda Constitucional nº 115/2022 reforça a proteção dessas informações, impondo restrições rigorosas à coleta de dados de crianças e adolescentes e exigindo o consentimento explícito dos responsáveis. Isso garante que os direitos à privacidade e à segurança dos jovens sejam protegidos, evitando exposições indevidas e possíveis danos decorrentes do uso inadequado de suas informações (Souza; Acha, 2022).
A análise das implicações da proteção de dados pessoais não estaria completa sem considerar o impacto nas liberdades individuais e na democracia. Em um contexto de vigilância em massa e uso indiscriminado de dados pessoais por governos e corporações, a proteção de dados se torna um baluarte contra o autoritarismo e a repressão. A Emenda Constitucional nº 115/2022 fortalece a capacidade dos cidadãos de resistirem a abusos de poder e de exercerem seus direitos democráticos de maneira plena e informada. A transparência no tratamento de dados e o direito à privacidade são essenciais para a liberdade de expressão, a liberdade de associação e o direito à informação, que são pilares fundamentais de uma sociedade democrática (Souza; Acha, 2022).
No âmbito internacional, a proteção dos dados pessoais como direito fundamental coloca o Brasil em um patamar de maior relevância e respeito nas discussões globais sobre privacidade e segurança digital. A harmonização das normas de proteção de dados com padrões internacionais facilita a cooperação jurídica e comercial com outros países, promovendo um ambiente de negócios mais seguro e previsível. Além disso, a adoção de um quadro robusto de proteção de dados pode atrair investimentos estrangeiros, uma vez que as empresas internacionais buscam operar em jurisdições que ofereçam garantias sólidas para a proteção das informações pessoais (Souza; Acha, 2022).
Em resumo, a proteção de dados pessoais como uma nova dimensão dos direitos fundamentais, impulsionada pela Emenda Constitucional nº 115/2022, representa um avanço significativo na adaptação do sistema jurídico brasileiro às demandas da era digital. Este novo direito não só reforça a privacidade e a segurança dos dados, mas também promove a justiça social, a transparência e a confiança nas interações digitais. A efetivação desse direito exige um esforço contínuo e multifacetado, que envolve legislação, tecnologia, educação e governança, refletindo um compromisso firme com a proteção e a promoção dos direitos fundamentais em um mundo cada vez mais interconectado e digitalizado.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Emenda Constitucional nº 115/2022, ao reconhecer a proteção de dados como direito fundamental, marca um avanço significativo na adaptação do ordenamento jurídico brasileiro às exigências da era digital. Este reconhecimento não apenas fortalece a privacidade e a segurança dos dados pessoais, mas também tem profundos impactos na concepção de comunicação na sociedade líquida de Bauman, caracterizada pela fluidez das relações e pela predominância das interações mediadas pela internet.
Na sociedade líquida de Bauman, a fluidez das comunicações é exacerbada pela onipresença da internet e das tecnologias digitais. Indivíduos estão constantemente conectados, compartilhando informações pessoais e participando de redes sociais e plataformas digitais que facilitam a disseminação instantânea de dados. A proteção de dados como direito fundamental, conforme estabelecido pela Emenda Constitucional nº 115/2022, redefine as fronteiras da privacidade e da autonomia individual nesse contexto fluido. A necessidade de proteger os dados pessoais contra acessos não autorizados e uso indevido implica em limitações às práticas comunicativas que violam a dignidade e a integridade dos indivíduos.
Segundo a teoria das dimensões, a dignidade da pessoa humana é um elemento ampliador dos direitos fundamentais, transcendendo a mera proteção jurídica para abranger aspectos éticos, morais e sociais. A inclusão da proteção de dados pessoais como direito fundamental fortalece essa dimensão ao reconhecer que a privacidade é essencial para a manutenção da dignidade dos indivíduos em um mundo digital. Proteger os dados pessoais não é apenas uma questão de conformidade legal, mas também um imperativo ético para preservar a autonomia, a liberdade e a integridade dos cidadãos.
A relação entre o reconhecimento da proteção de dados como direito fundamental e a concepção de comunicação na sociedade líquida de Bauman destaca-se pela necessidade de encontrar um equilíbrio entre a liberdade de expressão e o direito à privacidade. A internet, ao mesmo tempo que facilita a conexão e o compartilhamento de informações, também amplia os riscos de exposição indevida e manipulação de dados pessoais. A regulamentação rigorosa da proteção de dados busca mitigar esses riscos, assegurando que os indivíduos possam participar ativamente da esfera pública digital sem comprometer sua dignidade e privacidade.
Sugerir uma nova linha de pesquisa ao leitor poderia envolver a investigação sobre os impactos psicossociais da exposição digital e da proteção de dados na sociedade contemporânea. Estudos poderiam explorar como a conscientização sobre a proteção de dados influencia o comportamento online dos usuários, suas percepções de segurança e confiança nas plataformas digitais, bem como os efeitos emocionais e psicológicos da exposição indevida de informações pessoais. Além disso, pesquisas interdisciplinares poderiam examinar como diferentes grupos sociais, como crianças, idosos e minorias, são afetados de maneiras distintas pelas práticas de proteção de dados e pelas políticas de privacidade implementadas por empresas e governos.
Em suma, o reconhecimento da proteção de dados como direitos fundamentais, à luz da Emenda Constitucional nº 115/2022, não apenas redefine as dinâmicas de comunicação na sociedade líquida de Bauman, mas também reforça a importância da dignidade da pessoa humana como um princípio norteador na era digital. A pesquisa futura pode explorar essas interações de maneira mais profunda, oferecendo insights valiosos para a construção de um ambiente digital mais justo, ético e respeitoso dos direitos fundamentais dos indivíduos.
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1 Graduando em Direito pela Faculdade de Direito de Cachoeiro de Itapemirim. (FDCI)