AS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS E A BNCC (BASE NACIONAL CURRICULAR COMUM) NA EDUCAÇÃO INFANTIL: UM OLHAR PARA A DIVERSIDADE NO DESENVOLVIMENTO INFANTIL
PDF: Clique aqui
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.16749214
Harley Charles de Oliveira Santos
RESUMO
Este trabalho, de caráter bibliográfico, tem como objetivo analisar as contribuições da Teoria das Inteligências Múltiplas, proposta por Howard Gardner, para a prática pedagógica na Educação Infantil, à luz das diretrizes da Base Nacional Comum Curricular (BNCC). A pesquisa fundamenta-se em autores como Gardner (2011), Antunes (2012), Luckesi (2011), entre outros, e parte do entendimento de que a inteligência humana é plural, sendo composta por diferentes habilidades cognitivas, emocionais, artísticas e sociais. A BNCC, por sua vez, orienta a Educação Infantil com base em direitos de aprendizagem e campos de experiência, que favorecem uma abordagem integral e respeitosa à diversidade das crianças. Ao relacionar essas duas perspectivas, o estudo evidencia que a valorização das múltiplas inteligências permite práticas mais inclusivas, criativas e significativas, potencializando o desenvolvimento infantil em suas várias dimensões. São discutidas ainda estratégias de planejamento, avaliação e organização do ambiente educativo, bem como os desafios enfrentados pelos educadores na implementação de propostas alinhadas a essa visão ampliada da aprendizagem. Conclui-se que a integração entre teoria e prática exige formação docente contínua, escuta sensível e compromisso com uma educação centrada na criança.
Palavras-chave: Educação Infantil; Inteligências Múltiplas; BNCC; Desenvolvimento Integral; Prática Pedagógica.
ABSTRACT
This bibliographic study aims to analyze the contributions of Howard Gardner’s Theory of Multiple Intelligences to pedagogical practices in Early Childhood Education, based on the guidelines of the Brazilian National Common Curricular Base (BNCC). The research is grounded in authors such as Gardner (2011), Antunes (2012), and Luckesi (2011), and is based on the understanding that human intelligence is plural, composed of different cognitive, emotional, artistic, and social abilities. The BNCC guides Early Childhood Education through learning rights and fields of experience, which support an integral and respectful approach to children's diversity. By relating these two perspectives, the study highlights that valuing multiple intelligences enables more inclusive, creative, and meaningful educational practices, enhancing child development in various dimensions. It also discusses strategies for planning, assessment, and classroom environment organization, as well as the challenges educators face in implementing proposals aligned with this broader view of learning. The conclusion emphasizes that integrating theory and practice requires continuous teacher training, attentive listening, and a commitment to child-centered education.
Keywords: Early Childhood Education; Multiple Intelligences; BNCC; Integral Development; Pedagogical Practice.
1. INTRODUÇÃO
A educação infantil é a fase inaugural da vida escolar das crianças e desempenha papel fundamental na formação de sujeitos autônomos, críticos e criativos. Nesse contexto, cresce a necessidade de abordagens pedagógicas que respeitem as singularidades do desenvolvimento infantil e promovam o aprendizado significativo. A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), documento normativo que orienta a educação brasileira desde 2017, reforça o compromisso com uma prática pedagógica centrada nos direitos de aprendizagem e nos campos de experiência, reconhecendo a criança como sujeito ativo, potente e participante do seu processo formativo (BRASIL, 2017).
Paralelamente, a teoria das Inteligências Múltiplas, desenvolvida por Howard Gardner, propõe que não existe uma inteligência única, mas múltiplas formas pelas quais o ser humano pode aprender e expressar seu conhecimento. Essa teoria contrapõe a visão tradicional, que prioriza apenas as capacidades lógico-matemática e linguística, e amplia as possibilidades de ensino e aprendizagem na educação infantil (GARDNER, 2011).
Dessa forma, este artigo tem como objetivo refletir sobre como a teoria das Inteligências Múltiplas pode contribuir para a efetivação dos princípios e diretrizes da BNCC na Educação Infantil, promovendo uma educação mais inclusiva, plural e significativa. Parte-se da premissa de que conhecer as múltiplas formas de aprender é essencial para construir práticas pedagógicas que respeitem as especificidades de cada criança, favorecendo seu desenvolvimento integral.
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 A Teoria das Inteligências Múltiplas
A teoria das Inteligências Múltiplas foi apresentada por Howard Gardner no livro Frames of Mind (1983) e representou uma ruptura com os modelos tradicionais de avaliação da inteligência humana.
Segundo Gardner (2011), a inteligência deve ser entendida como a capacidade de resolver problemas ou criar produtos que tenham valor em um ou mais contextos culturais.
Inicialmente, Gardner propôs sete tipos de inteligência: linguística, lógico-matemática, espacial, musical, corporal-cinestésica, interpessoal e intrapessoal. Posteriormente, foram adicionadas a inteligência naturalista e, de forma mais exploratória, a inteligência existencial. Cada indivíduo possui um perfil cognitivo único, com combinações distintas dessas inteligências, as quais podem ser desenvolvidas por meio de estímulos adequados.
Gardner (2011) argumenta que a escola tradicional favorece apenas algumas dessas inteligências, deixando outras em segundo plano. Isso implica que muitos estudantes acabam tendo seus talentos desvalorizados, o que pode afetar sua autoestima e motivação. Ao reconhecer as múltiplas inteligências, o educador pode promover práticas pedagógicas mais diversificadas, justas e eficazes, alinhadas às potencialidades de seus alunos.
Antunes (2012) complementa essa ideia ao afirmar que, ao estimular diferentes inteligências, o professor contribui para uma aprendizagem mais significativa e para a formação de sujeitos mais conscientes de suas capacidades. Essa abordagem permite valorizar a diversidade cultural, social e cognitiva dos estudantes, especialmente na educação infantil, onde o brincar, o experimentar e o descobrir são fundamentais.
2.2 A Educação Infantil e a BNCC
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) estabelece que a Educação Infantil deve garantir experiências que promovam o desenvolvimento integral das crianças de 0 a 5 anos. Nesse sentido, propõe cinco campos de experiência, os quais devem nortear o trabalho pedagógico: “O eu, o outro e o nós”; “Corpo, gestos e movimentos”; “Traços, sons, cores e formas”; “Escuta, fala, pensamento e imaginação”; e “Espaços, tempos, quantidades, relações e transformações” (BRASIL, 2017).
Esses campos de experiência dialogam com os direitos de aprendizagem e desenvolvimento: conviver, brincar, participar, explorar, expressar e conhecer-se. A BNCC valoriza o protagonismo infantil, a escuta ativa e o respeito às especificidades da infância, reconhecendo a importância do ambiente, das interações e das brincadeiras para o processo educativo.
Segundo Kramer (2018), a BNCC representa um avanço ao reconhecer as crianças como sujeitos de direitos, produtores de cultura e capazes de agir sobre o mundo à sua volta. Isso implica repensar o papel do professor como mediador e propositor de situações educativas ricas e desafiadoras.
Ao cruzarmos os princípios da BNCC com a teoria das Inteligências Múltiplas, percebemos uma afinidade natural: ambas as abordagens valorizam o desenvolvimento global e respeitam a diversidade humana como algo positivo e essencial para o processo de ensino-aprendizagem.
3. CONEXÕES ENTRE INTELIGÊNCIAS MULTIPLAS E OS CAMPOS DE EXPERIENCIAS DA BNCC
A BNCC organiza a Educação Infantil a partir de cinco campos de experiência, que visam proporcionar às crianças vivências que favoreçam o desenvolvimento integral. Cada campo envolve dimensões cognitivas, afetivas, motoras, sociais e culturais, em consonância com as múltiplas formas de aprender descritas por Gardner (2011). A seguir, exploraremos como cada campo de experiência pode ser articulado com as diferentes inteligências múltiplas, enriquecendo a prática pedagógica e promovendo uma educação centrada na criança.
3.1 O Eu, o Outro e o Nós
Este campo de experiência propõe a construção da identidade pessoal e coletiva, promovendo o respeito às diferenças, a cooperação e a empatia. Atividades como rodas de conversa, dramatizações de histórias, jogos cooperativos e dinâmicas de grupo favorecem o desenvolvimento da inteligência interpessoal, ao estimular as interações sociais, e da intrapessoal, ao incentivar o autoconhecimento.
Segundo Gardner (2011), a inteligência interpessoal envolve a capacidade de perceber e responder adequadamente aos sentimentos, temperamentos e motivações dos outros, enquanto a inteligência intrapessoal está relacionada à habilidade de introspecção, reconhecimento das próprias emoções e tomada de decisões. Na prática pedagógica, é fundamental que o educador favoreça ambientes acolhedores e oportunidades para que as crianças expressem suas opiniões, aprendam a resolver conflitos e desenvolvam autonomia.
Por exemplo, ao propor uma atividade em que as crianças cuidam de um colega machucado ou acolhem um novo colega na turma, o professor estimula competências socioemocionais importantes e atua de forma intencional no fortalecimento dessas inteligências.
3.2 Corpo, Gestos e Movimentos
Este campo valoriza as expressões corporais, o movimento e a consciência corporal, fundamentais para o desenvolvimento físico, motor e emocional das crianças. Ele se articula fortemente com a inteligência corporal-cinestésica, definida por Gardner (2011) como a capacidade de usar o corpo para resolver problemas ou expressar ideias e sentimentos.
Práticas como circuitos motores, jogos de imitação, danças, brincadeiras de equilíbrio e atividades ao ar livre estimulam essa inteligência e promovem a coordenação motora ampla e fina. Além disso, permitem que a criança desenvolva autoconfiança, domínio corporal e controle emocional.
Segundo Antunes (2012), é por meio do corpo que a criança conhece o mundo nos primeiros anos de vida. Assim, restringir o movimento na Educação Infantil é limitar a capacidade de exploração, aprendizado e expressão das crianças. Um planejamento pedagógico alinhado à BNCC deve, portanto, garantir tempo e espaço para que a criança movimente-se livremente e de forma significativa.
3.3 Traços, Sons, Cores e Formas
Este campo de experiência abrange as linguagens visuais, musicais e plásticas, promovendo a sensibilidade estética, a criatividade e a capacidade de representação simbólica. Ele está diretamente relacionado à inteligência musical, espacial e naturalista.
A inteligência musical refere-se à habilidade de perceber, discriminar e expressar formas musicais, e pode ser estimulada por meio de cantigas, brincadeiras rítmicas, instrumentos musicais e exploração sonora. Já a inteligência espacial está ligada à capacidade de visualizar o mundo em três dimensões, sendo favorecida por atividades como desenho, pintura, colagem, modelagem e construções com blocos.
Ainda, a inteligência naturalista pode ser desenvolvida por meio do contato com elementos da natureza, como folhas, pedras, sementes, terra e água, que também podem ser utilizados como materiais artísticos. Nessas atividades, a criança não apenas cria, mas interpreta o mundo à sua volta e expressa seus sentimentos, ideias e percepções por meio de diferentes linguagens.
Gardner (2011) destaca que essas inteligências são muitas vezes negligenciadas em ambientes escolares formais, mas que podem florescer quando as crianças têm liberdade de experimentar e criar.
3.4 Escuta, Fala, Pensamento e Imaginação
Neste campo, a linguagem oral e a imaginação são valorizadas como formas essenciais de expressão, comunicação e construção de conhecimento.
Ele se relaciona diretamente com a inteligência linguística, que, segundo Gardner (2011), envolve a sensibilidade aos sons, ritmos, significados e funções das palavras.
Na prática, isso se traduz em momentos de contação de histórias, dramatizações, rodas de conversa, criação de narrativas, uso de fantoches e brincadeiras simbólicas. Tais experiências não apenas desenvolvem o vocabulário e a organização do pensamento, mas também promovem a criatividade e o raciocínio verbal.
Além disso, este campo pode envolver outras inteligências, como a interpessoal (quando há diálogos e interações em grupo) e a intrapessoal (quando a criança elabora sentimentos em narrativas fictícias ou autobiográficas). É importante que o educador esteja atento à escuta qualificada, valorizando o que as crianças dizem, como dizem e o que revelam em suas falas.
3.5 Espaços, Tempos, Quantidades, Relações e Transformações
Este campo envolve experiências com noções de espaço, tempo, número, medida, sequência, lógica e causalidade, relacionando-se à inteligência lógico-matemática. Gardner (2011) descreve essa inteligência como a capacidade de raciocinar de forma lógica, reconhecer padrões e resolver problemas abstratos.
Na Educação Infantil, ela pode ser estimulada por meio de jogos de classificação, seriação, contagem, experimentos com materiais naturais, culinária, observação de ciclos da natureza, brincadeiras de encaixe e desafios lógicos. O importante, segundo Antunes (2012), é que essas atividades estejam contextualizadas, façam sentido para a criança e partam de sua curiosidade e interesse.
Além disso, experiências com o tempo (dias da semana, estações do ano), com o espaço (mapas simples da sala, trajetos no pátio) e com a transformação de materiais (misturas, derretimento, secagem) permitem que as crianças construam noções fundamentais para a compreensão do mundo físico e social.
4. PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL À LUZ DAS INTELIGENCIAS MÚLTIPLAS
A aplicação da teoria das Inteligências Múltiplas no contexto da BNCC exige que o educador vá além do planejamento tradicional, buscando estratégias que contemplem a diversidade de formas de aprender. Isso implica uma postura pedagógica atenta, reflexiva e intencional, que reconhece cada criança como um sujeito único, com capacidades múltiplas que precisam ser estimuladas de forma equilibrada.
4.1 Planejamento e Intencionalidade Pedagógica
Planejar com base nas múltiplas inteligências requer uma mudança de perspectiva: ao invés de pensar apenas nos conteúdos a serem ensinados, o educador precisa considerar como as crianças aprendem e quais caminhos podem ser mais eficazes para cada grupo ou indivíduo.
Segundo Antunes (2012), essa abordagem amplia as possibilidades do professor, que passa a considerar diferentes linguagens e recursos: música, arte, dramatização, movimento, jogos, natureza, lógica, tecnologia e narrativa oral. O planejamento torna-se mais rico, variado e acessível, respeitando os diferentes ritmos, estilos de aprendizagem e interesses infantis.
Por exemplo, ao trabalhar o tema “meios de transporte”, o professor pode criar propostas integradas:
Inteligência linguística: leitura de livros infantis sobre o tema e elaboração de histórias coletivas.
Inteligência lógico-matemática: contagem de rodas de diferentes veículos, organização em tabelas simples, construção de trajetos.
Inteligência espacial: maquetes de cidades, desenhos de mapas ou ilustrações dos meios de transporte.
Inteligência musical: criação de sons com instrumentos que imitam o barulho dos transportes.
Inteligência corporal-cinestésica: jogos de mímica, encenação de uma viagem.
Inteligência interpessoal e intrapessoal: trabalho em duplas, votação sobre o transporte favorito, construção de regras para o jogo coletivo.
Inteligência naturalista: investigação de meios de transporte que afetam menos o meio ambiente.
Esse exemplo mostra como o mesmo conteúdo pode ser explorado de maneira multifacetada, engajando todas as crianças de forma mais completa e significativa.
Além disso, o ambiente deve ser cuidadosamente organizado para favorecer a exploração e o protagonismo infantil.
De acordo com Oliveira (2019), ambientes ricos em estímulos, materiais diversos e propostas abertas possibilitam que as crianças escolham caminhos diferentes para aprender, respeitando suas inteligências predominantes e seus interesses momentâneos.
4.2 Avaliação e Escuta Sensível
A avaliação na Educação Infantil, conforme preconiza a BNCC, deve ser formativa, processual e qualitativa, com foco no acompanhamento do desenvolvimento da criança e não na medição de desempenhos padronizados (BRASIL, 2017). Nesse sentido, a escuta sensível do educador torna-se essencial para compreender as múltiplas formas de expressão e construção de saberes das crianças.
Avaliar sob a ótica das inteligências múltiplas significa reconhecer que o aprendizado pode se manifestar por diferentes vias: uma criança pode demonstrar domínio de um conteúdo não pela fala, mas pelo corpo, pelo desenho, pela construção com blocos ou pela dramatização. Isso exige do professor uma postura investigativa e aberta a diferentes linguagens infantis.
Luckesi (2011) reforça que avaliar é ajudar a criança a se conhecer, a reconhecer seus avanços e suas dificuldades, promovendo a autorreflexão e o desenvolvimento da autonomia. A documentação pedagógica, nesse contexto, é uma ferramenta valiosa: por meio de registros escritos, fotografias, vídeos, portfólios e relatórios descritivos, o educador consegue construir um retrato mais fiel do percurso de aprendizagem de cada criança.
Um aspecto fundamental é o respeito ao tempo da criança. Algumas inteligências, como a interpessoal ou a musical, podem se manifestar mais cedo, enquanto outras, como a lógico-matemática ou a intrapessoal, necessitam de mais tempo para se desenvolver plenamente. Por isso, a avaliação deve considerar os aspectos qualitativos do desenvolvimento e não seguir uma lógica comparativa ou classificatória.
Por fim, a escuta ativa permite que o professor esteja sensível às necessidades, desejos e hipóteses das crianças, dando-lhes espaço para serem sujeitos do próprio processo. Como destaca Barbosa (2018), "avaliar é também escutar, acolher e acreditar no potencial da infância".
5. DESAFIOS E POSSIBILIDADES DA INTEGRAÇÃO ENTRE TEORIA E PRATICA
Integrar a teoria das Inteligências Múltiplas à BNCC na Educação Infantil representa um avanço significativo para o desenvolvimento de uma prática pedagógica mais inclusiva e significativa. No entanto, essa integração também apresenta desafios concretos que exigem reflexão, formação contínua e apoio institucional.
Um dos principais desafios está na formação docente. Muitos professores ainda têm pouca familiaridade com a teoria das Inteligências Múltiplas e podem apresentar resistência a abordagens que se distanciem da lógica tradicional de ensino. É necessário que os cursos de formação inicial e continuada ofereçam subsídios teóricos e metodológicos que permitam aos educadores reconhecer e trabalhar com as múltiplas potencialidades das crianças.
Outro obstáculo é a falta de tempo e de estrutura para o planejamento e desenvolvimento de atividades diversificadas. Muitas vezes, a rotina escolar está engessada por práticas repetitivas e pela exigência de registros burocráticos, o que compromete a intencionalidade pedagógica e o espaço para a escuta sensível e a personalização das propostas.
Além disso, a avaliação na Educação Infantil ainda enfrenta desafios quanto à sua compreensão e aplicação. Embora a BNCC oriente uma avaliação formativa e qualitativa, muitas instituições ainda praticam avaliações baseadas em instrumentos padronizados ou exigências externas, contrariando os princípios da abordagem das inteligências múltiplas, que valoriza os processos individuais e expressões diversas de aprendizagem. Por outro lado, há inúmeras possibilidades e experiências bem-sucedidas.
Ambientes educativos que reconhecem a criança como protagonista, promovem a escuta ativa, e investem em práticas integradas mostram resultados significativos em termos de desenvolvimento, engajamento e bem-estar infantil. Projetos interdisciplinares, propostas de ateliês, oficinas, exploração do ambiente natural e trabalho com temas geradores são exemplos de caminhos possíveis.
A BNCC oferece uma base potente para essa integração ao valorizar os campos de experiência, os direitos de aprendizagem e as diferentes linguagens infantis. A teoria das Inteligências Múltiplas vem, assim, como uma lente que amplia a forma de olhar para o desenvolvimento das crianças, abrindo espaço para práticas que reconhecem e celebram a diversidade humana.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A articulação entre a teoria das Inteligências Múltiplas e os princípios da BNCC na Educação Infantil representa uma oportunidade para repensar o fazer pedagógico a partir de uma perspectiva mais sensível, plural e humana. Reconhecer que cada criança possui formas únicas de aprender, expressar-se e se relacionar com o mundo é o primeiro passo para a construção de uma educação verdadeiramente inclusiva.
Ao ampliar o olhar sobre a inteligência humana, Gardner (2011) oferece aos educadores uma poderosa ferramenta para valorizar as potencialidades das crianças, muitas vezes invisibilizadas por práticas escolares homogêneas. A BNCC, por sua vez, propõe uma educação centrada nas experiências, na brincadeira e na escuta, o que a torna altamente compatível com a abordagem das inteligências múltiplas.
Contudo, para que essa integração se concretize de forma eficaz, é necessário investimento em formação docente, valorização das práticas pedagógicas reflexivas, adequações curriculares e comprometimento institucional com uma educação centrada no desenvolvimento integral.
É papel dos educadores atuar como mediadores atentos, capazes de criar ambientes ricos, desafiadores e afetivos, onde todas as crianças possam se reconhecer como competentes, criativas e pertencentes.
Ao fazê-lo, contribuem não apenas para a aprendizagem, mas para a formação de sujeitos mais conscientes de si, dos outros e do mundo.
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANTUNES, Celso. Inteligências múltiplas e seus estímulos. 2. ed. Campinas: Papirus, 2012.
BARBOSA, Maria Carmen Silveira. Avaliar na educação infantil: um olhar sensível e reflexivo sobre a criança. Porto Alegre: Penso, 2018.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017. Disponível em: https://basenacionalcomum.mec.gov.br/. Acesso em: 03 ago. 2025.
GARDNER, Howard. Estruturas da mente: a teoria das inteligências múltiplas. 24. ed. Porto Alegre: Artmed, 2011.
KRAMER, Sonia. Educação Infantil: muitos olhares. 7. ed. São Paulo: Ática, 2018.
LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem escolar: estudos e proposições. 23. ed. São Paulo: Cortez, 2011.
OLIVEIRA, Zilma de Moraes Ramos de. Educação Infantil: fundamentos e métodos. 8. ed. São Paulo: Cortez, 2019.