IMPORTÂNCIA DA INVESTIGAÇÃO DE TUBERCULOSE EM POPULAÇÕES DE PRIMATAS NÃO HUMANOS DE CATIVEIRO - REVISÃO DE LITERATURA

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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.12174605


Natalie Fontenla Bertolli1
Isabele Barbieri dos Santos2


RESUMO
A revisão sobre a investigação de tuberculose (TB) em população de primatas não humanos aborda a relevância da TB como um grave problema de saúde pública e animal, especialmente em cativeiros. Esta doença infectocontagiosa, causada por espécies do complexo Mycobacterium tuberculosis, afeta uma ampla variedade de mamíferos, incluindo primatas não humanos, que são altamente suscetíveis à infecção. Com o objetivo de compreender e controlar a disseminação da TB entre esses primatas, são utilizados diversos métodos diagnósticos, como o teste cutâneo de tuberculina (TST), testes de liberação de interferon gama (IFN-γ), ELISA e PCR. O TST, apesar de ser amplamente utilizado, apresenta limitações significativas devido a resultados falsos-positivos e falsos-negativos. A pesquisa enfatiza a necessidade de uma abordagem integrada, combinando técnicas diretas, celulares e sorológicas para um diagnóstico mais preciso e eficiente da TB. A conclusão indica que a implementação de múltiplos métodos diagnósticos é crucial para a detecção precoce e controle efetivo da doença em primatas não humanos, contribuindo significativamente para a saúde desses animais e para a mitigação dos riscos zoonóticos associados.
Palavras-chave: Tuberculose; Primatas Não Humanos; Diagnóstico; Zoonose.

Abstract
The review on tuberculosis (TB) investigation in the non human primate population addresses the relevance of TB as a serious public and animal health problem, especially in captivity. This infectious disease, caused by species of the Mycobacterium tuberculosis complex, affects a wide variety of mammals, including non-human primates, which are highly susceptible to infection. With the aim of understanding and controlling the spread of TB among these primates, several diagnostic methods were used, such as the tuberculin skin test (TST), interferon gamma (IFN-γ) release tests, ELISA and PCR. The TST, despite being widely used, has specific limitations due to false-positive and false-negative results. The research emphasizes the need for an integrated approach, combining direct, cellular and serological techniques for a more accurate and efficient diagnosis of TB. The conclusion indicates that the implementation of multiple diagnostic methods is crucial for the early detection and effective control of diseases in non-human primates, contributing significantly to the health of these animals and to the mitigation of associated zoonotic risks.
Keywords: Tuberculosis; Non Human Primates; Diagnosis; Zoonosis.

1 INTRODUÇÃO

A tuberculose (TB) permanece como um significativo problema de saúde pública no Brasil e no mundo (Thomas et al., 2021; WHO, 2023; Zaporojan et al., 2024). Esta doença infectocontagiosa granulomatosa crônica é provocada por espécies do complexo Mycobacterium tuberculosis - o MTBC (Mycobacterium tuberculosis complex), do qual fazem parte inúmeras espécies de micobactérias, algumas associadas ao homem, enquanto outras são associadas ao seu próprio tipo de hospedeiro não humano, tais como ungulados e roedores (Gomez-Laguna; Pallares; Salgueiro, 2024). Entretanto, todas as espécies do MTBC têm a capacidade de infectar uma ampla variedade de espécies de mamíferos (Srilohasin et al., 2024).

De acordo com Paton e colaboradores (2023), além de sua complexidade biológica, a tuberculose apresenta desafios significativos devido à sua transmissibilidade e resistência a tratamentos convencionais. A principal forma de transmissão da TB ocorre pela inalação de aerossóis contendo bacilos tuberculosos liberados por indivíduos infectados, especialmente durante atividades como tossir, espirrar ou falar. Uma vez nos pulmões, as bactérias do MTBC podem se disseminar para outros órgãos através da corrente sanguínea ou do sistema linfático, levando à formação de granulomas, característica patognomônica da doença (Kock et al., 2021;WHO, 2023).

A persistência da tuberculose como problema de saúde pública está também associada a fatores socioeconômicos, comportamentais e estruturais. Populações marginalizadas, incluindo indivíduos com baixo acesso a serviços de saúde e condições de moradia inadequadas, estão particularmente em risco (Lönnroth et al., 2010). A coinfecção com o vírus da imunodeficiência humana (HIV) é um fator adicional que aumenta significativamente o risco de desenvolver tuberculose ativa entre pessoas infectadas, contribuindo para a complexidade e gravidade do quadro clínico (WHO, 2023).

O controle eficaz da tuberculose requer uma abordagem multifacetada que inclui diagnóstico precoce, tratamento adequado, prevenção da transmissão e melhoria das condições socioeconômicas (WHO, 2023). Avanços recentes em biologia molecular e microbiologia têm permitido uma melhor compreensão das interações entre o MTBC e o hospedeiro humano, além de contribuírem para o desenvolvimento de novas estratégias terapêuticas (Gomez-Laguna; Pallares; Salgueiro, 2024) e vacinas promissoras (Thomas et al., 2021). No entanto, a erradicação completa da tuberculose permanece um desafio global devido à persistência de bolsões de transmissão e à emergência de cepas resistentes a múltiplos medicamentos (WHO, 2023).

2 REVISÃO DE LITERATURA

2.1 EPIDEMIOLOGIA E ZOONOSE

A TB é uma zoonose de fácil dispersão (Srilohasin et al., 2024) por meio de aerossóis e contato direto, com altos índices de morbidade e mortalidade em primatas não humanos (PNH). Em função de suas características epidemiológicas, clínicas e anatomopatológicas, aliadas ao seu significativo potencial zoonótico, poucas doenças se equiparam ao efeito devastador da TB nas populações de primatas, especialmente aquelas mantidas em cativeiro (Engel; Wilbur; Jones-Engel, 2013). As perdas econômicas associadas à morte de animais doentes é muito alto; cada animal é valioso e a perda de animais experimentais compromete os resultados das pesquisas, acarretando drásticos impactos econômicos, laborais e científicos (Wilbur, 2012; Thomas, 2021).

Apesar do empenho e da importância da doença na criação e experimentação de PNH, ainda se conhece pouco sobre a epidemiologia e fisiopatologia da TB nas diferentes espécies (Scanga; Flynn, 2014; Meesawat; Warit; Hamada; Malaivijitnond, 2023). Cada espécie apresenta história evolutiva única e distinta, estabelecendo diferentes relações patógeno e hospedeiro e, dessa forma, a resposta aos testes diagnósticos empregados torna-se variável (Wilbur, 2012).

2.2 VULNERABILIDADE DE PRIMATAS NÃO HUMANOS

Os PNH são extremamente vulneráveis à infecção por M. tuberculosis, constituindo uma ameaça significativa para as colônias em cativeiro. A TB é considerada uma das principais doenças infecciosas transmissíveis em PNH (Wilbur, 2012; Engel; Wilbur; Jones-Engel, 2013; Scanga; Flynn, 2014). Frequentemente, surtos dessa doença são reportados em instituições como zoológicos, centros de reabilitação de animais e em centros de experimentação animal (Wilbur, 2012), onde as taxas de morbidade e mortalidade são notavelmente altas (Meesawat; Warit; Hamada; Malaivijitnond, 2023).

2.3 PROGRESSÃO DA DOENÇA

O M. tuberculosis, de maneira clássica, provoca uma doença pulmonar progressiva em diversas espécies de PNH, sendo os macacos do Velho Mundo, como os macacos rhesus (Macaca mulatta), considerados mais susceptíveis do que os primatas do Novo Mundo (Montali; Mikota; Cheng, 2001; Lekko et al., 2020). A TB clínica torna-se evidente somente quando a infecção já esteja bem desenvolvida, proporcionando um período considerável para a disseminação da doença (Vervenne, 2004; Meesawat; Warit; Hamada; Malaivijitnond, 2023).

A progressão rápida da tuberculose em PNH é uma característica alarmante que agrava a complexidade do seu controle e manejo. Em muitos casos, a TB avança de forma assintomática nas fases iniciais, o que dificulta a identificação precoce e a implementação de medidas de contenção (Scanga; Flynn, 2014). Estudos demonstram que os macacos rhesus podem apresentar lesões pulmonares significativas antes de exibirem sinais clínicos visíveis, aumentando o risco de transmissão intra e interespécies. Essa progressão insidiosa permite que a infecção se espalhe amplamente dentro das colônias antes de ser detectada, complicando os esforços de controle (Meesawat; Warit; Hamada; Malaivijitnond, 2023).

Além disso, a resposta imunológica dos PNH ao M. tuberculosis pode variar significativamente entre diferentes espécies e até mesmo entre indivíduos da mesma espécie (Montali; Mikota; Cheng, 2001). Fatores como o estado imunológico, a presença de comorbidades e o ambiente de cativeiro influenciam a progressão da doença. A resposta imunológica ineficaz pode resultar em uma rápida multiplicação bacteriana e disseminação da TB para outros órgãos, além dos pulmões, como linfonodos, fígado e baço. Este padrão de disseminação sistêmica é frequentemente observado em PNH que são mantidos em ambientes estressantes ou inadequadamente manejados, destacando a necessidade de condições ótimas de bem-estar animal para mitigar a progressão da doença (Meesawat; Warit; Hamada; Malaivijitnond, 2023).

2.4 PREOCUPAÇÃO COM O BEM-ESTAR ANIMAL E SAÚDE PÚBLICA

Devido à característica zoonótica da enfermidade, especialmente em animais de cativeiro, esta é uma doença de grande preocupação, tanto no que diz respeito ao bem-estar animal, como para a saúde pública (Vervenne, 2004). Em virtude disso, foram implementados protocolos rigorosos para o controle da doença em PNH de cativeiro (Wilbur, 2012).

O bem-estar animal em centros de criação de primatas não humanos (PNH) biomodelos é uma consideração crucial, especialmente no contexto de doenças como a tuberculose (TB). A manutenção de condições adequadas de alojamento, alimentação, enriquecimento ambiental e cuidados veterinários é essencial para minimizar o estresse e a vulnerabilidade desses animais a infecções. O estresse crônico pode suprimir o sistema imunológico dos PNH, aumentando a suscetibilidade à TB e outras doenças infecciosas. Portanto, a implementação de práticas de manejo que promovam o bem-estar animal não apenas melhora a qualidade de vida dos PNH, mas também reduz a incidência de TB e melhora os resultados das pesquisas científicas que dependem desses animais (Meesawat; Warit; Hamada; Malaivijitnond, 2023).

Além disso, a tuberculose em PNH biomodelos representa um desafio significativo devido à necessidade de garantir a saúde e a viabilidade das colônias. A aplicação de medidas preventivas, como quarentena para novos animais, testes diagnósticos regulares e controle rigoroso da movimentação de pessoas e materiais dentro das instalações, é fundamental para prevenir surtos de TB (Flynn; Chan, 2001) A adoção de tecnologias avançadas de monitoramento, como o uso de biomarcadores e testes de imagem, pode auxiliar na detecção precoce da doença, permitindo intervenções mais rápidas e eficazes. Essas práticas são essenciais não apenas para proteger os PNH, mas também para garantir a continuidade das pesquisas biomédicas que dependem desses modelos animais (Lerche et al., 2008).

Portanto, a integração de estratégias de bem-estar animal com medidas rigorosas de controle e prevenção da tuberculose é essencial para a gestão eficaz de PNH biomodelos em centros de criação. Essa abordagem holística beneficia tanto os animais quanto os objetivos científicos, promovendo um ambiente de pesquisa mais seguro e produtivo, contibuindo para avanços de saúde pública (Kock et al., 2021).

2.5 IMPACTO DA PANDEMIA DE COVID-19

A pandemia de COVID-19 destacou a importância das pesquisas em doenças respiratórias, ampliando a demanda por primatas não humanos (PNH) para estudos. Esta situação gerou um impacto significativo na disponibilidade desses animais, uma vez que a necessidade de pesquisas emergenciais em COVID-19 aumentou a pressão sobre os recursos disponíveis (Fan et al., 2022) O fornecimento de PNH tornou-se um desafio ainda maior, exacerbado pelas restrições de transporte internacional e pelos protocolos de segurança reforçados para evitar a transmissão de doenças zoonóticas. Isso reforça a necessidade de um controle mais rigoroso da TB em colônias de PNH, para assegurar a saúde dos animais e a viabilidade das pesquisas que dependem deles (Guerrini, 2021).

2.6 MÉTODOS DIAGNÓSTICOS

2.6.1 Teste Cutâneo de Tuberculina (TST)

O teste cutâneo de tuberculina (TST – tuberculin skin test) tem sido amplamente utilizado para a detecção da infecção por TB em humanos e PNH (Balansard, 2019). Este teste envolve a injeção intradérmica de tuberculina e subsequente observação da resposta de hipersensibilidade retardada do sistema imunológico, caracterizada por um inchaço no local da injeção três dias após a aplicação (Thomas et al., 2021). Apesar de ser internacionalmente reconhecido como o teste padrão de triagem para a TB, o TST apresenta limitações, incluindo resultados falsos-negativos, que ocorrem quando a resposta ao antígeno depende de um sistema imune intacto do animal. Também apresenta resultados falsos-positivos, devido a reações cruzadas com outras micobactérias não patogênicas, devido à natureza indefinida dos antígenos derivados do M. tuberculosis na tuberculina (Vervenne et al., 2004; Wolf et al., 2015).

2.6.2 Teste de Interferon Gama (IFN- ɣ)

Devido às reações falsas, tanto positivas como negativas do TST, assim como a subjetividade da interpretação de seu resultado imunológico da reação, foram desenvolvidos outros métodos para diagnóstico da infecção, para humanos e para PNH. (Yee et al., 2022). Entre estes métodos, destaca-se o baseado na detecção do interferon gama (IFN- ɣ), uma citocina que desempenha um papel crucial na resposta imune do hospedeiro à TB (Vervenne, 2004). Este teste, por ser mais específico, representa uma ferramenta valiosa e complementar ao TST para o monitoramento da TB, sendo particulamente útil em casos onde o TST apresenta resultados positivos (Yee et al., 2022).

Os testes que se baseiam na ativação da resposta celular do hospedeiro, tais como os testes cutâneos ou de liberação de interferon gama (IFN- ɣ), são amplamente reconhecidos em escala global como métodos de triagem eficazes para TB. Isso se deve ao tipo de resposta imune que é provocada no hospedeiro pelas micobactérias. A resposta imune celular, desencadeada imediatamente após a infecção, é crucial para a formação dos granulomas, que são lesões inflamatórias características da TB. Este processo envolve uma série de interações complexas entre células do sistema imunológico e as micobactérias, resultando na contenção inicial da infecção (Thomas et al., 2021).

2.6.3 Cultura Bacteriana

A baciloscopia é realizada por meio da coloração bacilo álcool-ácido resistente (BAAR), uma técnica que permite a visualização rápida e fácil das micobactérias. No entanto, essa coloração não é específica para MTBC (Zaporojan et al, 2024). Assim, deve estar sempre associada à cultura bacteriana, considerada o padrão ouro para o diagnóstico da TB (Balansard, 2019). A cultura bacteriana, embora altamente específica, possui a desvantagem de ser um processo demorado, especialmente nas fases iniciais da infecção, quando a carga bacteriana no estágio inicial da doença é baixa (Lodha; Kabra, 2004; Zaporojan et al., 2024). Diferentes amostras, como lavados gástrico, bronquioalveolar ou retal, fezes, biópsias de lesões ou órgãos com ou sem alterações, podem ser encaminhadas para cultura (Lodha; Kabra, 2004). O grande problema reside no período de até oito semanas para obtenção do resultado final do teste pode se fazer necessário (WHO, 2023).

2.6.4 Reação em Cadeia da Polimerase (PCR)

O PCR é um método diagnóstico que detecta o DNA das micobactérias e oferece resultados mais rápidos comparado a cultura bacteriana (Wolf et al., 2015; Zaporojan et al., 2024). Em 2012 essa técnica foi aplicada em amostras de swab oral, baseando-se no princípio de que as bactérias do MTBC são patógenos intracelulares predominantemente respiratórios ou gastrointestinais e, portanto, entram e saem pela cavidade oral. A utilização de um elemento de inserção bem específico para MTBC (IS6110) confere ao teste uma alta especificidade (Wilbur, 2012). Entre 2000 e 2005, foram estudados 263 PNH, de 11 espécies diferentes, provenientes de cinco países, em contextos distintos de contato humano, tais como templos, animais de estimação ou de espetáculos, de vida livre ou de zoológicos. Em 84 animais (31,9%) foi detectado o MTBC. Como esperado, as maiores prevalências foram descobertas nos países onde o contato dos animais com os humanos é mais intenso e frequente (Wilbur, 2012). A facilidade de obtenção da amostra, a vantagem de não depender do sistema imunológico do animal e a relativa simplicidade do teste o tornam-no uma ferramenta promissora para o monitoramento de colônias de PNH para TB (Wolf et al., 2015).

Como esperado, as maiores prevalências foram descobertas nos países onde o contato dos animais com os humanos é mais intenso e frequente (Wilbur, 2012). A facilidade de obtenção da amostra, a vantagem de não depender do sistema imunológico do animal e a relativa simplicidade do teste o tornam-no uma ferramenta promissora para o monitoramento de colônias de PNH para TB (Balansard, 2019).

2.6.5 Sequenciamento genético

Os avanços no sequenciamento genético do M. tuberculosis e M. bovis possibilitaram a identificação de proteínas específicas do complexo MTBC, como a ESAT-6 e CPF-10. A produção de anticorpos contra essas proteínas pode ser quantificada através de ensaios imunológicos que utilizam antígenos específicos, como o ELISA, ou múltiplos antígenos específicos do MTBC, como os utilizados no MAPIA (multigen print assay) ou no MMIA (multiplex microbead immunoassay)15 . Esses ensaios oferecem uma abordagem mais precisa para a detecção da TB, permitindo uma melhor compreensão da resposta imune e da epidemiologia da doença em diferentes espécie de PNH (Zaporojan et al., 2024).

2.6.6 Ensaios imunológicos

Após a infecção inicial, a resposta imune celular torna-se predominante, sendo responsável pela formação dos granulomas característicos da doença (Wolf et al., 2015). Durante essa fase, a população bacteriana ainda é reduzida, limitando a disseminação da infecção. No entanto, a progressão da infecção leva a uma segunda fase, conhecida como fase anérgica, na qual há uma perda significativa de reatividade aos teste cutâneos, resultando em falsos-negativos. Nessa fase, a resposta imune é dominada pela formação de anticorpos circulantes, correlacionada com uma progressão severa da doença e um aumento substancial na população micobacteriana. Assim, os testes para a detecção de anticorpos, como o ELISA (enzyme-linked imunosorbant assay) ou para a detecção direta da bactéria, como a cultura bacteriana ou a reação em cadeia da polimerase – o PCR (polymerase chain reaction) tornam-se métodos mais confiáveis e sensíveis (Zaporojan et al., 2024).

O PrimaTB STAT-PAK® (ChemBio Diagnostic Systems, Inc., NY, USA) é um conjunto diagnóstico comercial que permite a detecção rápida de anticorpos contra M. tuberculosis e M. bovis em PNH, por meio de imunoensaio de corrida lateral (Wolf et al., 2015). Além dos antígenos ESAT-6 e CPF-10, este teste inclui mais dois antígenos específicos do MTBC (MPB83 e TBF10). Em um estudo abrangente envolvendo 243 (n=243) macacos rhesus (Macaca mulatta), 46 macacos cynomolgus (M. fascicularis) e 133 macacos verdes africanos (Chlorocebus aethiops sabaceus), o teste demonstrou uma sesibilidade de 90% e uma especificidade de 99%. Esses resultados indicam a alta eficácia e confiabilidade do PrimaTB STAT ® na detecção de infecções por TB em diferentes espécies de primatas, contribuindo para a implementação de estratégias de controle mais eficazes (Balansard, 2019).

Outro teste complementar que pode auxiliar na identificação da tuberculose em PNH é a pesquisa da proteína C reativa, que consiste em um marcador inflamatório presente mediante uma inflamação ou infecção. Em PNH, os níveis séricos desta proteína são significativamente elevados na presença da infecção por MTB.

2.7 OBSTÁCULOS DE MÉTODOS DIAGNÓSTICOS

Dada a importância crítica em criações de PNH, a disponibilidade de métodos de diagnóstico precisos faz-se essencial para o seu controle efetivo8.

Apesar dos avanços nos métodos diagnósticos, nenhum ensaio diagnóstico individual apresenta 100% de acurácia (Lodha; Kabra, 2004). Isso torna necessária a utilização de uma combinação de diferentes métodos diagnóstico, especialmente quando a suspeita clínica é elevada. Além disso, nenhum método atual é capaz de detectar a infecção latente de forma confiável, o que representa um grande desafio para pesquisas sobre a resposta imunológica à TB. O teste ideal deveria ser capaz de detectar todos os diferentes estágios de infecção, incluindo os assintomáticos ou latentes, de forma rápida, segura e de fácil interpretação. Este diagnóstico ideal também deveria detectar a infecção antes da transmissão para outros animais, permitindo assim um controle mais efetivo e eficiente da doença (Montali; Mikota; Cheng, 2001).

Devido ao elevado valor agregado dos animais, à crescente dificuldade de importação de novos animais (maioria das companhias aéreas não realizam mais o transporte), aos critérios éticos rigorosos e às limitações dos testes diagnósticos na certificação de animais livres de TB, torna-se imperativo realizar um levantamento de dados abrangente para compreender plenamente as características da infecção e da doença nas espécies de primatas para uso em pesquisa e desenvolvimento na área da saúde. Por se tratar de ponto nevrálgico para a devida investigação epidemiológica, bem como para a tomada de ações de manejo dos animais, é fundamental investir no conhecimento e aprimoramento das técnicas diagnósticas que ofereçam maior acurácia, sendo viáveis e de fato confiáveis para aplicação no monitoramento de rotina das colônias de PNH (Wolf et al., 2015).

Portanto, para o diagnóstico preciso e abrangente da TB em um animal ou um grupo de animais é recomendável a combinação de técnicas diagnósticas em três vias de exploração: direta (cultura bacteriana e PCR), celular (TST e IFN- ɣ) e sorológico (ensaios imunoenzimáticos). Essa abordagem multifacetada permite uma valiação mais completa e precisa da infecção, contribuindo para a implementação de estratégias de controle mais eficazes e para a proteção da saúde tanto dos animais quanto dos seres humanos que entram em contato com eles (Montali; Mikota; Cheng, 2001).

3 CONCLUSÃO

Os avanços tecnológicos decorrentes dos experimentos realizados em primatas não humanos (PNH) desempenham um papel crucial no cenário econômico global, transcendem as fronteiras nacionais e têm impacto significativo no desenvolvimento científico mundial. A ampliação das investigações sobre a tuberculose (TB) na população de primatas estudada permitirá a realização de ensaios com maior segurança e eficácia, impulsionando pesquisas aplicadas e o desenvolvimento tecnológico de produtos e procedimentos com repercussão direta na saúde pública e no controle de doenças infecto-parasitárias. Isso inclui o desenvolvimento de vacinas, kits de diagnóstico, biofármacos e o aprimoramento de processos biotecnológicos do instituto.

Além de sua importância científica, o controle e a erradicação da TB nas colônias de PNH de cativeiro permitirá a melhoria dos protocolos experimentais e o planejamento de ensaios, contribuindo para um aumento significativo na produção científica. Isso se manifestará na forma de dissertações e teses de pós-graduação, artigos científicos em revistas indexadas e patentes, além de conhecimentos contínuos no campo da experimentação com PNH.

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1 E-mail: [email protected].

2 Centro de Experimentação Animal – Instituto Oswaldo Cruz – CEA/IOC/RJ – e-mail: [email protected]