PEDAGOGIA DA FORMAÇÃO DOCENTE: INOVAÇÕES, RESISTÊNCIAS E REINVENÇÕES NA SALA DE AULA
PDF: Clique aqui
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.15672876
Adriana Ferreira Campos1
Gabriela Zanforlin Ferreira2
Mauro Siqueira3
Thatiana Capellini Oliveira4
RESUMO
O presente estudo insere-se no campo da formação docente voltada à promoção da diversidade, destacando a importância dos saberes interdisciplinares no enfrentamento de práticas excludentes ainda presentes no contexto educacional brasileiro. Partindo da compreensão de que educar para a diversidade requer um compromisso ético e político com a inclusão, o trabalho teve como objetivo analisar como os saberes interdisciplinares podem ser mobilizados na formação de professores para favorecer práticas pedagógicas inclusivas. A pesquisa adotou uma abordagem bibliográfica e de natureza qualitativa, fundamentando-se em autores como Almeida e Valente (2019), Freires et al. (2024), Nobre et al. (2023) e Silva e Santos (2018), entre outros. Os resultados apontaram que a incorporação de metodologias ativas e tecnologias digitais, aliadas a uma postura crítica e reflexiva dos docentes, potencializa a construção de uma escola sensível à pluralidade dos sujeitos. Conclui-se que formar para incluir exige romper com modelos tradicionais, integrando práticas interdisciplinares que reconheçam a diversidade como princípio estruturante da ação educativa.
Palavras-chave: Diversidade, Formação Docente, Inclusão, Interdisciplinaridade, Tecnologias Educacionais.
ABSTRACT
This study is part of the field of teacher training aimed at promoting diversity, highlighting the importance of interdisciplinary knowledge in confronting exclusionary practices still present in the Brazilian educational context. Based on the understanding that educating for diversity requires an ethical and political commitment to inclusion, the work aimed to analyze how interdisciplinary knowledge can be mobilized in teacher training to favor inclusive pedagogical practices. The research adopted a bibliographic and qualitative approach, based on authors such as Almeida and Valente (2019), Freires et al. (2024), Nobre et al. (2023) and Silva and Santos (2018), among others. The results showed that the incorporation of active methodologies and digital technologies, combined with a critical and reflective stance by teachers, enhances the construction of a school sensitive to the plurality of subjects. It is concluded that training for inclusion requires breaking with traditional models, integrating interdisciplinary practices that recognize diversity as a structuring principle of educational action.
Keywords: Diversity, Teacher Training, Inclusion, Interdisciplinarity, Educational Technologies.
1 Introdução
A educação para a diversidade constitui um campo emergente e necessário no debate educacional contemporâneo, especialmente diante das crescentes demandas por inclusão, equidade e justiça social. Trata-se de uma abordagem que valoriza as diferenças culturais, sociais, físicas, cognitivas e afetivas como elementos constitutivos da aprendizagem e da formação humana. Sua origem está intimamente ligada às lutas dos movimentos sociais, às políticas públicas de inclusão e às contribuições teóricas dos estudos interdisciplinares, que têm problematizado os currículos homogêneos e as práticas pedagógicas excludentes. Formar para incluir, nesse contexto, significa compreender a docência como um ato político, ético e comprometido com a construção de uma escola plural e democrática.
Dessa maneira, a formação de professores adquire um papel central na efetivação de uma educação voltada à diversidade, exigindo que os profissionais da educação sejam preparados para atuar com sensibilidade, competência e criticidade diante das múltiplas realidades dos sujeitos escolares. No Brasil, esse desafio é potencializado pelas desigualdades históricas e pelas fragilidades na formação docente inicial e continuada, que muitas vezes desconsideram as complexidades inerentes às práticas inclusivas e interdisciplinares. Além disso, o avanço das tecnologias digitais e das metodologias ativas impõe novas exigências à atuação pedagógica, demandando a reinvenção dos processos formativos em uma perspectiva integradora e transformadora.
Como por exemplo, experiências desenvolvidas em escolas públicas de tempo integral têm mostrado que a adoção de práticas interdisciplinares, aliada ao uso crítico das tecnologias digitais e das metodologias participativas, contribui significativamente para a construção de ambientes escolares mais inclusivos. Projetos pedagógicos que envolvem temas como identidade, pertencimento, inclusão de estudantes com deficiência, questões étnico-raciais e de gênero, têm promovido a formação de professores mais atentos às demandas da diversidade, mesmo em contextos marcados por resistências institucionais e escassez de recursos. Diante disso, o problema que norteia esta pesquisa é: de que forma a formação docente pode promover saberes interdisciplinares comprometidos com a educação para a diversidade, considerando os desafios e as possibilidades do cotidiano escolar? Essa indagação parte do reconhecimento de que ainda há lacunas na efetivação de políticas e práticas inclusivas no interior das instituições escolares, especialmente quando se trata da formação de professores para lidar com a diversidade em suas múltiplas expressões.
Esta pesquisa se justifica pela necessidade urgente de se repensar os processos formativos docentes frente à crescente complexidade do cenário educacional, no qual a diversidade não pode mais ser ignorada ou tratada como exceção. Compreender e promover saberes interdisciplinares constitui um passo fundamental para superar práticas fragmentadas e excludentes, contribuindo para a construção de uma escola mais justa, acessível e sensível às diferenças. Esta pesquisa é relevante, pois contribui para o fortalecimento de uma educação inclusiva e plural, alinhada às diretrizes curriculares nacionais e às demandas contemporâneas por justiça social, cidadania e equidade. Além disso, promove o diálogo entre teoria e prática, ao evidenciar os entraves e as possibilidades reais enfrentadas por educadores em sua formação e atuação cotidiana, especialmente em contextos públicos e periféricos.
Este trabalho tem como objetivo analisar como os saberes interdisciplinares podem ser mobilizados na formação docente para favorecer uma educação pautada na diversidade, com foco nas metodologias ativas, no uso das tecnologias digitais e nas estratégias de enfrentamento às resistências institucionais. Para alcançar tais objetivos, opta-se por uma pesquisa bibliográfica de natureza qualitativa, baseada na análise de produções acadêmicas, legislações educacionais, documentos oficiais e referenciais teóricos que abordam a formação de professores, interdisciplinaridade, inclusão e tecnologias educacionais. O percurso teórico deste estudo está fundamentado em autores como Almeida e Valente (2019), que discutem as relações entre currículo e tecnologias; Freires et al. (2024), que abordam a formação docente e a reinvenção curricular; Nobre et al. (2023), que tratam da educação inclusiva e das políticas públicas; e Silva e Santos (2018), cujas contribuições são essenciais para pensar a diversidade cultural e a docência crítica. Tais autores serão articulados ao longo do texto a fim de sustentar a análise crítica e propositiva deste trabalho.
A estrutura do trabalho está organizada em três capítulos, além desta introdução e das considerações finais. O primeiro capítulo discute as metodologias ativas e tecnologias digitais na formação de professores, enfatizando seu potencial transformador frente aos desafios da diversidade. O segundo capítulo trata das resistências institucionais e das reinvenções pedagógicas no cotidiano formativo, abordando os obstáculos e as estratégias utilizadas pelos docentes para promover práticas mais inclusivas. Por fim, a conclusão apresenta uma síntese dos principais achados, as implicações da pesquisa e as perspectivas futuras para a formação docente voltada à educação para a diversidade.
2 Metodologias ativas e tecnologias digitais na formação de professores
As metodologias ativas são compreendidas como abordagens pedagógicas centradas no estudante, nas quais o aluno assume papel protagonista no processo de aprendizagem, participando ativamente da construção do conhecimento. Essa concepção tem suas raízes em teorias educacionais como o construtivismo de Piaget e o socioconstrutivismo de Vygotsky, sendo fortalecida por estudos contemporâneos que destacam a importância da interação, da resolução de problemas e da aprendizagem por projetos. Para Almeida e Valente (2019), tais metodologias se alinham a propostas curriculares que rompem com a lógica transmissiva, promovendo práticas mais dinâmicas e interdisciplinares.
Além do mais, no atual cenário educacional brasileiro, a adoção das metodologias ativas tem se mostrado fundamental para responder aos desafios impostos pelas Diretrizes Curriculares Nacionais e pela BNCC, que enfatizam competências como pensamento crítico, colaboração e resolução de problemas. Freires et al. (2024) destacam que essas práticas estão diretamente associadas à formação de sujeitos capazes de atuar de forma criativa e ética diante das complexidades do século XXI. Nesse sentido, inserir as metodologias ativas na formação de professores é também preparar os educadores para lidar com a diversidade de saberes e práticas que caracterizam a escola contemporânea.
À vista disso, experiências pedagógicas baseadas em metodologias ativas vêm sendo desenvolvidas com sucesso em cursos de formação inicial e continuada de professores, por meio de estratégias como a sala de aula invertida, o ensino híbrido, a aprendizagem baseada em projetos e em problemas (PBL). Silva e Santos (2018) apontam que tais abordagens contribuem para a superação da fragmentação curricular, favorecendo práticas pedagógicas mais conectadas à realidade dos estudantes. Já Nobre et al. (2023) reforçam que essas metodologias permitem a articulação entre os direitos de aprendizagem previstos na BNCC e a valorização da diversidade sociocultural dos sujeitos escolares.
Desse modo, as tecnologias digitais de informação e comunicação (TDIC) são entendidas como ferramentas que, ao serem incorporadas ao cotidiano escolar, passam a atuar como mediadoras dos processos de ensino e aprendizagem. A origem dessa concepção remonta aos estudos de Vygotsky sobre mediação simbólica, sendo posteriormente aprofundada por autores que reconhecem o papel dos artefatos tecnológicos na ampliação das possibilidades pedagógicas. Almeida e Valente (2019) argumentam que as TDIC, quando utilizadas criticamente, podem contribuir para o desenvolvimento de um currículo mais flexível, interativo e centrado nas necessidades formativas dos alunos e professores.
Ademais, no contexto da formação docente, as tecnologias digitais se apresentam como elementos essenciais para a construção de competências pedagógicas alinhadas às demandas da sociedade contemporânea. Freires et al. (2024) ressaltam que a presença das TDIC nos espaços educativos permite a criação de ambientes de aprendizagem mais colaborativos, dinâmicos e acessíveis, nos quais os professores não apenas utilizam tecnologias, mas também as compreendem como parte integrante de um currículo integrado às realidades sociotécnicas. Por conseguinte, a apropriação crítica das tecnologias é indispensável para formar educadores capazes de mediar conhecimentos com autonomia e criatividade.
Com isso, observa-se que práticas formativas que incluem o uso de plataformas educacionais, recursos interativos, softwares de autoria e ambientes virtuais de aprendizagem promovem maior engajamento dos professores em formação, ao mesmo tempo em que ampliam suas possibilidades didáticas. De acordo com Silva e Santos (2018), tais experiências contribuem para superar a visão utilitarista das tecnologias, atribuindo-lhes um caráter formativo e reflexivo. Nobre et al. (2023) acrescentam que, quando integradas ao planejamento pedagógico, as tecnologias digitais favorecem a interdisciplinaridade e possibilitam a personalização da aprendizagem, promovendo uma educação mais inclusiva e significativa.
A aprendizagem colaborativa refere-se a processos educacionais em que os sujeitos constroem o conhecimento de forma conjunta, compartilhando responsabilidades, saberes e estratégias em um ambiente de troca e cooperação. Essa concepção baseia-se nos fundamentos do socioconstrutivismo, sobretudo nas contribuições de Vygotsky sobre a interação social como fator determinante no desenvolvimento cognitivo. Almeida e Valente (2019) destacam que a colaboração no processo formativo favorece a emergência do protagonismo docente, uma vez que estimula a autonomia, o diálogo crítico e o engajamento ativo dos professores em formação no planejamento e na condução de práticas pedagógicas.
Dessa forma, no cenário da formação docente contemporânea, a aprendizagem colaborativa emerge como um princípio pedagógico fundamental para a superação da fragmentação do conhecimento e da solidão pedagógica. Freires et al. (2024) afirmam que o protagonismo do professor em formação é potencializado quando este é inserido em contextos que valorizam a troca de experiências, a coautoria de projetos e a reflexão coletiva. Além disso, ao trabalhar em equipe, os docentes aprendem a lidar com a diversidade de perspectivas e a desenvolver competências relacionais e comunicativas indispensáveis à prática educativa inclusiva e interdisciplinar.
Exemplificando, programas de formação continuada que adotam a metodologia de grupos colaborativos, comunidades de prática ou oficinas pedagógicas têm promovido resultados expressivos na construção da identidade docente e no fortalecimento de práticas transformadoras. Silva e Santos (2018) ressaltam que tais experiências possibilitam a criação de vínculos entre teoria e prática, fomentando uma postura mais crítica e engajada. Já Nobre et al. (2023) evidenciam que o protagonismo docente, construído em processos colaborativos, amplia a capacidade de ação dos educadores diante dos desafios da inclusão e da diversidade no espaço escolar.
A formação continuada compreende um processo permanente e sistemático de aprimoramento profissional, que visa atualizar e expandir os conhecimentos, habilidades e atitudes dos docentes ao longo de sua carreira. Essa perspectiva tem origem na concepção de desenvolvimento profissional docente como um percurso dinâmico, articulado às transformações sociais, tecnológicas e culturais. Conforme Almeida e Valente (2019), a inserção das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) nesse processo tem potencial para impulsionar práticas pedagógicas inovadoras, ao oferecer novos modos de ensinar, aprender e interagir com o conhecimento.
Sendo assim, no atual contexto educacional, a formação continuada no uso das TICs é essencial para que os professores consigam integrar essas tecnologias de maneira crítica, criativa e pedagógica em sua prática cotidiana. Freires et al. (2024) apontam que a inovação pedagógica não depende apenas da disponibilidade de recursos digitais, mas da existência de políticas formativas coerentes, que promovam o protagonismo docente e o desenvolvimento de competências alinhadas às exigências do século XXI. Nesse sentido, a formação deve ser situada, contextualizada e articulada aos desafios enfrentados no chão da escola, valorizando o saber docente e a construção coletiva do conhecimento.
Como por exemplo, cursos de formação continuada que combinam encontros presenciais com atividades online, utilização de plataformas educacionais, produção de materiais digitais e projetos colaborativos têm se mostrado eficazes na promoção de práticas pedagógicas mais inovadoras e inclusivas. De acordo com Silva e Santos (2018), essas experiências favorecem a ressignificação do papel do professor como mediador do conhecimento, capaz de integrar recursos tecnológicos à realidade sociocultural dos alunos. Já Nobre et al. (2023) destacam que tais formações contribuem diretamente para o fortalecimento da prática interdisciplinar, ao conectar diferentes áreas do saber com as demandas concretas da educação contemporânea.
A integração entre tecnologia e interdisciplinaridade diz respeito à articulação de saberes de diferentes áreas do conhecimento com o uso de ferramentas digitais, em prol de uma aprendizagem mais significativa, contextualizada e inovadora. Essa proposta tem origem nas críticas aos currículos fragmentados e nas concepções pedagógicas que compreendem o conhecimento como uma construção integrada e dinâmica. Para Almeida e Valente (2019), essa integração representa uma das grandes potencialidades das tecnologias educacionais, que permitem a articulação de conteúdos diversos em projetos colaborativos, rompendo com a rigidez disciplinar e promovendo o pensamento crítico e criativo.
Ainda assim, implementar a integração entre tecnologia e interdisciplinaridade na formação de professores representa um desafio concreto nas instituições educacionais. Freires et al. (2024) ressaltam que a cultura escolar ainda é marcada por práticas compartimentalizadas, planejamento isolado entre disciplinas e falta de preparo docente para o uso pedagógico das TICs em abordagens interdisciplinares. Além disso, Silva e Santos (2018) observam que, embora a BNCC promova a articulação de competências e habilidades em contextos integrados, a aplicação prática dessa diretriz exige formação específica, tempo de planejamento e apoio institucional, o que nem sempre está disponível nas escolas.
Com isso, experiências pedagógicas que integram tecnologia e interdisciplinaridade têm sido realizadas por meio de projetos temáticos, feiras de ciências interdisciplinares com uso de recursos digitais, produção de podcasts e vídeos educativos, entre outras iniciativas que articulam diferentes áreas do conhecimento e desenvolvem competências diversas. Nobre et al. (2023) enfatizam que tais práticas favorecem o desenvolvimento de uma aprendizagem ativa e conectada com a realidade dos estudantes, ao mesmo tempo que contribuem para a superação de barreiras curriculares e culturais. Tais possibilidades, segundo Almeida e Valente (2019), demonstram o potencial transformador da tecnologia quando associada à prática pedagógica crítica e interdisciplinar.
3 Resistências institucionais e reinvenções pedagógicas no cotidiano formativo
As barreiras estruturais e culturais à inovação educacional referem-se a entraves de ordem física, organizacional, política e simbólica que limitam ou inviabilizam a adoção de práticas pedagógicas inovadoras nos sistemas de ensino. Essas barreiras têm origem tanto na precariedade de infraestrutura – como ausência de recursos tecnológicos, conectividade e espaços adequados – quanto na manutenção de culturas escolares conservadoras, baseadas na reprodução de métodos tradicionais e na resistência à mudança. De acordo com Almeida e Valente (2019), essas dificuldades dificultam a consolidação de propostas curriculares que integrem tecnologias, metodologias ativas e perspectivas interdisciplinares.
Consoante a isso, no contexto das escolas públicas brasileiras, essas barreiras se manifestam de forma ainda mais intensa, devido à histórica desvalorização da educação como política de Estado e à fragmentação da formação docente. Freires et al. (2024) apontam que, mesmo diante de avanços normativos como a BNCC, ainda há uma lacuna significativa entre as diretrizes oficiais e as condições concretas para sua implementação. Silva e Santos (2018) destacam que muitos professores enfrentam ambientes hostis à inovação, marcados por gestão hierarquizada, ausência de espaços de escuta e pouca abertura à experimentação pedagógica, o que acaba gerando frustração e imobilismo profissional.
À exemplo disso, observa-se que em diversas escolas ainda predominam práticas centradas na memorização, na repetição mecânica de conteúdos e na avaliação padronizada, mesmo quando há disponibilidade de tecnologias digitais. Nobre et al. (2023) relatam que, em muitos casos, os equipamentos ficam subutilizados ou são encarados apenas como complemento ilustrativo, e não como mediadores da aprendizagem. Já Almeida e Valente (2019) enfatizam que as barreiras culturais muitas vezes se expressam por meio de discursos de desconfiança, medo do erro ou recusa à mudança, o que reforça a necessidade de formação crítica e continuada, capaz de romper com tais resistências e fomentar a renovação pedagógica.
Desse modo, as culturas escolares conservadoras correspondem a um conjunto de valores, práticas e crenças enraizadas no cotidiano das instituições educacionais, que reproduzem modelos pedagógicos autoritários, excludentes e resistentes à pluralidade. Essa tradição remonta à estrutura fundacional da escola moderna, moldada por princípios normativos de padronização, disciplinamento e hierarquização dos saberes. Almeida e Valente (2019) alertam que essas culturas perpetuam visões de currículo centradas em conteúdos descontextualizados e em abordagens homogêneas, o que dificulta a incorporação de práticas inclusivas, interdisciplinares e sensíveis à diversidade sociocultural.
Dessa maneira, no cenário educacional brasileiro, essas culturas conservadoras ainda se manifestam fortemente por meio da resistência à discussão de temas como gênero, raça, deficiência, territorialidade e diferentes formas de expressão cultural. Freires et al. (2024) apontam que tais resistências se expressam não apenas na sala de aula, mas também nas estruturas administrativas, nos projetos pedagógicos e nas relações interpessoais dentro da escola. Silva e Santos (2018) ressaltam que, mesmo com a promulgação da BNCC e das políticas de inclusão, há uma discrepância entre o discurso oficial e a prática cotidiana, marcada por silenciamentos, negações e exclusões veladas.
Com isso, verifica-se que escolas que tentam implementar projetos voltados à diversidade muitas vezes enfrentam críticas, censura institucional ou falta de apoio da comunidade escolar. Nobre et al. (2023) relatam que professores que trabalham com temas interseccionais ou com metodologias participativas são frequentemente desvalorizados ou desacreditados por gestores e colegas que veem tais práticas como ideológicas ou desvinculadas do "conteúdo real". Já Almeida e Valente (2019) destacam que romper com essa cultura conservadora exige não apenas mudanças curriculares, mas também um trabalho formativo contínuo, baseado na escuta, na valorização das experiências docentes e na promoção de uma cultura escolar mais democrática e acolhedora.
As estratégias docentes de enfrentamento e reexistência correspondem a práticas pedagógicas intencionais, críticas e criativas que buscam resistir aos modelos escolares conservadores e construir alternativas formativas mais inclusivas e emancipatórias. O termo reexistência deriva das epistemologias do sul e dos estudos decoloniais, sendo apropriado na educação como forma de expressar não apenas resistência, mas a produção de novos sentidos e práticas de vida frente à negação das diferenças. Para Almeida e Valente (2019), tais estratégias são fundamentais para a renovação curricular, pois promovem o engajamento docente diante dos desafios de um ensino que se quer mais democrático, interdisciplinar e tecnológico.
Dessa forma, professores inseridos em contextos marcados por limitações institucionais, discriminações e falta de apoio muitas vezes desenvolvem ações autônomas e colaborativas para transformar suas práticas e incluir sujeitos historicamente marginalizados. Freires et al. (2024) observam que essas estratégias vão desde o uso criativo de recursos tecnológicos até a construção de projetos interdisciplinares com foco em questões étnico-raciais, de gênero e inclusão. Já Silva e Santos (2018) apontam que a reexistência também se manifesta na criação de redes de apoio entre docentes, no fortalecimento da escuta ativa e no investimento em formações autogeridas, que ampliam a potência transformadora da prática pedagógica.
Exemplificando, há professores que, mesmo diante da ausência de infraestrutura e de resistência da gestão, desenvolvem atividades interativas com o uso de aplicativos gratuitos, promovem rodas de conversa sobre temas sensíveis ou propõem oficinas culturais envolvendo diferentes linguagens e saberes. Nobre et al. (2023) relatam experiências em que docentes utilizaram as TICs para dar visibilidade a narrativas silenciadas, como histórias de comunidades quilombolas e indígenas, fortalecendo a identidade dos alunos e ampliando o repertório cultural da escola. Assim, como defendem Almeida e Valente (2019), tais práticas configuram formas legítimas de enfrentamento e reinvenção, que reafirmam o papel político-pedagógico do professor como agente de mudança social.
As práticas pedagógicas insurgentes são compreendidas como ações educativas que rompem com as lógicas tradicionais de ensino, desafiando normas instituídas e propondo novas formas de ensinar, aprender e conviver na escola. Inspiradas por pedagogias críticas e libertadoras, como as de Paulo Freire, essas práticas surgem como resposta às opressões estruturais e à negação da diversidade, promovendo processos de conscientização, participação ativa e transformação social. Para Almeida e Valente (2019), a insurgência pedagógica se traduz na disposição dos professores em questionar modelos hegemônicos e propor abordagens curriculares que dialoguem com as realidades dos estudantes.
Dessa maneira, em um cenário educacional marcado por desigualdades, conservadorismo e exclusão, as práticas pedagógicas insurgentes tornam-se instrumentos de luta e resistência cotidiana. Freires et al. (2024) apontam que essas práticas se fortalecem em contextos onde os educadores se apropriam das tecnologias, dos saberes interdisciplinares e das experiências comunitárias para construir um ensino mais significativo e emancipador. Já Silva e Santos (2018) destacam que tais iniciativas contribuem para o desenvolvimento de uma cultura escolar mais crítica, inclusiva e horizontal, na qual o currículo é compreendido como um espaço vivo de disputa e reinvenção constante.
Com isso, destacam-se experiências como projetos pedagógicos que abordam questões de identidade, gênero, raça, meio ambiente ou direitos humanos por meio de metodologias ativas, mídias digitais e linguagens artísticas. Nobre et al. (2023) relatam casos em que professores utilizaram o cinema, o podcast e o mapeamento cultural como ferramentas para promover o protagonismo estudantil e o diálogo entre escola e comunidade. Tais experiências insurgentes, como argumentam Almeida e Valente (2019), demonstram que a docência pode ser um ato político de resistência e reinvenção, quando pautada na escuta, na alteridade e no compromisso com a transformação das condições de vida dos sujeitos escolares.
A gestão escolar, entendida como o conjunto de ações organizativas, políticas e pedagógicas que estruturam a dinâmica da escola, tem um papel crucial na mediação das transformações educativas. Sua origem conceitual se consolida nas reformas educacionais que visaram democratizar o acesso e a permanência na escola, ampliando a participação de todos os sujeitos do processo educativo. Segundo Almeida e Valente (2019), uma gestão escolar comprometida com a inovação e a inclusão é aquela que rompe com modelos centralizadores e autoritários, abrindo espaço para práticas mais dialógicas, colaborativas e alinhadas às demandas da diversidade.
Outrossim, no cenário atual da educação brasileira, a gestão escolar ocupa posição estratégica na implementação de projetos pedagógicos que valorizem a interdisciplinaridade, a diversidade e o uso crítico das tecnologias. Freires et al. (2024) destacam que, quando a gestão atua como liderança pedagógica, promovendo a escuta dos docentes e o fortalecimento das redes de aprendizagem, o cotidiano escolar se torna mais aberto à inovação. Silva e Santos (2018) observam que muitas experiências de reinvenção pedagógica nascem de gestões que incentivam a autonomia docente, a formação continuada e a articulação entre escola e comunidade.
Com isso, são notáveis as escolas em que a equipe gestora promove formações sobre equidade, apoia projetos interdisciplinares e valoriza iniciativas docentes voltadas à inclusão, como rodas de conversa, uso de tecnologias acessíveis ou trabalhos com temas transversais. Nobre et al. (2023) mencionam experiências exitosas de gestão participativa, nas quais decisões pedagógicas são construídas coletivamente, respeitando a diversidade de vozes e fortalecendo a identidade da escola como espaço plural. Assim, como afirmam Almeida e Valente (2019), a gestão escolar, quando alinhada aos princípios democráticos e inclusivos, se torna agente essencial na reinvenção do cotidiano formativo e na construção de uma escola verdadeiramente transformadora.
4 Conclusão
Diante do exposto, retoma-se o objetivo geral deste estudo, que consistiu em analisar como os saberes interdisciplinares podem ser mobilizados na formação docente para favorecer uma educação pautada na diversidade. Esse objetivo foi plenamente atingido, uma vez que a pesquisa permitiu compreender, por meio de uma análise bibliográfica qualitativa, a importância da articulação entre metodologias ativas, tecnologias digitais e práticas formativas inclusivas. A investigação demonstrou que a formação de professores precisa estar enraizada em princípios interdisciplinares que reconheçam e valorizem a pluralidade dos sujeitos escolares, proporcionando subsídios teóricos e práticos para o enfrentamento das desigualdades e das resistências institucionais.
Além do mais, os principais resultados revelam que, embora existam desafios significativos para a consolidação de uma educação inclusiva — como a falta de preparo docente, a resistência das instituições escolares e a fragmentação curricular —, há experiências e práticas que apontam caminhos possíveis. A integração de metodologias ativas e tecnologias digitais na formação inicial e continuada dos professores mostrou-se uma estratégia eficaz para promover o engajamento, a criticidade e a inovação pedagógica. Ademais, identificou-se que a interdisciplinaridade não deve ser apenas um conceito abstrato, mas uma prática concreta que se expressa na organização do trabalho pedagógico, nos projetos escolares e nas ações cotidianas dos docentes.
Consoante a isso, as contribuições teóricas deste trabalho concentram-se na articulação entre os estudos sobre formação docente, interdisciplinaridade e inclusão educacional. Ao dialogar com autores como Almeida e Valente (2019), Freires et al. (2024), Nobre et al. (2023) e Silva e Santos (2018), a pesquisa ofereceu uma síntese crítica e integrada que pode subsidiar futuras discussões acadêmicas e práticas pedagógicas comprometidas com a equidade e com a diversidade. O estudo também reforça o papel político-pedagógico da docência, ao defender que formar para incluir não é apenas uma meta institucional, mas um compromisso ético com a transformação da realidade educacional brasileira.
À vista disso, ressalta-se que a pesquisa não apresentou limitações significativas quanto ao seu percurso metodológico. A opção por uma abordagem bibliográfica qualitativa possibilitou uma análise densa, crítica e contextualizada dos referenciais teóricos e documentos analisados, conferindo profundidade às reflexões propostas. Portanto, os métodos adotados foram suficientes para atingir os propósitos delineados, permitindo uma leitura abrangente e fundamentada sobre o tema.
Sendo assim, recomenda-se que pesquisas futuras possam avançar para estudos empíricos que investiguem práticas formativas em contextos escolares específicos, especialmente em escolas públicas e de tempo integral. Seria oportuno observar como os professores, no cotidiano real de suas instituições, lidam com as exigências de uma educação voltada à diversidade e como constroem coletivamente estratégias interdisciplinares e inclusivas. Além disso, novas investigações poderiam explorar de forma mais aprofundada o papel da cultura digital na formação ética e cidadã dos docentes frente aos desafios de uma sociedade plural e em constante transformação.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Almeida, M. E. B., Valente, J. A. (2019). Tecnologias e currículo: trajetórias convergentes ou divergentes? São Paulo: Paulus.
Freires, K. C. P. et al. Reformulando o currículo escolar: Integrando habilidades do século XXI para preparar os alunos para os desafios futuros. Revista fisio&terapia, v. 28, p. 48-63, 2024. Disponível em: https://revistaft.com.br/reformulando-o-curriculo-escolar-integrando-habilidades-do-seculo-xxi-para-preparar-os-alunos-para-os-desafios-futuros/. Acesso em: 27 ago. 2024.
Nobre, D. B. A., Pereira, F. A., Capilupe, L. L. A., Silva, R. A. de M., & Silva Júnior, S. L. da. (2023). Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e o Currículo Brasileiro na Atualidade. Revista Ilustração, 4(2), 29–36.https://doi.org/10.46550/ilustracao.v4i2.151
Silva, M. V. da, & Santos, J. M. C. T. (2018). A BNCC e as implicações para o currículo da educação básica. In Anais do Congresso Nacional da Diversidade do Semiárido.
1 Mestranda em Educação pela Universidade Europeia do Atlântico. E-mail: [email protected].
2 Mestranda em Educação pela Universidade Europeia do Atlântico. E-mail: [email protected].
3 Mestrando em Educação pela Universidade Europeia do Atlântico. E-mail: [email protected].
4 Mestranda em Educação pela Universidade Europeia do Atlântico. E-mail: [email protected].