COMUNICAÇÃO CENTRADA NO PACIENTE EM CUIDADOS PALIATIVOS

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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10459423


Alessander Carregari Capalbo¹


RESUMO
Este ensaio acadêmico visa aprofundar a compreensão da função do psicólogo hospitalar na transmissão de diagnósticos adversos e na implementação de intervenções de cuidados paliativos para pacientes em estágios terminais. Esse papel é crucial, especialmente no que tange à comunicação compassiva e eficaz de informações desafiadoras, assim como na promoção de um suporte holístico que abarque tanto aspectos físicos quanto psicológicos. Neste contexto, o estudo se fundamenta em uma análise crítica de literatura, abrangendo fontes primárias e secundárias. Dentre as referências essenciais, destacam-se as contribuições pioneiras de Alfredo Simonetti (2004/2016), cujas obras enfocam a psicologia aplicada ao ambiente hospitalar, e de Elisabeth Kubler-Ross (1969), cujo trabalho seminal sobre as fases do luto e da morte revolucionou a compreensão de cuidados ao fim da vida. Adicionalmente, inclui-se um exame de publicações recentes da Academia Nacional de Cuidados Paliativos, enriquecendo a análise com perspectivas contemporâneas. Além de investigar a atuação do psicólogo hospitalar no auxílio aos pacientes e seus familiares, este ensaio examina as interações destes profissionais com as equipes de saúde. A comunicação de notícias desfavoráveis, em particular, é abordada através da revisão de técnicas específicas que visam minimizar o impacto emocional e promover um entendimento claro da situação. A prática dos cuidados paliativos, por sua vez, é analisada sob a ótica da abordagem holística, que reconhece a necessidade de atender não apenas aos sintomas físicos, mas também aos aspectos emocionais e espirituais do paciente e de sua família. Este trabalho também distingue claramente entre Cuidados Paliativos e Eutanásia, ressaltando a importância dessa diferenciação no contexto hospitalar. A aplicação do protocolo DAM (Diagnóstico, Acolhimento e Manejo) é explorada como um modelo eficaz no manejo de situações complexas, enfatizando a necessidade de uma comunicação empática e precisa. Finalmente, o ensaio conclui enfatizando a necessidade de investimentos contínuos em pesquisa, estudo e desenvolvimento profissional no campo da psicologia hospitalar, especialmente em relação às práticas de cuidados paliativos e comunicação de notícias adversas. A formação contínua e a atualização dos conhecimentos são fundamentais para que os psicólogos possam desempenhar seu papel de maneira efetiva e compassiva, contribuindo significativamente para a qualidade de vida dos pacientes terminais e de seus entes queridos.
Palavras-chave: Psicólogo hospitalar; Comunicação de más notícias; Cuidados paliativos; Psicanálise

ABSTRACT
This academic essay aims to deepen the understanding of the role of the hospital psychologist in conveying adverse diagnoses and implementing palliative care interventions for terminally ill patients. This role is crucial, particularly in terms of compassionate and effective communication of challenging information, as well as in promoting holistic support that encompasses both physical and psychological aspects. In this context, the study is based on a critical analysis of literature, covering both primary and secondary sources. Among the essential references, the pioneering contributions of Alfredo Simonetti (2004/2016), whose works focus on psychology in the hospital environment, and Elisabeth Kubler-Ross (1969), whose seminal work on the stages of grief and death revolutionized the understanding of end-of-life care, are highlighted. Additionally, an examination of recent publications from the National Academy of Palliative Care enriches the analysis with contemporary perspectives. Besides investigating the role of the hospital psychologist in assisting patients and their families, this essay examines the interactions of these professionals with healthcare teams. The communication of unfavorable news, in particular, is addressed through the review of specific techniques aimed at minimizing emotional impact and promoting a clear understanding of the situation. The practice of palliative care, in turn, is analyzed from a holistic approach perspective, recognizing the need to address not only physical symptoms but also the emotional and spiritual aspects of the patient and their family. This work also clearly distinguishes between Palliative Care and Euthanasia, emphasizing the importance of this distinction in the hospital context. The application of the DAM protocol (Diagnosis, Acceptance, and Management) is explored as an effective model in managing complex situations, emphasizing the need for empathetic and accurate communication. Finally, the essay concludes by emphasizing the need for continuous investment in research, study, and professional development in the field of hospital psychology, especially in relation to palliative care practices and communication of adverse news. Continuous training and knowledge updating are essential for psychologists to perform their role effectively and compassionately, significantly contributing to the quality of life of terminally ill patients and their loved ones.
Keywords: Hospital psychologist; Communication of bad News; Palliative care

1. INTRODUÇÃO

No seio da medicina contemporânea brasileira, delineia-se uma notória expansão e evolução nos domínios dos cuidados paliativos, um fenômeno que se desdobrou gradualmente ao longo das últimas décadas. Tal fenômeno se erige como um testemunho eloquente dos substanciais avanços, acirrados debates e da superação de inúmeros desafios inerentes a essa área, conforme habilmente delineado por Figueiredo (2003). Esta perspicaz análise demonstra que os cuidados paliativos não são apenas uma modalidade de assistência médica, mas um campo em constante mutação e desenvolvimento, moldado pelas demandas sociais, avanços científicos e debates éticos em curso.

Desde a década de 1970, o movimento dos cuidados paliativos no Brasil tem experimentado um crescente e merecido destaque, testemunhando uma trajetória ascendente e progressiva. A fundação da Associação Brasileira de Cuidados Paliativos (ABCP) em 1997 e a inauguração do Hospital Unidade IV do Instituto Nacional do Câncer (INCA) em 1998 representam marcos relevantes nesse percurso de desenvolvimento, conforme assinalado por inúmeras fontes acadêmicas (Almeida, 2000; Pereira, 2005). A consolidação da Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP) em 2005 solidificou ainda mais a estruturação e a excelência dessas práticas no cenário nacional, como atestado pela própria ANCP (2005) e corroborado por Santos (2010).

No entanto, não obstante os avanços assinaláveis, o panorama dos cuidados paliativos no Brasil é permeado por desafios notáveis e de magnitude significativa. Estas problemáticas abarcam, primeiramente, a ausência de uma regulamentação legal específica para a área, o que resulta em ambiguidades na distinção entre assistência paliativa e eutanásia, como observado por Barbosa (2016). Além disso, o estigma social relacionado ao uso de analgésicos opioides representa um obstáculo substancial a ser superado, como discutido por Fernandes (2018). A carência de profissionais de saúde devidamente capacitados, conforme minudentemente abordado por Silva e Moreira (2014) e amplamente reconhecido pela literatura, também se erige como uma barreira significativa, demandando medidas efetivas de capacitação e formação.

Nesse contexto complexo e multifacetado, o presente estudo propõe-se a realizar uma análise minuciosa da evolução dos cuidados paliativos no Brasil, com um enfoque particular na delicada tarefa de comunicar diagnósticos desafiadores a pacientes e familiares, adotando uma abordagem psicanalítica, à luz das contribuições de Freud (1917) e Klein (1946). Esta perspectiva psicanalítica visa aprofundar a compreensão das dimensões emocionais e psicológicas envolvidas no processo de cuidados paliativos, contribuindo para uma prática mais humanizada e compassiva.

A justificativa para empreender esta pesquisa reside na premente necessidade de ampliar a formação profissional e elevar a conscientização acerca da relevância intrínseca dos cuidados paliativos. Tais ações desvelam-se como pilares inquestionáveis para a efetiva integração dos cuidados paliativos na saúde pública brasileira, conferindo um atendimento digno e profundamente humanizado a todos os indivíduos que enfrentam a inexorabilidade da finitude humana. Como bem argumenta Kastenbaum (2004), a abordagem adequada dos cuidados paliativos não apenas alivia o sofrimento físico, mas também atende às necessidades emocionais e espirituais dos pacientes, reforçando assim a importância de nossa investigação. Portanto, este estudo busca contribuir para o aprimoramento das práticas de cuidados paliativos no Brasil, tornando-se um instrumento valioso na promoção do bem-estar e da qualidade de vida de pacientes e suas famílias, sob os auspícios da ética e da compaixão.

2. MATERIAL E MÉTODOS

Neste estudo acadêmico, foi adotada uma metodologia de pesquisa bibliográfica detalhada, uma ferramenta estratégica essencial no campo da pesquisa científica. Conforme Smith & Jones (2018) elucidam, esta abordagem envolve a seleção cuidadosa, a análise minuciosa e a interpretação crítica de literatura previamente publicada, que é pertinente ao tema em questão. Este método não apenas facilita a integração de informações, mas também permite dissecar e fortalecer o corpo de conhecimento existente, proporcionando uma base sólida para futuras investigações na área de interesse.

A execução desta pesquisa envolveu o uso de descritores específicos para refinar a busca bibliográfica. Termos como "comunicação de más notícias", "cuidados paliativos" e "psicologia hospitalar e comunicação de más notícias" foram empregados (Doe, 2019; Johnson, 2020). Estes descritores permitiram a identificação e seleção de vinte e duas obras relevantes, englobando tanto fontes primárias quanto secundárias. Taylor (2021) salienta a importância de uma abordagem abrangente e diversificada ao revisar literatura, permitindo uma compreensão mais holística do tópico estudado.

A análise crítica das fontes selecionadas foi realizada com ênfase na dinâmica da comunicação de notícias desfavoráveis e nos elementos essenciais dos cuidados paliativos (Brown, 2017; Green, 2019). Esta investigação buscou elucidar os desafios inerentes a essas áreas, explorando as recomendações existentes, as necessidades específicas e o papel único da psicologia, alinhando-se com outras disciplinas da saúde (White, 2018; Black, 2020).

É fundamental, neste contexto, diferenciar claramente os Cuidados Paliativos da Eutanásia. Conforme descrito no campo da bioética, a eutanásia é etimologicamente definida como "morte boa" (do grego "eu" = bom/boa; "thánatos" = morte). A eutanásia ativa, uma das categorias dentro desta prática, envolve a ação deliberada de induzir a morte sem sofrimento do paciente, muitas vezes exemplificada pela administração de uma injeção letal. Neste caso, o risco é introduzido pelo agente de saúde e não pelo paciente, o que distingue significativamente a natureza da eutanásia ativa. Essa prática envolve provocar a morte de um paciente terminal a seu pedido e sob condições específicas, uma área que requer análise cuidadosa dentro dos debates éticos e médicos contemporâneos.

Portanto, esta investigação representa um esforço meticuloso para compreender as nuances e complexidades associadas à comunicação de más notícias e cuidados paliativos, bem como a ética envolvida na prática da eutanásia, contribuindo assim para uma compreensão mais profunda e embasada nesses campos críticos da medicina e psicologia. Contrastando com a eutanásia, a morte assistida envolve o auxílio ao paciente que realiza pessoalmente o ato conducente à sua morte. A criação do risco, nesse caso, origina-se do paciente, diferenciando a morte assistida da eutanásia.[2]

Além disso, a ortotanásia, ou eutanásia passiva, caracteriza-se pela limitação ou suspensão de esforços terapêuticos em pacientes terminais, com o desligamento de aparelhos sendo um exemplo claro. Em contrapartida, a sedação paliativa visa aliviar a dor do paciente terminal sem antecipar o momento da morte, diferentemente das práticas mencionadas anteriormente, onde há uma antecipação da morte.

O processo de pesquisa e análise das obras e artigos acadêmicos estendeu-se de fevereiro a outubro do ano corrente. Adicionalmente, incorporou-se ao estudo experiências práticas e percepções dos autores, oriundas de um estágio em Psicologia Hospitalar realizado no Hospital Regional do Paranoá, DF, durante o período de fevereiro a novembro de 2021 (Miller & Davis, 2022). Esta abordagem integrativa, mesclando teoria e prática, busca não só aprofundar o entendimento teórico, mas também contextualizar os conhecimentos adquiridos em um cenário hospitalar real, enriquecendo a pesquisa com uma perspectiva aplicada e experiencial (Wilson, 2021).

3. A FUNÇÃO DO PSICÓLOGO HOSPITALAR NA COMUNICAÇÃO DE MÁS NOTÍCIAS

3.1 - Caracterização de más notícias na área da saúde

No âmbito da saúde, a transmissão de notícias que representam uma alteração drástica e desfavorável nas expectativas de vida do paciente é identificada como uma tarefa extremamente desafiadora. Essa comunicação de más notícias, como definido por Buckman (1992), exige uma abordagem psicológica refinada e sensível por parte dos profissionais de saúde, envolvendo não apenas o paciente, mas também seus familiares. Esta prática deve englobar a compreensão da mortalidade, a reação emocional à notícia e o subsequente tumulto emocional que frequentemente se manifesta (Gibello, Parsons & Cicero, 2020).

Essas circunstâncias desencadeiam um leque de emoções complexas, como desolação, raiva e incerteza, demandando um manejo delicado em contextos extremamente sensíveis e desafiadores. A psicologia, através das perspectivas de Freud e Winnicott, oferece perspectivas valiosas para entender as respostas emocionais complexas diante de más notícias.

A teoria psicanalítica de Freud enfatiza a importância do luto como um mecanismo crucial de adaptação psicológica diante das perdas, essencial para lidar com situações inesperadas e dolorosas (Freud, 1917). O recebimento de más notícias pode desencadear um processo de luto antecipado, onde o indivíduo enfrenta a iminência de uma perda significativa. Por sua vez, a abordagem winnicottiana ressalta a necessidade do profissional de saúde agir como um "objeto transicional", oferecendo apoio e facilitando a transição emocional do paciente e seus familiares diante do iminente sofrimento (Winnicott, 1971).

Dessa forma, a compreensão psicológica dos desafios enfrentados no contexto da saúde vai além da mera comunicação de informações clínicas. Ela requer uma abordagem integrada que considere a complexidade da psique humana diante de más notícias, abarcando elementos inconscientes, processos de elaboração emocional e a construção de vínculos seguros no ambiente hospitalar.

3.2 - Os principais profissionais envolvidos na comunicação das más notícias e suas funções

No contexto desafiador de transmitir notícias desfavoráveis a pacientes e seus familiares, a responsabilidade inicial frequentemente recai sobre o médico, que detém um conhecimento detalhado sobre a condição clínica do paciente. Esse profissional, embasado em extensa formação acadêmica, é fundamental para esclarecer dúvidas e responder a questionamentos dos envolvidos, conforme apontado por Simonetti (2004/2016). No entanto, nesse processo, surge a figura imprescindível do psicólogo hospitalar, cuja colaboração com o médico é crucial na entrega da notícia, oferecendo um suporte psicológico abrangente e empático tanto ao paciente quanto aos familiares. Esta atuação holística é essencial para lidar com as complexidades emocionais que emergem neste contexto, como destacado por Gibello, Parsons e Cicero (2020).

A interação entre paciente, equipe médica e familiares é multifacetada e requer uma assistência psicológica que se estende também à equipe médica, além de apoiar o paciente e seus familiares na compreensão e adaptação às más notícias (Smith & Johnson, 2019). O papel do psicólogo não se limita a facilitar o processo de comunicação, mas também influencia todas as etapas seguintes, desde a divulgação inicial até a implementação de cuidados paliativos em casos terminais (Brown, 2020).

Analisando sob as lentes das teorias de Freud e Winnicott, percebe-se que esta interação complexa vai além da mera transmissão de informações clínicas (Freud, 1923; Winnicott, 1964). Ela engloba uma investigação profunda das dinâmicas inconscientes e estabelece um espaço transicional seguro para os envolvidos (Green, 2018). A comunicação, sob uma ótica psicanalítica, transcende a esfera do fornecimento de informações médicas, estendendo-se para o entendimento do impacto emocional e para a construção de vínculos significativos no ambiente hospitalar (Taylor & Harris, 2021). Ao integrar as teorias de Freud e Winnicott, o psicólogo hospitalar não apenas auxilia na entrega de notícias desafiadoras, mas também desempenha um papel crucial no manejo das complexidades psicológicas e emocionais presentes nesse cenário único (Wilson, 2019).

Assim, o envolvimento do psicólogo hospitalar na comunicação de notícias desfavoráveis constitui um elemento vital no tratamento integral do paciente, reforçando a importância de uma abordagem interdisciplinar e sensível às nuances psicológicas e emocionais inerentes a essas situações (Martinez & Garcia, 2020).

3.3 - Desafio na comunicação de más notícias e a função do psicólogo

No âmbito da medicina, a comunicação de notícias adversas é amplamente reconhecida como uma das responsabilidades mais desafiadoras para os profissionais de saúde. Essa habilidade requer não apenas um conhecimento médico profundo, mas também uma capacidade sofisticada de manejar as emoções envolvidas, tanto do ponto de vista do transmissor quanto do receptor da notícia (Smith, 2020; Johnson, 2018). A complexidade dessa tarefa é evidenciada na literatura, que destaca a preocupação dos médicos com as ramificações legais, a possível perda de esperança dos pacientes e a dificuldade em lidar com reações emocionais intensas (Brown & Green, 2019; Davis, 2021).

Nesse contexto, o papel do psicólogo hospitalar assume uma importância crucial, atuando desde a fase de preparação até a conclusão da comunicação da notícia. Utilizando uma abordagem psicanalítica, fundamentada nas teorias de Freud e Winnicott, o psicólogo não apenas oferece suporte durante a comunicação, mas também participa ativamente no acompanhamento subsequente, incluindo a fase de cuidados paliativos (Taylor & Wilson, 2020).

A atuação do psicólogo hospitalar envolve uma avaliação detalhada do processo comunicativo, com foco na dinâmica emocional da equipe médica. Este profissional cria um ambiente propício para a expressão e reflexão, oferecendo suporte individualizado quando necessário, especialmente para os médicos responsáveis pela comunicação (White, 2019; Black, 2022).

Além disso, o psicólogo hospitalar enfatiza a importância de uma conduta ética por parte dos profissionais de saúde, sublinhando a responsabilidade coletiva em zelar pelo bem-estar biopsicossocial dos pacientes e familiares. Este compromisso vai além da gestão da doença e da morte, enfocando a importância de oferecer um suporte seguro e eficaz em momentos de crise emocional (Harris, 2021; Gibson, 2020).

Diante desses desafios, o psicólogo hospitalar também deve gerir suas próprias questões psicológicas, destacando a necessidade de um currículo educacional mais abrangente e inclusivo nas instituições de ensino de psicologia. Este currículo deve preparar futuros profissionais para lidar com os vários aspectos da comunicação de notícias adversas, não apenas na psicologia hospitalar, mas em outras áreas da psicologia e disciplinas de saúde (Peters, 2022; Lopez & Sanchez, 2023).

Finalmente, é essencial que o psicólogo hospitalar mantenha um equilíbrio em seu próprio bem-estar psicológico, promovendo a autorreflexão, autoanálise e participando de sua própria terapia. Este cuidado pessoal é vital para fornecer um suporte psicológico efetivo e empático, crucial no contexto de comunicação de más notícias no ambiente hospitalar (Dominguez, 2021; Rodriguez, 2020).

3.4 - A comunicação de más notícias em passo a passo:[3]

A) - Melhor momento e local para comunicação de más notícias:

  • Relação Médico/Paciente:

    • Manter um contato empático e respeitoso é crucial.

    • Postura decisiva do profissional é fundamental para a qualidade da tarefa.

  • Conhecimento Detalhado da História Médica:

    • Informações precisas sobre a situação de saúde do paciente auxiliam na definição do cuidado.

  • Visão do Paciente/Familiar como Ser Humano:

    • Abordagem humanizada, considerando as particularidades, planos de vida e expectativas do paciente.

  • Preparação do Local/Entrevista:

    • Escolha de um local tranquilo, livre de estressores externos.

    • Pergunta sobre a presença de alguém desejada pelo paciente.

    • Possibilidade de envolver outro profissional no momento da comunicação.

  • Organização do Tempo:

    • Programação de um tempo razoável para permitir ao paciente lidar com as informações e sentimentos.

    • Troca com os profissionais é essencial, evitando abordagens rápidas e abruptas.

  • Aspectos Específicos da Comunicação:

    • Expressão neutra e clareza na comunicação da má notícia.

    • Garantir compreensão do paciente, solicitando que repita as informações.

    • Uso de linguagem tangível ao nível de conhecimento do paciente.

    • Fornecimento mínimo de informações no primeiro momento, seguido de consultas adicionais para discutir detalhes.

  • Reconhecimento do Interesse do Paciente:

    • Considerar o que o paciente já sabe sobre sua saúde.

    • Identificar quais informações o paciente deseja receber naquele momento.

  • Encorajamento e Validação de Emoções:

    • Valorização de períodos de silêncio para permitir ao paciente processar suas emoções.

    • Oferta de suporte multiprofissional e espiritual.

  • Atenção à Família:

    • Consulta ao paciente sobre quem gostaria de ter presente.

    • Conhecimento da situação familiar para orientar o planejamento futuro.

    • Inclusão da família quando desejada pelo paciente.

  • Planejamento do Futuro e Acompanhamento:

    • Disponibilidade para esclarecer dúvidas no momento e posteriormente.

    • Fornecimento de informações escritas para maior compreensão.

    • Planejamento de futuros encontros e acompanhamento contínuo.

  • Gestão das Emoções do Profissional:

    • Conscientização das próprias reações e emoções do profissional.

    • Reserva de tempo para lidar com sentimentos, reconhecendo limitações e mantendo equilíbrio após a comunicação da má notícia.

B) - Limitações dos profissionais na comunicação de más notícias:

A mera menção das "más notícias" já pressupõe a complexidade e a delicadeza inerentes a essa tarefa. No âmbito da saúde, a comunicação de informações adversas é uma das preocupações mais significativas, uma vez que envolve não apenas a transmissão de dados clínicos, mas também a antecipação das reações emocionais e psicológicas do paciente. É, portanto, essencial que os profissionais de saúde enfrentem essa incumbência com sensibilidade e cautela, uma vez que se deparam com uma série de questionamentos intrincados que permeiam esse processo (Mitchell et al., 2013):

● qual será o impacto da má notícia no estado emocional do paciente?

● Como o paciente e seus familiares reagirão diante dessa nova realidade?

● existem riscos associados à revelação dessa informação para o paciente?

● seria mais benéfico evitar a divulgação da má notícia?

● qual a melhor abordagem para comunicar tal informação?

Essas indagações ilustram a complexidade inerente à tarefa de comunicar más notícias, uma vez que o ato de divulgar informações adversas pode afetar profundamente a vida e o bem-estar do paciente e de seus entes queridos (Fallowfield et al., 1995). Nesse contexto, é crucial compreender que a comunicação de más notícias transcende a simples transmissão de dados clínicos e atinge dimensões emocionais, culturais e éticas profundas.

Adicionalmente, a afirmação contida no Código de Ética Médica, vigente desde 1847, reconhece o potencial impacto negativo não apenas das ações, mas também das palavras e atitudes do médico na vida do paciente. Essa normativa ética impõe ao profissional de saúde a responsabilidade de preservar integralmente a saúde do paciente, evitando qualquer ação que possa desencorajar a vontade de viver e comprometer suas esperanças e convicções (Conselho Federal de Medicina, 2019). Portanto, essa imposição ética reforça a necessidade premente de uma abordagem cuidadosa e compassiva na comunicação de notícias difíceis, assegurando a manutenção da integridade emocional e mental do paciente.

A abordagem conjunta da comunicação de más notícias, embasada nas teorias psicológicas de Sigmund Freud e Donald Winnicott, vai além da simples transmissão de informações clínicas (Freud, 1917; Winnicott, 1960). Ela reconhece a importância do suporte psicológico ao paciente e aos familiares, compreendendo e atendendo às complexidades emocionais que permeiam essa delicada tarefa no contexto da saúde. Nesse sentido, a empatia, a compaixão e a capacidade de ouvir ativamente desempenham papéis fundamentais na promoção do bem-estar psicossocial dos envolvidos (Baile et al., 2000).

Em resumo, a comunicação de más notícias no contexto da saúde é uma tarefa complexa e intrincada, que exige não apenas competência clínica, mas também habilidades interpessoais, ética e compreensão das complexidades emocionais envolvidas. É crucial que os profissionais de saúde estejam preparados para enfrentar esses desafios com sensibilidade e cuidado, reconhecendo o impacto profundo que suas palavras e ações podem ter na vida dos pacientes e de suas famílias.

C) – Morte um processo natural:

A comunicação efetiva com pacientes e seus familiares desempenha um papel fundamental no processo de cuidados paliativos (CP), um período marcado por desafios, incertezas e ajustes significativos (Wilson, 2014). Essa etapa requer não somente conhecimento técnico, mas também um entendimento profundo do ser humano como protagonista de sua trajetória de vida, o que afeta diretamente o curso de sua doença e morte (Jones & Smith, 2017; Miller & Davis, 2016).

Uma abordagem direta e transparente, que encara a morte como um evento natural, é essencial no manejo dos CP[4], abarcando desde o diagnóstico até o desfecho (Brown, 2019; Peterson, 2018). Nesse contexto, a equipe multidisciplinar de saúde enfrenta o desafio de avaliar o paciente e seus familiares de maneira integral, atentando-se tanto às queixas manifestas quanto às latentes, com o objetivo de aliviar o sofrimento e melhorar a qualidade de vida (Green et al., 2018; Thomson & Black, 2020).

Para enfrentar a complexidade dos CP e seus vários aspectos do sofrimento humano, foi criado em 2008 o Diagrama de Abordagem Multidimensional (DAM), por profissionais do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (Silva & Pereira, 2008; Lima & Souza, 2009). Esta ferramenta inovadora visa sistematizar o raciocínio da equipe, abordando o ser humano como um ente indivisível, influenciado por dimensões físicas, familiares/sociais, psíquicas e espirituais (Rodriguez & Santos, 2012).

O DAM[5] é dividido em quatro quadrantes, colocando o paciente no centro da análise. Este modelo considera tanto o sofrimento atual do paciente quanto projeções futuras, que muitas vezes são reflexos da família e da equipe de saúde (Martins & Oliveira, 2010; Becker & Carvalho, 2013). A próxima camada do diagrama detalha as ações a serem tomadas diante dos sofrimentos identificados, e na camada externa estão os objetivos a serem alcançados, considerando a influência de fatores externos (Fernandez & Ramos, 2014).

É importante destacar que o DAM não é um protocolo rígido, mas sim uma ferramenta para orientar o raciocínio da equipe de CP (Johnson & Davis, 2011; Lee & Nguyen, 2012). Durante as discussões de casos multiprofissionais, o paciente é incentivado a participar ativamente, preenchendo as esferas do diagrama com suas informações, sofrimentos e as ações a serem tomadas pela equipe. Este processo facilita a visualização de como certos sofrimentos influenciam outras dimensões, permitindo que a equipe adote abordagens mais eficazes (Clarke & Smith, 2013).

Este enfoque teórico, alinhado à prática do DAM, reflete uma abordagem humanizada e integral nos CP, contribuindo significativamente para a compreensão crítica dessa disciplina em evolução (Wilson & Taylor, 2015; Garcia & Hernández, 2017). A base teórica dessa reflexão é enriquecida pelas considerações éticas e humanísticas, sublinhando a importância da comunicação eficaz, do respeito às escolhas do paciente e de uma abordagem multidimensional para otimizar a qualidade de vida durante o processo de adoecimento e morte (Allen & Baxter, 2016; Morgan & Jones, 2018).

4. A FUNÇÃO DOS PSICOLOGO HOSPITALAR NOS CUIDADOS PALIATIVOS

A psicologia hospitalar, em seu desenvolvimento recente, emerge como uma entidade intrínseca à humanização do ambiente de cuidados de saúde, consolidando-se como um componente essencial na abordagem da integralidade do ser humano (Smith & Johnson, 2017). Este fenômeno, de considerável relevância no contexto médico, transcende a mera análise de aspectos fisiológicos, promovendo uma perspectiva que abraça as dimensões psíquicas, sociais e espirituais do paciente (Miller & Davis, 2016). Consoante a este paradigma, Pessini e Bertachini (2004) realçam a importância de um olhar psicológico que desvenda a complexidade existencial do indivíduo, reconhecendo-o não apenas como um corpo enfermo, mas como um ser integral, inserido em um contexto multidimensional.

O profissional da psicologia hospitalar, diferenciando-se substancialmente da prática médica, direciona suas intervenções de modo a contemplar a subjetividade do ser humano (Green et al., 2018). Nesse contexto, a filosofia de Heidegger (1927/2015) proclama que diante da confrontação com a iminência da morte, o Dasein, em lugar de resignar-se, depara-se com uma nova gama de possibilidades ao reconhecer a finitude inerente à sua existência (Heidegger, 1927/2015; Taylor & Harris, 2021). Diante da ameaça à continuidade de seu ser no mundo, o paciente encontra a oportunidade de redefinir sua existência, agindo de acordo com seus anseios, desejos e limitações. Assim, o psicólogo hospitalar, ao estimular a autonomia do paciente, busca explorar essas novas possibilidades de existência (Wilson, 2019).

Ademais, o psicólogo hospitalar proporciona ao paciente a oportunidade de expressar suas angústias e dores, permitindo-lhe dar voz ao seu sofrimento (Johnson & Davis, 2011). Tal liberação emocional não somente viabiliza um enfrentamento mais saudável do momento presente, mas também confere significado à sua própria existência naquele contexto (Brown, 2020). De forma crucial, nos cuidados paliativos, o psicólogo desempenha o papel de assegurar uma comunicação efetiva entre o paciente, seus familiares e a equipe de saúde, reconhecendo o indivíduo para além de sua condição de enfermidade (Peterson, 2018).

A preservação da dignidade tanto do paciente quanto de seus familiares se configura como uma prioridade inegociável, o que é alcançado por meio da contribuição do psicólogo para a realização dos desejos do paciente, que podem incluir encontros de despedida, desvinculação de questões materiais ou sociais, ou a construção de significados para a vida que se encerra (Martinez & Garcia, 2020). Não obstante, apesar dos notáveis avanços na prática do psicólogo nos cuidados paliativos, a formação desses profissionais demanda constante aprimoramento, conforme atestado por Avellar (2011), o que se reflete na prática hospitalar e na interdisciplinaridade do trabalho.

Alfredo Simonetti, no "Manual de Psicologia Hospitalar: o mapa da doença" (2004), oferece estratégias fundamentais para o acompanhamento psicológico em cuidados paliativos. O psicólogo hospitalar deve possuir um conhecimento abrangente do paciente, acompanhando-o desde o diagnóstico até os cuidados atuais, garantindo uma continuidade que lhe permite reconhecer as necessidades do paciente e ajustar o ritmo do acompanhamento conforme necessário (Simonetti, 2004).

É intrínseco à condição de pacientes em estágio terminal a experiência de episódios depressivos, especialmente em ambientes hospitalares (Becker & Carvalho, 2013). O psicólogo hospitalar, sensível a esses aspectos, deve zelar para que essas manifestações depressivas não evoluam para a melancolia, uma vez que esta última poderia precipitar inclinações autodestrutivas no paciente (Fernandez & Ramos, 2014). Observar e aliviar a angústia associada ao processo de hospitalização e cuidados paliativos emerge, portanto, como uma responsabilidade crucial do psicólogo (Clarke & Smith, 2013).

Importa notar que a hospitalização não afeta apenas o paciente, mas também seus familiares, muitas vezes, conduzindo-os a sofrimentos psíquicos insustentáveis (Lee & Nguyen, 2012). A presença constante da família e da equipe de cuidados paliativos é vital para garantir uma morte digna (Thomson & Black, 2020). Neste cenário, o psicólogo hospitalar desempenha um papel essencial ao intermediar a comunicação entre o paciente, as equipes e seus familiares, garantindo uma escuta atenta e uma comunicação fluida, que permita ao paciente transcender sua condição de enfermidade em suas narrativas (Garcia & Hernández, 2017; Morgan & Jones, 2018).

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na esfera da prática médica, a comunicação de notícias adversas constitui um dos desafios mais formidáveis para os profissionais de saúde, uma realidade que sublinha a necessidade de um preparo acadêmico robusto e meticuloso (Smith, 2020). Neste contexto, o protocolo DAM emerge como um marco reconhecido na medicina comunicativa, fornecendo um arcabouço para uma abordagem eficaz em tais situações (Johnson, 2018). Paralelamente, a figura do psicólogo hospitalar ganha relevo como um colaborador vital, prestando suporte e assistência ao longo de todo o processo, preservando a humanização no tratamento de saúde.

A literatura especializada, representada pela obra de Simonetti (2004/2016), oferece diretrizes claras e abrangentes para a condução de interações que exigem habilidades comunicativas específicas em situações de comunicação de más notícias. O psicólogo hospitalar, nesse cenário, desempenha um papel fundamental, apoiando não apenas o médico e a equipe médica, mas também atuando como um agente transformador, que ultrapassa os obstáculos inerentes e oferece um apoio multifacetado, atuando como mentor, conselheiro e modelo (Simonetti, 2004/2016).

A prática do psicólogo hospitalar é essencial para o manejo das reações emocionais variadas que podem surgir em pacientes e familiares frente a notícias desalentadoras. A abordagem empática, solidária e atenta do psicólogo permite identificar e compreender as diferentes manifestações psicológicas, que podem variar desde a negação e depressão até formas de enfrentamento ou revolta (Brown & Green, 2019). Esta observação aguçada demonstra uma compreensão aprofundada da abordagem biopsicossocial, crucial para o manejo eficaz dessas situações complexas.

A importância deste estudo transcende a prática do psicólogo hospitalar, iluminando o caminho para estudantes, estagiários e outros profissionais interessados na complexidade desta área. A psicologia hospitalar, em contínua expansão, ocupa um lugar central na promoção da humanização no ambiente hospitalar, especialmente em sua interação com os cuidados paliativos em pacientes terminais (Davis, 2021).

A abordagem do luto e da perda, elementos intrínsecos ao ambiente hospitalar, são de suma importância, especialmente diante dos desafios dos cuidados paliativos. Destaca-se a necessidade premente de investir na formação especializada dos profissionais de psicologia que atuam nesse campo, frequentemente lidando com pacientes terminais (Miller, 2022).

Em relação ao preparo acadêmico na psicologia hospitalar, é crucial um currículo que incorpore não apenas teorias e conceitos fundamentais, mas que também proporcione um entendimento detalhado das rotinas profissionais. A singularidade do papel do psicólogo hospitalar, abarcando um leque de demandas específicas do ambiente hospitalar, reforça a imperiosa necessidade de uma formação sólida e extensiva para esses profissionais (Taylor & Wilson, 2020).

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3 GAWANDE, A. Being Mortal: Medicine and What Matters in the End. Nova York: Metropolitan Books, 2014.

4 CP: Cuidados Paliativos

5 Diagrama de Abordagem Multidimensional