AUTORIA MEDIATA E IMPUTAÇÃO OBJETIVA EM CRIMES CONTRA A VIDA PRATICADOS COM O USO DE INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL AUTÔNOMA
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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.17654512
Davi Silva Possebom1
Ticiano Yazegy Perim2
RESUMO
O presente artigo tem por objetivo analisar os desafios da responsabilidade penal diante de crimes contra a vida cometidos com o uso de sistemas autônomos de Inteligência Artificial (IA), buscando compreender em que medida as categorias clássicas do Direito Penal, especialmente a autoria mediata e a imputação objetiva, podem ser aplicadas a condutas mediadas por algoritmos. A relevância do estudo decorre da crescente integração de sistemas inteligentes em atividades humanas essenciais, como transporte e produção, o que tem ocasionado acidentes fatais e suscitado questionamentos sobre a possibilidade de imputação penal em contextos de autonomia tecnológica. A pertinência da pesquisa justifica-se pela incompatibilidade entre os pressupostos antropocêntricos da culpabilidade e o comportamento autônomo de sistemas capazes de aprender e decidir de modo independente. Diante da insuficiência das categorias tradicionais de dolo e culpa, torna-se necessário refletir sobre novos critérios de atribuição de responsabilidade, baseados na previsibilidade técnica e no dever de controle normativo. A discussão ainda se insere em um cenário global marcado por casos emblemáticos, como os acidentes envolvendo veículos autônomos e robôs industriais, que evidenciam o descompasso entre o avanço tecnológico e a capacidade regulatória do Direito Penal. Conclui-se que, embora não seja possível reconhecer personalidade penal à Inteligência Artificial, é imprescindível desenvolver mecanismos de imputação funcional que permitam responsabilizar os agentes humanos (programadores, fabricantes e operadores) que exercem domínio sobre o risco tecnológico. Assim, a dogmática penal deve evoluir para compatibilizar a proteção dos bens jurídicos fundamentais com as transformações impostas pela era algorítmica, preservando sua função garantista e seu caráter de ultima ratio.
Palavras-chave: Inteligência Artificial. Responsabilidade Penal. Imputação Objetiva. Autoria Mediata. Autonomia Algorítmica.
ABSTRACT
This article aims to analyze the challenges of criminal liability in crimes against life committed through the use of autonomous Artificial Intelligence (AI) systems, seeking to understand to what extent classical categories of Criminal Law—particularly mediate authorship and objective imputation—can be applied to actions mediated by algorithms. The relevance of this study stems from the increasing integration of intelligent systems into essential human activities, such as transportation and industrial production, which has led to fatal accidents and raised questions about the possibility of criminal imputation in contexts of technological autonomy. The pertinence of the research lies in the incompatibility between the anthropocentric assumptions of culpability and the autonomous behavior of systems capable of learning and making independent decisions. Given the insufficiency of traditional categories of intent (dolo) and negligence (culpa), it becomes necessary to reflect on new criteria for assigning responsibility, based on technical foreseeability and the duty of normative control. The discussion also unfolds within a global context marked by emblematic cases, such as accidents involving autonomous vehicles and industrial robots, which highlight the gap between technological advancement and the regulatory capacity of Criminal Law. It is concluded that, although it is not possible to attribute criminal personality to Artificial Intelligence, it is essential to develop functional imputation mechanisms that allow for the accountability of human agents—programmers, manufacturers, and operators—who exercise control over technological risks. Thus, criminal dogmatics must evolve to reconcile the protection of fundamental legal interests with the transformations brought about by the algorithmic era, while preserving its guarantor function and its character as ultima ratio.
Keywords: Artificial Intelligence; Criminal Liability; Objective Imputation; Mediate Authorship; Algorithmic Autonomy.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O presente artigo tem por objetivo examinar os desafios dogmáticos e normativos da responsabilidade penal em crimes contra a vida praticados com o uso de sistemas autônomos de Inteligência Artificial, analisando-se em que medida tais tecnologias podem ser inseridas nas categorias clássicas do Direito Penal, especialmente sob a ótica da autoria mediata e da imputação objetiva. Busca-se compreender como o desenvolvimento de agentes algorítmicos capazes de agir com relativa independência altera a estrutura de imputação e o conceito de culpabilidade, além de identificar possíveis caminhos interpretativos para assegurar a proteção de bens jurídicos fundamentais sem comprometer os princípios basilares do sistema penal.
No primeiro capítulo, o estudo dedica-se à análise dos fundamentos teóricos da responsabilidade penal e da imputação subjetiva, contextualizando as noções de crime sob os critérios material, legal e analítico. Parte-se da premissa de que o Direito Penal é construído sobre a capacidade de ação consciente e voluntária do ser humano, o que torna problemática a extensão da responsabilidade a entidades destituídas de tais atributos, como as inteligências artificiais. A partir dessa base, o texto discute a evolução do conceito de crime na doutrina penal, destacando as contribuições de autores como Cleber Masson, Guilherme de Souza Nucci e Fernando Capez, que, embora em diferentes perspectivas, convergem ao entender o delito como fato típico, ilícito e culpável.
Ainda nesse primeiro eixo, abordou-se a responsabilidade penal da pessoa jurídica como um importante precedente histórico para a reflexão sobre a imputação de entes não humanos. O reconhecimento da responsabilidade criminal das corporações representou uma ruptura com o paradigma antropocêntrico da culpabilidade, ao admitir a punição de entidades sem vontade própria, mas dotadas de capacidade funcional e relevância social. Assim, esse modelo serve de inspiração para pensar a eventual responsabilização penal de inteligências artificiais, especialmente na medida em que ambas operam como centros de decisão desvinculados da individualidade física, embora a dogmática ainda resista à ideia de uma culpabilidade puramente normativa aplicada a máquinas.
O segundo capítulo, por sua vez, concentrou-se no exame da autoria mediata e da imputação objetiva em crimes contra a vida envolvendo sistemas autônomos. Retomando as teorias de Claus Roxin, posteriormente desenvolvidas por Hörnle e Schünemann, a análise destacou o conceito de domínio funcional do fato e a figura do instrumento hiperpotente, demonstrando como a Inteligência Artificial pode ser compreendida como um meio de execução controlado à distância, mas dotado de autonomia operacional. A figura do “homem de trás”, personificado na figura do programador ou da empresa desenvolvedora, passa a ocupar papel central na discussão da autoria, enquanto a IA é tratada como uma nova forma de aparato organizado de poder tecnológico.
Além disso, o texto examinou a teoria da imputação objetiva sob a ótica do risco permitido e proibido, destacando que a responsabilidade penal exige a criação de um risco juridicamente relevante, sua concretização no resultado e a correspondência desse resultado com o tipo penal. Foram também apresentados exemplos da aplicação dessa teoria no contexto brasileiro, a partir de decisões jurisprudenciais que consolidaram sua aceitação doutrinária, e relatados casos emblemáticos de acidentes envolvendo sistemas autônomos, como os episódios da Uber, Tesla e Volkswagen, que ilustram os desafios de aplicar conceitos tradicionais de dolo e culpa a condutas mediadas por algoritmos.
Metodologicamente, a pesquisa adota uma abordagem qualitativa, exploratória e teórico-descritiva, baseada em revisão bibliográfica de autores clássicos e contemporâneos do Direito Penal, além da análise de casos concretos e de decisões judiciais. Utiliza-se o método dedutivo, partindo de premissas gerais sobre o conceito de responsabilidade penal para examinar situações particulares relacionadas à atuação de sistemas autônomos. A coleta de dados foi realizada a partir de obras doutrinárias, artigos científicos, relatórios institucionais e fontes oficiais, priorizando materiais em língua portuguesa, inglesa e espanhola que tratam diretamente da imputação penal e da autonomia algorítmica.
Complementarmente, foram utilizados elementos de análise comparada, com destaque para o estudo da doutrina alemã, em especial as contribuições de Roxin, Welzel, Hörnle e Schünemann, dada sua influência direta na formulação da teoria da imputação objetiva e do domínio do fato. Essa perspectiva comparativa permitiu confrontar as bases conceituais europeias com o tratamento que a jurisprudência e a doutrina brasileiras vêm conferindo ao tema, possibilitando uma reflexão crítica sobre a aplicabilidade desses modelos ao ordenamento nacional.
Por fim, o trabalho foi estruturado de modo a propiciar um percurso lógico de compreensão: parte-se da fundamentação teórica clássica da responsabilidade penal, avança-se à análise das novas formas de imputação decorrentes da atuação de sistemas autônomos e, por fim, discute-se a limitação do Direito Penal diante da crescente autonomia das inteligências artificiais. Com isso, pretende-se contribuir para o debate contemporâneo acerca dos impactos da tecnologia sobre o sistema penal, sugerindo bases teóricas para uma futura regulação compatível com os princípios da legalidade, culpabilidade e dignidade da pessoa humana.
1. A RESPONSABILIDADE PENAL FRENTE À AUTONOMIA TECNOLÓGICA DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL
A rápida difusão de sistemas de Inteligência Artificial (IA) dotados de capacidades decisórias autônomas vem trazendo à tona desafios inéditos ao Direito Penal contemporâneo. Esses sistemas, que abrangem desde veículos autônomos e drones até algoritmos de decisão em ambientes médicos e industriais, não apenas se limitam a executar comandos humanos de forma previsível, mas aprendem, adaptam-se e, por vezes, produzem comportamentos emergentes que extrapolam o projeto inicial de seus criadores.
Portanto, ainda que não intencionais, acidentes causados por agentes artificiais controlados por IA tem se tornado praxe, principalmente no meio industrial. É elucidativo o incidente ocorrido em uma fábrica da Volkswagen, na Alemanha, onde uma das máquinas da linha de produção da empresa agarrou um jovem de 22 anos e o esmagou contra uma placa de metal. Conforme citado pelo The Guardian (2015) e pela BBC (2015), o jornal alemão DPA - The German Press Agency informou a incerteza dos promotores quanto ao oferecimento de denúncia no caso e, se oferecida, contra quem.
Esse, assim como diversos outros episódios, trazem à tona uma questão crucial quanto à presença de agentes autônomos em nossa sociedade. Desta forma, Simmler questiona “como uma entidade artificial pode ser verdadeiramente responsabilizada a ponto de a punição ser justificada?" (2024, p. 799). A autora assevera que a responsabilidade penal, até então, tem seguido fundamentos clássicos que, com o avanço de tais tecnologias, são postos em xeque:
Criminal law has traditionally been based on a strictly dualistic perspective: People act; machines function. However, the emergence of increasingly capacitated machines, socially interacting robots, and above all, technical systems based on AI challenge this foundational dualism (Simmler, 2024, p. 799).3
A tradicional articulação entre tipicidade, ilicitude e culpabilidade, tal como estabelecida na Teoria Geral do Crime (Greco, 2025), pode já não ser suficiente para abarcar todas as condutas potencialmente infracionais, especialmente diante de situações que envolvem inteligência artificial e outros agentes autônomos, o que exige uma reflexão mais profunda sobre a responsabilidade penal nesses contextos. Assim, antes de discutir a possibilidade de imputação penal a sistemas autônomos, é necessário examinar o conceito de crime segundo alguns critérios básicos, de modo a estabelecer um ponto de partida sólido para o debate.
Os institutos do Direito Penal são permeados por distintas concepções teóricas que buscam explicar o crime, sua estrutura e sua função dentro da ordem jurídica e social. A conceituação de delito, portanto, constitui um dos temas mais complexos da dogmática penal, pois serve de alicerce à estrutura teórica da lei penal e orienta tanto o legislador quanto o intérprete na identificação das condutas merecedoras de sanção.
Apesar das divergências terminológicas e metodológicas, a doutrina converge em reconhecer que o crime pode ser analisado sob três perspectivas complementares: material, formal e analítica. Essas dimensões, embora distintas, se articulam para compor uma visão sistemática do fenômeno criminal, que parte da lesão ao bem jurídico, passa pela previsão legal e culmina na decomposição técnico-jurídica de seus elementos estruturais. Cada uma delas ilumina aspectos diferentes da relação entre ação, antijuridicidade e culpabilidade, fornecendo parâmetros para esta discussão sobre a imputação penal.
Sob a ótica material, entende-se o crime como a conduta humana que lesa ou expõe a perigo bens jurídicos essenciais à coexistência social. Tal concepção cumpre função de legitimação do Direito Penal, na medida em que limita a criminalização às ações que ofendem de modo relevante a ordem social e a dignidade da pessoa humana. Como ensina Roxin (1997, p. 51), “por tanto, el concepto material de delito es previo al Código Penal y le suministra al legislador un criterio políticocriminal sobre lo que el mismo puede penar y lo que debe dejar impune”.4
Não obstante, ante um prisma formal, o crime é toda conduta descrita pela lei penal como infração, enfatizando o princípio da legalidade e o monopólio estatal de definir o que é punível. Finalmente, sob o conceito analítico, examina-se a estrutura interna do crime, decompondo-o em seus elementos constitutivos, para permitir ao aplicador do direito avaliar, de maneira sistemática, a existência ou não de responsabilidade penal.
Em fina análise, observamos que autores como Nucci (2025), Capez (2024) e Masson (2025) convergem na ideia de que o critério material cumpre uma função político-criminal, pois impede que o Direito Penal seja utilizado como instrumento de mera repressão moral ou disciplinar, reservando-lhe a proteção dos bens jurídicos mais valiosos. Nesse diapasão, Nucci ainda busca desconstruir o conceito de crime como algo natural e ontológico, sendo esse uma construção artificial e social, criada pela coletividade a partir de seus valores e interesses, e posteriormente positivada pelo legislador:
Em verdade, é a sociedade a criadora inaugural do crime, qualificativo que reserva às condutas ilícitas mais gravosas e merecedoras de maior rigor punitivo. Após, cabe ao legislador transformar esse intento em figura típica [...]. Nas palavras de Michel Foucault: “É verdade que é a sociedade que define, em função de seus interesses próprios, o que deve ser considerado como crime: este, portanto, não é natural”. (Nucci, 2025, p. 229)
Contudo, divergem quanto à forma de composição analítica do crime.
Fernando Capez filia-se à uma concepção bipartida de crime, segundo a qual “a culpabilidade não integra o seu conceito, sendo crime apenas fato típico e ilícito (ou antijurídico).” (Capez, 2024, p. 101). Desta maneira, a culpabilidade é tratada como pressuposto para a aplicação da pena, e não como elemento integrante do delito. Essa posição decorre da influência da teoria finalista de Hans Welzel, que deslocou o dolo e a culpa do campo da culpabilidade para o da tipicidade, reduzindo o papel daquela a um mero juízo de reprovação estatal:
Com o finalismo de Welzel, descobriu-se que dolo e culpa integravam o fato típico e não a culpabilidade. A partir daí, com a saída desses elementos, a culpabilidade perdeu a única coisa que interessava ao crime, ficando apenas com elementos puramente valorativos. [...] Ora, isso nada tem que ver com o crime. É apenas uma censura exercida sobre o criminoso. (Capez, 2024, p. 102)
Deste modo, é possível que haja crime mesmo quando o agente for inimputável, como ocorre nos casos em que, embora ausente a culpabilidade, subsistem o fato típico e a ilicitude. Isto é, “não existe crime culpado, mas autor de crime culpado” (Capez, 2024, p. 102). Também filiado a teoria bipartida, Damásio de Jesus (apud Capez, 2024, p. 103) elucida tal possibilidade demonstrando que, sendo a culpabilidade elemento do crime, não haveria de se falar em receptação quanto aquele que, dolosamente, adquire produto de roubo praticado por menor, pois se este não pratica crime, o receptor não teria adquirido produto de tal delito.
Sob o mesmo prisma, Masson sustenta a teoria bipartida asseverando que tal é implicitamente adotada em nosso Código Penal:
[...] no Título II da Parte Geral o Código Penal trata “Do Crime”, enquanto logo em seguida, no Título III, cuida “Da Imputabilidade Penal”. Dessa forma, crime é o fato típico e ilícito, independentemente da culpabilidade [...]. O crime existe sem a culpabilidade, bastando seja o fato típico e revestido de ilicitude. (Masson, 2025, p. 150)
Não obstante, o autor ainda ressalta os termos usados pelo Código Penal ao tratar da exclusão de ilicitude e culpabilidade. O art. 23 do referido código dispõe que “não há crime” se ausentes elementos que comprovem a ilicitude do delito, embora diz ser o autor “isento de pena” ao referir-se a ausência de culpabilidade (art. 26, caput, e 28, §1º). Ou seja, “é necessário que o fato típico seja ilícito para a existência do crime. Ausente a ilicitude, não há crime. Por outro lado, subsiste o crime com a ausência da culpabilidade” (Masson, 2025, p. 151).
Em contrapartida, Nucci (2025) rejeita as concepções bipartidas, por entender que excluir a culpabilidade do conceito de crime ameaça os fundamentos éticos e garantistas do Direito Penal, podendo conduzir a uma indevida ampliação do poder punitivo estatal. Sustenta ainda que tal concepção compromete a coerência lógica da teoria do delito, pois a culpabilidade constitui o elo subjetivo que conecta a ação ao agente, sendo inconcebível um crime sem autor moralmente responsável:
Não se deve acolher a concepção bipartida, que refere ser o delito apenas um fato típico e antijurídico, simplificando em demasia a culpabilidade e colocando-a como mero pressuposto da pena. Com primor, alerta Juarez Tavares que “o isolamento da culpabilidade do conceito de delito representa uma visão puramente pragmática do Direito Penal, subordinando-o de modo exclusivo à medida penal, e não aos pressupostos de sua legitimidade”. (Nucci, 2025, p. 233)
Para o autor, a culpabilidade representa elemento essencial do conceito de delito, pois é ela que permite aferir a possibilidade de censura pessoal ao agente, garantindo que a pena seja dirigida apenas a quem possui consciência e liberdade para agir de modo diverso. Nessa visão, excluir a culpabilidade da estrutura do crime significaria romper o vínculo ético que legitima a punição, abrindo espaço para um Direito Penal de índole objetiva, alheio à dignidade humana.
Segundo Nucci, a teoria tripartida seria a mais “lógica” e com a melhor “fórmula didaticamente indicada para o estudo do operador do direito” (Nucci, 2025, p. 232). O autor finda sua crítica à concepção bipartida alegando que “os argumentos dessa linha de pensamento não se baseiam em nenhuma corrente filosófica”, constituindo apenas um conjunto de argumentos extraídos do Código Penal, que buscam entender de maneira diversa termos e expressões nele constantes (Nucci, 2025, p. 234).
Em suma, a discordância de Nucci e diversos outro doutrinadores adeptos a teoria tripartida5, baseiam-se no equívoco de “não justificar (e apenas citar) como um legislador causalista, compondo um Código Penal causalista, teria a ideia de lançar a culpabilidade como pressuposto da pena, sendo certo que o dolo e a culpa (elementos subjetivos do crime) nela estavam inseridos” (Nucci, 2025, p. 236).
No que tange ao critério formal, é uniforme o entendimento de sua natureza estritamente normativa, ressaltando que o crime é, antes de tudo, uma criação legal e política. Nucci (2025), entretanto, destaca que nem toda conduta tipificada conserva relevância material, advertindo para o risco de descompasso entre o crime previsto em lei e o efetivo dano social produzido. Tal preocupação reflete uma leitura mais dinâmica do princípio da legalidade, que deve ser compatibilizado com a ideia de proporcionalidade e com as transformações tecnológicas e sociais que alteram o significado de certas condutas:
O avanço tecnológico, a mudança de comportamento dos integrantes da sociedade, as novas formas de convivência e tantos outros instrumentos modernos passam a influenciar diretamente no campo penal. Se, em 1940, época de edição do Código Penal, nem existia a rede mundial de computadores, os comportamentos humanos eram bem diversos e a convivência era mais pessoal. Hoje, a internet formou inúmeras redes sociais, muitos convivem virtualmente [...], além do que a tecnologia substituiu muitos atos que, anteriormente, seriam praticados pessoalmente. (Nucci, 2025, p. 231)
Finalmente, o autor evidencia o desgaste natural e inevitável dos tipos penais, para se adaptarem aos novos tempos. Portanto, presume-se a alteração da lei penal buscando prever novos tipos incriminadores, abarcando condutas até então inéditas, ou mantém-se “lacunas insuperáveis” no âmbito criminal (Nucci, 2025, p. 231).
Portanto, percebe-se que o sistema tripartido de caracterização de crime é o posicionamento da doutrina brasileira. Assim, para o sistema brasileiro crime é um fato típico, ilícito e culpável. Todavia, tais afirmações parecem trazer gravíssimo impasse para a discussão em tela, pois, ainda que uma Inteligência Artificial possa atuar de forma autônoma e causar resultados graves, a ausência de vontade e consciência impediria que lhe fossem atribuídos elementos subjetivos exigidos pelo conceito analítico de crime.
Diante dessa limitação teórica, torna-se necessário buscar mecanismos que permitam repensar a imputação de condutas a entes destituídos de vontade e consciência, mas cujas ações produzem efeitos concretos no mundo jurídico. Nesse sentido, a responsabilidade penal da pessoa jurídica surge como um importante precedente, pois representou, em sua origem, uma ruptura com o paradigma antropocêntrico da culpabilidade.
Tradicionalmente, o Direito Penal clássico assentou-se sobre a máxima societas delinquere non potest, segundo a qual apenas pessoas físicas poderiam ser sujeitas de imputação criminal, uma vez que somente o indivíduo possui consciência e vontade, elementos indispensáveis à culpabilidade (Masson, 2025). Na chamada teoria da ficção jurídica, idealizada por Savigny, não há como imaginar uma infração penal cometida por um ente fictício, haja vista este não possuir vontade própria e existência real.
A corporação, por sua natureza abstrata, era tida como desprovida de vontade própria e, portanto, incapaz de cometer crimes. Nesse diapasão, Jescheck destaca que:
As pessoas jurídicas e as associações sem personalidade somente podem atuar através de seus órgãos, razão pela qual elas próprias não podem ser punidas. Frente a elas carece, ademais, de sentido a desaprovação ético-social inerente à pena, visto que a reprovação de culpabilidade somente pode ser formulada a pessoas individualmente responsáveis, e não perante membros de uma sociedade que não participaram do fato nem perante a uma massa patrimonial. (Jescheck apud Bitencourt, 2025, p. 296)
Esse paradigma, contudo, foi progressivamente superado diante da complexificação das relações sociais, da expansão das estruturas empresariais e da constatação de que muitos delitos graves, especialmente os de natureza econômica e ambiental, são cometidos no seio ou em benefício de pessoas jurídicas. Nessa ótica, destaca-se a teoria da realidade, de Otto Gierke, sustentando ser a pessoa jurídica um ente autônomo e distinto de seus membros, dotado de vontade própria, sendo assim, sujeito de direitos e obrigações, tal como uma pessoa física (Masson, 2025).
No ordenamento brasileiro o artigo 225, §3º, da Constituição Federal estabelece a possibilidade de responsabilização penal de pessoas jurídicas nos casos de crimes ambientais:
Art. 225. [...] § 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. (Brasil, 1988)
Contudo, doutrinadores voltam a divergir neste aspecto. Masson afirma a escolha da teoria da realidade pelo legislador federal e a admissão deste quanto à responsabilidade penal da pessoa jurídica, independentemente da responsabilidade individual dos seus dirigentes (Masson, 2025, p. 153). Em contrapartida, Bitencourt considera “equivocado” tal entendimento, pois “a responsabilidade penal ainda se encontra limitada à responsabilidade subjetiva e individual” (Bitencourt, 2025, p. 297). O autor prossegue sua crítica reiterando que “a conduta (ação ou omissão), pedra angular da Teoria Geral do Crime, é produto essencialmente do homem. A doutrina, quase à unanimidade, repudia a hipótese de a conduta ser atribuída à pessoa jurídica” (Bitencourt, 2025, p. 298).
Fato é que, ao renunciar o princípio societas delinquere non potest, com a consagração da responsabilidade penal da pessoa jurídica, evidenciada pelo artigo 225, §3º da CF, faz-se como pressuposto necessário para uma efetiva imputação penal à entes fictícios a adoção de uma responsabilização objetiva que independa de elementos inerentes à pessoa humana, ficando a persecução da culpa adstrita somente aos naturais que representam a pessoa jurídica.
Essa perspectiva adquire especial relevância no contexto das tecnologias autônomas e da Inteligência Artificial. A impossibilidade de imputação direta à IA não resolve a questão normativa, pois ainda restam lacunas quanto à atribuição do resultado a pessoas físicas ou jurídicas que, em graus diversos, controlaram, autorizaram ou lucraram com o uso do sistema. Assim, a pessoa jurídica figura como sujeito mediato da ação, na medida em que é ela quem cria, treina e libera no mercado sistemas cuja atuação pode gerar danos à vida humana.
A ausência de dolo ou culpa de uma pessoa física específica não elide a responsabilidade do ente coletivo, se demonstrado que houve falha na estrutura de governança, no controle de riscos ou na adoção de medidas de segurança adequadas ao uso ético e seguro da tecnologia. Deste modo, a responsabilidade penal da pessoa jurídica, antes restrita a campos específicos, apresenta-se como um modelo dogmático apto a servir de parâmetro para a reflexão sobre a imputação de condutas envolvendo sistemas autônomos de IA.
Assim como ocorre com a Inteligência Artificial, a pessoa jurídica também é uma ficção construída pela mente humana, carente de corporeidade e de consciência própria, mas reconhecida como sujeito de direitos e deveres. A evolução doutrinária e legislativa que legitimou a punição de entes coletivos demonstra que a imputação penal pode ser concebida sob fundamentos normativos e funcionais, desvinculados da noção psicológica de culpa individual.
Embora ainda haja obstáculos teóricos e legislativos à sua ampliação, o instituto fornece um precedente relevante. Se o Direito Penal foi capaz de reconhecer responsabilidade a um ente abstrato como a empresa, destituído de sentidos e vontade individual, não se pode descartar, em tese, a criação futura de mecanismos semelhantes para responsabilizar juridicamente sistemas algorítmicos autônomos ou seus operadores institucionais. Trata-se, pois, de um ponto de inflexão da teoria penal, que convida à revisão dos fundamentos tradicionais da imputação sem renunciar aos princípios da legalidade e da culpabilidade.
2 A IMPUTAÇÃO OBJETIVA E A AUTORIA MEDIATA EM CRIMES CONTRA A VIDA ENVOLVENDO SISTEMAS AUTÔNOMOS
Conforme destaca Hallevy (2013), “a máquina não pode ser sujeito de deveres penais, pois carece de consciência moral e de capacidade de autodeterminação”. Assim, a resposta imediata de que um ente não humano não pode ser detentor de obrigações, haja vista a ausência de personalidade jurídica e culpabilidade moral é, em regra, correta do ponto de vista formal.
Todavia, a crescente autonomia das máquinas inteligentes, capazes de processar informações e tomar decisões sem intervenção humana direta, desafia os alicerces da dogmática penal. No plano da teoria do delito, o problema central coloca-se em termos de autoria e imputação: quem deve responder quando um sistema autônomo causa a morte de uma pessoa? Com base em que elementos pode-se atribuir a alguém esse resultado? Essa indagação ganha relevo especialmente nos crimes contra a vida (art. 121 e ss do Código Penal), em que a causalidade técnica e a decisão autônoma da máquina se entrelaçam de modo inédito.
Sob o prisma dogmático, duas vertentes se destacam. A primeira defende a preservação do modelo clássico de imputação humana, aplicando-se as categorias tradicionais de autoria mediata, participação e culpa às condutas que envolvem a criação, programação e supervisão de sistemas autônomos, aplicando o disposto nos arts. 13 e 29 do Código Penal:
Relação de causalidade
Art. 13 - O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.
[...]
Art. 29 - Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade. (Brasil, 1940)
A segunda propõe o desenvolvimento de novos parâmetros normativos, capazes de lidar com a complexidade das decisões algorítmicas e com o potencial de risco que delas decorre. Em ambas as perspectivas, o núcleo da discussão repousa sobre as teorias da autoria mediata e da imputação objetiva, pois ambas oferecem ferramentas dogmáticas para compreender a responsabilidade humana em contextos de intermediação tecnológica.
Conforme a teoria do domínio do fato, criada por Hans Welzel e posteriormente desenvolvida por Roxin (2000), o autor é aquele que, no contexto do crime, detém o controle funcional sobre a realização do fato típico. Aquele que decide se o fato ocorrerá exerce tal domínio e, portanto, é autor, mesmo que não pratique materialmente a ação. Nesse modelo de autoria mediata, há um agente que atua “por meio de outrem”, controlando o curso causal de forma indireta, o chamado “homem de trás” (Roxin, 2000, p. 158). Tradicionalmente, esse domínio se concretiza em contextos de erro, coação ou hierarquia, nos quais o executor direto é reduzido a instrumento da vontade do autor mediato.
Ou seja, na concepção roxiniana, o autor mediato é aquele que realiza o delito por intermédio de outra pessoa, valendo-se desta como instrumento de sua vontade. Conforme explica Roxin (2000), o domínio do fato, nesse caso, não se manifesta na execução direta da conduta típica, mas na determinação e controle funcional do curso causal mediante o uso de um executor que atua sem plena autonomia ou sob erro, coação ou subordinação. O autor mediato, portanto, é quem mantém nas mãos “o domínio da vontade do outro”, decidindo se e como o fato ocorrerá, enquanto o executor atua como simples instrumento (Roxin, 2000, p. 342).
No entanto, quando o instrumento não é humano, mas um ente autônomo, a relação causal assume nova feição. Roxin, ao apresentar o domínio da vontade através de aparatos organizados de poder, descreve a figura do autor que exerce controle indireto sobre o fato mediante “maquinarias o estructuras de poder organizadas”6, isto é, sistemas complexos que permitem a execução de crimes sem decisão autônoma de cada executor (Roxin, 2000, p. 270).
Esse é o ponto de origem conceitual daquilo que, na doutrina posterior7, evolui para o que se denomina “instrumento hiperpotente”, isto é, um meio técnico ou organizacional dotado de eficácia e autonomia tal que permite o domínio estrutural do fato pelo autor mediato. Sistemas de Inteligência Artificial, portanto, podem ser compreendidos como tais instrumentos, haja vista seus meios técnicos de atuação que ampliam exponencialmente o poder de causar resultados, reduzindo o controle humano direto sobre a execução.
Transportada ao campo tecnológico, a teoria de Roxin oferece uma chave interpretativa promissora. Nesse modelo, o autor (normalmente o programador, gestor ou dirigente da corporação) detém controle estrutural sobre o sistema, cuja atuação previsível dentro de determinados parâmetros o transforma em extensão funcional da vontade humana. O programador ou a empresa que detém o comando sobre o sistema passam, então, a exercer tal autoria mediata, operando domínio funcional sobre o aparato tecnológico. Assim, quando a Inteligência Artificial atua de modo previsível dentro de parâmetros definidos, pode-se sustentar que o domínio do fato subsiste em quem a concebeu ou operou.
A IA, nesse contexto, configura um caso-limite do domínio do aparato organizado de poder, em que o agente humano perde o controle físico direto, mas mantém o controle estrutural e organizacional do processo tecnológico que culmina na produção do resultado. Contudo, a dificuldade emerge quando o comportamento da IA extrapola o previsto pelo programador, tomando decisões autônomas e imprevisíveis.
Em 2012, em Aschaffenburg, Alemanha, testemunhou-se o considerado primeiro acidente envolvendo um sistema semiautônomo de direção. Na ocasião, um veículo era conduzido por um homem de 60 anos que, enquanto no volante, veio a sofrer um derrame cerebral, perdendo a consciência e direcionando o carro ao acostamento. Ocorre que o veículo foi reconduzido automaticamente à pista pelo sistema de assistência de faixa, seguindo em alta velocidade até a cidade vizinha, onde veio a atropelar e matar uma mulher e uma criança.
Conforme aponta o professor Hilgendorf em entrevista dada ao Council of Europe Human Rights and Rule of Law (2020), embora o caso tenha sido tratado civilmente com base na responsabilidade pelo risco, seu impacto penal foi expressivo, ao suscitar discussões sobre a imputação em situações nas quais o controle humano é parcial ou inexistente.
Já no campo das inteligências artificiais de interação social, um epsódio envolvendo a IA “Tay”, chatbot desenvolvido pela Microsoft, revelou riscos éticos e sociais do aprendizado autônomo de máquinas. Segundo o jornal The Guardian (2016), “o chatbot, direcionado a jovens de 18 a 24 anos nos EUA, foi desenvolvido pelas equipes de tecnologia e pesquisa da Microsoft para ‘experimentar e conduzir pesquisas sobre compreensão conversacional’.”. Porém, a IA rapidamente passou a reproduzir discursos racistas e misóginos, obrigando a empresa a encerrar o experimento em menos de 24 horas.
Por fim, evidenciam-se casos envolvendo carros autônomos da empresa Tesla que representam uma sequência de acidentes envolvendo veículos equipados com sistemas de direção autônoma, como o Autopilot e o Full Self-Driving Capability. Em 2022, durante o feriado de Ação de Graças, um Tesla em modo autônomo causou um grave acidente na ponte Bay Bridge, em São Francisco, envolvendo múltiplos veículos. O episódio ocorreu horas após o anúncio público de Elon Musk sobre a liberação do software de direção autônoma para todos os consumidores norte-americanos (The Guardian, 2022). As imagens das câmeras da autoestrada indicam que o acidente foi provocado por uma frenagem súbita e injustificada do veículo8.
Nessas situações, a teoria da imputação objetiva oferece critérios para aferir se o resultado pode ou não ser atribuído ao agente humano “por detrás”. Anterior aos ensinamentos de Roxin, adotava-se a teoria causal, desenvolvida por Liszt e Beling, segundo a qual fundamentava o tipo no conceito de causalidade. Em outras palavras, o objeto da lei penal versava sobre o resultado de dano ou de perigo, verificado na causalidade. Nas palavras do autor:
Considerava-se realizado o tipo toda vez em que alguém constituía uma condição para o resultado nele previsto, ou seja, toda vez em que alguém o causava, no sentido da teoria da equivalência dos antecedentes. Acabava o tipo, assim, com uma grande extensão, pois, nesta perspectiva, praticou uma ação de matar não só aquele que disparou o tiro mortífero, mas todos os que contribuíram para o resultado com uma condictio sine qua non: o fabricante e o vendedor do revólver e da munição, aqueles que ocasionaram a desavença da qual resultou o tiro, até mesmo os pais e outros ascendentes do criminoso. (Roxin, 2006, p. 101)
Tal entendimento foi duramente criticado, haja vista as infinitas possibilidades de regresso, vez que seria possível incluir no curso causal diversos participantes essenciais ao resultado típico. Contudo, com influência do neokantismo, o Direito Penal passou a orientar-se pelo dever ser normativo, afastando-se do positivismo legalista. Desta maneira, o objeto da lei penal deixou de ser atribuído diretamente com o texto da lei e passou a ser valorado anteriormente. No neokantismo:
O injusto é produto de uma criação normativa, sem referência real, como resultado de juízos de valor, tendo em vista o objetivo visado pelo legislador, que tanto pode ser a proteção de bens jurídicos quanto de qualquer outra situação estatal de conveniência. (Tavares, 2019, p. 75)
Nessa perspectiva, o tipo penal deixou de ser autônomo e passou a servir como fundamento da antijuridicidade, de modo que o injusto passou a surgir pela realização de uma conduta descrita na lei como crime, configurando uma verdadeira inversão na relação tipo–ilicitude (Tavares, 2019).
Após a Segunda Guerra Mundial, emergiu a teoria finalista da ação de Hans Welzel, que concebe o crime como ação finalisticamente dirigida, isto é, uma conduta humana dotada de propósito consciente (Greco, 2014). Essa visão introduziu o elemento volitivo no tipo penal e reduziu a ênfase no resultado, priorizando a direção final da conduta.
Buscando superar tais limitações, Roxin desenvolveu a teoria da imputação objetiva, segundo a qual o resultado só pode ser atribuído a um agente quando sua conduta cria um risco não permitido, que se concretiza no resultado e, por fim, o resultado se enquadra no tipo penal previsto (Roxin, 2006). Essa formulação confere à imputação penal um critério objetivo de valoração, equilibrando causalidade e responsabilidade normativa.
A teoria da imputação objetiva tenta resolver os problemas que decorrem destes e de outros grupos de casos, ainda a serem examinados. Em sua forma mais simplificada, diz ela: um resultado causado pelo agente só deve ser imputado como sua obra e preenche o tipo objetivo unicamente quando o comportamento do autor cria um risco não permitido para o objeto da ação (1), quando o risco se realiza no resultado concreto (2) e este resultado se encontra dentro do alcance do tipo (3). (Roxin, 2006, p. 104)
Ademais, Schünemann (2013) assevera que a imputação objetiva exige que o resultado seja consequência de uma conduta que criou ou incrementou um risco juridicamente desaprovado e que esse risco se concretize no resultado lesivo. Se o risco era permitido, isto é, inerente à atividade socialmente útil e exercida dentro de padrões de cuidado e segurança, não há imputação penal. Se, ao contrário, o risco era proibido, caracterizando uma atuação imprudente ou negligente, o resultado deve ser atribuído ao agente que o criou.
A aplicação dessa lógica ao contexto da IA exige um exame das condições em que o sistema foi projetado, treinado e supervisionado. Quando a empresa desenvolvedora deixa de adotar salvaguardas técnicas, mecanismos de correção e protocolos de segurança adequados, ela cria um risco proibido cuja concretização em morte humana pode ensejar responsabilidade penal, nos termos do art. 13 do Código Penal. Já quando o evento decorre de falha imprevisível e inevitável, dentro de padrões técnicos aceitos, estar-se-á diante de um risco permitido, afastando-se a imputação penal, embora subsistam eventuais responsabilidades civis ou administrativas.
Hörnle (2025) propõe que a imputação objetiva, nesse tipo de cenário, seja guiada por critérios de previsibilidade técnica e controle normativo. O que se exige do agente humano não é a onisciência sobre o comportamento do algoritmo, mas a adoção de medidas que demonstrem governança, auditabilidade e rastreabilidade do sistema. Assim, quanto maior o grau de autonomia da IA, maior deve ser o dever de controle e prevenção imposto a seus criadores e operadores, sob pena de se configurar a assunção de um risco proibido.
Constata-se, portanto, uma espécie de “direito penal do inimigo tecnológico”, onde a sociedade deve prevenir-se contra riscos criados por sistemas que escapam ao controle humano. Embora controversa, tal ideia evidencia a preocupação de que, diante de tecnologias altamente complexas, a imputação penal não se esgote na análise da culpabilidade subjetiva, mas também na avaliação objetiva da criação de riscos intoleráveis. Nesse sentido, a objetividade torna-se instrumento essencial para equilibrar segurança jurídica e proteção de bens jurídicos fundamentais, como a vida.
Dessa forma, as teorias da autoria mediata e da imputação objetiva, quando reinterpretadas à luz da tecnologia autônoma, revelam-se aptas a sustentar uma responsabilização penal funcionalmente coerente, pois permitem compreender como o programador, o gestor empresarial ou a corporação podem ser responsabilizados como “homens de trás” no domínio de aparatos tecnológicos capazes de produzir resultados letais. Não somente, fornecem limites à expansão do poder punitivo, ao exigir que a imputação se restrinja à criação de riscos proibidos e ao controle funcional efetivo sobre o sistema.
A incorporação desses conceitos oferece um caminho dogmaticamente consistente para evitar tanto a impunidade quanto o arbítrio punitivo, preservando princípios essenciais como a legalidade, culpabilidade e mínima intervenção do Direito Penal. Entretanto, considerando que, nos casos envolvendo sistemas autônomos, a conduta típica tende a assumir natureza culposa, a análise da imputação objetiva não pode restringir-se à mera criação ou incremento de um risco não permitido e à sua concretização no resultado. Assim, faz-se indispensável que sejam examinados elementos subjetivos do agente, especialmente a previsibilidade e a evitabilidade do resultado, os quais desempenham papel decisivo na aferição da culpabilidade (Taveres, 2018).
Questiona-se então à aplicabilidade de tal teoria no cenário jurídico brasileiro. Esta tem encontrado aceitação tanto no campo doutrinário quanto na jurisprudência dos tribunais superiores que, em diversas oportunidades, tem recorrido a seus pressupostos teóricos para delimitar o alcance da responsabilidade penal, afastando uma interpretação puramente causal e introduzindo critérios de imputação pautados na criação de riscos juridicamente relevantes. Em que pese não versarem especificamente sobre crimes praticados por entes não humanos, alguns exemplos demonstram a aceitação da corte com relação a imputação objetiva como teoria suficiente para resolver conflitos complexos.
Dessarte, é ilustrativo o julgado nº 164.698/PE, da Sexta Turma do STJ, sob Relatoria do Ministro Olindo Menezes, que decidiu pelo trancamento de uma ação penal por considerar inepta a denúncia, por não descrever plenamente as condutas da pessoa física denunciada, ficando assim sujeita a um “indevido regressus ad infinitum na cadeia causal”.
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL POR INÉPCIA DA DENÚNCIA. DESCRIÇÃO INSUFICIENTE DA CONDUTA. FALTA DE RESPONSABILIDADE LEGAL ACERCA DOS FATOS. POSIÇÃO EM GRUPO ECONÔMICO QUE NÃO INDUZ AUTORIA. [...] 9. Dir-se-ia que o recorrente, na qualidade de Presidente do Grupo Empresarial, poderia ter alguma participação nas condutas dadas como delitivas, até mesmo como interessado, pois era o maior acioniata a empresa, mas isso não dispensaria a denúncia de descrever a(s) sua(s) condutas voltadas para a finalidade, na estrutura diretiva da empresa [...], em termos de imputação objetiva, sob pena um indevido regressus ad infinitum na cadeia causal, que poderia chegar ao todos os acioniatas! 10. Agravo regimental provido, a fim de conceder o habeas corpus e trancar a ação penal n. 0815080-23.2020.4.05.8300 por inépcia. (AgRg no RHC n. 164.698/PE, relator Ministro Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª REGIÃO), Sexta Turma, julgado em 6/12/2022, DJe de 19/12/2022.). (Grifo nosso).
No caso, imputava-se a uma empresa os crimes de apropriação indébita previdenciária e sonegação de contribuição previdenciária. Ocorre que, a despeito disso, a denúncia também atribuía tais delitos ao diretor do grupo empresarial da qual a empresa inicialmente processada era integrante. Contudo, o Paciente, ainda que acionista majoritário, não teria participação direta em sua gestão. Assim, fundamentou-se a inépcia da denúncia em descreve que condutas causais teria ele praticado ou contribuído para os crimes mencionados. Dessa forma, decidiu o Tribunal por aplicar a teoria da imputação objetiva, afastando uma análise puramente causal, vez que, de outra maneira, poderiam ser os crimes imputados a todos os demais acionistas.
Ademais, verifica-se no Habeas Corpus, processo nº 68.871/PR, julgado pela mesma turma do Superior Tribunal de Justiça, sob Relatoria da Ministra Maria Thereza de Assis Moura, em 2009, a adoção da teoria da imputação objetiva para justificar o trancamento da ação penal, pois não foi demonstrada a criação do risco não permitido ou aumento do risco permitido pelo então Paciente.
HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO CULPOSO. VÍTIMA - MERGULHADOR PROFISSIONAL CONTRATADO PARA VISTORIAR ACIDENTE MARÍTIMO. ART. 121, §§ 3º E 4º, PRIMEIRA PARTE, DO CÓDIGO PENAL. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. 1. Para que o agente seja condenado pela prática de crime culposo, são necessários, dentre outros requisitos: a inobservância do dever de cuidado objetivo (negligência, imprudência ou imperícia) e o nexo de causalidade. 2. No caso, a denúncia imputa ao paciente a prática de crime omissivo culposo, no forma imprópria. A teor do § 2º do art. 13 do Código Penal, somente poderá ser autor do delito quem se encontrar dentro de um determinado círculo normativo, ou seja, em posição de garantidor. 3. A hipótese não trata, evidentemente, de uma autêntica relação causal, já que a omissão, sendo um não-agir, nada poderia causar, no sentido naturalístico da expressão. Portanto, a relação causal exigida para a configuração do fato típico em questão é de natureza normativa. 4. Da análise singela dos autos, sem que haja a necessidade de se incursionar na seara fático-probatória, verifico que a ausência do nexo causal se confirma nas narrativas constantes na própria denúncia. 5. Diante do quadro delineado, não há falar em negligência na conduta do paciente (engenheiro naval), dado que prestou as informações que entendia pertinentes ao êxito do trabalho do profissional qualificado, alertando-o sobre a sua exposição à substância tóxica, confiando que o contratado executaria a operação de mergulho dentro das regras de segurança exigíveis ao desempenho de sua atividade, que mesmo em situações normais já é extremamente perigosa. 6. Ainda que se admita a existência de relação de causalidade entre a conduta do acusado e a morte do mergulhador, à luz da teoria da imputação objetiva, seria necessária a demonstração da criação pelo paciente de uma situação de risco não permitido, não-ocorrente, na hipótese. 7. Com efeito, não há como asseverar, de forma efetiva, que engenheiro tenha contribuído de alguma forma para aumentar o risco já existente (permitido) ou estabelecido situação que ultrapasse os limites para os quais tal risco seria juridicamente tolerado. 8. Habeas corpus concedido para trancar a ação penal, por atipicidade da conduta. (HC n. 68.871/PR, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, relator para acórdão Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, julgado em 6/8/2009, DJe de 5/10/2009.). (Grifo nosso).
Por fim, no julgamento do Recurso Especial nº 822.517/DF, sob Relatoria do Ministro Gilson Dipp, o Egrégio Tribunal já havia decidido que a aplicabilidade da teoria em tela não poder ser atribuída ao agente cujo a conduta decorre da criação de um risco não permitido. Neste caso, ao descumprir norma de trânsito, o agente teria provocado a morte de outrem, criando, desta maneira, risco não permitido de que o resultado consta na lei.
CRIMINAL. RESP. DELITO DE TRÂNSITO. RESPONSABILIDADE PENAL. DELITO CULPOSO. RISCO PERMITIDO. NÃO OCORRÊNCIA. IMPUTABILIDADE OBJETIVA. MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA 07/STJ. INCIDÊNCIA. PENA PECUNIÁRIA SUBSTITUTIVA. AUSÊNCIA DE CORRESPONDÊNCIA COM A PENA SUBSTITUÍDA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO. I. De acordo com a Teoria Geral da Imputação Objetiva o resultado não pode ser imputado ao agente quando decorrer da prática de um risco permitido ou de uma ação que visa a diminuir um risco não permitido; o risco permitido não realize o resultado concreto; e o resultado se encontre fora da esfera de proteção da norma. II. O risco permitido deve ser verificado dentro das regras do ordenamento social, para o qual existe uma carga de tolerância genérica. É o risco inerente ao convívio social e, portanto, tolerável. III. Hipótese em que o agente agiu em desconformidade com as regras de trânsito (criou um risco não permitido), causando resultado jurídico abrangido pelo fim de proteção da norma de cuidado - morte da vítima, atraindo a incidência da imputabilidade objetiva. IV. As circunstâncias que envolvem o fato em si não podem ser utilizadas para atrair a incidência da teoria do risco permitido e afastar a imputabilidade objetiva, se as condições de sua aplicação encontram-se presentes, isto é, se o agente agiu em desconformidade com as regras de trânsito, causando resultado jurídico que a norma visava coibir com sua original previsão. V. O fato de transitar às 3 horas da madrugada e em via deserta não pode servir de justificativa à atuação do agente em desconformidade com a legislação de trânsito. Isto não é risco permitido, mas atuação proibida. [...] IX. Recurso parcialmente conhecido e desprovido. (REsp n. 822.517/DF, relator Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, julgado em 12/6/2007, DJ de 29/6/2007, p. 697.). (Grifo nosso).
Em linhas gerais, a jurisprudência nacional tem reconhecido que, para que o resultado típico seja imputado a determinado agente, é indispensável que sua conduta tenha gerado ou incrementado um risco não permitido ao bem jurídico tutelado, e que tal risco tenha se concretizado no resultado lesivo. Essa análise, de natureza normativa, busca distinguir situações em que o resultado decorre de um risco socialmente tolerado (ou permitido) daquelas em que há extrapolação dos limites aceitáveis de perigo, configurando-se, então, a responsabilidade penal.
O fundamento dessa abordagem repousa sobre a função protetiva da norma penal, que visa não apenas à punição de comportamentos lesivos, mas também à contenção do poder punitivo estatal dentro dos limites da legalidade e da racionalidade. Assim, a imputação objetiva opera como um filtro de tipicidade, afastando a responsabilização quando a conduta do agente não ultrapassa o âmbito do risco permitido ou quando o resultado se encontra fora do escopo de proteção da norma.
Desse modo, a assimilação da teoria da imputação objetiva pelo ordenamento jurídico nacional reforça o caráter racional e garantista do Direito Penal contemporâneo, adequando-o às complexas relações sociais e tecnológicas do presente. No contexto dos crimes praticados mediante o uso de sistemas autônomos, sua aplicação mostra-se particularmente promissora, ao permitir uma análise criteriosa da relação entre conduta humana, risco tecnológico e resultado lesivo, aspectos que serão explorados nos tópicos seguintes.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A análise dos casos emblemáticos envolvendo sistemas autônomos evidencia que o avanço da tecnologia tem extrapolado as fronteiras tradicionais da imputação penal. Se, em um primeiro momento, era possível atribuir responsabilidade direta ao agente humano que programava, supervisionava ou operava a máquina, a crescente autonomia algorítmica vem desafiando a própria noção de domínio do fato, deslocando o centro decisório da esfera humana para o ambiente informacional. Essa transição marca uma ruptura entre o controle humano e o comportamento das inteligências artificiais, tornando cada vez mais complexa a delimitação de quem deve responder penalmente pelos resultados lesivos decorrentes de suas ações.
A autonomia algorítmica consiste na capacidade de determinados sistemas de processar dados, aprender com a experiência e tomar decisões sem intervenção humana direta. Tal fenômeno, característico das chamadas IAs de aprendizado profundo (deep learning), introduz um novo grau de imprevisibilidade nas relações entre causa e efeito, pois o comportamento do sistema pode divergir de forma significativa da intenção inicial de seus desenvolvedores ou usuários. Assim, as tradicionais categorias de dolo e culpa tornam-se insuficientes para explicar situações em que o resultado decorre de uma sequência de decisões autônomas, não antecipadas nem controladas pelo agente humano.
Nesse contexto, a dogmática penal enfrenta um dilema: como imputar responsabilidade sem violar os princípios da pessoalidade e da culpabilidade, pilares do Direito Penal moderno? A responsabilização penal pressupõe a existência de consciência e vontade, elementos inexistentes em entidades algorítmicas. Por outro lado, a impunidade diante de danos graves causados por sistemas autônomos é incompatível com a necessidade de proteção dos bens jurídicos fundamentais. Surge, assim, um espaço de tensão entre a preservação dos princípios penais e a adaptação normativa às novas realidades tecnológicas.
Alguns autores defendem que o Direito Penal deve buscar novos critérios de imputação baseados no controle normativo e na previsibilidade técnica, deslocando o foco do ato volitivo para a estrutura de governança e de segurança do sistema. Nessa perspectiva, a responsabilidade recairia sobre aqueles que, tendo o dever de supervisão, omitiram-se quanto à adoção de salvaguardas adequadas ou permitiram o funcionamento de algoritmos com riscos evidentes. Essa linha de raciocínio, inspirada nas reflexões de Tatjana Hörnle e Günther Jakobs, propõe uma releitura funcional da imputação, em que a conduta relevante é a falha no dever de controle e prevenção.
Contudo, há limites intransponíveis para a expansão do Direito Penal a essas novas formas de agência tecnológica. A criação de uma “responsabilidade penal da máquina” afrontaria a essência antropocêntrica da culpabilidade, transformando o Direito Penal em um instrumento de mera gestão de riscos. A responsabilização simbólica de entidades não humanas, desprovidas de consciência e discernimento, desvirtuaria sua função garantista e comprometeria o próprio princípio da dignidade humana. Nesse sentido, a imputação penal deve permanecer circunscrita à esfera humana, ainda que o comportamento autônomo da IA dificulte a identificação do agente responsável.
Diante dessa limitação ontológica, surge a necessidade de mecanismos normativos complementares, capazes de preencher o vácuo de responsabilidade deixado pelas ações autônomas. Medidas como o fortalecimento da responsabilidade civil objetiva, a imposição de deveres específicos de vigilância e o desenvolvimento de padrões ético-jurídicos para o design algorítmico podem funcionar como instrumentos de prevenção e compensação, sem recorrer à ficção de uma culpabilidade artificial. O Direito Penal, portanto, deve continuar atuando como ultima ratio, preservando sua função subsidiária diante de formas alternativas e mais adequadas de regulação.
Além disso, a discussão sobre os limites da imputação penal diante da autonomia algorítmica impõe uma reflexão ética e social mais ampla. A sociedade contemporânea precisa decidir até que ponto está disposta a delegar decisões que afetam direitos fundamentais, como a vida e a liberdade, a entidades automatizadas. Essa reflexão transcende o campo jurídico, alcançando dimensões filosóficas, políticas e econômicas que moldarão o próprio conceito de responsabilidade no século XXI.
Por fim, o debate sobre a responsabilidade penal diante da autonomia algorítmica revela que o desafio não reside apenas em adaptar o Direito às novas tecnologias, mas também em redefinir a própria relação entre o ser humano e o poder tecnológico. A dogmática penal, ao reconhecer os limites de suas categorias tradicionais, precisa desenvolver soluções que conciliem inovação, segurança e justiça, assegurando que o progresso tecnológico não se converta em instrumento de desumanização jurídica.
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1 Graduando do Curso de Direito da Faculdade de Direito de Cachoeiro de Itapemirim (FDCI). E-mail: [email protected].
2 Mestre em Direito e Sociologia pela UFF, especialista em Direito Público pela UCAM.
3 "O direito penal tem sido tradicionalmente baseado em uma perspectiva estritamente dualista: Pessoas agem; máquinas funcionam. No entanto, o surgimento de máquinas cada vez mais capacitadas, robôs que interagem socialmente e, acima de tudo, sistemas técnicos baseados em IA desafiam esse dualismo fundamental." (tradução nossa)
4 “O conceito material de crime é prévio ao Código Penal e fornece ao legislador um critério político-criminal sobre o que o Direito Penal deve punir e o que deve deixar impune.” (tradução nossa)
5 Como Rogério Greco, Cézar Roberto Bitencourt, Luiz Régis Prado, Eugênio Raul Zaffaroni, dentre outros.
6 “Máquinas ou estruturas de poder organizado.” (tradução nossa)
7 Especialmente Hörnle e Schünemann.
8 Imagens disponíveis em: https://theintercept.com/2023/01/10/tesla-crashfootage-autopilot/.