IMPACTOS DAS ALTERAÇÕES DO PRO-ONCOGENE RET NO CARCINOMA MEDULAR DE TIREOIDE

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Julia Cristina Onça Prado¹
Wânia de Oliveira Vianna²
Larissa Teodoro Rabi³ 


RESUMO
O carcinoma papilar emerge como a manifestação mais prevalente do câncer de tireoide, caracterizado por um desenvolvimento predominantemente indolente na maioria dos casos, mas suscetível à disseminação e invasão de órgãos adjacentes. Em contrapartida, o Carcinoma de Tireoide Medular (CTM) figura como uma entidade notável de raridade, apresentando-se sob duas categorias distintas: hereditária e esporádica. O objetivo principal desse trabalho foi avaliar a influência das alterações do proto-oncogene RET no contexto de CMT. Trata-se de uma revisão da literatura na qual foram coletados artigos científicos do Pubmed e Biblioteca Virtual em Saúde, publicados nos últimos 10 anos. As principais alterações manifestam-se como mutações de ativação dominante nesse gene, cuja função primordial é codificar uma tirosina quinase receptora. Esta, por sua vez, desempenha um papel crucial na instigação e avanço do câncer medular da tireoide. As mutações no gene RET evidenciam receptores de membrana de tirosina quinase, estabelecendo ligações multifacetadas com neutrófilos e permitindo a adaptação a proteínas de sinalização ao se vincular à tirosina intracelular RET.
Palavras-chave: Câncer, Mutação e Tireoide.

1. INTRODUÇÃO

O câncer de tireoide consiste em uma neoplasia maligna da glândula tireoide. [1] Sua incidência é cerca de 3 vezes maior em mulheres do que em homens, estima-se que esteja relacionado a fatores hormonais. [1,2] Seu crescimento, normalmente, é lento e assintomático e, por esse motivo, é considerado um câncer indolente por diversos pesquisadores. [3,4]

Em estágios mais avançados, observa-se edema na região cervical, dores musculares, alterações nas cordas vocais e até mesmo dificuldade ou desaparecimento da fala. [5] Além disso, o aparecimento dos nódulos tireoidianos, dependendo de seu tamanho, pode ocasionar dificuldades de deglutição e problemas respiratórios. [5,6]

Os carcinomas localizados na glândula da tireoide são classificados em três principais tipos: Carcinoma Papilífero da Tireoide (CPT), Carcinomas Folicular da Tireoide (CFT) e Carcinoma Medular de Tireoide (CMT). O CPT possui crescimento lento e desenvolve-se nas células papilíferas da tireoide. O CFT ocorre nas células foliculares da tireoide e, normalmente, possui dificuldade de disseminação para os gânglios linfáticos.

Por fim, o CMT pode desenvolver-se de forma hereditária ou esporádica. [6] Sabe-se que o CMT hereditário possui íntima correlação com mutações no gene RET e, também, podem estar relacionados a neoplasias endócrinas múltiplas do tipo 2 com alterações em MEN2A e MEN2B, ligados a transmissão autossômica dominante do gene. [7,8] Os pacientes portadores de alterações no gene RET que pertente a mesma família podem apresentar a heterogeneidade clínica. [8-10]

O proto-oncogene RET além de ter uma participação importante nas formas hereditárias do CMT, também tem sido implicado na patogênese dos tumores esporádicos. [10] O gene RET codifica um receptor da membrana da tirosina quinase que possui como função a sinalização intracelular. [10]

Surgindo a partir de rearranjos cromossômicos, os quais induzem à ativação constitutiva da RET quinase, os CMT frequentemente resultam de fusões genéticas, destacando-se as fusões KIF5B e CCDC6 como as mais comuns. [10,11] Esses rearranjos desencadeiam a produção de proteínas com funções específicas, propiciando a ativação independente dos ligantes do RET, cuja ligação não apenas fomenta o crescimento, mas também impulsiona a proliferação e, notavelmente, a sobrevivência das células cancerígenas. [11]

O CMT oriundo de mutações no proto-oncogene RET provém das células parafoliculares, responsáveis pela produção de calcitonina e desempenhando atividades bioquímicas significativas no contexto do CMT. [12] As mutações patogênicas da linha germinativa do oncogene RET são prontamente identificadas na síndrome MEN2, onde tais mutações se manifestam exclusivamente no tumor. Essa observação estende-se a uma ampla variedade de casos esporádicos de CMT, delineando uma heterogeneidade notável nas ocorrências dessas mutações. [12-14]

Dessa forma, o objetivo desse trabalho foi identificar as principais correlações entre mutações no proto-oncogene RET e o aparecimento de CMT.

2. METODOLOGIA

Trata-se de uma revisão bibliográfica da literatura na qual foram coletados artigos científicos publicados nos últimos 10 anos. Os critérios de inclusão foram: artigos disponíveis no Pubmed e Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), com data de publicação entre 2014 e 2023, disponíveis em inglês, português ou espanhol.

A seleção dos artigos consistiu na análise do título e resumo, seguida pela leitura completa do artigo. O Fluxograma 1 demonstra a estratégia utilizada.  
Figura 1. Fluxograma do Processo de Seleção dos Artigos da Revisão Integrativa 

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES

Foram selecionados 15 artigos para compor a revisão da literatura (Tabela 1). O protooncogene RET, responsável pela codificação de receptores de tirosina quinase, desempenha um papel crucial em diversas manifestações de carcinomas em seres humanos, abrangendo principalmente o CMT hereditário [14]. Ao analisar as pesquisas apresentadas, torna-se evidente o impacto das alterações provocadas pelo proto-oncogene RET nos CMTs, principalmente devido a ativação dominante e codificação de tirosina quinase receptora. [13- 14] Além disso, sabe-se que diversas alterações no gene RET podem desempenhar um papel facilitador nos tratamentos direcionados aos pacientes diagnosticados com CMT, auxiliando na melhora do prognóstico do paciente. [14-15]

Tabela 1. Aspectos dos estudos revisados

O proto-oncogene RET apresenta um domínio extracelular rico em cisteína, desempenhando funções cruciais na conformação e dimerização das proteínas. Além disso, possui domínios intracelulares, incluindo um citoplasmático tirosina-quinase, atuando como receptores. [14,15]

Estudos indicam que as formas hereditárias de CMT são resultado de mutações autossômicas dominantes do proto-oncogene RET, com penetrância incompleta, revelando influências genéticas nas mutações do gene no carcinoma medular de tireoide. [1-5] Além disso, Subbiah et al. [4,6], destacam a eficácia do tratamento com a substância LOXO-292 nos pacientes diagnosticados com CMT.

Contudo, a abordagem com inibidores de tirosina quinase (MKI) em casos de carcinoma medular da tireoide (CMT) em pacientes de 18 anos, conforme Minuto et al. [2], demonstra maior eficácia e segurança. Análises morfológicas, incluindo coloração com hematoxilina-eosina e marcação por imunofluorescência, mostram que os CTM hereditários resultam de mutações autossômicas dominantes. [14]

Estudos conduzidos por Takahashi et al.[1,3] revelam os fatores genéticos interligados ao proto-oncogene RET em casos de doenças já detectadas no organismo humano, enquanto Orois et al.[9] indicam que o carcinoma familiar não medular da tireoide não é necessariamente uma doença de causa genética, mas está diretamente associado a síndromes hereditárias.

Os estudos in vivo de autores como Marotta et al.[12], Subbiah et al.[4], Hincza et al.[10], evidenciam que as alterações no proto-oncogene RET proporcionam um campo vasto de oportunidades para pesquisas, dada a peculiaridade do RET em reagir de maneira singular com cada organismo e seu câncer, apresentando potencial promissor ou não.

A análise de visibilidade celular e contagens de células, bem como os ensaios de isolamento de proteínas e RNA realizados nos estudos de Valenciaga et al.[5], concluem que o câncer medular de tireoide é, atualmente, considerado incurável. Por sua vez, estudos de Luzón-Toro et al.[11] destacam a detecção de ações desreguladas nos IncRNAs em pacientes com CMT, revelando novos biomarcadores e evidenciando o impacto direto do proto-oncogene RET nas mutações celulares associadas ao CMT.

As mutações no proto-oncogene RET constituem evidências de que, em determinados casos clínicos e contextos genéticos específicos, podem influenciar positivamente na aceleração e eficácia de tratamentos específicos, ou, por outro lado, resultar em respostas negativas, retardando o desenvolvimento do CMT.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS.

Os cânceres dependentes do proto-oncogene RET, que apresentam resultados positivos para fusões cromossômicas, revelam, nos testes realizados em pacientes diagnosticados com CMT, uma gama variada de possibilidades para tratamentos promissores. A inibição do avanço do câncer e a potencialização da eficácia de determinados fármacos surgem como estratégias promissoras, proporcionando uma eficácia notável. A aprovação de inibidores seletivos do RET, embasada em estudos clínicos, pesquisas in vivo e acompanhamento de pacientes, ressalta que nem todos os tratamentos oferecem benefícios máximos. Em muitos casos, as mutações do RET podem impulsionar o crescimento celular, comprometendo as chances de cura do CMT. As mutações originadas pelo gene RET manifestam-se como receptores de membrana da tirosina quinase, cuja função reside em estabelecer conexões com diversos neutrófilos. Além disso, permitem a adaptação à proteína de sinalização, vinculando-se à tirosina intracelular RET. Os rearranjos resultantes dessas mutações podem gerar proteínas com funções específicas, desencadeando uma ativação independente que promove o crescimento celular. 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Bim, L. v, Navarro, F. C. P., Valente, F. O. F., Lima-Junior, J. v, Delcelo, R., Dias-da-Silva, M. R., Maciel, R. M. B., Galante, P. A. F., & Cerutti, J. M. (2019). Retroposed copies of RET gene: a somatically acquired event in medullary thyroid carcinoma. BMC Medical Genomics, 12(1), 104. Disponível em: https://doi.org/10.1186/s12920-019-0552-1

2. Minuto, M., Varaldo, E., Marcocci, G., de Santanna, A., Ciccone, E., & Cortese, K. (2018). ERBB1- and ERBB2-Positive Medullary Thyroid Carcinoma: A Case Report. Diseases (Basel, Switzerland), 6(2), 25. Disponível em: https://doi.org/10.3390/diseases6020025

3. Takahashi, M., Kawai, K., & Asai, N. (2020). Roles of the RET Proto-oncogene in Cancer and Development. JMA Journal, 3(3), 175–181. Disponível em: https://doi.org/10.31662/jmaj.2020-0021

4. Subbiah, V., & Cote, G. J. (2020). Advances in Targeting RET-Dependent Cancers. Cancer Discovery, 10(4), 498–505. Disponível em: https://doi.org/10.1158/2159-8290.CD-19-1116

5. Valenciaga, A., Saji, M., Yu, L., Zhang, X., Bumrah, C., Yilmaz, A. S., Knippler, C. M., Miles, W., Giordano, T. J., Cote, G. J., & Ringel, M. D. (2018). Transcriptional targeting of oncogene addiction in medullary thyroid cancer. JCI Insight, 3(16), e122225. Disponível em: https://doi.org/10.1172/jci.insight.122225

6. Subbiah, V., Velcheti, V., Tuch, B. B., Ebata, K., Busaidy, N. L., Cabanillas, M. E., Wirth, L. J., Stock, S., Smith, S., Lauriault, V., Corsi-Travali, S., Henry, D., Burkard, M., Hamor, R., Bouhana, K., Winski, S., Wallace, R. D., Hartley, D., Rhodes, S., … Drilon, A. (2018). Selective RET kinase inhibition for patients with RET-altered cancers. Annals of Oncology : Official Journal of the European Society for Medical Oncology, 29(8), 1869–1876. Disponível em: https://doi.org/10.1093/annonc/mdy137

7. Capezzone, M., Robenshtok, E., Cantara, S., & Castagna, M. G. (2021). Familial non-medullary thyroid cancer: a critical review. Journal of Endocrinological Investigation, 44(5), 943–950. Disponível em: https://doi.org/10.1007/s40618-020-01435-x

8. Takahashi, M. (2022). RET receptor signaling: Function in development, metabolic disease, and cancer. Proceedings of the Japan Academy. Series B, Physical and Biological Sciences, 98(3), 112–125. Disponível em: https://doi.org/10.2183/pjab.98.008

9. Orois, A., Mora, M., Halperin, I., & Oriola, J. (2021). Familial non medullary thyroid carcinoma: Beyond the syndromic forms. Endocrinología, Diabetes y Nutrición (English Ed.), 68(4), 260–269. Disponível em: https://doi.org/https://doi.org/10.1016/j.endien.2020.08.013

10. Hińcza, K., Kowalik, A., & Kowalska, A. (2019). Current Knowledge of Germline Genetic Risk Factors for the Development of Non-Medullary Thyroid Cancer. Genes, 10(7), 482. Disponível em: https://doi.org/10.3390/genes10070482

11. Luzón-Toro, B., Villalba-Benito, L., Fernández, R. M., Torroglosa, A., Antiñolo, G., & Borrego, S. (2021). RMRP, RMST, FTX and IPW: novel potential long non-coding RNAs in medullary thyroid cancer. Orphanet Journal of Rare Diseases, 16(1), 4. Disponível em: https://doi.org/10.1186/s13023-020-01665-5

12. Marotta, V., Chiofalo, M. G., di Gennaro, F., Daponte, A., Sandomenico, F., Vallone, P., Costigliola, L., Botti, G., Ionna, F., & Pezzullo, L. (2021). Kinase-inhibitors for iodine-refractory differentiated thyroid cancer: still far from a structured therapeutic algorithm. Critical Reviews in Oncology/Hematology, 162, 103353. Disponível em: https://doi.org/https://doi.org/10.1016/j.critrevonc.2021.103353

13. Zhao J. Z, Guo L, Zhao J. Q, Lou J. L, Tan XR. [A review on the RET proto-oncogene mutation in medullary thyroid carcinoma]. Lin Chung Er Bi Yan Hou Tou Jing Wai Ke Za Zhi. 2018 Nov;32(22):1754-1758. Chinese. doi: 10.13201/j.issn.1001-1781.2018.22.018. PMID: 30716812.

14. Drilon, A., Hu, Z. I., Lai, G. G. Y., & Tan, D. S. W. (2018). Targeting RET-driven cancers: lessons from evolving preclinical and clinical landscapes. Nature Reviews. Clinical Oncology, 15(3), 151–167. Disponível em: https://doi.org/10.1038/nrclinonc.2017.175

15. Liang, J., Zeng, W., Fang, F., Yu, T., Zhao, Y., Fan, X., Guo, N., & Gao, X. (2017). Clinical analysis of Hashimoto thyroiditis coexistent with papillary thyroid cancer in 1392 patients. Acta Otorhinolaryngologica Italica : Organo Ufficiale Della Societa Italiana Di Otorinolaringologia e Chirurgia Cervico-Facciale, 37(5), 393–400. Disponível em: 10.14639/0392-100X-1709" target="_blank">https://doi.org/10.14639/0392-100X-1709.

¹ Discente do Curso Superior de Farmácia do Instituto de Ciências da Saúde, Universidade Paulista (UNIP), Campinas, São Paulo-SP, Brasil. e-mail: [email protected]
² Docente do Curso Superior de Farmácia do Instituto de Ciências da Saúde, Universidade Paulista (UNIP), Campinas, São Paulo-SP, Brasil. Doutora em Fármacos e Medicamentos (USP).
³ Docente do Curso Superior de Farmácia do Instituto de Ciências da Saúde, Universidade Paulista (UNIP), Campinas, São Paulo-SP, Brasil. Mestre em Ciências (UNICAMP).