GLOBALIZAÇÃO, ESTRATÉGIAS DE INTERNACIONALIZAÇÃO E TECNOLOGIAS DISRUPTIVAS: DESAFIOS E PERSPECTIVAS PARA EMPRESAS BRASILEIRAS

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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.17249154


Ana Paula Marques Gomes1
Bruna Maisa Baniski2
Joelma Sartor Rosa Paixão3
Kelly Timm4
Lucimara Gomes Martins5
Raquel Silva Gomes6


RESUMO
A globalização intensificou a integração econômica, política e cultural, ampliando as oportunidades e desafios para empresas que buscam expandir suas operações além das fronteiras nacionais. Este artigo tem como objetivo analisar de forma integrada a influência da globalização nas estratégias de internacionalização das empresas, com foco nas organizações brasileiras, abordando aspectos como regulamentação do comércio internacional, diferenças culturais, vantagens e riscos associados, bem como o papel das tecnologias emergentes, em especial a Inteligência Artificial (IA) e o blockchain. A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica, baseada em artigos, livros e documentos institucionais. Os resultados evidenciam que a internacionalização pode proporcionar ganhos de competitividade, diversificação de receitas e fortalecimento da marca, mas depende de estratégias bem definidas, alinhamento às regulamentações internacionais e adaptação aos contextos culturais. Além disso, tecnologias disruptivas oferecem novas possibilidades de eficiência e transparência, embora tragam consigo desafios de implementação e adequação regulatória. Conclui-se que a internacionalização deve ser entendida como um processo dinâmico, que requer planejamento, inovação constante e capacidade de adaptação ao ambiente global.
Palavras-chave: Globalização. Internacionalização. Estratégias. Empresas Brasileiras. Tecnologias Disruptivas.

ABSTRACT
Globalization has intensified economic, political, and cultural integration, expanding opportunities and challenges for companies seeking to expand operations beyond national borders. This article aims to analyze, in an integrated manner, the influence of globalization on corporate internationalization strategies, with a focus on Brazilian organizations. It addresses international trade regulation, cultural differences, associated advantages and risks, as well as the role of emerging technologies, especially Artificial Intelligence (AI) and blockchain. The methodology adopted was bibliographic research, based on articles, books, and institutional documents. The results show that internationalization can provide competitiveness gains, revenue diversification, and brand strengthening, but it depends on well-defined strategies, compliance with international regulations, and adaptation to cultural contexts. In addition, disruptive technologies offer new possibilities for efficiency and transparency, although they pose challenges of implementation and regulatory adjustment. It is concluded that internationalization should be understood as a dynamic process, requiring planning, constant innovation, and the ability to adapt to the global environment.
Keywords: Globalization. Internationalization. Strategies. Brazilian Companies. Disruptive Technologies.

1. INTRODUÇÃO

A globalização, intensificada a partir das últimas décadas do século XX, consolidou-se como um fenômeno multidimensional que transformou a forma como países, organizações e indivíduos se relacionam. Caracterizada pela integração econômica, política e cultural, a globalização reduziu barreiras comerciais, ampliou os fluxos de capitais e expandiu o alcance das tecnologias de informação, modificando a lógica de funcionamento dos mercados (ARRIGHI, 1996 & GRAMSCI, 2001). Nesse contexto, a internacionalização das empresas surgiu como estratégia central para garantir sobrevivência, competitividade e inovação em ambientes de negócios cada vez mais dinâmicos.

Para as empresas brasileiras, o processo de inserção internacional tornou-se um imperativo estratégico diante da necessidade de diversificação de mercados e da busca por maior competitividade global. Estudos apontam que a internacionalização pode proporcionar ganhos significativos, como o fortalecimento da marca, o acesso a novos consumidores e a diluição de riscos associados à instabilidade econômica doméstica (ALEM & CAVALCANTI, 2005; KOTLER & KELLER, 2016). Contudo, ao mesmo tempo em que cria oportunidades, o processo exige enfrentamento de desafios relacionados à adaptação cultural, ao cumprimento de regulamentações internacionais e à gestão de riscos políticos e financeiros.

Do ponto de vista regulatório, o comércio internacional é regido por normas que buscam uniformizar práticas e oferecer segurança às transações. Os Incoterms (International Commercial Terms), por exemplo, padronizam contratos de compra e venda internacional, reduzindo incertezas sobre responsabilidades logísticas e financeiras (MCKINSEY & COMPANY, 2020). Apesar disso, a heterogeneidade das legislações nacionais e o avanço de políticas protecionistas em determinados países continuam a representar barreiras significativas à inserção de empresas em novos mercados. Essa tensão entre a lógica da integração global e os interesses nacionais mostra que a internacionalização deve ser compreendida como um processo permeado por contradições.

Outro aspecto relevante diz respeito às diferenças culturais, que exercem papel central na condução das estratégias empresariais. A teoria das dimensões culturais de Hofstede, (1991) destaca como valores e práticas locais influenciam negociações, processos de gestão e aceitação de produtos e serviços. Ignorar essas diferenças pode comprometer a efetividade da expansão internacional, evidenciando a importância de estratégias culturalmente sensíveis. Nesse sentido, a internacionalização não deve ser vista apenas como uma operação econômica, mas como um fenômeno social e cultural, que exige das empresas capacidade de adaptação e flexibilidade organizacional.

Além dos aspectos tradicionais, o ambiente de negócios contemporâneo é marcado pela crescente influência das tecnologias disruptivas. A Inteligência Artificial (IA) e o blockchain, por exemplo, têm alterado significativamente os modelos de gestão e de operação global, ampliando a eficiência na análise de dados, reduzindo custos de transação e oferecendo maior transparência em cadeias de suprimentos (PORTO et al., 2019; BARELLI & LEME, 2024). No entanto, esses avanços também geram desafios regulatórios, éticos e estruturais, colocando em evidência a necessidade de constante atualização estratégica.

Dessa forma, este artigo tem como objetivo analisar de forma integrada a influência da globalização nas estratégias de internacionalização das empresas brasileiras, destacando elementos regulatórios, culturais, estratégicos e tecnológicos. Busca-se compreender como esses fatores interagem, quais oportunidades e riscos se apresentam e de que maneira as empresas podem construir trajetórias de expansão mais consistentes no cenário global. O estudo é baseado em pesquisa bibliográfica, articulando diferentes perspectivas teóricas e práticas, de modo a oferecer uma visão crítica e abrangente do tema.

2. GLOBALIZAÇÃO E A INTERNACIONALIZAÇÃO DOS MERCADOS

O fenômeno da globalização consolidou-se como uma das transformações mais marcantes do século XX, influenciando não apenas as relações econômicas, mas também as esferas política, cultural e social. Embora as trocas comerciais internacionais remontam à Antiguidade e tenham se intensificado a partir das grandes navegações, foi no contexto pós-Segunda Guerra Mundial, com a formação de organismos multilaterais e o avanço das tecnologias de transporte e comunicação, que a globalização adquiriu seu caráter contemporâneo (ARRIGHI, 1996). Esse processo se intensificou a partir dos anos 1980, com a ascensão do neoliberalismo e a expansão das cadeias de valor globais.

Do ponto de vista econômico, a globalização promoveu maior integração dos mercados, aumentando a interdependência entre países e estimulando fluxos comerciais e financeiros em escala mundial. Esse movimento foi potencializado pelo fortalecimento de organismos como a Organização Mundial do Comércio (OMC), cuja atuação contribuiu para a redução de barreiras tarifárias e a padronização de regras de comércio internacional (RATTNER, 1995). Por outro lado, a crescente abertura econômica também trouxe novos riscos, como maior exposição a crises globais e vulnerabilidade a oscilações nos preços de commodities, fatores especialmente relevantes para economias dependentes da exportação, como o Brasil.

Sob a perspectiva social e cultural, a globalização gerou uma circulação mais intensa de informações, valores e práticas de consumo, aproximando diferentes sociedades. Entretanto, segundo Ghemawat (2011) esse movimento não levou à completa homogeneização cultural, mas sim a uma “semiglobalização”, em que ainda persistem barreiras e particularidades locais. Essa constatação é relevante para compreender que, embora as empresas encontrem mercados cada vez mais acessíveis, a adaptação às especificidades culturais permanece fundamental para o sucesso da internacionalização.

No âmbito empresarial, a globalização possibilitou que organizações de diferentes portes buscassem estratégias de expansão internacional. A literatura identifica múltiplos modos de inserção, como exportações diretas e indiretas, licenciamento, franquias, joint ventures e investimentos diretos no exterior (CAVUSGIL, KNIGHT & RIESENBERGER, 2010). Cada modalidade oferece diferentes níveis de risco, controle e comprometimento de recursos, o que exige planejamento estratégico alinhado às capacidades internas da empresa e às condições do mercado-alvo.

Um aspecto crítico da globalização é a desigualdade de seus impactos. Enquanto grandes corporações multinacionais foram capazes de ampliar sua presença global e aumentar seus lucros, pequenas e médias empresas enfrentam maiores dificuldades para superar barreiras logísticas, tecnológicas e regulatórias (KOTLER & KELLER, 2016). Além disso, os benefícios da globalização não se distribuíram de maneira equitativa entre os países: enquanto alguns consolidaram posições de liderança no comércio internacional, outros tornaram-se mais dependentes das dinâmicas globais, reproduzindo assimetrias históricas (GRAMSCI, 2001).

Apesar dessas contradições, a globalização permanece sendo um motor para a internacionalização empresarial. Para empresas brasileiras, em particular, esse processo representa a possibilidade de acessar novos mercados, reduzir a dependência do consumo interno e elevar padrões de inovação e eficiência. Contudo, como destacam estudos recentes, essa inserção não ocorre de forma automática, exige não apenas capacidade de investimento, mas também a construção de redes de relacionamento, o fortalecimento da governança corporativa e o domínio de práticas de negociação em ambientes multiculturais (SOBRAL, 2019).

Em síntese, a globalização deve ser entendida como um processo ambivalente: ao mesmo tempo em que cria condições favoráveis à expansão dos negócios internacionais, também introduz novos riscos e desafios. A internacionalização empresarial, nesse contexto, não é apenas resultado da abertura econômica, mas uma estratégia deliberada que requer adaptação a um ambiente global complexo, em que coexistem forças de integração e fragmentação.

3. INTERNACIONALIZAÇÃO DE EMPRESAS BRASILEIRAS

O processo de internacionalização das empresas brasileiras desenvolveu-se de forma mais intensa a partir da década de 1990, quando políticas de abertura comercial e privatizações ampliaram a inserção do país no comércio mundial. Embora o Brasil tenha tradição exportadora desde o período colonial, a busca por atuação global por meio de investimentos diretos no exterior (IDE), alianças estratégicas e fusões e aquisições tornou-se mais relevante nas últimas décadas, acompanhando tendências internacionais (HONÓRIO, 2008).

Segundo Alem & Cavalcanti (2005), a internacionalização é vista não apenas como estratégia de crescimento, mas como forma de reduzir vulnerabilidades associadas ao mercado doméstico. Em um país sujeito a instabilidades econômicas e políticas, como o Brasil, a presença em mercados externos permite diversificar receitas e diluir riscos. Essa visão é coerente com a perspectiva de Kotler & Keller (2016), para quem a inserção internacional fortalece a marca e amplia as oportunidades de inovação.

Apesar disso, a literatura aponta que as empresas brasileiras enfrentam desafios significativos no processo de internacionalização. Entre eles destacam-se a burocracia estatal, a elevada carga tributária, a infraestrutura deficiente e a volatilidade cambial (BARROS, 2019). Esses fatores aumentam os custos de operação e dificultam a competitividade no mercado global. Além disso, as barreiras protecionistas de outros países e a complexidade regulatória internacional que envolve desde normas técnicas até legislações ambientais e trabalhistas impõem custos adicionais de conformidade (MCKINSEY & COMPANY, 2020).

Um aspecto central do debate é o papel da regulamentação internacional. Ferramentas como os Incoterms, elaborados pela Câmara de Comércio Internacional, padronizam contratos de exportação e importação, oferecendo maior previsibilidade às transações. No entanto, a heterogeneidade regulatória entre países permanece como obstáculo, sobretudo para empresas de médio porte, que possuem menos recursos para investir em compliance. A literatura sugere que a harmonização de regras e a atuação coordenada entre setor público e privado são caminhos importantes para reduzir esses entraves (GHEMAWAT, 2011).

Do ponto de vista estratégico, muitas empresas brasileiras optaram inicialmente por formas menos arriscadas de internacionalização, como exportações diretas ou indiretas. Esse movimento é consistente com o modelo gradualista da escola de Uppsala, que sugere que a expansão internacional ocorre de maneira incremental, à medida que a empresa acumula experiência e reduz incertezas (CAVUSGIL, KNIGHT & RIESENBERGER, 2010). Entretanto, observa-se que algumas organizações de maior porte, especialmente nos setores de commodities e manufaturas, buscaram estratégias mais ousadas, como investimentos diretos no exterior e aquisição de empresas estrangeiras, visando consolidar presença global.

Ainda que o número de multinacionais brasileiras seja relativamente pequeno em comparação com economias desenvolvidas, existem casos de sucesso emblemáticos, como Embraer, Vale, Gerdau, JBS e Natura. Essas empresas demonstram que a capacidade de inovação, a gestão eficiente e a construção de parcerias estratégicas são fatores críticos para o êxito da expansão. Por outro lado, também existem exemplos de fracassos, geralmente relacionados à subestimação das diferenças culturais, à falta de planejamento de longo prazo e à dificuldade de adaptação a ambientes regulatórios complexos.

Críticos do processo argumentam que a internacionalização de empresas brasileiras ainda é marcada por concentração setorial: predominam os setores de commodities, alimentos e bens de consumo, enquanto setores intensivos em tecnologia ainda enfrentam dificuldades para competir globalmente. Essa limitação reforça a importância de políticas públicas que incentivem inovação, investimento em pesquisa e desenvolvimento e maior integração às cadeias globais de valor (SOBRAL, 2019).

Em síntese, a internacionalização de empresas brasileiras revela-se um processo repleto de contradições: ao mesmo tempo em que oferece oportunidades de crescimento e fortalecimento da competitividade, expõe as fragilidades estruturais do ambiente de negócios nacional. Para que esse processo seja sustentável, torna-se indispensável a articulação entre estratégias empresariais sólidas e políticas institucionais que favoreçam a inserção internacional.

4. ESTRATÉGIAS DE INTERNACIONALIZAÇÃO: VANTAGENS E RISCOS

A internacionalização empresarial pode ocorrer por diferentes estratégias, que variam em termos de nível de risco, controle e comprometimento de recursos. A literatura clássica identifica modalidades como exportação direta e indireta, licenciamento, franchising, joint ventures, alianças estratégicas e investimento direto no exterior (CAVUSGIL, KNIGHT & RIESENBERGER, 2010; KOTLER, 1998). A escolha entre essas alternativas deve considerar tanto fatores internos como recursos financeiros, capacidade de inovação e experiência gerencial quanto fatores externos como estabilidade institucional, barreiras comerciais e características culturais do mercado de destino.

A exportação indireta, por exemplo, costuma ser a forma inicial de inserção internacional, pois envolve menor risco e investimento. Nesse modelo, a empresa depende de intermediários para comercializar seus produtos no exterior, o que reduz custos de entrada, mas também limita o controle sobre a marca e o relacionamento com o cliente. Já a exportação direta oferece maior autonomia, permitindo contato direto com distribuidores e consumidores estrangeiros, embora demande maior estrutura logística e conhecimento regulatório.

Estratégias como licenciamento e franchising ampliam o alcance internacional por meio da concessão de direitos de uso de marcas, processos ou know-how a parceiros locais. Essas modalidades possibilitam rápida expansão, com menor necessidade de capital próprio, mas expõem a empresa a riscos relacionados à perda de controle sobre a qualidade do produto ou serviço e à dependência da capacidade de execução do parceiro. No caso da franchising, por exemplo, a padronização cultural é um desafio, pois os hábitos de consumo variam significativamente entre países (KOTLER & KELLER, 2016).

As joint ventures e alianças estratégicas surgem como alternativas para reduzir riscos de entrada em mercados altamente regulados ou culturalmente distintos. Ao compartilhar recursos e conhecimento com empresas locais, as organizações conseguem superar barreiras institucionais e acelerar sua adaptação ao ambiente estrangeiro. Contudo, a literatura aponta que conflitos de governança, divergência de objetivos e diferenças culturais são obstáculos frequentes para a sustentabilidade dessas parcerias (SOBRAL, 2019).

O investimento direto no exterior (IDE) é a estratégia mais complexa e de maior comprometimento, mas também a que oferece maior autonomia e potencial de retorno. Por meio da instalação de filiais, aquisição de empresas estrangeiras ou construção de unidades produtivas, a organização consolida presença global e passa a controlar diretamente suas operações internacionais. Essa estratégia, no entanto, demanda altos investimentos e exposição a riscos cambiais, políticos e regulatórios (ALEM & CAVALCANTI, 2005).

Entre as vantagens da internacionalização, destacam-se:

Quadro 1- Vantagens e Riscos da Internacionalização

Aspecto

Descrição

Referência

VANTAGENS

Diversificação de mercados

Reduz dependência do mercado doméstico e dilui riscos de crises econômicas locais

INSTITUTE OF BUSINESS EDUCATION (2019); ALEM & CAVALCANTI (2005)

Fortalecimento da marca

Empresas internacionalizadas tendem a obter maior reconhecimento e credibilidade global

ALEM & CAVALCANTI (2005); KOTLER & KELLER (2016)

Economia de escala

Ampliação do mercado permite otimizar a produção, reduzir custos unitários e aumentar a lucratividade

KOTLER & KELLER (2016)

Acesso a inovações

Inserção em ambientes competitivos favorece aprendizado organizacional e incorporação de novas práticas

BARELLI & LEME (2024); PORTO, LIMA JR. & SILVA (2019)

RISCOS

Cambiais

Flutuações monetárias impactam custos e receitas, principalmente em economias voláteis como a brasileira

BARROS (2019); ALEM & CAVALCANTI (2005)

Políticos e regulatórios

Instabilidades institucionais, protecionismo e exigências legais podem inviabilizar operações

BARROS (2019); MCKINSEY & COMPANY (2020)

Comerciais e logísticos

Falhas em transporte, distribuição e adaptação de produtos ao mercado local comprometem resultados

MCKINSEY & COMPANY (2020); CAVUSGIL, KNIGHT & RIESENBERGER (2010)

Interculturais

Falta de sensibilidade às práticas locais pode gerar rejeição da marca e insucesso em negociações

CAVUSGIL, KNIGHT & RIESENBERGER (2010); HOFSTEDE (1991); SOBRAL et al. (2012)

Fonte: Elaborado pelas autoras

Do ponto de vista crítico, percebe-se que as vantagens frequentemente são apresentadas como universais, mas os riscos variam significativamente conforme o porte da empresa e o setor de atuação. Grandes corporações tendem a absorver com mais facilidade os custos de adaptação e os impactos de crises, enquanto pequenas e médias empresas enfrentam maiores restrições financeiras e gerenciais.

Nesse sentido, a escolha da estratégia de entrada deve ser realista e alinhada ao perfil da organização, evitando expansões precipitadas que podem comprometer sua sustentabilidade. Em suma, a internacionalização não pode ser entendida apenas como um movimento de expansão geográfica, mas como uma decisão estratégica complexa, que exige avaliação minuciosa das oportunidades e riscos envolvidos. O sucesso depende da capacidade da empresa em equilibrar ganhos de escala e diversificação com a gestão de riscos políticos, econômicos e culturais, de modo a construir trajetórias de crescimento sustentáveis no cenário global.

5. CULTURA E INTERNACIONALIZAÇÃO

Embora a globalização tenha reduzido barreiras comerciais e ampliado a circulação de bens e serviços, as diferenças culturais permanecem como um dos principais fatores de influência no processo de internacionalização das empresas. A cultura molda valores, comportamentos e práticas de consumo, interferindo diretamente nas negociações, na aceitação de produtos e na gestão de equipes em ambientes multiculturais (KOTLER & KELLER, 2016). Assim, compreender e adaptar-se às particularidades culturais torna-se condição essencial para o sucesso em mercados internacionais.

Um dos referenciais mais utilizados nesse campo é o modelo de dimensões culturais de Hofstede (1991) que identifica variáveis como distância ao poder, individualismo versus coletivismo, masculinidade versus feminilidade, aversão à incerteza e orientação temporal. Essas dimensões permitem analisar como diferentes sociedades lidam com hierarquia, cooperação, competitividade, previsibilidade e planejamento de longo prazo. Por exemplo, em culturas com alta distância ao poder, como alguns países da Ásia, práticas de gestão centralizadas podem ser mais bem aceitas do que em sociedades com maior horizontalidade, como em parte da Europa Ocidental.

De acordo com Sobral et al. (2012) a falta de sensibilidade cultural pode comprometer estratégias de internacionalização, gerando mal-entendidos, conflitos e perda de oportunidades de mercado. Isso se observa em casos de fracasso de grandes corporações que não consideraram hábitos locais — seja na adaptação de produtos, seja no estilo de comunicação de marketing. Por outro lado, empresas que desenvolvem competências interculturais conseguem estabelecer relacionamentos mais sólidos, adaptar ofertas ao público-alvo e aumentar a credibilidade de sua marca.

Do ponto de vista crítico, é importante destacar que a literatura frequentemente apresenta a cultura como uma barreira à internacionalização, mas ela também pode ser fonte de aprendizado e inovação. O contato com diferentes práticas e valores pode enriquecer a gestão empresarial, favorecendo a criação de soluções mais criativas e a ampliação da visão estratégica. Nesse sentido, a cultura não deve ser vista apenas como obstáculo, mas como recurso estratégico para empresas que conseguem desenvolver capacidade de absorção e flexibilidade organizacional.

A influência cultural não se limita às práticas de consumo, estendendo-se também à governança corporativa e às formas de negociação. Em países com tradição de maior formalidade, como o Japão e a Alemanha, contratos detalhados e protocolos rígidos são valorizados, enquanto em mercados mais informais, como em alguns países latino-americanos, as relações pessoais e a confiança exercem papel central nas transações comerciais (FERREIRA, 2011). Essa diversidade exige das empresas brasileiras não apenas adaptação de produtos, mas também ajuste no estilo de gestão e comunicação.

Outro aspecto relevante é a gestão de equipes multiculturais. Com a internacionalização, torna-se comum que organizações brasileiras coordenem operações em diferentes países, integrando profissionais com distintas formações culturais. Isso requer políticas de recursos humanos voltadas à diversidade e mecanismos de mediação de conflitos culturais, sob pena de comprometer o desempenho organizacional.

Logo, a cultura exerce papel decisivo no processo de internacionalização, influenciando desde as práticas de consumo até a governança corporativa. Empresas que ignoram essas diferenças correm risco de fracassar em sua inserção global, enquanto aquelas que desenvolvem sensibilidade cultural e competências de adaptação ampliam suas chances de sucesso. Portanto, a dimensão cultural deve ser tratada como componente estratégico das decisões de internacionalização, e não como elemento secundário.

6. TECNOLOGIAS DISRUPTIVAS NA INTERNACIONALIZAÇÃO: IA E BLOCKCHAIN

O avanço das tecnologias digitais têm remodelado o cenário da internacionalização empresarial, tornando a inovação tecnológica não apenas um diferencial, mas um requisito estratégico para a competitividade global. Entre essas tecnologias, destacam-se a Inteligência Artificial (IA) e o blockchain, ambas consideradas disruptivas por sua capacidade de transformar modelos de negócios e criar formas de gerar valor (BARELLI & LEME, 2024; PORTO, LIMA JR. & SILVA, 2019).

A IA tem se consolidado como ferramenta essencial para análise de grandes volumes de dados, permitindo a identificação de padrões de consumo, a previsão de demandas e a personalização de estratégias de marketing. Em mercados internacionais, onde a diversidade cultural e comportamental amplia a complexidade da atuação empresarial, a IA fornece recursos analíticos capazes de segmentar consumidores com maior precisão e adaptar campanhas às especificidades locais (KOTLER & KELLER, 2016).

Além disso, a IA contribui para a automação de processos operacionais e administrativos, aumentando a eficiência e reduzindo custos. Sistemas de atendimento baseados em chatbots multilíngues, por exemplo, possibilitam a comunicação direta com consumidores de diferentes países, ampliando a acessibilidade e melhorando a experiência do cliente. Outro exemplo é o uso de algoritmos de machine learning para otimizar cadeias de suprimentos globais, ajustando estoques e fluxos logísticos em tempo real.

No entanto, a adoção da IA no processo de internacionalização enfrenta barreiras significativas. A privacidade e a proteção de dados constituem desafios centrais, especialmente diante de legislações rigorosas como a General Data Protection Regulation (GDPR) na União Europeia e a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) no Brasil. A necessidade de profissionais altamente qualificados, capazes de desenvolver e interpretar algoritmos, também limita o uso da IA em pequenas e médias empresas. Assim, embora apresente grande potencial, sua implementação requer investimentos robustos em tecnologia e capacitação.

O blockchain, originalmente associado às criptomoedas, vem sendo aplicado em diversos setores empresariais, com destaque para o comércio internacional. Sua principal contribuição está na garantia de transparência, segurança e rastreabilidade das transações. Para empresas que atuam em cadeias globais de suprimentos, o blockchain permite acompanhar em tempo real o percurso de mercadorias, desde a produção até a entrega final, reduzindo riscos de fraude e fortalecendo a confiança entre parceiros (PORTO et al., 2019).

Outro benefício é a redução da burocracia em transações internacionais. Contratos inteligentes baseados em blockchain automatizam o cumprimento de cláusulas previamente definidas, dispensando intermediários e reduzindo custos administrativos. Essa funcionalidade é especialmente relevante em contextos em que a diversidade regulatória aumenta a complexidade dos contratos.

Contudo, a aplicação do blockchain enfrenta limitações práticas. Problemas como a escalabilidade das redes, o alto consumo energético e a falta de regulamentação específica dificultam sua consolidação em larga escala. Além disso, ainda há resistência cultural e institucional, pois a descentralização proposta pelo blockchain desafia modelos tradicionais de controle por parte de governos e instituições financeiras.

A adoção de tecnologias disruptivas na internacionalização não deve ser vista apenas como solução técnica, mas como parte de uma estratégia empresarial ampla. A IA e o blockchain ampliam a eficiência, reduzem custos e oferecem maior segurança, mas também trazem riscos associados à dependência tecnológica, à concentração de poder em grandes empresas de tecnologia e às lacunas regulatórias.

No caso brasileiro, esses desafios se tornam ainda mais complexos devido à infraestrutura tecnológica desigual e à escassez de investimentos em inovação. Enquanto grandes corporações nacionais conseguem implementar soluções avançadas, pequenas e médias empresas encontram dificuldades para acompanhar essa transformação digital. Isso reforça a necessidade de políticas públicas que incentivem pesquisa, desenvolvimento e difusão tecnológica, de modo a democratizar o acesso a essas ferramentas.

Portanto, a integração da IA e do blockchain às estratégias de internacionalização deve ser entendida como um processo gradual, que envolve não apenas a adoção de sistemas digitais, mas também a adaptação cultural, organizacional e regulatória. A capacidade de alinhar inovação tecnológica com sensibilidade cultural e gestão eficiente poderá determinar o sucesso das empresas brasileiras no cenário global.

7. DISCUSSÃO

A análise integrada dos temas tratados evidencia que a internacionalização empresarial é um fenômeno complexo, condicionado por múltiplas variáveis que se entrelaçam em um contexto global em constante transformação. Embora a globalização tenha ampliado as oportunidades de expansão, também trouxe novos riscos e desafios, o que torna a decisão de internacionalizar mais estratégica e multifacetada.

Do ponto de vista econômico, a globalização ampliou o acesso a mercados e gerou condições favoráveis para que empresas brasileiras busquem novas fronteiras de crescimento (CULPI, 2016; KOTLER & KELLER, 2016). No entanto, essa inserção ocorre em um ambiente marcado por assimetrias: grandes corporações globais tendem a se beneficiar mais desse processo, enquanto empresas de médio e pequeno porte enfrentam maiores dificuldades para superar barreiras logísticas, regulatórias e tecnológicas (GRAMSCI, 2001; RATTNER, 1995). Assim, a expansão internacional não pode ser entendida apenas como consequência natural da globalização, mas como resultado de escolhas estratégicas que precisam considerar os recursos e limitações de cada organização.

As estratégias de internacionalização analisadas mostram que não existe um modelo único capaz de garantir sucesso. Modalidades como exportação indireta oferecem menor risco, mas também menor controle, enquanto investimentos diretos no exterior ampliam a autonomia, mas expõem a empresa a altos custos e incertezas políticas e cambiais (CAVUSGIL, KNIGHT & RIESENBERGER, 2010). Essa diversidade de caminhos revela que a decisão sobre a forma de entrada deve ser flexível e alinhada ao setor de atuação, ao porte da empresa e ao contexto regulatório do país de destino.

A dimensão cultural surge como um dos pontos mais sensíveis do processo de internacionalização. Ferramentas como o modelo proposto por Hofstede (1991) evidenciam como valores locais impactam negociações, práticas de gestão e aceitação de produtos e serviços. Muitas vezes, o insucesso de empresas em mercados internacionais está menos relacionado a fatores econômicos e mais a falhas de adaptação cultural. Nesse sentido, a cultura deve ser compreendida não apenas como barreira, mas também como fonte de aprendizado organizacional e de inovação, na medida em que o contato com diferentes realidades pode enriquecer as práticas empresariais (SOBRAL et al., 2012).

Outro eixo relevante refere-se às tecnologias disruptivas, como a Inteligência Artificial e o blockchain, que vêm se consolidando como ferramentas estratégicas na internacionalização. Essas tecnologias ampliam a eficiência na análise de dados, a personalização de estratégias de marketing e a transparência em cadeias de suprimentos (BARELLI & LEME, 2024; PORTO et al., 2019). No entanto, sua adoção exige investimentos em infraestrutura, capacitação e compliance regulatório, o que evidência novamente a desigualdade de condições entre grandes corporações e pequenas e médias empresas.

Do ponto de vista crítico, observa-se que os benefícios da globalização e da tecnologia não se distribuem de maneira uniforme. Enquanto algumas empresas conseguem se posicionar de forma competitiva no mercado internacional, outras permanecem restritas ao mercado doméstico devido à falta de recursos, planejamento ou sensibilidade cultural. Essa constatação reforça a ideia de que a internacionalização não é um processo automático, mas sim uma estratégia dinâmica, que demanda constante adaptação a mudanças econômicas, políticas, culturais e tecnológicas.

Portanto, a discussão sugere que o sucesso da internacionalização das empresas brasileiras dependerá da capacidade de combinar três elementos-chave: estratégias flexíveis, que considerem diferentes modos de entrada; competências interculturais, que garantam adaptação a contextos diversos; e inovação tecnológica, que permita eficiência e competitividade em cadeias globais cada vez mais complexas. A articulação equilibrada desses fatores será determinante para definir quais organizações conseguirão se consolidar no cenário internacional nas próximas décadas.

8. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Assim, nota-se que a globalização transformou profundamente os negócios internacionais, criando oportunidades e desafios para as empresas brasileiras. Para competir de forma sustentável em mercados externos, as organizações precisam desenvolver estratégias bem estruturadas de internacionalização, que considerem fatores econômicos, culturais e tecnológicos. Ademais, a incorporação de tecnologias disruptivas, como a Inteligência Artificial e o blockchain, tem potencial para otimizar processos, reduzir custos e aumentar a transparência nas operações. Contudo, essas inovações exigem investimentos significativos e capacidade de adaptação, o que pode ser um obstáculo, especialmente para pequenas e médias empresas.

O contexto cultural permanece como um fator decisivo para o sucesso internacional. A compreensão das diferenças culturais e a adoção de práticas de gestão intercultural contribuem para minimizar riscos e fortalecer relacionamentos comerciais. Assim, a integração entre estratégias tecnológicas, planejamento estratégico e sensibilidade cultural é essencial para que as empresas brasileiras se posicionem de forma competitiva no cenário global.

Em síntese, a internacionalização bem-sucedida depende da capacidade das organizações de equilibrar inovação, gestão estratégica e compreensão das complexidades globais, transformando desafios em oportunidades de crescimento e desenvolvimento econômico.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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1 Mestranda em Administração pela Must University. E-mail: [email protected]

2 Mestranda em Administração pela Must University. E-mail: [email protected]

3 Mestranda em Administração pela Must University. E-mail: [email protected]

4 Mestra em Administração pela Must University. E-mail: [email protected]

5 Mestranda em Administração pela Must University. E-mail: [email protected]

6 Mestranda em Administração pela Must University. E-mail: [email protected]