METODOLOGIAS ATIVAS NO ENSINO DE HISTÓRIA
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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.15540351
Camila Rosa Ponte1
Átila Barros Silva2
RESUMO
Diante das transformações sociais e tecnológicas, esta pesquisa analisa a importância das metodologias ativas no ensino de História, destacando seu papel na promoção do pensamento crítico, da autonomia e da participação dos alunos. A pesquisa qualitativa, com base em estudos de 2008 a 2025, evidenciou que estratégias como jogos, sala de aula invertida, dramatizações e ferramentas digitais tornam o conteúdo mais atrativo e conectado à realidade dos estudantes. Contudo, sua aplicação ainda enfrenta obstáculos, como a falta de preparo docente e infraestrutura. O estudo também alerta para o risco de uso superficial dessas metodologias. Conclui-se que sua adoção deve ser crítica e integrada ao ensino tradicional, com foco na prática pedagógica e no protagonismo discente.
Palavras-chave: Metodologias ativas; Ensino de História; Educação crítica.
ABSTRACT
Amid social and technological changes, this article analyzes the relevance of active methodologies in History teaching, emphasizing their role in fostering critical thinking, autonomy, and student engagement. The qualitative research, based on studies from 2008 to 2025, highlights that strategies such as games, flipped classrooms, dramatizations, and digital tools make historical content more appealing and connected to students’ realities. However, implementation still faces challenges, including insufficient teacher training and limited infrastructure. The study also warns against the superficial use of these approaches. It concludes that active methodologies should be critically adopted and integrated with traditional teaching, focusing on pedagogical practice and student protagonism.
Keywords: Active methodologies; History Teaching; Critical education.
INTRODUÇÃO
Recentemente, a área de ensino da História enfrenta um importante desafio ao ter que se ajustar às transformações sociais, culturais e tecnológicas que afetam a forma como os alunos se relacionam com o aprendizado. A escola, que antes representava a única fonte de conhecimento, agora compartilha esse papel com a internet, redes sociais, vídeos e diversas ferramentas interativas que alteram o comportamento dos jovens. Neste cenário, o professor de História, que antes se concentrava na transmissão de informações, precisa alterar sua abordagem, orientando os alunos e estimulando a criatividade e o pensamento crítico. As metodologias ativas emergem como componentes essenciais para tornar o aprendizado mais envolvente e participativo, permitindo que os estudantes adquiram conhecimento por meio de suas experiências e reflexões pessoais (Moran, 2013).
Embora as metodologias ativas tenham estado presentes por bastante tempo, elas se tornaram mais proeminentes devido às demandas do século XXI, especialmente em razão das limitações da educação tradicional, que não se conecta eficazmente com os jovens de hoje. Filósofos como John Dewey e Paulo Freire, já no século XX, defendiam que o aprendizado deveria estar enraizado nas experiências dos alunos, na troca de ideias sobre problemas do dia a dia e na construção colaborativa do conhecimento. Dewey acreditava que a escola deveria ser um espaço democrático e não apenas um local para decorar informações. Freire, por sua vez, propõe uma educação que emancipa, fundamentada no diálogo, na escuta atenta aos alunos e no reconhecimento de seus conhecimentos prévios, o que requer uma mudança nas abordagens de ensino convencionais. Esses princípios sustentam as metodologias ativas, que incluem práticas como aprendizado baseado em problemas, projetos, jogos, salas de aula invertidas e dramatizações, entre outras estratégias que incentivam a participação dos alunos. Ao combinar teoria e prática, essas metodologias promovem a autonomia dos estudantes, o fortalecimento do pensamento crítico e a preparação para a cidadania (Piaget, 2016; Valente, 2019).
Apesar das vantagens claras que as metodologias ativas oferecem, sua implementação no ensino de História ainda enfrenta várias barreiras significativas. Isso é perceptível na formação inicial e em contínua dos professores, bem como nas limitações estruturais das escolas, que muitas vezes carecem de recursos materiais, tecnológicos e até mesmo de tempo para adotar novas abordagens. Ademais, persiste uma mentalidade educacional que valoriza modelos centrados no conteúdo e nas avaliações, priorizando os resultados em detrimento do próprio processo de aprendizado. Portanto, a formação dos professores necessita de uma nova avaliação, que não apenas aborde a compreensão dos eventos históricos, mas também considere como se dá o aprendizado mediado por métodos ativos, além da capacidade de ajustar essas estratégias à realidade das salas de aula brasileiras (Tardif, 2014).
Diante desse cenário, é essencial explorar mais profundamente as vantagens e desvantagens das abordagens ativas no ensino de História, compreendendo de que forma podem contribuir para a formação de alunos mais críticos, reflexivos e engajados socialmente. Ao colocar os alunos no centro do processo de aprendizagem e promover a reflexão sobre a História através de experiências e atividades relevantes, essas metodologias apresentam uma alternativa pedagógica que se alinha com as necessidades da educação contemporânea. Contudo, para que essas metodologias sejam realmente eficazes, é necessário descartar uma visão limitada e superficial que frequentemente as define, além de desenvolver um plano educacional abrangente que esteja alinhado com as condições reais de trabalho dos educadores, o currículo escolar e as particularidades da disciplina histórica (Libâneo, 2013).
Dessa forma, o presente artigo tem como objetivo geral analisar a importância das metodologias ativas no ensino de História, discutindo seus fundamentos teóricos, suas contribuições para o processo de ensino-aprendizagem, seus desafios de implementação e suas implicações para a formação docente e a prática pedagógica na educação básica.
MÉTODO
Este estudo é identificado como uma pesquisa qualitativa e exploratória, que faz uso de uma revisão literária para examinar trabalhos acadêmicos que abordam o uso de metodologias ativas no ensino de História. A opção por esse método visa aprofundar a compreensão dos significados associados a essas abordagens educacionais no contexto atual. Segundo as observações de Gil (2021) e Severino (2016), a revisão literária é adequada para conhecer e interpretar, através de publicações científicas, as contribuições relativas a um tema, possibilitando o mapeamento teórico das discussões em curso e a comparação crítica entre diferentes pontos de vista.
A coleta de dados foi realizada no período de abril a maio de 2025, por meio de levantamento de produções científicas nas plataformas Scielo, Google Acadêmico, CAPES Periódicos e ERIC. Foram utilizados os seguintes descritores: “metodologias ativas”, “ensino de História”, “educação crítica”, “formação docente”, “inovação pedagógica”, “sala de aula invertida”, “gamificação”, “debates escolares” e “aprendizagem baseada em projetos”. Para assegurar a relevância e a contemporaneidade das fontes, foi estabelecido o critério de selecionar materiais publicados entre 2008 e 2025, considerando o período de renovação das discussões pedagógicas e das diretrizes educacionais no país.
Após a coleta inicial, foram escolhidos 23 trabalhos acadêmicos que se encaixavam nos critérios de relevância temática, rigor metodológico e coerência na argumentação. Os textos foram lidos e examinados através de uma abordagem qualitativa interpretativa, com a finalidade de identificar as principais categorias que surgiram, como os fundamentos teóricos das metodologias ativas, suas aplicações no ensino de História, os desafios que os educadores enfrentam ao adotá-las e as críticas à educação tradicional. A análise de conteúdo, segundo a proposta de Bardin (2016), guiou a organização das informações em eixos temáticos, viabilizando uma discussão crítica e embasada sobre os avanços e limitações na implementação dessas metodologias no ambiente escolar.
É indispensável destacar que o objetivo principal desta pesquisa não é realizar generalizações com base em dados estatísticos, mas sim fomentar uma compreensão mais profunda sobre métodos pedagógicos inovadores e seus efeitos na aprendizagem de História. Essa abordagem está alinhada aos princípios da pesquisa qualitativa, que prioriza a interpretação dos significados, a complexidade dos acontecimentos educacionais e o papel dos indivíduos envolvidos (Minayo, 2017). Dessa forma, a estratégia metodológica empregada busca captar a diversidade de experiências e perspectivas que afetam a prática dos educadores no ensino de História, oferecendo bases teóricas e análises críticas para sua reformulação.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Antes de entendermos o que são as metodologias ativas, devemos buscar a origem delas. As metodologias ativas não são algo novo, como aponta Abreu (2009): “Na obra Emilio de Jean Jacques-Rousseau (1712-1778), considerada o primeiro tratado sobre filosofia da educação no mundo ocidental, encontra-se o que se pode ter por prenúncio dos métodos ativos”. Nessa obra de Rousseau (2004, p. 41), a qual a experiência possui maior destaque do que a teoria, os métodos ativos têm suas primeiras aparições e o autor disserta:
“O espírito dessas regras está em conceder às crianças mais liberdade verdadeira e menos voluntariedade, em deixá-las com que façam mais por si mesmas e exijam menos dos outros. Assim, acostumando-se desde cedo, a subordinar seus desejos a suas forças, elas sentirão pouco a privação do que não estiver em seu poder.”
O debate em torno da pedagogia ativa foi aprofundado no século XX com os trabalhos de educadores que se tornaram referências mundiais. Maria Montessori propôs um método baseado na autonomia, na autoeducação e na preparação de ambientes que favoreçam o livre desenvolvimento da criança. Para ela, o professor deve observar e orientar, e não impor conteúdos, respeitando o ritmo e os interesses individuais do aluno (Montessori, 2004). Jean Piaget, por sua parte, baseou cientificamente a formação do conhecimento como uma consequência da relação entre o sujeito e o objeto, por meio de esquemas mentais que se reestruturam durante o processo de desenvolvimento. Suas ideias sobre as fases de crescimento demonstraram que a aprendizagem real acontece quando o estudante é incentivado a refletir, agir e se envolver com o mundo de maneira ativa e relevante.
No campo da educação crítica, Paulo Freire estabeleceu que o ato de educar é uma atividade política e emancipadora. Na sua obra Pedagogia da Autonomia, ele destaca a importância de reconhecer os saberes anteriores dos estudantes, especialmente aqueles oriundos das classes mais humildes, e de aceitar sua capacidade de produzir conhecimento a partir de suas experiências de vida. Conforme Freire (1996):
Por isso mesmo pensar certo coloca ao professor ou, mais amplamente, à escola, o dever de não só respeitar os saberes com que os educandos, sobretudo os da classes populares, chegam a ela – saberes socialmente construídos na prática comunitária – mas também, como há mais de trinta anos venho sugerindo, discutir com os alunos a razão de ser de alguns desses saberes em relação com o ensino dos conteúdos (Freire, 1996, p.53).
Freire também disserta sobre o respeito à autonomia do educando, na mesma obra anteriormente citada:
Outro saber necessário à prática educativa, e que se funda na mesma raiz que acabo de discutir – a da inconclusão do ser que se sabe inconcluso –, é o que fala do respeito devido à autonomia do ser do educando. Do educando criança, jovem ou adulto. Como educador, devo estar constantemente advertido com relação a este respeito que implica igualmente o que devo ter por mim mesmo. Não faz mal repetir afirmação várias vezes feita neste texto – o inacabamento de que nos tornamos conscientes nos fez seres éticos. O respeito à autonomia e à dignidade de cada um é um imperativo ético e não um favor que podemos ou não conceder uns aos outros (Freire, 1996, p.59).
O conceito de aprendizagem ativa está em consonância com as teorias de John Dewey, um influente filósofo da educação progressista. Dewey defendia que a aprendizagem ocorre quando os estudantes vivenciam situações concretas, explorando, agindo e refletindo sobre elas. Em Democracia e Educação, o autor afirma que “o objetivo da educação é proporcionar aos indivíduos a habilidade de continuar aprendendo, ou seja, aprender deve resultar na capacidade de sempre se desenvolver” (Dewey, 2007, p. 105). Essa perspectiva do aprendizado, visto como um processo dinâmico, reforça a importância das metodologias ativas para que os estudantes cultivem sua autonomia intelectual e se tornem cidadãos críticos, especialmente no ambiente escolar.
O QUE SÃO METODOLOGIAS ATIVAS E QUAL SUA IMPORTÂNCIA?
As metodologias ativas formam um conjunto de abordagens que estimulam a participação dos estudantes de maneira envolvente no processo de ensino, afastando-se do modelo clássico que se foca apenas na transmissão de informações. Assim, o aluno deixa de ser apenas um receptor passivo e passa a ser o ator principal de sua formação, se envolvendo na construção do conhecimento através de atividades como resolução de problemas, colaboração em grupo, discussões e expressões criativas, entre outras. Essas práticas ressaltam a aprendizagem por meio da vivência, aceitam os erros como parte do processo educativo e promovem a liberdade intelectual, com o objetivo de desenvolver capacidades de análise, reflexão e interação social. De acordo com Moran (2015), essas metodologias transformam a forma de ensinar, colocando o estudante como a figura central da educação e transformando o educador em um facilitador e intermediário. Essa mudança é sustentada por teorias filosóficas e pedagógicas de pensadores como Dewey, Montessori, Freire e Piaget, que destacaram a relevância da experiência e da construção ativa do conhecimento (Freire, 1996; Piaget, 2016).
A relevância das metodologias ativas está ligada à urgência de tornar a escola um ambiente dinâmico, significativo e alinhado com a realidade dos estudantes. No campo do ensino de História, essa questão adquire uma importância ainda maior, pois a matéria requer a interpretação de várias narrativas, a análise de fontes históricas, a reflexão sobre a memória coletiva e uma visão crítica do tempo. As metodologias ativas, ao encorajar uma participação mais intensa dos alunos, possibilitam que eles visualizem a História como um processo em constante mutação, e não como um conjunto de verdades absolutas. Atividades como discussões, simulações, oficinas e projetos interdisciplinares fomentam o pensamento crítico e auxiliam os estudantes a aprimorarem suas habilidades de análise, argumentação e posicionamento em relação aos fatos. Segundo Libâneo (2013), essas metodologias criam condições que possibilitam aos alunos assumirem um papel central em sua educação, respeitando suas diversidades, promovendo o diálogo e favorecendo um aprendizado mais significativo e duradouro (Valente, 2019).
Além disso, as metodologias ativas incentivam a conexão com recursos digitais e a aquisição de habilidades descritas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), como pensamento crítico, empatia, colaboração e capacidade de resolver problemas. Essas competências são indispensáveis para educar cidadãos em um contexto de mudanças rápidas na sociedade, cultura e informação. No ensino de História, a adoção dessas técnicas facilita a interpretação dos eventos históricos por meio de vivências diretas, aumentando o envolvimento e o sentimento de pertencimento dos estudantes. Dessa forma, as metodologias não apenas potencializam a aprendizagem, mas também reforçam a função social da educação na formação de pessoas cientes de sua época e do seu papel na sociedade.
A Tabela 1 sintetiza os principais princípios das metodologias ativas e suas respectivas aplicações no ensino de História, evidenciando os resultados esperados na formação dos estudantes.
Tabela 1: Princípios das metodologias ativas e sua contribuição no ensino de História
Princípios | Aplicações | Resultados Esperados |
Protagonismo do aluno | Análise de fontes históricas, debates e projetos interdisciplinares | Engajamento, autonomia e construção crítica do saber |
Aprendizagem significativa | Relação entre conteúdo e contexto de vida dos alunos | Compreensão profunda e duradoura |
Colaboração e interação | Atividades em grupo, dramatizações, simulações de eventos históricos | Desenvolvimento de habilidades sociais e comunicativas |
Reflexão e pensamento crítico | Questionamento de narrativas históricas dominantes | Formação cidadã e emancipatória |
Integração com tecnologias | Uso de plataformas digitais, vídeos, podcasts e jogos históricos | Atratividade e familiaridade com mídias contemporâneas |
Fonte: Elaborado pelo autor com base na BNCC (Brasil, 2018).
EXEMPLOS DE METODOLOGIAS ATIVAS E SUAS APLICAÇÕES
As metodologias ativas representam abordagens pedagógicas que colocam o estudante no centro do processo de aprendizagem, estimulando sua autonomia, participação crítica e construção ativa do conhecimento. A seguir, destacam-se alguns exemplos relevantes e suas aplicações práticas no contexto educacional:
1. GAMIFICAÇÃO
Gamificação é uma abordagem educacional que integra elementos típicos de jogos em ambientes de aprendizado, visando aumentar o envolvimento, o interesse e a retenção dos alunos. No campo da História, essa técnica tem o potencial de transformar temas que podem parecer maçantes em experiências interativas e cativantes. Por meio de desafios, sistemas de pontuação, classificações, recompensas simbólicas, atividades e histórias intrigantes, os estudantes são encorajados a se conectar com os temas históricos de uma forma lúdica e reflexiva. Um exemplo disso seria a criação de jogos sobre disputas históricas, fases de revoluções, batalhas por território ou simulações de assembleias políticas, onde os alunos assumem funções e defendem as perspectivas de figuras históricas, sejam elas reais ou fictícias, enriquecendo sua compreensão dos contextos sociais e ideológicos que cercam cada evento (Zichermann; Cunningham, 2011).
Além de despertar o interesse dos alunos, a gamificação também facilita a aprendizagem colaborativa e o aprimoramento de habilidades socioemocionais, como empatia, resolução de problemas e pensamento estratégico. Educadores podem se valer de ferramentas digitais como Kahoot, Quizizz, Classcraft e Google Forms para elaborar competições temáticas ou testes de maneira divertida. Uma alternativa é criar desafios investigativos inspirados em “escape rooms” que estão relacionados à história, onde os alunos devem solucionar enigmas que se apoiam em documentos, imagens, mapas ou cartas, promovendo a análise de fontes primárias e a reconstrução de narrativas. Quando bem alinhada com metas educacionais claras, essa técnica de ensino facilita a assimilação crítica dos conteúdos, pois os alunos são desafiados a interpretar eventos com base em evidências, justificar suas escolhas e reavaliar suas estratégias em tempo real (Deterding et al., 2011; Huizinga, 2001).
2. APRENDIZAGEM BASEADA EM PROBLEMAS (ABP)
A Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) é uma metodologia ativa que propõe a exploração de situações problemáticas, sejam elas reais ou fictícias, como ponto de partida para o aprendizado. No ensino de História, essa abordagem permite que os alunos analisem questões históricas relevantes, como conflitos sociais, dilemas políticos, movimentos revolucionários ou debates historiográficos. O problema apresentado deve ter complexidade suficiente para que o aluno busque informações, desenvolva hipóteses, compare diferentes fontes e construa argumentos sólidos. A ABP estimula o pensamento crítico e promove a autonomia, uma vez que o professor atua como facilitador do processo, não como fornecedor de respostas prontas (Barrows; Tamblyn, 1980).
Na sala de aula, o professor tem a possibilidade de agrupar os alunos e propor perguntas como: "Qual a relevância da Revolução Francesa na narrativa histórica?" ou "Quais são os fatores que levaram ao Golpe de 64?". Por meio disso, os alunos se dedicam a pesquisas, examinam documentos e compartilham suas descobertas através de seminários, debates ou relatórios. A Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) enfatiza a pesquisa e estimula a integração entre diferentes disciplinas, promovendo um aprendizado mais crítico e que se relaciona com a realidade. Além disso, auxilia no desenvolvimento de habilidades estabelecidas pela BNCC, como a argumentação, o senso de responsabilidade e a tomada de decisões (Mizukami, 2008; Hernandez, 1998).
3. DEBATES
Os debates são essenciais no ensino de História, pois expõem aos estudantes uma variedade de opiniões e maneiras de interpretar o conteúdo. Ao promover discussões em sala de aula, o educador encoraja os alunos a confrontar diferentes visões sobre um evento ou fenômeno histórico, incentivando a reflexão crítica, o respeito por opiniões distintas e a capacidade de argumentação verbal. Um exemplo seria dividir a turma em grupos, cada um defendendo uma perspectiva sobre temas como imperialismo, escravidão, ditadura ou globalização, fazendo com que investiguem, elaborem argumentos e sustentem suas posições com provas (Perrenoud, 2000). Esse estilo de ensino não apenas favorece a compreensão do conteúdo, mas também exercita princípios democráticos e a habilidade de escuta. Ao replicar debates acadêmicos, os alunos aprendem a diferenciar entre opinião e argumento, a levar em conta diversas narrativas e a se posicionar acerca de assuntos históricos e contemporâneos. Ademais, as discussões podem ser ligadas a outros tipos de produções textuais, como resumos, ensaios e relatórios, conectando as habilidades de oratória e escrita. Consoante Zabala (1998), as discussões são ótimas para formar indivíduos críticos e conscientes, particularmente em áreas que tratam de tópicos de memória, identidade e poder (Zabala, 1998; Libâneo, 2013).
4. DRAMATIZAÇÃO
A encenação se refere a uma abordagem que combina o uso do movimento, da criatividade e da arte durante o aprendizado. No contexto do ensino da História, essa técnica permite que alunos atuem como figuras históricas, reconstituam cenários do passado e se envolvam na interpretação de eventos históricos, oferecendo uma experiência envolvente e que se relaciona diretamente com os conteúdos estudados. Esse método favorece a aprendizagem dos conteúdos ao fazer com que os estudantes se tornem protagonistas das narrativas históricas, aumentando a compreensão dos elementos simbólicos, culturais e emocionais que estão presentes nas situações históricas (Koudela, 2008).
Dentro da sala de aula, o docente pode promover pequenas encenações sobre episódios como o julgamento de Sócrates, a promulgação da Lei Áurea ou os eventos que cercaram a Independência do Brasil. O ato de criar essas encenações, que abrange desde a elaboração dos textos, a pesquisa, até os ensaios e a apresentação final, transforma-se numa experiência rica e interdisciplinar que mistura História, Literatura, Artes e Língua Portuguesa. Além disso, essa prática incentiva a sensibilidade estética, a empatia e a habilidade de comunicação, competências fundamentais para a cidadania e a compreensão dos eventos históricos. Assim, a encenação se revela não apenas como uma atividade lúdica, mas como um recurso poderoso para a reconstituição do passado, fundamentado em experiências vividas (Freire, 1996; Koudela, 2008).
5. EXIBIÇÃO DE FILMES
O uso de filmes como recurso didático no ensino da História representa uma metodologia que combina entretenimento e análise crítica. As produções cinematográficas possibilitam visualizar contextos históricos, recriar cenários, representar personagens e dramatizar eventos, o que ajuda a criar uma conexão emocional e cognitiva dos alunos com os assuntos tratados. Ao assistir a um filme, o estudante é apresentado a elementos visuais, sonoros e simbólicos que auxiliam na interpretação dos processos históricos e promovem a análise de diferentes formas de linguagem (Napolitano, 2003).
Contudo, para que a utilização de filmes seja efetiva, é categórico que exista uma intenção pedagógica bem definida. O educador deve escolher filmes apropriados, estabelecer metas claras, sugerir atividades de reflexão crítica e discutir com os alunos as limitações e as potencialidades da linguagem do cinema na representação histórica. Títulos como "A Lista de Schindler", "Olga", "Tempos Modernos" e "Getúlio" podem ser utilizados para explorar temas como o Holocausto, a ditadura, a Revolução Industrial e a política no Brasil, respectivamente. As atividades após a exibição do filme podem incluir a produção de textos, discussões, painéis ou comparações com documentos históricos. De acordo com Napolitano (2003), o cinema não substitui a pesquisa historiográfica, mas serve como um meio valioso para incitar reflexões e encorajar o pensamento histórico (Napolitano, 2003; Valente, 2019).
6. SALA DE AULA INVERTIDA (FLIPPED CLASSROOM)
Em vez do método tradicional de ensino, a abordagem da sala de aula invertida propõe uma mudança: os alunos estudam a teoria previamente em casa, utilizando vídeos e textos, e aproveitam o tempo em sala para aprofundar a compreensão e aplicar o que aprenderam. Dessa forma, os estudantes se tornam mais autônomos, enquanto o professor auxilia com esclarecimentos e demonstra como aplicar o conhecimento na prática, além de promover atividades em grupo. Por exemplo, em História, pode-se enviar vídeos ou textos sobre um determinado período antes da aula, para que, durante o tempo em classe, se analisem fontes históricas, realizem simulações e debates (Bergmann; Sams, 2012).
Para que esse método seja eficaz, é essencial um planejamento cuidadoso, e o professor deve ter competência em tecnologia, além de monitorar o empenho dos alunos antes da aula. Quando implementada corretamente, a sala de aula invertida proporciona um ensino mais personalizado, respeitando as diferentes formas de aprendizado de cada aluno. Também otimiza o uso do tempo em sala, tornando as aulas mais produtivas e promovendo maior envolvimento dos estudantes. No caso da História, onde a análise crítica e o debate são essenciais, essa metodologia conecta teoria e prática de maneira eficaz (Morán, 2015).
ENSINO DE HISTÓRIA E A TECNOLOGIA
Incorporar a tecnologia na educação de História vai além de simplesmente modernizar os métodos; representa uma transformação marcante na forma como aprendemos e ensinamos. A matéria, que anteriormente focava em aulas e livros tradicionais, agora abre espaço para novas metodologias de ensino ao utilizar ferramentas digitais que ampliam o acesso dos estudantes a variadas fontes, expressões e pontos de vista. Em um mundo cada vez mais digital, a formação em História deve ser analítica e fazer uso eficaz da tecnologia, aproveitando suas potencialidades para promover a autonomia, a criatividade e a reflexão. Como indicado por Valente (2019), a aplicação de recursos digitais nas instituições de ensino vai além da técnica, abrangendo a elaboração de métodos de ensino inovadores que se conectam com a cultura digital e incentivam o pensamento crítico (Valente, 2019).
A tecnologia, quando utilizada com um objetivo educacional claro, tem o poder de converter o aprendizado da História em experiências interativas e cativantes. Através de ferramentas como infográficos, jogos digitais, cronologias multimídia, simulações e ambientes virtuais, os alunos tornam-se participantes ativos no processo de formação do conhecimento histórico. Por exemplo, ao usar plataformas como o Timeline JS, os estudantes podem desenvolver suas próprias linhas do tempo com eventos, fontes e imagens, melhorando suas habilidades em organizar acontecimentos e contar histórias. Com o Google Earth, eles conseguem explorar rotas marítimas, áreas de conflito e fluxos migratórios, conectando visualmente a geografia à História. Assim, a tecnologia ajuda a desenvolver competências essenciais descritas na BNCC, como o uso crítico de informações, raciocínio lógico, comunicação e pesquisa (BRASIL, 2018). Entretanto, ao integrar a tecnologia no ensino de História, é indispensável adotar uma abordagem crítica. A internet é um espaço repleto de várias interpretações da História, revisões e informações enganosas. Portanto, cabe às instituições de ensino prepararem os alunos para analisar e avaliar o que encontram online, desenvolvendo habilidades que os ajudem a interpretar a mídia e a História, facilitando a identificação de fontes confiáveis, o reconhecimento de informações ausentes e a percepção dos interesses por trás das narrativas. Tendências como memes históricos, vídeos de influenciadores, postagens em redes sociais ou boatos podem, por exemplo, conectar o conteúdo com as experiências dos alunos, ao mesmo tempo que cultivam uma visão crítica sobre a exposição pública da História. Como argumenta Santaella (2013), é fundamental preparar os jovens para que não sejam apenas consumidores da tecnologia, mas leitores ativos da cultura digital e de suas repercussões na formação do conhecimento (Santaella, 2013).
Um ponto importante a ser considerado é como incentivar a participação dos alunos, incentivando-os a criar conteúdo digital. Ao desenvolver podcasts, vídeos, apresentações e blogs que abordam temas históricos, os estudantes deixam de ser meros ouvintes para se tornarem participantes ativos do seu aprendizado. Essa mudança de atitude provoca um efeito positivo na confiança, na motivação e no senso de responsabilidade dos alunos. De acordo com Moran (2015), a tecnologia deve ser utilizada para aprimorar uma abordagem pedagógica dinâmica, focada no aluno, que estimule a criatividade, a troca de ideias, a atenção e a pesquisa. Dessa forma, o ensino de História se torna mais interessante e profundo, passando de uma simples repetição de conhecimentos para um processo contínuo de exploração e redefinição de conceitos (Moran, 2015).
Dentro desse panorama, diversas ferramentas digitais podem ser integradas de maneira estratégica ao planejamento educacional da matéria de História, não como alternativas ao conteúdo, mas como instrumentos que ampliam a aprendizagem ativa, a pesquisa e a análise crítica. Em seguida, é apresentada uma tabela com exemplos de plataformas tecnológicas e suas funções no ensino de História, além das principais competências que são aprimoradas com sua utilização, de acordo com os fundamentos das metodologias ativas e as orientações da BNCC. A seguir, apresenta-se uma tabela com exemplos de plataformas tecnológicas aplicadas ao ensino de História, suas funcionalidades pedagógicas e as principais competências que são desenvolvidas com sua utilização, conforme os princípios das metodologias ativas e as diretrizes da BNCC.
Tabela 2: Tecnologias aplicadas ao ensino de História e seus efeitos pedagógicos
Ferramenta/Plataforma | Aplicação no Ensino de História | Habilidades Desenvolvidas |
Google Earth | Exploração de rotas históricas, fronteiras e eventos geopolíticos | Leitura espacial, análise territorial, geohistória |
Timeline JS | Criação de linhas do tempo multimídia sobre eventos históricos | Organização cronológica, síntese, autoria digital |
Podcasts e vídeos autorais | Produção de conteúdo sobre temas históricos com linguagem acessível | Comunicação oral, pesquisa, autoria e argumentação |
Museus virtuais e AR | Visitação digital a acervos históricos, simulações de batalhas e cidades antigas | Empatia histórica, análise cultural, interpretação visual |
Plataformas de gamificação | Quiz temáticos, jogos de múltipla escolha, RPGs históricos online | Raciocínio lógico, motivação, fixação de conteúdo |
Fonte: Elaborado pelo autor.
QUESTÕES SOBRE A EDUCAÇÃO TRADICIONAL
Em várias instituições de ensino, especialmente nas públicas, ainda se observa aquele método tradicional de educação, com o docente no papel principal, transmitindo seus conhecimentos e desafiando os alunos a memorizar conteúdos. Essa abordagem, que remonta ao passado e coloca o educador como a principal referência, foi significativa e continua a ser, pois proporciona uma estrutura ao aprendizado, clarifica os conteúdos e auxilia na delimitação do que devemos dominar. Contudo, se esse for o único método adotado, não favorece nosso desenvolvimento pessoal, pois ignora nossa habilidade de refletir de forma independente, formular ideias, questionar e participar ativamente de nosso processo de aprendizagem. Como mencionou Libâneo (2013), essa pedagogia antiquada é útil para organizar o material, mas não pode perder de vista que, na atualidade, é essencial formar indivíduos que pensem, contemplem e façam escolhas por conta própria (Libâneo, 2013).
A dificuldade da educação tradicional reside no fato de nos tornarmos excessivamente passivos, recebendo informações sem a possibilidade de questionar, investigar ou aplicar o conhecimento obtido em contextos reais. Dessa maneira, torna-se complicado cultivar habilidades essenciais para a vida, como raciocínio lógico, trabalho em grupo, expressão de opiniões e resolução de problemas. No contexto das aulas de História, por exemplo, a compreensão dos processos históricos se torna desafiadora, assim como a análise de diversos pontos de vista e a empatia com as experiências de indivíduos do passado. Dewey (2007) já afirmava que a educação deveria nos habilitar a aprender continuamente, algo que ocorre apenas quando as aulas se baseiam no que já sabemos e nos motivam a participar ativamente (Dewey, 2007). Entretanto, atualmente a situação é oposta: as novas abordagens estão sendo tão exaltadas que a educação tradicional é vista como irrelevante. Essa percepção, mesmo que pareça positiva, é arriscada, uma vez que muitos alunos assimilam melhor os conteúdos quando há estrutura, horários estabelecidos, explicações diretas e atividades com um caráter mais previsível. Para certos jovens e crianças, particularmente aqueles em condições adversas, o modelo tradicional pode proporcionar segurança, estabilidade e uma forma racional de aprender. Nóvoa e Alarcão (2001) ressaltam que não existe um método ideal, mas diversos caminhos que devem ser escolhidos conforme cada turma, disciplina e educador (Nóvoa; Alarcão, 2001).
É essencial ter em mente que, apesar dos claros benefícios das metodologias ativas, sua implementação requer certas condições, como tempo apropriado para aprendizagem, formação contínua para educadores, acesso à tecnologia, infraestrutura adequada e cooperação dentro da escola. Muitas vezes, esses elementos estão ausentes nas escolas públicas brasileiras. Forçar o uso dessas metodologias, sem os recursos necessários, pode causar frustração, prejudicar o desempenho e minar a confiança no processo de ensino. Portanto, é imperativo considerar as metodologias ativas como alternativas, e não como respostas definitivas. A excelência educacional não reside na metodologia empregada, mas na utilização crítica e planejada das ferramentas disponíveis, conforme argumenta Imbernón (2011), que ressalta a importância de um diálogo entre inovação e a realidade das instituições educacionais (Imbernón, 2011).
Assim, tanto os métodos tradicionais quanto as metodologias ativas são valiosos e podem ser implementados de maneira reflexiva, deliberada e alinhada ao projeto da escola. No contexto do ensino de História, uma abordagem equilibrada pode integrar aulas teóricas com atividades práticas, discussões, análise de fontes e tecnologia. Uma aula bem conduzida, que demonstre domínio do conteúdo e estabeleça conexões com a vida dos estudantes, continua a ser eficaz. Por outro lado, as metodologias ativas fortalecem a capacidade dos alunos de compreender o mundo histórico através de experiências interativas e trabalho em grupo. Como mencionado por Perrenoud (2000), um educador competente é aquele que utiliza diferentes métodos, ajustando-os ao contexto e promovendo aprendizagens significativas (Perrenoud, 2000).
Dessa forma, a discussão entre o ensino tradicional e as metodologias ativas não deve ser extremista ou simplista. O que realmente importa é transcender divisões e criar um ensino diversificado, contextualizado e crítico. Em vez de optar por um ou outro, o desafio reside em saber em que situações cada abordagem é mais adequada, assegurando que todas elas respeitem princípios éticos, democráticos e pedagógicos. O ensino de História, devido à sua riqueza e complexidade, necessita dessa flexibilidade, respeitando o ritmo dos alunos, desenvolvendo competências e transformando a sala de aula em um ambiente dinâmico de construção de significados (Freire, 1996; Libâneo, 2013; Valente, 2019).
INTERPRETAÇÃO CRÍTICA DOS DADOS
A análise do material acadêmico examinado revela que as metodologias ativas marcam um avanço significativo nas táticas educacionais aplicadas ao ensino de História, principalmente pela capacidade de promover um aprendizado mais envolvente, contextual e reflexivo. Os estudos revistos compartilham a mesma opinião sobre a importância do papel ativo do estudante, da pesquisa como meio de construção do conhecimento e da diversidade de expressões nas instituições de ensino. Estratégias como jogos, aprendizagem orientada por problemas, dramatizações e sala de aula invertida foram identificadas, em várias investigações, como formas eficazes de estimular a motivação dos alunos, aumentar o interesse por assuntos de história e desenvolver habilidades como argumentação, empatia, pensamento crítico e trabalho em equipe.
Entretanto, essa literatura destaca que a implementação dessas metodologias requer um planejamento meticuloso, objetivos de aprendizado bem definidos e capacitação específica para os educadores. A inadequação do preparo, juntamente com a falta de infraestrutura tecnológica e a sobrecarga do trabalho docente, pode comprometer a eficácia das práticas ativas, tornando-as superficiais ou mal implementadas. Além disso, pesquisas apontam que muitos educadores enfrentam resistências institucionais e culturais ao tentarem implementar mudanças em suas metodologias, evidenciando a necessidade de políticas educacionais mais robustas que incentivem a inovação pedagógica. A pesquisa bibliográfica também demonstrou que a maioria das experiências bem-sucedidas com abordagens ativas ocorre em ambientes escolares que possuem certa estabilidade, acesso a recursos e suporte institucional, situações ainda distantes da realidade de muitas escolas públicas no Brasil. Por outro lado, um elemento significativo identificado nos textos revistos é a ameaça da “espetacularização” das metodologias ativas, isto é, sua implementação de maneira desconexa, como uma tendência passageira ou solução mirabolante para os problemas educacionais. Essa abordagem pode resultar em uma desconfiguração do processo de ensino, com ênfase excessiva em atividades performáticas, mas com pouca profundidade. A efetividade de uma técnica, seja tradicional ou ativa, reside em sua intenção pedagógica, no alinhamento com os objetivos curriculares e no respeito ao contexto sociocultural dos alunos. Portanto, os dados coletados reforçam a necessidade de um equilíbrio metodológico, de uma escuta atenta das realidades escolares e de uma perspectiva crítica em relação às práticas educacionais. A escolha da metodologia deve ser guiada por aquilo que se pretende ensinar, a forma como se deseja ensinar e, especialmente, para quem se quer ensinar.
METODOLOGIAS ATIVAS COMO APOIO E NÃO SOLUÇÃO
A emergência das chamadas “metodologias ativas de aprendizagem” nas discussões educacionais contemporâneas tem sido acompanhada por discursos entusiásticos que, por vezes, as posicionam como panaceias para as múltiplas crises da educação. Tais abordagens, que incluem a sala de aula invertida, a aprendizagem baseada em projetos, estudos de caso, ensino híbrido, gamificação, entre outras, são frequentemente apresentadas como estratégias capazes de promover o engajamento discente, a autonomia intelectual e o protagonismo estudantil. Entretanto, ao reduzir o debate pedagógico a uma questão meramente metodológica, corre-se o risco de esvaziar sua dimensão política e epistemológica, desconsiderando os fundamentos da práxis educativa como espaço de formação crítica e emancipatória.
A obra de Paulo Freire, notadamente em Pedagogia da Autonomia (1996), constitui uma crítica contundente à concepção tradicional de educação centrada na transmissão verticalizada de saberes e na negação da experiência vivida dos educandos. A pedagogia freiriana afirma o direito à fala, à escuta, ao erro como caminho e à autonomia como processo histórico. Não se trata, portanto, de simplesmente substituir métodos, mas de construir uma nova racionalidade pedagógica, alicerçada na dialogicidade, na problematização e no reconhecimento dos saberes populares e comunitários. Freire adverte contra qualquer técnica que se imponha de forma autoritária ou tecnocrática, desvinculada da realidade concreta dos sujeitos: “Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção” (Freire, 1996, p. 47).
Neste sentido, a crítica freiriana à "pedagogia bancária" revela-se ainda atual quando observamos que determinadas metodologias ativas, apesar da roupagem inovadora, acabam por reproduzir uma lógica instrumental da aprendizagem. Quando aplicadas sem consciência crítica, tais metodologias apenas deslocam a ênfase da centralidade do professor para uma centralidade metodológica, esvaziando o conteúdo político da educação e perpetuando relações de poder sutis e não problematizadas.
No plano prático, as metodologias ativas vêm ganhando destaque nos discursos de políticas públicas, reformas curriculares e instituições privadas de ensino. O modelo da sala de aula invertida, defendido por Bergmann e Sams (2012), propõe a reorganização do tempo e espaço escolar a partir de uma inversão entre os momentos de exposição teórica e resolução de problemas, transferindo a exposição inicial de conteúdos para o ambiente domiciliar por meio de vídeos e materiais digitais. A ideia é que, em sala, o tempo seja dedicado à aplicação prática, à interação e ao debate. Entretanto, tal rearranjo metodológico, embora promissor, não está isento de críticas. Conforme alerta Abreu (2009), a adoção de metodologias ativas em contextos desestruturados, seja por falta de recursos, formação docente insuficiente ou ausência de projeto pedagógico coerente, pode gerar uma sensação de inovação pedagógica aparente, mascarando a precariedade das condições materiais e simbólicas da escola.
Além disso, a generalização da noção de “protagonismo do aluno” pode se transformar em um imperativo performático que ignora as desigualdades históricas e estruturais dos sujeitos. O protagonismo, quando tratado como imposição e não como construção dialógica e crítica, corre o risco de reforçar a lógica neoliberal da responsabilização individual e da meritocracia, obscurecendo as determinações sociais que incidem sobre o processo educativo. Hernández (1998), ao propor os projetos de trabalho como metodologia transgressora, contribui com uma perspectiva de aprendizagem centrada na experiência significativa, interdisciplinar e situada. O autor propõe que os projetos não sejam simples agregadores de atividades práticas, mas sim espaços de negociação de sentidos, de construção coletiva de saberes e de articulação entre escola e vida. Contudo, mesmo as propostas de Hernández requerem mediação docente crítica e compromisso com a formação humanizadora. A simples adoção de projetos de trabalho sem reflexão sobre sua intencionalidade pedagógica pode resultar na superficialidade do conteúdo, na fragmentação curricular ou na falsa ideia de liberdade. Como afirma Freire: “Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Esses quehaceres se encontram um no corpo do outro” (Freire, 1996, p. 35). Dessa forma, o docente deve atuar como intelectual comprometido, e não como técnico aplicador de modelos prontos. As metodologias ativas só ganham sentido emancipatório se forem compreendidas como meios e não como fins, como ferramentas em um processo maior de formação crítica e transformação social.
Um dos principais perigos das metodologias ativas quando desvinculadas de um projeto político-pedagógico crítico é sua apropriação por discursos gerencialistas. A ideia de que a simples introdução de novas técnicas resolverá os problemas educacionais ignora que a educação é, antes de tudo, um fenômeno político. A neutralidade metodológica é, portanto, uma falácia perigosa, pois invisibiliza os conflitos de classe, raça, gênero e território que atravessam a escola. Na era da performance e da eficiência, há uma tendência de se medir o “sucesso pedagógico” pelas métricas de produtividade e inovação tecnológica, em detrimento da construção de vínculos, da escuta ativa e da formação ética. Neste ponto, o pensamento de Freire nos desafia a retomar a centralidade do sujeito na práxis educativa e a resistir às seduções das soluções fáceis e rápidas. A educação, enquanto ato de liberdade, exige tempo, escuta, contradição e compromisso. Nenhuma metodologia, por mais inovadora que seja, poderá substituir a complexidade da relação pedagógica. Como afirma Freire: “A formação técnica, científica e profissional é indispensável, mas não suficiente. O fundamental é saber pensar certo” (Freire, 1996, p. 28).
Em breve síntese, as metodologias ativas, longe de representarem uma ruptura em si mesmas, devem ser compreendidas como possibilidades instrumentais dentro de um horizonte mais amplo de transformação educativa. Seu valor reside não na novidade técnica, mas na maneira como são incorporadas a projetos políticos comprometidos com a justiça social, a equidade e a formação integral dos sujeitos. A pedagogia freiriana nos convida a resgatar o sentido ético e político do ato de educar. É preciso, portanto, recusar tanto a pedagogia bancária quanto a pedagogia tecnocrática das metodologias ativas despolitizadas. Entre o tecnicismo e o imobilismo, a saída é a mediação crítica, capaz de integrar métodos, contextos e sujeitos em um movimento dialético de construção coletiva do conhecimento.
A educação não será salva por metodologias, mas por educadores e educadoras críticos, atentos à historicidade dos sujeitos e comprometidos com um projeto emancipatório. Como afirmou Freire, “ensinar exige risco, aceitação do novo e rejeição a qualquer forma de discriminação”. As metodologias ativas podem apoiar este caminho, mas jamais substituí-lo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho teve como objetivo principal investigar a importância das metodologias ativas na educação em História, visando compreender os seus benefícios, desafios e métodos de implementação na educação básica. Através de uma análise meticulosa da literatura existente, constatamos que as metodologias ativas representam um avanço significativo rumo a um ensino que é mais interativo, engajado e centrado na construção do conhecimento pelos alunos. No contexto do ensino de História, essas abordagens ampliam as oportunidades para explorar temas, valorizam a experiência dos estudantes e promovem o desenvolvimento de habilidades essenciais para a formação crítica e cidadã, como a avaliação de fontes, a comparação de narrativas e a investigação crítica do passado.
Entretanto, a pesquisa também indicou que a aplicação de metodologias ativas, por si só, não garante a qualidade do aprendizado. A eficácia dessas metodologias está intrinsecamente relacionada ao planejamento educacional, aos objetivos das atividades de ensino, à formação contínua dos educadores e às condições estruturais das instituições de ensino. Além disso, observou-se um recente excesso de promoção das metodologias ativas em relação ao ensino tradicional, o que pode levar a práticas desconectadas da realidade e sem resultados efetivos. É elementar reconhecer que a educação tradicional, quando bem estruturada, ainda desempenha um papel significativo no processo de aprendizagem, especialmente em situações que requerem organização e clareza conceitual. Uma limitação deste trabalho é a sua abordagem centrada exclusivamente na bibliografia, o que impede a observação direta de práticas pedagógicas em sala de aula. Para investigações futuras, é recomendado realizar estudos de caso, análises de práticas reais e pesquisas empíricas que examinem os efeitos das metodologias ativas em diferentes contextos educacionais, considerando também as percepções de professores e alunos. Progredir nessa área é vital para fortalecer a prática docente e contribuir para a construção de uma educação que seja mais crítica, inclusiva e transformadora.
Dessa forma, chegamos à conclusão de que a busca por um ensino de História mais significativo não deve se basear em tendências pedagógicas passageiras ou em divisões metodológicas, mas sim em uma postura reflexiva, crítica e contextualizada por parte do professor. A combinação equilibrada entre métodos tradicionais e abordagens ativas possibilita uma resposta mais efetiva às necessidades dos estudantes e às exigências de uma educação completa. O ensino de História, devido à sua complexidade e riqueza, demanda uma diversidade de estratégias, flexibilidade didática e um comprometimento com a formação de indivíduos historicamente conscientes de seu papel na sociedade.
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1 Discente do Curso de Pedagogia pela Universidade Estácio de Sá (Campus Teresópolis).
2 Docente dos Cursos de Pedagogia, Análise e Desenvolvimento de Sistemas e Ciências da Computação (UNESA-RJ). Doutorando em Educação pela Universidade Nacional de Rosário (UNR-ARG). Mestrado em Educação (UNESA-RJ). MBA em Data Warehouse e Business Intelligence (FI - PR). Pós-Graduado em Engenharia de Software, Antropologia, Psicopedagogia, Neuropsicopedagogia, Educação no Campo, Filosofia e Ciência da Religião (FAVENI-MG). Historiador pela Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU-SP). E-mail: [email protected]