PEDAGOGIA NA REFLEXÃO DO TEMPO FILOSÓFICO COMO UM PROCESSO ATEMPORAL CONTÍNUO
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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.15468681
Hugo Kfouri de Paula1
RESUMO
Este ensaio busca estabelecer um diálogo profundo entre as concepções de tempo, filosofia e a arte de educar, propondo reflexões e melhorias tanto no ensino presencial quanto no uso das tecnologias educacionais. Inspirado na obra “O tempo não é o que parece”, de Atila Barros (2025), e enriquecido por uma leitura poética da educação como fenômeno cósmico, o estudo problematiza a noção tradicional de tempo linear na educação, questionando sua influência na organização do trabalho pedagógico, no papel do professor e no processo de aprendizagem. Barros oferece uma visão macrocósmica da educação, comparando-a metaforicamente a fenômenos astrofísicos, como buracos negros e seus horizontes de eventos. Nessa analogia, cada aluno é compreendido como um "evento" singular, um corpo celeste em constante transformação, capaz de absorver e ressignificar conhecimentos de maneira única. Esta pesquisa articula teoria e prática, ciência e poesia, convidando a repensar a educação como um fenômeno dinâmico e multidimensional, em que o tempo não é uma prisão, mas um espaço de possibilidades e liberdade ontológica.
Palavras-chave: Filosofia do tempo. Singularidade pedagógica. Temporalidade atemporal.
ABSTRACT
This essay seeks to establish a profound dialogue between conceptions of time, philosophy, and the art of educating, proposing reflections and improvements in both in-person teaching and the use of educational technologies. Inspired by the work Time Is Not What It Seems by Atila Barros (2025), and enriched by a poetic reading of education as a cosmic phenomenon, the study problematizes the traditional notion of linear time in education, questioning its influence on the organization of pedagogical work, the role of the teacher, and the learning process. Barros offers a macrocosmic vision of education, metaphorically comparing it to astrophysical phenomena such as black holes and their event horizons. In this analogy, each student is understood as a singular “event,” a celestial body in constant transformation, capable of absorbing and re-signifying knowledge in a unique way. This research articulates theory and practice, science and poetry, inviting us to rethink education as a dynamic and multidimensional phenomenon, in which time is not a prison, but a space of possibilities and ontological freedom.
Keywords: Philosophy of time. Pedagogical singularity. Timeless temporality.
INTRODUÇÃO
A obra do educador e pensador Atila Barros (2025) situa-se no cruzamento entre a pedagogia, a filosofia e as ciências naturais, propondo uma reflexão radical sobre o tempo como categoria estruturante do processo educativo. Barros desafia a noção reducionista de aula como fenômeno circunscrito ao espaço físico da escola, argumentando que o aprendizado é um continuum que se inicia na experiência pré-natal— onde a memória e a percepção começam a se constituir — e se estende ao longo da existência humana. Essa perspectiva ecoa as contribuições de Stephen Hawking (2015) em Uma Breve História do Tempo, ao demonstrar que o tempo não é uma grandeza absoluta, mas uma dimensão relacional, moldada pelas condições materiais e subjetivas do sujeito que aprende. Nesse sentido, a pedagogia do tempo, tal como proposta por Barros, dialoga com a física quântica de Carlo Rovelli (2016), para quem "a realidade não é o que parece", e com a filosofia de Martin Heidegger, que em Ser e Tempo (1927) desvela a temporalidade como constitutiva do Dasein (ser-aí). A educação, portanto, não pode ser reduzida a um conjunto de técnicas ou a um cronograma rígido; ela é, antes de tudo, uma experiência temporal em que passado, presente e futuro se entrelaçam na construção do conhecimento. A noção de tempo em Barros (2025) não se restringe à sua mensuração cronológica, mas assume um caráter filosófico, em consonância com a tradição crítica de Immanuel Kant. Em Crítica da Razão Pura (1781), Kant postula que o tempo é uma forma a priori da sensibilidade, uma estrutura que permite a organização da experiência. Transpondo essa ideia para a pedagogia, Barros argumenta que o tempo escolar não é um recipiente vazio a ser preenchido com conteúdo, mas uma dimensão ativa que molda a própria possibilidade do aprender.
Paulo Freire, em Pedagogia do Oprimido (1968), amplia essa discussão ao destacar que a educação é um ato político e temporal, no qual o educando não apenas assimila informações, mas se reconhece como sujeito histórico. Barros recupera essa perspectiva ao afirmar que "o tempo pedagógico é, antes de tudo, um tempo de libertação" (2025, p. 47), em que a reflexão crítica sobre o mundo permite a superação de estruturas opressivas.
Um dos grandes desafios da pedagogia contemporânea, conforme aponta Buscariolo (2012), é a otimização do tempo escolar em contextos marcados por desigualdades. Em muitas realidades sul-americanas, a jornada diária de ensino é limitada a quatro ou cinco horas, frequentemente interrompida por fatores como pobreza, violência e falta de infraestrutura. Diante disso, Barros (2025) recorre à pedagogia de Célestin Freinet, que no pós-guerra reinventou o ensino multisseriado, adaptando-o a condições adversas sem renunciar à qualidade educativa. Freinet, como lembra Buscariolo (2012), valorizava a troca de saberes e a autonomia discente, princípios que permanecem urgentes em um mundo onde o tempo é frequentemente sequestrado pela lógica produtivista. Foucault (1975), em Vigiar e Punir, já denunciava a disciplinarização do tempo nas instituições modernas, submetendo corpos e mentes a ritmos alienantes. Barros retoma essa crítica, propondo uma pedagogia que ressignifique o tempo como espaço de criação e não de controle. Barros (2025) avança ainda em uma discussão epistemológica, aproximando-se de Karl Popper e Carlo Rovelli para refletir sobre a sistematização do conhecimento. Popper, em A Lógica da Pesquisa Científica (1934), defendia que a ciência progride por conjecturas e refutações, um processo que demanda tempo e abertura ao erro. Rovelli, por sua vez, em A Realidade Não É o Que Parece (2016), reforça que o tempo é uma ilusão emergente das relações quânticas, o que implica repensar a linearidade do ensino.
Essa visão relativista do tempo tem implicações profundas para a didática. Se o conhecimento não é estático, mas fluido e contextual, a educação deve ser "longeva" (Barros, 2025, p. 89), permitindo que professores e alunos transitem entre diferentes estágios culturais sem a imposição de hierarquias rígidas. Educadores como Sócrates, que privilegiava o diálogo, e Einstein, que revolucionou a física ao questionar o tempo absoluto, transcendem sua época justamente porque suas contribuições são atemporais — ou melhor, porque ressignificam o próprio conceito de tempo. A obra de Atila Barros (2025) não apenas sintetiza contribuições fundamentais da física, da filosofia e da pedagogia, mas as coloca em diálogo para propor uma nova compreensão do tempo educativo. Em um mundo marcado pela aceleração capitalista — onde, como alertou Herbert Marcuse (1964), a razão instrumental reduz o tempo a mera produtividade —, repensar a pedagogia do tempo é um ato de resistência.
Foucault (1984), em A Coragem da Verdade, lembra que a parrhesia (fala franca) exige coragem para desafiar as estruturas dominantes. Barros assume esse desafio ao defender que a educação deve ser um espaço de desaceleração reflexiva, onde o tempo não seja um inimigo a ser dominado, mas um aliado na construção de sujeitos autônomos e críticos. Assim, a relevância deste tema transcende o âmbito acadêmico: ela questiona as próprias bases de uma sociedade que fragmenta o tempo em nome da eficiência, negando a complexidade do aprender. A pedagogia do tempo, portanto, não é apenas um campo de estudo — é um chamado à transformação.
A obra “O tempo não é o que parece” (Barros, 2025) convida o leitor a refletir sobre a educação em analogia com processos geológicos e cósmicos. Assim como a Terra passou por eras para se formar, o aprendizado consolida-se em camadas, variando conforme disposição, condições cognitivas e contextos sociais. O capitalismo, ao associar tempo a produtividade ("tempo é dinheiro"), contrasta com a ideia de que educar é um investimento sem valor quantificável (Barros, p. 273). A falseabilidade de Popper é outro pilar teórico: o conhecimento educacional é constantemente revisado, exigindo crítica e reconstrução. O "horizonte de eventos" da sala de aula absorve informações, reinterpreta-as e as transforma em saber coletivo.
A educação permite "viajar no tempo" ao recuperar saberes históricos, como os das escolas jesuítas, e ressignificá-los no presente. Barros (2025) explora paradoxos temporais, como o "paradoxo do avô", para questionar estruturas educacionais arcaicas. A máquina do tempo de Hawking é metáfora para a revisão crítica do conhecimento, enquanto a "radiação de Hawking" alerta para o risco de perdermos saberes, como na queima da Biblioteca de Alexandria. A educação é um sistema macrocósmico, interligando disciplinas, culturas e indivíduos. Durkheim (2014) reforça que fatos sociais— como a escolarização — devem ser analisados com imparcialidade, mesmo em contextos dogmáticos. Barros (2025) propõe uma visão geodésica da educação, onde o tempo não é linear, mas adaptativo, como na teoria da evolução.
A contracapa do livro de Barros sintetiza: "Tudo está exatamente onde deixamos; o que não sabemos é como acessar esse tudo". A educação, como fenômeno atemporal, exige métodos inovadores para ser democratizada. Recomenda-se a leitura de Carl Sagan (Cosmos) e Liu Cixin (O Problema dos Três Corpos) para ampliar a reflexão sobre o futuro educacional.
O TEMPO COMO PROCESSO EDUCATIVO
A leitura da obra de Barros (2025), impõe ao leitor, a priori, uma dupla exigência: a paixão pela física enquanto disciplina estruturante do pensamento científico e a reflexão sobre o ensino do tempo como categoria pedagógica transversal. Tal como a geografia opera com seus meridianos — linhas imaginárias que ordenam o espaço —, o tempo, em sua dimensão educativa, requer uma cartografia própria, capaz de integrar escalas tão díspares quanto os ciclos de Wilson (Winge, 2021), que delineiam o tempo geológico em eras tectônicas, e a microfísica da aprendizagem humana, onde conhecimentos se sedimentam em estratos cognitivos. A Terra, enquanto entidade geológica, aprendeu a ser Terra através de processos cataclísmicos: rearranjos crustais, deriva continental, ciclos de supercontinentes como Pangeia e Rodínia. Analogamente, o sistema educativo — enquanto organismo dinâmico — opera por processos de agregação, desagregação e reconfiguração de saberes, onde o tempo pedagógico não é linear, mas recursivo, alimentando-se de ficções orientadoras (no sentido de Bildung alemã) que transcendem gerações.
O ato de aprender, enquanto fenômeno neurocognitivo e sociocultural, obedece a uma dialética de velocidades assimétricas: para alguns, a assimilação é rápida, mediada pela qualidade dos estímulos e pela disposição neuroplástica; para outros, fatores como nutrição, ambiente socioeconômico e capacidades cognitivas impõem ritmos dilatados. Contudo, todo conhecimento internalizado consolida-se como rocha epistemológica na estratigrafia do indivíduo — uma "pedra filosofal" no sentido alquímico, onde o opus educativo transforma matéria bruta (ignorância) em ouro (saber). Essa metáfora remete à noção de Barros (2025, p. 273) sobre o "legado cósmico": o ensino acumulado desde os pré-socráticos até as neurociências contemporâneas constitui um capital temporal irredutível, cujo valor não pode ser quantificado sob a lógica do tempus pecunia est. A perversão capitalista, ao reduzir o tempo a mera mercadoria, ignora que o custo da educação é, paradoxalmente, quase nada (pois seu valor é imanente) e tudo (pois estrutura civilizações).
Ao considerar essa interconexão, torna-se evidente que a busca pelo conhecimento não pode se limitar a abordagens fragmentadas. A educação, nesse sentido, deve promover uma integração entre ciência e filosofia, incentivando o pensamento crítico e reflexivo desde as fases iniciais do aprendizado (Barros, 2025, p.22).
Barros avança para uma tese quase cinematográfica: o conhecimento já está no mundo, como um a priori ontológico; aprender é "despertar" para o que já existe, reordenar fragmentos, reocupar espaços epistemológicos abandonados. Essa visão ecoa a anamnese platônica, mas com um viés materialista: o tempo educativo não é descoberta, mas reconfiguração. Aqui, a educação enfrenta um paradoxo: deve ser laica (respeitando a neutralidade axiológica das ciências), mas inevitavelmente dialoga com saberes tradicionais, mitopoéticos e religiosos. Livros sagrados e tratados filosóficos, mesmo quando hipotéticos (no sentido peirceano de abdução), codificam fenômenos — pois, como lembra Freinet, a escrita é um "campo livre" onde hipóteses, fantasias e verdades coexistem. Barreto (2023), ao analisar a "arte filosofal da física do tempo" em Barros, destaca o fenômeno educativo como ato criativo — um evento no sentido whiteheadiano, onde Vygotsky (com sua ênfase na mediação social) e Popper (com sua falseabilidade) convergem: o saber é um processo aberto, nunca fechado, sujeito a refutação e reescrita.
Barros (2025), introduz uma tese radical: o tempo educativo é uma convecção — um fluxo que ordena fatos não pela cronologia, mas por densidade semântica. Existem questões atemporais (a ética, a morte, a justiça) que permeiam a educação como invariantes transgeracionais. Esse "legado" opera por sedimentação: cada geração herda, critica e reformula os habitus cognitivos anteriores. O construtivismo, nessa ótica, não é um produto acabado, mas um campo de forças onde hipóteses são testadas — desde a infância, como sugere Popper, a criança deve aprender a indagar: isto é verdadeiro? É falseável? A sala de aula transforma-se, assim, num horizonte de eventos (em analogia aos buracos negros), onde conhecimentos são absorvidos, deformados e reemitidos sob novas formas — um processo que é, em essência, ontológico, pois o ato de aprender modifica o ser que aprende.
A colisão entre o tempo e a razão da existência, então, pode ser vista como uma oportunidade para transcender as limitações da nossa própria percepção. Talvez a busca por um propósito não esteja no correr das horas ou no acúmulo de experiências temporais, mas na capacidade de nos conectarmos com algo além do simulacro que chamamos de realidade (Barros, 2025, p. 308).
Em síntese, Barros (2025), propõe uma física pedagógica do tempo: se o tempo cósmico é relativo (Einstein), o tempo educativo é relacional — tecido nas interações entre sujeitos, saberes e contextos. A educação, portanto, não ocorre no tempo, mas com o tempo — e, em última instância, contra o tempo, pois resiste à sua redução a mero recurso econômico. O desafio é repensar as escolas como aceleradores de partículas epistemológicas, onde o passado (legado), o presente (prática) e o futuro (potencial) colidem para gerar novos quanta de saber.
A PEDAGOGIA COMO VIAGEM TEMPORAL
A pedagogia, enquanto disciplina dinâmica e reflexiva, não se limita ao estudo estático de métodos e teorias educacionais. Ela opera como uma verdadeira máquina do tempo intelectual, permitindo-nos transitar entre diferentes épocas, contextos históricos e paradigmas filosóficos. Essa viagem temporal não se restringe a uma mera revisitação do passado, mas constitui um exercício profundo de reconstrução crítica, capaz de reconfigurar o presente e projetar futuros alternativos para a educação. Ao recorrer a fontes literárias, cinematográficas, historiográficas e até mesmo às representações midiáticas de períodos pretéritos, o educador assume o papel de um arqueólogo do saber, desenterrando as camadas sedimentares do conhecimento para examinar suas contradições, continuidades e rupturas.
A colonização pedagógica, exemplificada pelas escolas jesuítas no período colonial, não apenas impôs um modelo eurocêntrico de ensino, mas também estabeleceu um diálogo – muitas vezes violento – entre saberes tradicionais indígenas, africanos e europeus. A representação desses processos em obras ficcionais (como novelas, peças teatrais ou produções cinematográficas) ou em trabalhos acadêmicos não deve ser vista como mera reprodução histórica, mas como um ato de ressignificação. Ao revisitar tais épocas, não nos limitamos a memorizar fatos ou criticar estruturas de poder; antes, mergulhamos em uma análise antropológica e filosófica que questiona a própria noção de tempo linear na educação.
A pedagogia freinetiana, ao instituir a escrita livre e a aplicação prática do conhecimento como eixos estruturantes do processo educativo, opera uma ruptura epistemológica com os paradigmas tradicionais de ensino. Essa abordagem não apenas subverte a linearidade temporal implícita na pedagogia convencional, mas também reconceitualiza a própria noção de historicidade no espaço escolar. Ao privilegiar a produção textual espontânea e a investigação contextualizada, o método freinetiano transcende a mera transmissão de saberes cristalizados para instituir uma prática pedagógica em que o passado deixa de ser um dado estático e se transforma em um campo de problematização dialética. Nessa perspectiva, a reescrita crítica de eventos históricos pelos educandos não constitui um simples exercício de imaginação, mas um ato de reconstrução hermenêutica que tensiona as fronteiras entre tempo vivido, tempo ensinado e tempo projetado. Quando um educador freinetiano estimula a elaboração de hipóteses contra-factuais sobre processos históricos, ele não está apenas promovendo o pensamento crítico; está reconfigurando a própria temporalidade educativa. Esse movimento assemelha-se ao que Ricoeur (1985) denomina de "refiguração do tempo narrativo", em que a reelaboração discursiva do passado não é um mero recurso didático, mas um ato de libertação ontológica – uma forma de ressignificar o presente e reabrir futuros que a historiografia hegemônica havia declarado encerrados.
A implicação radical dessa prática é a desestabilização da noção de determinismo histórico no ensino. Se, na pedagogia tradicional, o passado é apresentado como uma sucessão inevitável de causas e efeitos, a abordagem freinetiana o reconcebe como uma rede de possibilidades – algumas realizadas, outras abortadas, muitas ainda latentes. Essa visão ecoa as proposições de Bloch (1954) sobre os "futuros não cumpridos" da história, que permanecem como virtualidades a serem reativadas. Na sala de aula freinetiana, o estudante que reconstrói o processo de independência do Brasil não como um desfecho necessário, mas como um campo de alternativas plurais (e.g.: "E se a Confederação do Equipo tivesse prevalecido?"), está performando o que Benjamin (1940) chamaria de "escovar a história a contrapelo" – um gesto que emancipa o aprendizado da tirania do já-acontecido.
Esse processo tem profundas ressonâncias intergeracionais. Assim como um pai, ao identificar no filho potencialidades que transcendem seu próprio percurso existencial, reabre o leque de futuros possíveis para sua linhagem, o educador freinetiano – ao desnaturalizar narrativas históricas petrificadas – liberta seus estudantes da camisa-de-força do tempo unilinear. Aqui, a pedagogia converge com as teses de Mead (1932) sobre a "natureza plástica do passado": assim como as relações familiares se redefinem constantemente à luz de novas gerações, o significado dos eventos históricos se transforma quando confrontado com as releituras das novas gerações de aprendizes.
A implicação mais radical dessa abordagem reside na emergência de uma temporalidade educativa pluriversa, que se contrapõe radicalmente à concepção homogênea de tempo característica da escola tradicional. Enquanto o modelo convencional se fundamenta em um chronos linear e padronizado - manifestado na rígida sucessão de conteúdos ao longo dos anos letivos -, a pedagogia freinetiana instaura um kairos pedagógico, criando espaços de ruptura nos quais o tempo cronológico é suspenso para permitir a eclosão de múltiplas temporalidades alternativas. Nesse contexto polifônico, um mesmo evento histórico como a Revolução Francesa adquire simultaneamente - e de forma paradoxal - diversas camadas de significação temporal: como evento concluído em 1799; como processo inacabado cujos ideais originais ainda aguardam plena realização; como constelação de possibilidades históricas não atualizadas (como poderia ter sido o caso de uma via jacobina radicalizada); e, finalmente, como símbolo em constante ressignificação pelas lutas políticas contemporâneas. Essa multiplicidade de temporalidades coexistentes desestabiliza a noção monológica de história e abre espaço para uma compreensão dialética do processo educativo.
Essa multiplicação de camadas temporais não representa um relativismo inconsequente, mas antes o reconhecimento – tal como propunha Braudel (1958) em sua teoria dos tempos históricos entrelaçados – de que todo fenômeno educativo ocorre simultaneamente em múltiplas durações: a longa duração das estruturas sociais, o tempo médio das conjunturas pedagógicas e o tempo breve das experiências individuais de aprendizagem. Portanto, quando a pedagogia freinetiana transforma a sala de aula em um laboratório de reescrita histórica, ela não está apenas ensinando história – está ensinando a fabricar tempos. Nesse processo, educadores e educandos tornam-se coautores do que Koselleck (2004) denominaria de "espaços de experiência" e "horizontes de expectativa" renovados. O passado deixa de ser um fardo para converter-se em um repertório de futuros possíveis; o presente, em um campo de experimentação temporal; e o futuro, em uma construção coletiva permanentemente reaberta – tal como uma página em branco na qual cada geração inscreve, com sua escrita livre, novas possibilidades de ser no tempo.
A MÁQUINA DO TEMPO PEDAGÓGICA
O paradoxo temporal na educação pode ser analisado à luz de teorias científicas e filosóficas. Se físicos como Crawford e Lobo (2025) exploram a viabilidade de máquinas do tempo através de túneis de minhoca e relatividade geral, a pedagogia opera sua própria viagem temporal por meio da transmissão e reconstrução do conhecimento. Atila Barros, em seus ensaios metafísicos, sugere que a educação transcende o físico, manifestando-se em dimensões emocionais e intelectuais – como no choro de um idoso que finalmente se forma ou no resgate educacional de indivíduos marginalizados.
O "túnel de minhoca educacional" não é uma metáfora vazia: ele simboliza a capacidade de saltar entre eras, revisitar conteúdos anteriores, ou mesmo transgredir a linearidade curricular – como discutir culinária em uma aula de gramática, ou resgatar conceitos científicos em contextos históricos. Essa abordagem dialética, de inspiração marxista, reconhece o conhecimento como um produto material e coletivo, cujo valor excede a mera mais-valia acadêmica para transformar comunidades e nações.
No clássico paradoxo temporal, matar o próprio avô inviabilizaria a existência do viajante. Na pedagogia, porém, o paradoxo se desloca: "matar" o educador do passado (isto é, superar modelos arcaicos e opressivos) não implica aniquilar a história, mas ressignificá-la. Ao estudar bibliotecas virtuais, reproduzir críticas em sala de aula e formular novas hipóteses, o educador não nega o passado – ele o revive e o transforma. A educação, assim, não morre; ela se metamorfoseia, adaptando-se a novas temporalidades e demandas sociais.
Aqui, o "mal educador" do passado, se eliminado criticamente, não gera "filhos maus" no presente. Pelo contrário, sua superação permite a construção de um futuro pedagógico mais justo. Esse processo ecoa a relatividade restrita da educação: assim como o tempo e o espaço são relativos na física einsteiniana, a pedagogia deve adaptar-se a contextos de escassez de recursos, desigualdades e necessidades de acessibilidade, mantendo um ciclo contínuo de aprendizagem docente e discente.
A pedagogia não tem início nem fim; ela existe em um fluxo constante, onde o passado é reinterpretado, o presente é transformado e o futuro é projetado. Sua viagem temporal não é um mero exercício de nostalgia, mas um imperativo ético e epistemológico. Ao transitar entre eras, criticar estruturas e reinventar metodologias, a educação cumpre seu papel mais elevado: o de libertar o intelecto e garantir que o conhecimento, como o universo, continue em expansão.
O TEMPO E A EDUCAÇÃO
A obra de Barros (2025), oferece uma reflexão acadêmica profunda sobre a natureza do tempo e suas implicações em diferentes esferas do conhecimento, incluindo a educação. O autor, fundamentado em teorias da física espacial, filosofia e sociologia, estabelece um diálogo entre a relatividade temporal e os processos educativos, demonstrando como a aprendizagem não ocorre de forma linear, mas em ciclos complexos e muitas vezes paradoxais.
A abordagem interdisciplinar do livro transita desde a física quântica e a cosmologia—com discussões sobre a dilatação do tempo, buracos negros e a hipótese da "Floresta Negra"—até as ciências humanas, em especial a sociologia da educação de Émile Durkheim. Essa dualidade entre o macrocosmo (o tempo cósmico) e o microcosmo (o tempo humano e pedagógico) permite uma compreensão mais holística da educação como um fenômeno dinâmico, sujeito a diferentes ritmos e distorções. Barros (2025) desafia a noção convencional de tempo como uma linha reta, propondo que a educação opera em múltiplas temporalidades, análogas às deformações espaço-temporais descritas pela relatividade geral. Assim como um relógio próximo a um buraco negro marca o tempo de forma distinta de um relógio na Terra, o aprendizado também ocorre em velocidades diferentes, dependendo de fatores como contexto sociocultural, metodologias de ensino e individualidade cognitiva. Alunos em condições de vulnerabilidade podem ter seu tempo de aprendizagem "dilatado" por barreiras estruturais, enquanto abordagens tradicionais versus pedagogias ativas alteram a percepção do tempo em sala de aula. Além disso, alguns aprendizes assimilam conceitos rapidamente, como "estrelas de nêutrons", enquanto outros requerem um processo mais lento, similar à formação de planetas.
Essa perspectiva relativística da educação questiona a padronização dos currículos e a ideia de que todos os alunos devem seguir o mesmo ritmo. Em vez disso, Barros sugere que um sistema educacional mais eficaz seria aquele que reconhece e respeita as diferentes "velocidades temporais" do aprendizado.
Recorrendo a As Regras do Método Sociológico (Durkheim, 1895/2014), Barros analisa como o tempo não é apenas uma grandeza física, mas também um fato social. A escola, como instituição, impõe uma temporalidade rígida—horários, calendários letivos, prazos de avaliação—que muitas vezes entra em conflito com os ritmos naturais dos estudantes. Durkheim argumenta que a educação é um mecanismo de reprodução social, e Barros expande essa ideia, demonstrando que o controle do tempo escolar é uma forma de poder. A padronização do tempo educacional reflete uma tentativa de homogeneizar as experiências de aprendizagem, ignorando que, assim como no universo, onde diferentes sistemas planetários têm dinâmicas temporais distintas, os alunos também possuem ciclos únicos de desenvolvimento.
Barros (2025), aplica o Paradoxo de Fermi—a aparente contradição entre a alta probabilidade de vida extraterrestre e a falta de evidências—à educação. Se o conhecimento humano é tão vasto e as ferramentas pedagógicas tão diversificadas, por que ainda enfrentamos crises educacionais profundas? A resposta, segundo o autor, está na incompreensão do tempo educativo. Assim como o Paradoxo de Fermi pode ser explicado por hipóteses como o "Grande Filtro" (uma barreira que impede o avanço de civilizações), a educação enfrenta seus próprios filtros: desigualdades estruturais, que distorcem o tempo de acesso ao conhecimento; metodologias ultrapassadas, que ignoram a relatividade do aprendizado; e falta de investimento, que retarda a inovação educacional.
Em uma era de imediatismo digital, Barros alerta para o risco de a educação tornar-se refém de um tempo acelerado, onde o conhecimento é tratado como informação descartável. No entanto, assim como certos fenômenos cósmicos exigem milhões de anos para se desenvolverem, alguns saberes demandam paciência e profundidade. O autor contrasta dois modelos: a educação "estelar", rápida e intensa, representada por cursos técnicos e microcertificações, que operam em ciclos curtos, similares a estrelas que brilham intensamente e se extinguem rápido; e a educação "planetária", lenta e sustentável, como a formação humanística e a pesquisa científica, que exigem um tempo dilatado, como planetas que levam eras para se consolidar. O equilíbrio entre esses dois modelos é essencial para um sistema educacional que não apenas prepare para o mercado de trabalho, mas também cultive pensadores capazes de resolver problemas complexos. Barros (2025), em “O tempo não é o que parece”, encerra com uma provocação: se o tempo é relativo, por que insistimos em uma educação linear? A proposta de Barros é a de um sistema que reconheça a multiplicidade de ritmos de aprendizagem, a necessidade de políticas educacionais flexíveis e o papel da tecnologia não para acelerar, mas para personalizar o tempo do aprendizado. Assim como o universo não segue um cronograma rígido, a educação deve abraçar a complexidade temporal, permitindo que cada aluno encontre seu próprio caminho—seja como um cometa de trajetória rápida, seja como um planeta em órbita estável, mas sempre em movimento.
PERCEPÇÕES E MÉTODOS DO LIVRO
A pesquisa bibliográfica, quando conduzida com rigor metodológico, transcende a mera coleta de referências para se tornar um processo dialético de construção do conhecimento. O livro em análise não apenas alimenta as indagações do leitor, mas estrutura-se como um dispositivo epistêmico que articula simbologia, materialismo histórico (marxista) e uma ontologia do cosmos educacional. Sua contracapa, por exemplo, opera como um portal metafísico, desafiando o leitor a transcender a linearidade temporal e a engajar-se numa reflexão ontológica sobre a educação. A obra não se limita a descrever fenômenos pedagógicos; ela os situa dentro de um macrocosmo sistêmico, onde fatores genéticos (biológicos e culturais), estruturas sociais e processos históricos interagem dialeticamente. A perspectiva materialista adotada pelo livro não se restringe ao economicismo marxista tradicional. Ela expande-se para um materialismo universal, no qual a educação é entendida como um fragmento do cosmos — um microcosmo que reflete e reproduz as contradições do macrocosmo social. Essa abordagem dialoga com a noção de cosmologia educacional, onde o aluno não é um mero receptáculo de informações, mas um ser cósmico cuja formação é moldada por forças materiais (econômicas, biológicas) e imateriais (cultura, ideologia). A genética, nesse contexto, não se reduz à biologia, mas abrange a herança epistemológica — os saberes acumulados e transmitidos através das gerações. O livro questiona: Como acessar essa "boa educação" que parece sempre estar presente, mas permanece inalcançável para muitos? A resposta exige uma materialização do pensamento, ou seja, a transformação de abstrações pedagógicas em práxis revolucionárias.
Karl Popper, citado na obra, fornece um arcabouço lógico para desconstruir a noção linear do tempo na educação. Seu método crítico — falsificacionista — é aplicado para isolar o tempo como uma variável manipulável, não como uma prisão ontológica. A educação, assim, deve ser pensada como um horizonte de eventos (em analogia aos buracos negros), onde conhecimentos são absorvidos, transformados e, ocasionalmente, perdidos no "ralo cósmico" da desinformação. Contudo, o livro alerta: a educação não pode ser reduzida a um caos epistemológico. Seu operador pedagógico (o professor) deve evitar visões fatalistas, como se o ensino fosse um sistema entrópico irreversível. Em vez disso, propõe-se uma sistêmica dos saberes, na qual o cosmos educacional é ordenado através de revisões contínuas — tal como Popper defendia na evolução do conhecimento científico. Nas entrelinhas finais, o livro introduz uma narrativa ousada: a aplicação da física quântica à filosofia da educação. Nessa perspectiva, os alunos são partículas em superposição — simultaneamente incluídos e excluídos do sistema, atraídos ou repelidos por traumas sociais, econômicos ou pedagógicos. A educação, portanto, opera como um campo de forças, onde valores atemporais (como ética e crítica) funcionam como bósons de Higgs, dando massa e significado aos processos educativos.
A referência a Liu Cixin e seu Planeta Errante não é acidental. Assim como na ficção científica chinesa, onde a humanidade lida com corpos celestes desgarrados, a educação contemporânea enfrenta alunos errantes — aqueles que foram expulsos de suas órbitas pedagógicas por forças centrífugas (exclusão digital, pobreza, falhas metodológicas). A obra questiona: Como reinserir esses "planetas errantes" no sistema educacional? A resposta pode estar na adaptação darwinista que Paulo Freire aplicou aos camponeses analfabetos, agora transposta para a era digital.
O livro encerra com uma provocação: a educação burocrática atual é rígida demais para inovar. Seus operadores (professores, gestores) precisam buscar uma luz fonte — uma energia epistemológica que aqueça a troca informacional. A verdadeira educação de qualidade equivale a enxergar além do horizonte de eventos de um buraco negro: requer coragem para enfrentar distorções e enxergar o legado não distorcido do processo educativo. Em última instância, a obra não oferece respostas prontas, mas ferramentas críticas. Ela está ali, como um fóssil epistemológico, esperando ser desenterrado por leitores que ousem reler, ressocializar seus saberes e, assim, contribuir para a evolução do macrocosmo educacional.
CONTRACAPA DO LIVRO
As bibliotecas, enquanto instituições culturais e pedagógicas, transcendem sua função meramente arquivística para se tornarem espaços de transformação social e subjetiva. Historicamente, esses ambientes foram palco de contradições: de santuários do saber a instrumentos de disciplinamento, conforme elucidado por Lucia Helena Maroto (2009). Em sua obra, Maroto desvela a dualidade da biblioteca como um locus de elevação intelectual e, paradoxalmente, como um mecanismo de punição pedagógica, onde alunos eram confinados sob a justificativa de "reflexão". Essa prática, longe de fomentar o amor pelo conhecimento, associou o espaço à repreensão, reforçando uma dicotomia entre prazer e obrigação no processo educativo. A reflexão proposta por Barros (2025) — "tudo está exatamente onde deixamos, o que não sabemos é como acessar esse tudo" — ressoa profundamente nesse contexto. A contracapa deste livro não apenas invoca essa ideia, mas a expande para uma metáfora cosmológica: a educação como um sistema gravitacional, onde alunos, comparáveis a planetas errantes, podem ser reinseridos em órbitas de saber através de processos de ressocialização pedagógica. Aqui, a biblioteca deixa de ser um "cantinho do castigo" para se tornar um campo de forças simbólicas, capaz de atrair e reconfigurar trajetórias individuais.
Maroto (2009) identifica a biblioteca como um espaço de troca, ainda que subvertido por práticas disciplinares. Essa contradição reflete tensões mais amplas no sistema educacional: entre coerção e emancipação, entre normatização e criatividade. A biblioteca, em sua essência, deveria funcionar como um habitus (no sentido bourdieusiano) de acolhimento intelectual, mas frequentemente reproduz hierarquias que marginalizam aqueles que não se adaptam ao ritmo linear do ensino tradicional. Tal dinâmica remete à física de Barros (2025), que estabelece paralelos entre as leis da relatividade geral e as estruturas educacionais. Assim como o espaço-tempo é curvado pela massa dos corpos celestes, o "tecido" da educação é deformado por forças sociais — normas, currículos, avaliações — que determinam trajetórias aceitáveis ou desviantes. O "aluno errante", como um planeta expulso de sua órbita, só é reintegrado quando o sistema consegue exercer uma "atração gravitacional" suficiente, seja através de metodologias inclusivas, seja pela ressignificação de espaços como a biblioteca.
A questão do acesso ao conhecimento é central neste debate. Como destacam Caponi (2014) e Barros (2025), o saber está inscrito em múltiplas camadas — desde registros fósseis até algoritmos digitais —, mas sua decodificação exige ferramentas cognitivas e culturais específicas. A paleoantropologia, por exemplo, revela que o conhecimento é transmitido não apenas através de livros, mas também de marcadores genéticos e comportamentais, numa filogenia do pensamento que remonta a Aristóteles e Darwin. Essa perspectiva ecoa a "radiação de Hawking" mencionada por Barros: assim como os buracos negros emitem partículas que preservam informação, a educação enfrenta o risco de uma "evaporação" do saber quando não há mediação eficaz. A queima da Biblioteca de Alexandria serve como alerta histórico: sem sistemas robustos de difusão e crítica, o conhecimento pode se perder em singularidades culturais — buracos negros onde ideias são sugadas pelo esquecimento.
No contexto atual, marcado por tecnologias digitais e crises epistemológicas, a educação precisa navegar entre escalas macro e micro. Hawking e Penrose são evocados não apenas por suas teorias físicas, mas por sua capacidade de traduzir o complexo em narrativas acessíveis — um desafio igualmente urgente para pedagogos. Barros (2025) propõe um modelo geodésico de ensino, onde o aprendizado não segue linhas retas, mas se adapta às curvaturas dos contextos sociais e individuais.
A obra também convoca o leitor a revisitar Carl Sagan, cujo Cosmos exemplifica a potência da divulgação científica. Sagan, como Maroto e Freire, entende que a educação demanda inspiração — não apenas repetição de conteúdo. Sua abordagem interdisciplinar (astronomia, história, filosofia) reflete o "princípio antrópico" aplicado à pedagogia: o universo educacional só faz sentido se for capaz de incluir todos os observadores. A contracapa encerra com um chamado à ação epistemológica: se "tudo está onde deixamos", cabe aos educadores e alunos desvendar os modos de acessar. Isso exige rupturas com modelos rígidos (criticados por Popper e Durkheim) e a adoção de paradigmas adaptativos, onde falseabilidade e criatividade sejam normas. A educação, como a vida, é um fenômeno raro e precioso — e sua preservação depende da capacidade de reler o passado, reescrever o presente e “reorbitar” o futuro. Leitura obrigatória para quem ousa pensar a educação como um cosmos em expansão.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A obra “O tempo não é o que parece” (Barros, 2025), convida a uma reflexão urgente sobre como concebemos o tempo na educação. Ao desconstruir a noção linear e homogênea de tempo escolar, o autor demonstra que a aprendizagem é um fenômeno complexo, marcado por ritmos distintos e influenciado por fatores socioculturais, metodológicos e individuais. A padronização dos currículos e a rigidez dos sistemas educacionais, ao ignorarem essa multiplicidade temporal, acabam por reforçar desigualdades e limitar o potencial de muitos estudantes. A analogia entre a relatividade do tempo cósmico e a diversidade dos processos educacionais revela uma verdade fundamental: assim como o universo opera em escalas temporais variadas, a educação deve ser flexível o suficiente para acomodar diferentes trajetórias de aprendizagem. A crítica de Barros à imposição de um tempo único na escola ressoa com as ideias de Durkheim, ao evidenciar que o controle do tempo é também uma forma de poder—uma estrutura que pode tanto reproduzir desigualdades quanto, se reformulada, promover maior equidade.
O Paradoxo de Fermi, aplicado à educação, expõe uma contradição perturbadora: em um mundo com conhecimento abundante e ferramentas pedagógicas diversificadas, por que ainda enfrentamos crises profundas? A resposta, como sugere Barros, está na falha em reconhecer que o tempo educativo não é universal, mas relativo. As barreiras estruturais, metodologias ultrapassadas e a falta de investimento atuam como "filtros" que distorcem e retardam o acesso ao saber.
Diante do imediatismo digital, que reduz o conhecimento a informação descartável, o autor defende um equilíbrio entre a educação "estelar" (rápida e técnica) e a "planetária" (lenta e reflexiva). Essa dualidade é essencial para formar não apenas profissionais eficientes, mas pensadores capazes de lidar com desafios complexos. A proposta final de Barros é clara: a educação deve abandonar sua rigidez temporal e abraçar um modelo que respeite os ritmos individuais, utilize a tecnologia para personalização—não aceleração—e reconheça que, assim como no cosmos, não há uma única trajetória válida para o aprendizado.
Em um mundo em constante transformação, a obra serve como um chamado à ação: repensar o tempo na educação não é apenas uma questão pedagógica, mas um imperativo ético. Se o universo não se submete a um cronograma fixo, por que a educação insiste em fazê-lo? A resposta está em construir sistemas que permitam a cada aprendiz trilhar seu próprio caminho—seja como um cometa veloz, seja como um planeta em órbita paciente, mas sempre em movimento.
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1 Graduado em Ciências Humanas (UNESA-RJ). Bacharelado em Geografia (UNESA-RJ). Licenciatura em Geografia (UNICV-FCE). Pós-Graduação em Metodologia do Ensino de Geografia e História (FAVENI-MG). Pós-Graduação em Antropologia Teológica e Direitos Humanos (FASUL-MG).