CARACTERIZAÇÃO FARMACOGNÓSTICA DE FOLHAS E FRUTOS DE MALPIGHIA GLABRA L.

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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.15313652


Francisco José Mininel1
Silvana Márcia Ximenes Mininel2


RESUMO
A acerola (Malpighia glabra L.) é uma fruta típica das Américas e foi introduzida no Brasil na década de 1950. Hoje o país é um dos maiores produtores e exportadores da fruta e seus produtos industrializados, como o suco e polpa. É produzida em praticamente todo o território brasileiro, com destaque para região nordeste do país. Sua alta concentração de vitamina C é um grande atrativo econômico, sendo hoje utilizada para a produção de conservantes naturais de alimentos e produtos nutracêuticos. Essas características aumentam as possibilidades de aplicabilidade dos compostos bioativos da fruta e assim, seu valor comercial. O presente trabalho teve como objetivo estudos fitoquímicos para a identificação dos principais grupos de substâncias existentes nas drogas de folhas e frutos da espécie vegetal. Foram detectadas as seguintes classes de substâncias: taninos, alcaloides, flavonoides. O perfil cromatográfico de extratos simples das drogas de folhas indicou a presença dos compostos rutina e quercetina.
Palavras-chave: Malpighia glabra L. Estudos fitoquímicos. Flavonoides. Taninos.

ABSTRACT
Acerola (Malpighia glabra L.) is a typical fruit of the Americas and was introduced to Brazil in the 1950s. Today, the country is one of the largest producers and exporters of the fruit and its industrialized products, such as juice and pulp. It is produced in practically the entire Brazilian territory, with emphasis on the northeast region of the country. Its high concentration of vitamin C is a great economic attraction, and is currently used for the production of natural food preservatives and nutraceutical products. These characteristics increase the possibilities of applicability of the fruit's bioactive compounds and thus its commercial value. The present study aimed to carry out phytochemical studies to identify the main groups of substances existing in the drugs from the leaves and fruits of this plant species. The following classes of substances were detected: tannins, alkaloids, and flavonoids. The chromatographic profile of simple extracts of the drugs from the leaves indicated the presence of the compounds rutin and quercetin.
Keywords: Malpighia glabra L. Phytochemical studies. Flavonoids. Tannins.

1. INTRODUÇÃO

Malpighia glabra L. é uma árvore de pequeno porte que apresenta tronco ramificado desde a base e copa densa. Suas folhas são simples, opostas, ovaladas a lanceoladas, pequenas, de cor verde escura e brilhante, a margem é inteira ou ondulada. As inflorescências são do tipo corimbo, possuem de três a cinco flores e despontam nas axilas foliares. Já as flores são hermafroditas, pentâmeras, possuem pétalas franjadas de cor branca, podendo também se apresentarem na cor rosa. Os frutos, por sua vez, são do tipo drupa, possuem casca lisa, polpa carnosa e aromática, com três gomos que recobrem três sementes, de cor laranja a vermelha (Figura 1). Seu cultivo deve ser realizado em sol pleno, solo fértil, profundo, de fácil dreno e com regas periódicas. Não suporta seca extensa ou encharcamento (LORENZI & MATOS, 2008).

Tem como nomes populares, Acerola, Cereja-das-antilhas, Cereja-de-barbados. Pertence à Família Malpighiaceae. É uma árvore que possui de 2,4 metros a 6 metros de altura. Tem origem na América central, América do Norte, América do Sul, Antilhas, Brasil, México, Peru. Floresce o ano todo e a polinização é feita por entomofilia (LORENZI & MATOS, 2008).

A acerola é conhecida pelas altas concentrações de vitamina C. Ela possui em torno de 800mg/100g de fruto maduro (CHIM; ZAMBIAZI; RUI CARLOS, 2013). Sendo hoje um de seus principais atrativos comerciais. Essa alta concentração de vitamina C vem sendo utilizada tanto para produção de conservantes de alimentos naturais, como para a fabricação de outros produtos nutracêuticos.

Este trabalhou procurou caracterizar farmacognósticamente as drogas de folhas e frutos de Malpighia glabra L., uma vez que a literatura não traz muitos dados das classes de substâncias nessa espécie vegetal.

Figura 1. Aspectos dos frutos e da árvore de Malpighia glabra L.
Fonte: Os autores

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Malpighia glabra L. (acerola) é uma fruta originária das Antilhas, na América Central, e do norte da América do Sul, produzida por um arbusto da família Malpighiaceae (Malpighia glabra L.), medindo pouco mais de 2 metros de altura e que apresenta-se muito ramificado. É também conhecida como cereja das Antilhas, cereja das Índias Ocidentais, cereja dos Barbados, dependendo do país onde é cultivada, sendo fruta suculenta, tipo drupa, com sabor agridoce, medindo de 1 a 3 cm de diâmetro (GONSALVES, 2001; MEZADRI et al., 2006).

A acerola apresenta-se como alternativa comercial altamente viável no mercado fruticultor. O contínuo crescimento de sua produção justifica mais projetos e pesquisas direcionados ao desenvolvimento de novos produtos à partir dessa matéria prima, que concentra na fruta in natura e na polpa, suas maiores formas de consumo. Entre os novos produtos derivados, estão surgindo na indústria de cosméticos xampus, cremes e sabonetes (LIMA et al. 2012; RITZINGER & RITZINGER, 2011).

Malpighia glabra L. é rica em minerais como cálcio, fósforo e ferro e vitaminas A, B1, B2, B3, antocianinas, carotenóides e, particularmente, em vitamina C, sendo uma das maiores fontes naturais desse composto (GOMES et al. 2001). O consumo de 2 a 4 unidades da fruta é capaz de atender as necessidades médias de vitamina C de um adulto saudável (GONSALVES, 2002). Além disso, a acerola contém o ácido málico, o qual confere à fruta um perfume semelhante ao das maçãs (MARINO NETTO, 1986).

3. METODOLOGIA

3.1. Material

O material botânico destinado ao presente trabalho foi coletado no Campus da Universidade Brasil, no município de Fernandópolis, estado de São Paulo. A confirmação da espécie foi feita pelo professor Dra. Angelo Simonato da Universidade Brasil.

3.1.1. Abordagem fitoquímica - reações genéricas de identificação de classes de substâncias (MATOS, 1997).

O material vegetal folhas e frutos de Malpighia gabra L. foi separado para estudos de detecção de constituintes químicos (classes de substâncias).

3.2. Material destinado ao estudo fitoquímico, físico-químico da droga de folhas e frutos e análise cromatográfica.

O material vegetal de Malpighia gabra L. coletado no período de setembro a dezembro de 2024, correspondeu a cerca de 2 kg de frutos e 3 kg de folhas. Após fragmentações adequadas dos materiais e secagem em estufa com circulação de ar, por um período de 15 dias, foram triturados em um moinho de faca fixa obtendo-se um pó semi-fino, segundo a Farmacopéia Brasileira Segunda Edição (NEMITZ, 2016).

Na sequência, foram empregados para os ensaios físicos e físico-químicos e perfil cromatográfico da droga de frutos (Figura 2).

3.3. Caracterização cromatográfica da droga de folhas e frutos de Malpighia gabra L. Preparo de extratos a partir de folhas e frutos através de extração simples, empregando os solventes: hexano, acetato de etila e metanol.

- Drogas

Foi pesado para cada solvente utilizado cerca de 2 g de drogas de folhas e frutos. Foi adicionado 5 mL de cada solvente para cada amostra analisada, obtendo-se 3 extrações com 4 solventes diferentes, totalizando 12 amostras contendo extrações simples.

3.4. Padrões empregados na análise cromatográfica:

Os padrões utilizados na análise cromatográfica foram:

rutina 0,1% em clorofórmio v/v

quercetina 0,1% em etanol v/v

3.4.1. Sistema cromatográfico:

Tabela 1. Sistema cromatográfico empregado na análise de drogas de folhas.

SISTEMA CROMATOGRÁFICO Nº 1

Suporte da fase estacionária= placa de vidro

Tamanho do suporte da fase= 20 cm x 20 cm

Fase estacionária = silicagel G Merck 3689508

Espessura da camada da fase estacionária = 300 µm

Fase móvel = benzeno:tolueno: acetato de etila (50:50:03)

Percurso da fase móvel= 12 cm

Saturação da câmara= completa

Desenvolvimento = Ascendente simples

Amostra = extratos simples das drogas

Quantidade de amostras aplicadas = 5,10,15 gotas.

Reveladores= ácido sulfúrico 5% + vanilina 1%, posterior aquecimento a 105°C por 5 a 10 minutos.

Padrão: rutina 0,1%

Padrão: quercetina 0,1%

https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/8/81/Quercetin.svg/1280px-Quercetin.svg.png

Diagrama

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Figura 2. Sequência adotada na abordagem fitoquímica de Malpighia glabra L.
Fonte: Os autores

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES

O estudo e pesquisa fitoquímica é importante principalmente quando ainda não são dispostos todos os estudos químicos com espécies de interesse popular, tendo como objetivo conhecer os compostos químicos das espécies vegetais e avaliar sua presença nos mesmos, identificando grupos de metabólitos secundários relevantes (SIMÕES et al., 2004) úteis enquanto marcadores químicos no monitoramento das plantas medicinais em processo de domesticação (LEITE, 2009), na qualidade da matéria prima medicinal e na prospecção da biodiversidade ou bioprospecção (BRAGA, 2009).

A etnobotânica aplicada ao estudo de plantas medicinais trabalha em estreita cumplicidade com a etnofarmacologia que consiste na exploração científica e interdisciplinar de agentes biologicamente ativos, que sejam tradicionalmente empregados ou observados por determinado agrupamento humano (LÓPEZ, 2006). Assim, estas áreas do conhecimento devem ser utilizadas em pesquisas de novas substâncias oriundas de plantas, tendo: a etnobotânica a incumbência de buscar informações a partir do conhecimento de diferentes povos e etnias; a fitoquímica o desempenho de identificação, purificação, isolamento e caracterização de princípios ativos; e a farmacologia o estudo dos efeitos farmacológicos de extratos e dos constituintes químicos isolados (ALBUQUERQUE & HANAZAKI, 2006). Esta atuação interdisciplinar é necessária e amplia as buscas direcionadas para o campo da bioatividade das plantas medicinais levando em conta também os aspectos agrotecnológicos, microbiológicos, farmacológicos e biotecnológicos (FOGLIO et al., 2006).

4.1. Cinza em drogas de folhas e frutos.

Tabela 2. Cinza em folha e frutos de Malpighia gabra L.

AMOSTRAS

CINZA

CINZA INSOLÚVEL EM ÁCIDO

 

% m/v

% m/v

Folha

7,39

0,32

Fruto

8,41

0,41

4.2. Pesquisa de classes de substâncias nas drogas de folhas e frutos de Malpighia gabra L.

4.2.1. Resultado das reações gerais indicativas da presença de taninos.

Tabela 3. Reações gerais indicativas da presença de taninos.

DROGAS

 

Fruto

Folha

Solução de sais de alcaloides

+

+

Solução de acetato de chumbo

+

-

Solução de acetato de cobre

+

-

Solução aquosa de acetato de chumbo e ácido acético glacial

+

+

Reativo de Wasicky

+

+

Reativo de floroglucina-clorídrica

+

+

+ = formação de precipitado

+ = formação de precipitado

4.2.3. Caracterização de alcaloides em extratos simples das drogas de folha e frutos.

Tabela 4. Resultado das reações gerais indicativas da presença de alcaloides.

DROGAS

 

Folha

Fruto

Reativo de Dragendorff

-

-

Reativo de Bertrand

-

+

Reativo de Bouchardat

+

+

+ = positivo

- = negativo

4.2.4. Caracterização de antraderivados através da reação geral de Bortraeger em extratos simples.

Tabela 5. Resultado da reação geral indicativa da presença de compostos antraquinônicos.

DROGAS

 

Folha

Fruto

Reativo de Borntraeger

-

-

- = negativo

Tabela 6. Resultado das reações químicas e microquímicas presença de compostos antraquinônicos.

DROGAS

 

Folha

Fruto

Reativo de Borntraeger

-

+

+ = positivo

- = negativo

4.2.5. Pesquisa de classes de glicosídeos saponínicos nas drogas de folhas e frutos de Malpighia gabra L.

4.3.6. Resultado das reações gerais indicativas da presença de saponinas.

Tabela 7. Reações gerais indicativas da presença de saponinas em resíduos de drogas.

DROGAS

 

Fruto

Folha

Reação de Rossol

-

-

Reação de Mitchel

-

+

Reação com reativo sulfovanílico

-

-

Reação de Rosenthalen

-

-

+ = positivo

- = negativo

Tabela 8. Reações específicas indicativas da presença de saponinas em resíduos de drogas.

DROGAS

 

Fruto

Folha

Reação de Liebermann

-

-

Tabela 9. Reações gerais indicativas da presença de saponinas: solução clorofórmica.

DROGAS

 

Fruto

Folha

Reação com ácido tricloroacético

-

-

Tabela 10. Reação específica indicativa da presença de saponinas.

DROGAS

 

Fruto

Folha

Reação de Salkowisk

+

-

Tabela 11. Reações indicativas da presença de flavonoides.

DROGAS

 

Fruto

Folha

Reação de Shinoda

+

+

Reação de Cloreto de Aluminio

-

-

Reação de Cloreto Férrico

+

-

Reação Hidróxido de Sódio

+

+

Reação Oxalo-bórico

-

-

+ = positivo

- = negativo

4.4. Resultado do perfil cromatográfico.

Figura 3. Perfil cromatográfico de extratos simples das drogas de folhas de Malpighia glabra L. (Ecl = extrato clorofórmico; Eet = extrato acetato de etila; Eme = extrato metanólico; Ru = padrão rutina; Qu = padrão quercetina).
Fonte: Os autores

O perfil cromatográfico dos extratos simples das drogas de folhas de Malpighia glabra L. mostra uma variedade de manchas nos extratos clorofórmico e acetato de etila, porém não foi possível evidenciar a presença de manchas no extrato metanólico, conforme indicado na Figura 3. Os padrões de rutina e quercetina puderam ser visualizados em Rf 0,33, conforme indicado na Figura 3, tanto no extrato clorofórmico, quanto no extrato acetato de etila.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A espécie Malpighia glabra L., foi estudada em termos das classes de substâncias químicas presentes nos extratos simples das drogas de folhas e frutos. Foi observada a presença de uma série de metabólitos vegetais, como por exemplo, taninos, alcaloides e flavonoides. Os testes fitoquímicos realizados não foram conclusivos para indicação da presença de compostos antraquinônicos e saponínicos.

O perfil cromatográfico realizado por cromatografia em camada delgada (CCD) com solventes de diferentes polaridades e extratos de drogas de folhas, indicaram a presença dos compostos rutina e quercetina.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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GONSALVES, P. E. Livro dos Alimentos. São Paulo: Book RJ, Gráfica e Editora 2002.

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LORENZI, H.; ABREU MATOS, F. J. Plantas Medicinais no Brasil Nativas e Exóticas. Instituto Plantarum, 2. ed. Nova Odessa-SP: Brasil, 2008.

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MATOS, FJ de A. Introdução à fitoquímica experimental. edições UFC, 1997.

MEZADRI, T. et al. El fruto de la acerola: composición y posibles usos alimenticios. ALAN, Caracas, v. 56, n. 2, jun. 2006.

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RITZINGER, R., RITZINGER, C. H. S. P. Acerola. Informe Agropecuário. Belo Horizonte. V.32, n.264, p17-25, 2011.

SIMÕES, C.M.O. et al. Farmacognosia: da planta ao medicamento. 5. ed. Porto Alegre/Florianópolis: Editora da UFSC, 2004.


1 Docente do Curso Superior de Farmácia da Universidade Brasil, Campus de Fernandópolis-SP. Doutor em Química pelo Instituto de Química UNESP, Campus de Araraquara-SP. E-mail: [email protected]

2 Docente do Curso Superior de Farmácia da Universidade Brasil, Campus de Fernandópolis-SP. Mestre em Química (PPGQUIM/UNESP - Araraquara-SP). E-mail: [email protected]