DESAFIOS E ESTRATÉGIAS NA IMPLEMENTAÇÃO DE PROGRAMA DE QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO: UM ESTUDO SOBRE A GESTÃO DE PESSOAS NUMA INSTITUIÇÃO FEDERAL DE EDUCAÇÃO
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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.13581878
Ricardo Nascimento Ferreira1
Isabela dos Santos Mattoso2
Jeniffer Aparecida de Lima Santos Rodrigues de Oliveira3
João Pedro dos Santos Heleno4
Júlia Christina Santos Venerando5
RESUMO
Este artigo aborda os desafios e estratégias na implementação de programas de Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) em instituições federais de educação profissional, científica e tecnológica. A gestão de pessoas desempenha um papel fundamental na promoção do bem-estar e da saúde dos servidores, mas enfrenta complexidades decorrentes da diversidade de perfis e demandas entre os colaboradores. O estudo explora como diferentes setores institucionais, desde áreas acadêmicas até setores administrativos e operacionais, apresentam necessidades distintas que exigem abordagens flexíveis e adaptativas. Além disso, discute-se a importância do comprometimento institucional e da alocação adequada de recursos para garantir a eficácia dos programas de QVT. Exemplos práticos ilustram como essas instituições podem superar desafios e implementar políticas que promovam um ambiente de trabalho saudável, produtivo e sustentável. Conclui-se que a QVT deve ser integrada à cultura organizacional, adaptada às especificidades locais, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida dos colaboradores e contribuir para o sucesso institucional.
Palavras-chave: Qualidade de Vida no Trabalho (QVT), Gestão de Pessoas, Instituições Federais, Bem-estar Organizacional, Desafios e Estratégias.
ABSTRACT
This article addresses the challenges and strategies in implementing Quality of Work Life (QWL) programs in federal institutions of professional, scientific, and technological education. Human resource management plays a crucial role in promoting employee well-being and health, but faces complexities arising from the diversity of profiles and demands among workers. The study explores how different institutional sectors, ranging from academic areas to administrative and operational departments, have distinct needs that require flexible and adaptive approaches. Additionally, it discusses the importance of institutional commitment and proper resource allocation to ensure the effectiveness of QWL programs. Practical examples illustrate how these institutions can overcome challenges and implement policies that promote a healthy, productive, and sustainable work environment. The conclusion emphasizes that QWL should be integrated into the organizational culture, adapted to local specificities, with the goal of improving employee quality of life and contributing to institutional success.
Keywords: Quality of Work Life (QWL), Human Resource Management, Federal Institutions, Organizational Well-being, Challenges and Strategies.
1. INTRODUÇÃO
A Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) emergiu como um conceito crucial nas discussões sobre a gestão de pessoas, especialmente em instituições da rede federal de educação profissional, científica e tecnológica. A importância deste tema é amplificada no contexto atual, onde os desafios enfrentados pelos setores de Recursos Humanos (RH) em ambientes acadêmicos são variados e complexos. Em um cenário marcado por mudanças rápidas e intensas nas dinâmicas de trabalho, a implementação de estratégias efetivas de QVT se torna um imperativo para garantir não apenas o bem-estar dos servidores, mas também a eficiência e a eficácia das instituições educacionais.
Originada na década de 1970, a QVT começou a ganhar destaque como uma resposta à crise estrutural nos padrões de gestão taylor-fordista, impulsionada pela necessidade de adaptar-se a novas realidades econômicas e sociais (FERREIRA ET. AL, 2009). Com o tempo, o conceito evoluiu para abranger não apenas a produtividade, mas também o bem-estar integral dos trabalhadores.
Os dados recentes destacam uma crescente preocupação com a saúde mental dos servidores públicos federais, refletida em um aumento nos afastamentos por questões psicológicas. Entre 2013 e 2023, uma média de 215 servidores se afastaram anualmente para cuidar da saúde mental, com a depressão e a ansiedade sendo as condições mais prevalentes. A falta de novos servidores e a baixa flexibilidade para mudar de equipe foram identificadas como causas que agravam esse sofrimento. O ano de 2018 teve um pico de 425 afastamentos temporários. (GALDEANO, 2024)
A gestão de pessoas nas instituições da rede federal enfrenta desafios específicos relacionados à adoção de programas de QVT. Estes desafios são exacerbados por fatores como a diversidade das demandas, a falta de um programa padronizado e as restrições orçamentárias. A crise provocada pela pandemia de COVID-19 evidenciou e ampliou a necessidade de uma abordagem mais holística e integrada para a QVT, refletindo uma crescente preocupação com a saúde mental e o equilíbrio entre a vida profissional e pessoal dos trabalhadores. A recente legislação, como a Lei nº 14.681/2023, tem introduzido novas diretrizes que influenciam diretamente as práticas de RH no setor educacional, tornando ainda mais relevante a análise das iniciativas e obstáculos na implementação de programas de QVT.
Este artigo tem como objetivo analisar a atuação da gestão de pessoas em uma das instituições da rede federal de educação profissional, científica e tecnológica, com foco na implementação de programas de QVT. Ao explorar as iniciativas adotadas e os desafios encontrados, busca-se compreender como as práticas de gestão de pessoas podem ser aprimoradas para promover um ambiente de trabalho mais saudável e produtivo. O estudo é relevante não apenas para os gestores e administradores dessas instituições, mas também para o setor acadêmico como um todo, que se beneficia diretamente da criação de ambientes de trabalho que favoreçam a qualidade de vida e o desempenho profissional.
A análise proposta se justifica pela necessidade de adaptar as práticas de RH às novas realidades e demandas do ambiente de trabalho contemporâneo. As mudanças nas formas de trabalho, impulsionadas pela globalização e pelo avanço tecnológico, exigem uma revisão das abordagens tradicionais de QVT. Além disso, a crescente evidência de que ambientes de trabalho saudáveis impactam positivamente na produtividade e na satisfação dos servidores reforça a necessidade de uma abordagem sistemática e bem fundamentada.
Este artigo, portanto, não apenas contribui para o entendimento das práticas de QVT em instituições da rede federal, mas também oferece uma base para a formulação de políticas e estratégias que possam ser implementadas para enfrentar os desafios identificados e promover uma gestão mais eficaz e humanizada.
2. REVISÃO DA LITERATURA
2.1 CONCEITOS CHAVE
A discussão sobre Qualidade de Vida (QV) e Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) tem se intensificado nas últimas décadas, especialmente com o avanço de novas formas de trabalho, como o teletrabalho, que ganharam destaque durante a pandemia da COVID-19. Embora QV e QVT estejam interligados, é fundamental entender que eles abordam aspectos distintos da vida dos indivíduos. A QV refere-se ao bem-estar geral de uma pessoa, englobando fatores como saúde física, mental, relacionamentos interpessoais e satisfação com a vida. Por outro lado, a QVT foca especificamente nas condições oferecidas pelo ambiente de trabalho que impactam diretamente o bem-estar do trabalhador. Segundo Chiavenato (2004), a QVT está relacionada a um conjunto de ações de uma empresa que visa promover a satisfação dos seus colaboradores, o que inclui desde as condições físicas do ambiente de trabalho até as relações interpessoais.
O autor Mário César Ferreira, em seu estudo "Qualidade de Vida no Trabalho no Contexto das Organizações Públicas Brasileiras: Uma Abordagem Preventiva Para Diagnóstico e Monitoramento", oferece uma análise crítica sobre as práticas de QVT, especialmente no setor público. Ferreira argumenta que muitas iniciativas de QVT têm se limitado ao assistencialismo, focando em ações pontuais e corretivas que visam resolver problemas já instalados, como a oferta de programas de bem-estar apenas após o surgimento de sinais de estresse ou esgotamento dos servidores. Ele critica essa visão assistencialista por ser reativa e por tratar apenas os sintomas de problemas mais profundos, sem abordar suas causas estruturais.
Em contraposição, Ferreira defende uma abordagem preventiva para a QVT, que se baseia no diagnóstico contínuo e no monitoramento das condições de trabalho, com o objetivo de antecipar e evitar problemas antes que eles se manifestem. Essa perspectiva preventiva é centrada na ideia de que a QVT deve ser integrada ao planejamento estratégico das instituições, promovendo um ambiente de trabalho saudável de forma proativa, ao invés de apenas reagir às demandas emergentes dos trabalhadores.
Ferreira enfatiza que a QVT deve ser entendida como um processo contínuo e integrado, que envolve a criação de políticas e práticas que não apenas melhorem as condições físicas e psicológicas dos trabalhadores, mas que também promovam um clima organizacional positivo e relações interpessoais saudáveis. Ao adotar essa abordagem, as instituições podem evitar a sobrecarga de trabalho, reduzir o estresse organizacional e, consequentemente, melhorar o desempenho e a satisfação dos servidores.
Esse viés preventivo proposto por Ferreira contrasta com o assistencialismo ao sugerir que, em vez de implementar medidas paliativas e esporádicas, as organizações públicas devem investir em um diagnóstico sistemático das necessidades dos trabalhadores e na construção de um ambiente de trabalho que previna o surgimento de problemas. Assim, a QVT deixa de ser vista como um conjunto de ações isoladas e passa a ser uma parte integral da gestão estratégica da instituição, visando a promoção contínua do bem-estar dos servidores e a criação de condições que favoreçam o desenvolvimento profissional e pessoal.
A pandemia de COVID-19 expôs a fragilidade da linha entre o tempo dedicado ao trabalho e o tempo pessoal, com muitas pessoas relatando dificuldades em equilibrar essas duas esferas. Esse descompasso tem implicações diretas na QVT, pois a má distribuição do tempo de trabalho afeta negativamente o bem-estar do trabalhador, podendo levar a casos de burnout, um transtorno reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como resultante de estresse crônico no local de trabalho. A experiência da servidora entrevistada para este estudo reforça a importância de um olhar atento às condições de trabalho e ao impacto que elas têm na vida dos servidores, mesmo em instituições onde programas de QVT ainda não estão formalmente institucionalizados.
Um exemplo clássico para entender a evolução das necessidades dos trabalhadores é a Pirâmide de Maslow, desenvolvida em 1943, que hierarquiza as necessidades humanas desde as mais básicas até as de autorrealização. No contexto laboral contemporâneo, as organizações são desafiadas a se adaptar às necessidades de seus trabalhadores, promovendo ambientes que vão além da simples satisfação das necessidades fisiológicas e de segurança, para incluir fatores de reconhecimento, pertencimento e realização pessoal. Entretanto, as ações voltadas à QVT, como programas de relaxamento ou atividades físicas no trabalho, podem ser inócuas se não forem acompanhadas por uma gestão que equilibre adequadamente às demandas profissionais com o bem-estar dos trabalhadores.
Além disso, a literatura também aponta para as mudanças nas relações de trabalho promovidas pelo capitalismo e pelas reformas administrativas, especialmente no setor público. Esses fatores aumentam a pressão sobre os trabalhadores, muitas vezes em detrimento de sua qualidade de vida. Segundo Drucker (1999), o capitalismo cria um ambiente em que o foco excessivo na produtividade pode resultar em um ambiente de trabalho prejudicial, onde as metas organizacionais estão em constante conflito com o bem-estar dos trabalhadores.
2.2 IMPORTÂNCIA DA QVT
A implementação de programas de QVT tem se mostrado uma estratégia eficaz não apenas para aumentar a satisfação dos trabalhadores, mas também para melhorar a produtividade organizacional. Estudos demonstram que colaboradores que se sentem valorizados e cujas necessidades são atendidas no ambiente de trabalho têm maior engajamento, o que se traduz em melhores resultados para a instituição (Ulrich, 1997). No entanto, para que esses programas sejam eficazes, é crucial que eles sejam bem planejados e que abordem as reais necessidades dos trabalhadores. A literatura destaca a importância de uma abordagem holística, onde ações de QVT não sejam meramente superficiais, mas sim integradas ao dia a dia dos trabalhadores, promovendo um ambiente que de fato contribua para o seu bem-estar.
Em muitas instituições, especialmente as menores, já se observam tentativas de implementar programas de QVT, mesmo que ainda não estejam completamente padronizados ou formalizados. Essas iniciativas, ainda que embrionárias, são indicativas de uma mudança cultural em direção à valorização do trabalhador como peça central na engrenagem organizacional. Contudo, o desafio de institucionalizar um programa de QVT em larga escala, especialmente em instituições da rede federal de educação profissional, científica e tecnológica, está na articulação interna necessária para superar obstáculos como a falta de pessoal e a sobrecarga de trabalho. A lógica assistencialista, mencionada nas entrevistas, demonstra como a falta de alinhamento e a burocracia podem dificultar a efetivação de programas de QVT que realmente façam a diferença.
A sobrecarga de trabalho, mencionada pela servidora entrevistada, é um problema recorrente em instituições públicas, onde as demandas são muitas e o número de trabalhadores, muitas vezes, insuficiente. Essa situação é agravada pela falta de novas contratações, especialmente em instituições mais antigas, como as da rede federal de educação profissional, científica e tecnológica, onde muitos servidores estão próximos da aposentadoria. A abertura de novas vagas muitas vezes não acompanha o ritmo necessário para substituir os profissionais que deixam o serviço, criando um ambiente de trabalho ainda mais estressante. A ausência de um programa formal de QVT, portanto, reflete não apenas a necessidade de planejamento, mas também de um esforço político para garantir que os direitos dos trabalhadores sejam respeitados e que o ambiente de trabalho seja propício ao desenvolvimento pessoal e profissional.
3. METODOLOGIA
3.1 DESCRIÇÃO DO ESTUDO
Este estudo tem como objetivo principal analisar a atuação da gestão de pessoas na promoção da Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) em instituições da rede federal de educação profissional, científica e tecnológica brasileiras, com foco em um caso específico que, devido a questões de confidencialidade, não será identificado diretamente. A pesquisa foi desenvolvida com base em um estudo de caso que explora as práticas e desafios enfrentados pela gestão de pessoas em uma instituição pública federal que está em processo de institucionalização de um programa de QVT. O estudo visa entender como a gestão de pessoas articula e implementa ações que promovam a QVT, considerando as especificidades do serviço público e os desafios impostos pelo contexto organizacional atual.
3.2 ENTREVISTAS E FONTES
Para a coleta de dados, foi realizada uma entrevista semiestruturada com uma servidora chave do Departamento de Gestão de Pessoas, em Assistência Social, além das suas atividades ela exerce uma função de grande responsabilidade na criação e implementação da política de QVT na instituição estudada. A entrevista foi conduzida de forma a capturar a complexidade da atuação do Departamento de Gestão de Pessoas (DGP), que, apesar de sua amplitude, trabalha com divisões específicas para atender diferentes demandas dos servidores, como saúde, assédio, e sistemas técnicos.
A análise da entrevista revelou que o DGP enfrenta desafios significativos na implementação de ações de QVT, especialmente devido à falta de padronização e à sobrecarga de trabalho dos servidores. No entanto, há um esforço contínuo para ouvir as necessidades dos trabalhadores e orientá-los, oferecendo possibilidades gerais que buscam melhorar suas condições de trabalho. Além disso, a pesquisa identificou que, embora ainda não exista um programa formalizado de QVT, há um planejamento em andamento para sua institucionalização, refletindo a importância crescente desse tema na agenda da gestão de pessoas.
3.3 ANÁLISE DE DADOS
Os dados coletados foram analisados por meio de uma abordagem qualitativa, com foco na identificação de temas emergentes relacionados à QVT e à gestão de pessoas. A análise foi orientada por categorias como "Desafios na Implementação de Programas de QVT" e "Necessidades de Abertura de Novas Vagas", que surgiram durante a entrevista. A falta de um programa formal de QVT foi identificada como um dos principais desafios, exacerbado pela sobrecarga de trabalho e pela falta de recursos humanos suficientes para atender à demanda.
A articulação interna necessária para superar esses desafios também foi um tema recorrente, com destaque para a importância de uma gestão que compreenda as especificidades de cada setor da instituição. A entrevista revelou que, embora haja ações esparsas voltadas para a QVT, estas ainda não estão integradas em um programa coeso e eficaz. O estudo conclui que, para que a QVT seja efetivamente implementada, é necessário não apenas planejamento e articulação interna, mas também um esforço político para garantir que as condições de trabalho dos servidores sejam adequadas e que eles possam realizar suas funções sem comprometer sua saúde e bem-estar.
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
O Departamento de Gestão de Pessoas (DGP) nas instituições da rede federal de educação profissional, científica e tecnológica, desempenha um papel essencial na gestão e desenvolvimento dos servidores. Estudos indicam que a variedade de perfis dos servidores, incluindo docentes, técnicos administrativos e terceirizados, exige abordagens flexíveis e adaptativas para atender às necessidades específicas de cada grupo (Limongi-França, 2004).
A implementação de programas de QVT é fortemente influenciada pelas particularidades de cada setor dentro de instituições. Como descrito por Siqueira (2010), diferentes setores possuem demandas distintas. Departamentos acadêmicos, por exemplo, podem enfrentar maior pressão relacionada à produção científica e ao ensino, necessitando de um foco maior em saúde mental e gestão do estresse. Por outro lado, setores administrativos lidam com prazos rigorosos e burocracia, elevando os níveis de estresse, enquanto setores como manutenção e segurança exigem políticas específicas de saúde ocupacional e segurança do trabalho. Essas diferenças impõem desafios ao DGP na criação de programas de QVT que sejam eficazes para todos os setores da instituição (Campos & Vasconcelos, 2017).
Recentemente, uma instituição federal, atuando como exemplo de boas práticas, revelou que está prestes a institucionalizar uma política de QVT em todas as suas unidades no próximo ano. Essa política, já planejada, visa abordar as questões de QVT de forma mais coesa, integrando ações que atualmente são geridas de forma independente por diferentes áreas e departamentos. Em um dos campus dessa instituição, embora já existam iniciativas voltadas para a QVT, elas são desenvolvidas e geridas separadamente por cada divisão e diretoria, evidenciando a necessidade de uma abordagem mais uniforme e institucionalizada. Foi realizada uma entrevista com uma colaboradora da instituição citada:
Entrevista sobre o tema:
A entrevistada, uma assistente social, mencionou que será institucionalizada uma política de Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) em todas as unidades da instituição no próximo ano.
Embora existam ações relacionadas à QVT em um dos campi, essas ações são desenvolvidas individualmente por cada área ou divisão.
A entrevista abordou a distinção entre qualidade de vida em geral e qualidade de vida no trabalho, com ênfase no caráter preventivo da QVT.
Foram mencionadas ações voltadas para a saúde mental após a pandemia, além de críticas ao impacto do uso excessivo de tecnologia e do capitalismo na qualidade de vida no trabalho.
Entrevista sobre Gestão de Pessoas:
A entrevistada, com experiência de uma década na instituição e formação em Serviço Social, discutiu a importância da QVT, especialmente no contexto pós-pandemia.
Foi destacada a diferença entre Qualidade de Vida no Trabalho e Qualidade de Vida em geral, com menção a algumas instituições menores que já aplicam programas de QVT, embora muitas ainda não tenham ações padronizadas.
A entrevista mencionou conceitos como a pirâmide de Maslow e discutiu o impacto do capitalismo e das reformas administrativas nos serviços públicos.
Um dos desafios para a implementação de programas de QVT é a falta de funcionários e a necessidade de articulação interna antes de formalizar tais programas.
A implementação de programas de QVT nas instituições de rede federais enfrenta diversos desafios. A má distribuição de tempo entre trabalho e vida pessoal é um dos problemas centrais, conforme relatado por Siqueira (2010). A sobrecarga de trabalho, somada à escassez de recursos humanos, muitas vezes impede que os programas sejam executados de maneira eficiente. Essa realidade é reforçada pelo manual do Ministério da Economia (2020), que destaca a necessidade de recursos adequados e apoio institucional para que os programas de QVT sejam efetivos no serviço público.
Além disso, a recente criação da Lei nº 14.681/2023, que aborda a qualidade de vida na educação, destaca a importância do tema e oferece uma nova perspectiva para a sua implementação. A pandemia também trouxe um foco maior em ações voltadas para a saúde mental, refletindo uma mudança nas prioridades institucionais. A lógica capitalista, com seu foco em produtividade e desempenho, pode entrar em conflito com os objetivos dos programas de QVT, que priorizam o bem-estar dos trabalhadores. Em entrevista com uma colaboradora da mesma instituição pública citada acima, foi constatado que o capitalismo intensifica a pressão sobre os servidores, muitas vezes colocando o lucro acima do bem-estar dos colaboradores. A distinção entre qualidade de vida, como pausas para exercícios durante a jornada de trabalho, e qualidade de vida no trabalho, relacionada ao clima organizacional e relações interpessoais, é crucial e deve ser respeitada. A QVT deve ter um caráter preventivo para ser eficaz.
Estudos de caso mostram que algumas redes de ensino têm obtido sucesso ao focar em programas de atenção à saúde mental e física dos servidores, enquanto outras priorizam iniciativas para conciliar vida pessoal e profissional, como horários de trabalho flexíveis. A experiência dessas instituições demonstra que, apesar dos desafios, é possível implementar programas de QVT eficazes, desde que haja um compromisso institucional forte e suporte adequado em termos de recursos. No entanto, é evidente que há poucas instituições que possuem programas bem estruturados e que se adequam às necessidades dos trabalhadores. Como evidência, o Instituto Federal Fluminense (IFF) oferece um exemplo concreto de como as instituições públicas podem enfrentar os desafios e implementar estratégias eficazes para promover a Qualidade de Vida no Trabalho (QVT). Em janeiro de 2024, foi aprovada a Resolução CONSUP/IFFLU N° 248, que institui o Programa de Qualidade de Vida no Trabalho do IFF, com diretrizes claras para a proposição, seleção, formalização, execução e avaliação dos projetos de QVT.
Entre os principais desafios enfrentados pelo IFF na implementação do programa, destacam-se a necessidade de equilibrar as demandas institucionais com as iniciativas de promoção da QVT e o engajamento dos servidores em atividades relacionadas à qualidade de vida. Para contornar esses desafios, o programa estabelece que os servidores devem dedicar no mínimo 5% de sua carga horária semanal a atividades de QVT, garantindo assim que as iniciativas tenham tempo e recursos suficientes para serem eficazes. Além disso, o programa é estruturado em torno de pilares fundamentais como o equilíbrio na organização do trabalho, o reconhecimento e valorização dos servidores, e a promoção de um ambiente de trabalho harmonioso. A gestão do IFF, em conjunto com os servidores, é corresponsável pela implementação das práticas que promovem a QVT, demonstrando um compromisso institucional com o bem-estar dos trabalhadores.
Este exemplo ilustra como o IFF está abordando os desafios inerentes à implementação de um programa de QVT e fornece insights valiosos para outras instituições que desejam melhorar a qualidade de vida de seus servidores.
5. PROPOSTAS DE MELHORIAS
A implementação de um programa eficaz de Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) requer a adoção de políticas padronizadas e consistentes que possam ser aplicadas em toda a instituição. Com a aprovação da Lei nº 14.681/2023, que institui a Política de Bem-Estar, Saúde e Qualidade de Vida no Trabalho e Valorização dos Profissionais da Educação, há uma base sólida para o desenvolvimento de ações que promovam o bem-estar e saúde dos servidores. A seguir, algumas possíveis melhorias baseadas nas diretrizes estabelecidas pela Lei:
5.1 PADRONIZAÇÃO DE PROGRAMAS DE QVT
A Lei enfatiza a criação de planos de qualidade de vida no trabalho com diretrizes claras e metas específicas. Portanto, é preciso que as instituições desenvolvam um programa padronizado de QVT, adaptado às suas necessidades particulares, mas seguindo as orientações da Lei. Este programa deve incluir:
Desenvolvimento de planos organizacionais (Art. 4º, VII): Criando ações que garantam a inclusão social e acessibilidade dos trabalhadores com deficiência, assegurando as condições de trabalho essenciais.
Adoção de indicadores e avaliação contínua (Art. 6º, §2º): Os planos de QVT devem conter indicadores de gestão claros e instrumentos de avaliação que permitam acompanhar a evolução das metas. Isso inclui relatórios anuais de clima organizacional e avaliação de absenteísmo e readaptação funcional.
5.2 POLÍTICAS INSTITUCIONAIS DE BEM-ESTAR E SAÚDE
A Lei promove o desenvolvimento de políticas voltadas ao equilíbrio entre vida pessoal e profissional, além de práticas que previnam o adoecimento e promovam a saúde integral (Art. 4º, VIII). A implementação de tais políticas pode incluir:
Flexibilização da carga horária: Propondo horários flexíveis e trabalho remoto parcial, quando aplicável, de modo a equilibrar as demandas pessoais e profissionais dos servidores.
Criação de um programa de saúde integral (Art. 3º): Desenvolver programas que incluam assistência psicológica, física e emocional para os servidores, abrangendo tanto os aspectos preventivos quanto os curativos.
5.3 EDUCAÇÃO CONTINUADA E VALORIZAÇÃO PROFISSIONAL
Para promover o desenvolvimento contínuo dos servidores, a Lei sugere a criação de programas de formação e capacitação, visando à valorização e ao desenvolvimento das competências profissionais (Art. 4º, VI). Algumas ações práticas podem incluir:
Cursos de capacitação e mentoria: Implementar programas regulares de formação continuada para todos os servidores, com foco em saúde, qualidade de vida e desenvolvimento profissional, conforme previsto na Lei (Art. 4º, X).
Programas de valorização profissional (Art. 2º, IV): Criação de mecanismos de reconhecimento institucional para os servidores que se destacam, promovendo uma cultura de valorização do trabalho e das competências adquiridas, além disso, vai ao encontro da proposta de criar um equilíbrio entre trabalho e vida pessoal, o que contribui para a satisfação e produtividade dos servidores.
5.4 FOMENTO AO BEM-ESTAR NO TRABALHO
Com base na Lei, que propõe a promoção de vivências lúdicas, culturais e esportivas para o bem-estar dos trabalhadores (Art. 5º, V), as instituições devem:
Promover atividades extracurriculares: Incentivar a prática de atividades culturais, esportivas e de lazer dentro e fora da instituição, proporcionando momentos de relaxamento e integração social para os servidores.
Organização de eventos de bem-estar: Promover eventos periódicos voltados à promoção da saúde e bem-estar, como semanas de saúde mental, atividades de integração entre departamentos e workshops sobre equilíbrio emocional.
5.5 ACOMPANHAMENTO E TRANSPARÊNCIA
A Lei também prevê a transparência e a constante atualização das ações de QVT, com a publicação de relatórios e dados acessíveis sobre o impacto dessas políticas (Art. 6º, §3º). Assim, as instituições devem:
Publicar relatórios de impacto: Divulgar anualmente relatórios que detalhem os resultados das políticas de QVT, com indicadores claros sobre absenteísmo, saúde mental e o clima organizacional.
Engajamento dos servidores: Incluir os servidores no processo de planejamento e avaliação das ações de QVT, garantindo que suas vozes sejam ouvidas nas melhorias propostas e na criação de novas iniciativas.
Essas propostas, fundamentadas na Lei nº 14.681/2023, fornecem um alicerce robusto para a criação de um ambiente de trabalho mais saudável, produtivo e satisfatório. Ao garantir o alinhamento das práticas institucionais às diretrizes legais, promovem não apenas o bem-estar imediato dos servidores, mas também o desenvolvimento sustentável da qualidade de vida no trabalho. Além disso, o acompanhamento contínuo dessas políticas será essencial para avaliar se as medidas implementadas estão efetivamente gerando os resultados esperados. Esse monitoramento constante permitirá ajustes dinâmicos, assegurando que os programas de QVT não apenas elevem a satisfação e saúde dos trabalhadores, mas também contribuam para o aumento da produtividade e melhoria geral da qualidade de vida, tanto no ambiente profissional quanto pessoal. Dessa forma, cria-se um ciclo virtuoso, em que a valorização e o cuidado com os servidores se traduzem em maior engajamento, eficiência e resultados positivos para a instituição como um todo.
6. CONCLUSÃO
A implementação de programas de Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) em qualquer instituição, independentemente de sua localização ou setor de atuação, envolve uma série de desafios e oportunidades que devem ser cuidadosamente avaliados e geridos. Em diferentes contextos, a aplicação dessas políticas enfrenta particularidades que vão desde a cultura organizacional até as características demográficas e socioeconômicas dos colaboradores. Instituições em áreas urbanas podem lidar com questões como o estresse decorrente de longas jornadas de trabalho e o trânsito, enquanto aquelas em regiões mais afastadas podem se concentrar em questões relacionadas ao isolamento social e à falta de acesso a serviços básicos. Essas variáveis exigem que os gestores de pessoas adotem abordagens flexíveis e adaptativas, garantindo que as estratégias de QVT sejam eficazes em atender às necessidades específicas de cada localidade.
Além disso, a diversidade dos perfis dos colaboradores – que pode incluir desde profissionais administrativos até operacionais, passando por acadêmicos e técnicos – requer a personalização das ações de QVT para que sejam realmente significativas. A implementação de tais programas deve considerar as particularidades de cada grupo, desenvolvendo iniciativas que variem desde a promoção da saúde mental e física até a criação de um ambiente de trabalho que valorize o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional. Em locais onde a rotina é mais intensiva, com prazos rígidos e alta pressão por resultados, como em áreas administrativas ou acadêmicas, é fundamental que as políticas de QVT incluam ações voltadas para a gestão do estresse e o bem-estar psicológico. Por outro lado, em setores como manutenção ou segurança, a prioridade pode ser dada a programas de saúde ocupacional e segurança no trabalho.
Adicionalmente, o sucesso de um programa de QVT em qualquer local depende fortemente do comprometimento da gestão e da alocação adequada de recursos. Em locais onde a instituição enfrenta desafios econômicos ou estruturais, a implementação de programas robustos de QVT pode ser particularmente difícil, exigindo criatividade e inovação para contornar as limitações e ainda assim promover um ambiente de trabalho saudável. A gestão de pessoas, portanto, deve atuar de forma proativa, buscando alinhar os objetivos de QVT com as metas organizacionais, garantindo que as iniciativas não apenas melhorem a qualidade de vida dos colaboradores, mas também contribuam para o sucesso e a sustentabilidade da instituição como um todo.
Em suma, a implementação de programas de QVT deve ser vista como uma estratégia essencial e contínua, adaptável às especificidades de cada local e contexto, mas sempre com o objetivo de promover um ambiente de trabalho mais saudável, produtivo e sustentável. A QVT, quando bem gerida, pode transformar o ambiente organizacional, aumentando a motivação, a satisfação e o desempenho dos colaboradores, independentemente do local de atuação da instituição.
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1 CEFET-RJ – Campus Maracanã. Professor do Ensino Básico Tecnológico. [email protected]
2 CEFET-RJ – Campus Maracanã. [email protected]
3 CEFET-RJ – Campus Maracanã. [email protected]
4 CEFET-RJ – Campus Maracanã. [email protected]
5 CEFET-RJ – Campus Maracanã.. [email protected]