ADMINISTRAÇÃO DE RECURSOS HUMANOS E O MICROGERENCIAMENTO, BREVE ESTUDO PELA ÓTICA SOCIOLÓGICA
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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.15313392
Michelle Pereira Justino1
Diego Rodrigues Dias dos Santos2
RESUMO
A administração de recursos humanos, enquanto campo estratégico da gestão organizacional, tem papel essencial na construção de ambientes laborais saudáveis, produtivos e alinhados com os objetivos institucionais. Sob a ótica sociológica, este estudo busca compreender como o microgerenciamento — prática caracterizada pelo controle excessivo e pela supervisão detalhada dos colaboradores — impacta as relações de trabalho, a cultura organizacional e o comportamento humano nas instituições. Partindo de uma análise qualitativa e teórica, observa-se que o microgerenciamento, embora frequentemente justificado como método para aumentar a eficiência e a entrega de resultados, pode gerar efeitos adversos como desmotivação, estresse, diminuição da criatividade e da autonomia dos funcionários, além de configurar relações de poder assimétricas que interferem na dinâmica social do ambiente de trabalho. A abordagem sociológica permite identificar que o microgerenciamento não é apenas uma técnica de controle, mas um reflexo das estruturas sociais mais amplas que atravessam as organizações, como a hierarquia rígida, o individualismo competitivo e a cultura do desempenho exacerbado. O estudo aponta ainda que a persistência dessa prática pode comprometer os vínculos de confiança entre gestores e subordinados, fragilizando a cooperação coletiva e os laços simbólicos que sustentam a identidade organizacional. Do ponto de vista da teoria sociológica, autores como Max Weber e Michel Foucault fornecem subsídios para analisar os mecanismos de poder, vigilância e controle presentes no microgerenciamento, destacando a importância da descentralização das decisões e da autonomia profissional como estratégias para o fortalecimento de uma gestão mais humana e participativa. Além disso, a crítica ao microgerenciamento, à luz da sociologia do trabalho, contribui para repensar modelos de liderança que valorizem a escuta ativa, o reconhecimento das competências individuais e a construção de ambientes de trabalho mais colaborativos e menos opressivos. Por fim, o trabalho enfatiza a necessidade de desenvolver políticas de recursos humanos que transcendam o controle mecanicista do desempenho e promovam práticas mais alinhadas com os valores da democracia organizacional, da confiança mútua e do desenvolvimento humano. Assim, ao incorporar a perspectiva sociológica na análise da administração de recursos humanos, torna-se possível compreender com maior profundidade os efeitos subjetivos e estruturais do microgerenciamento sobre os trabalhadores e as organizações contemporâneas.
Palavras-chave: Recursos Humanos; Microgerenciamento; Sociologia do Trabalho; Poder Organizacional; Cultura Corporativa; Autonomia Profissional
ABSTRACT
Human resource management, as a strategic field of organizational administration, plays an essential role in building healthy, productive work environments aligned with institutional goals. From a sociological perspective, this study aims to understand how micromanagement — a practice characterized by excessive control and detailed supervision of employees — impacts work relationships, organizational culture, and human behavior within institutions. Based on a qualitative and theoretical analysis, it is observed that micromanagement, although often justified as a method to increase efficiency and ensure results, can generate adverse effects such as demotivation, stress, reduced creativity, and loss of employee autonomy. Additionally, it establishes asymmetric power relations that interfere with the social dynamics of the workplace. The sociological approach makes it possible to identify that micromanagement is not merely a control technique but a reflection of broader social structures that permeate organizations, such as rigid hierarchy, competitive individualism, and an overemphasis on performance. The study further indicates that the persistence of this practice may undermine the trust between managers and subordinates, weakening collective cooperation and the symbolic ties that sustain organizational identity. From the standpoint of sociological theory, thinkers like Max Weber and Michel Foucault offer foundations to analyze the mechanisms of power, surveillance, and control inherent in micromanagement, highlighting the importance of decentralizing decisions and promoting professional autonomy as strategies for fostering a more human and participative management approach. Moreover, criticism of micromanagement, in light of labor sociology, contributes to rethinking leadership models that value active listening, recognition of individual competencies, and the creation of more collaborative and less oppressive work environments. Finally, the study emphasizes the need to develop human resource policies that transcend the mechanistic control of performance and promote practices more aligned with the values of organizational democracy, mutual trust, and human development. Thus, by incorporating the sociological perspective into the analysis of human resource management, it becomes possible to more deeply understand the subjective and structural effects of micromanagement on workers and contemporary organizations.
Keywords: Human Resources; Micromanagement; Sociology of Work; Organizational Power; Corporate Culture; Professional Autonomy
1 INTRODUÇÃO
A administração de recursos humanos, enquanto campo do saber e da prática organizacional, tem passado por profundas reformulações nas últimas décadas, impulsionadas por transformações sociais, econômicas e tecnológicas. Dentre os múltiplos desafios enfrentados por gestores e estudiosos da área, o microgerenciamento se destaca como uma prática polêmica, frequentemente associada à centralização de decisões, controle excessivo e à limitação da autonomia dos colaboradores. À luz da sociologia, esse fenômeno pode ser compreendido como reflexo de estruturas organizacionais enrijecidas, que perpetuam relações de poder assimétricas e reforçam dinâmicas de dominação simbólica e material no ambiente laboral (TORELLI et al., 2024).
No atual cenário mercadológico, em que as relações de trabalho são fortemente influenciadas por modelos ágeis, flexíveis e pautados em inovação, o microgerenciamento representa uma contradição. Essa abordagem de supervisão minuciosa tende a sufocar a criatividade, desencorajar a proatividade e comprometer o engajamento dos profissionais. A sociologia organizacional, ao analisar essas práticas sob uma perspectiva crítica, evidencia que o excesso de vigilância está intimamente ligado a um modelo gerencial de raízes tayloristas, no qual o trabalhador é reduzido a um mero executor de tarefas, desprovido de voz ativa ou senso de pertencimento (GOMIDE; MACHADO; ALBUQUERQUE, 2021).
Enquanto algumas teorias da administração ainda valorizam a eficiência mecânica das funções, estudiosos das ciências sociais apontam para os efeitos deletérios que o microgerenciamento acarreta sobre o clima organizacional e o bem-estar dos indivíduos. O controle exacerbado não apenas compromete a performance coletiva, mas também alimenta uma cultura de medo, insegurança e desconfiança, na qual o erro é punido e a inovação é desestimulada. Tal realidade tem sido especialmente observada em contextos empresariais onde a liderança adota uma postura autoritária, desprezando os princípios da escuta ativa, da empatia e da delegação eficaz (PORT et al., 2024).
Sob esse prisma, a administração de pessoas requer um reposicionamento conceitual e prático, no qual a liderança seja compreendida não como um exercício de comando rígido, mas como um processo relacional e inspirador. A literatura contemporânea em gestão ressalta a importância de gestores capazes de mobilizar equipes por meio da motivação intrínseca, do reconhecimento mútuo e da valorização das competências individuais. Essa abordagem não apenas potencializa resultados institucionais, mas também contribui para a construção de um ambiente organizacional saudável, inclusivo e voltado ao crescimento compartilhado (PEREIRA; CITADINI, 2024).
Em contraposição às práticas microgerenciais, observa-se uma valorização crescente da autonomia e da confiança como pilares da gestão moderna. As empresas que almejam inovação e competitividade devem repensar seus modelos de liderança, promovendo estruturas horizontais, nas quais o diálogo, a participação e a cooperação sejam incentivados. Na perspectiva sociológica, essa mudança implica romper com padrões hierárquicos engessados, que ainda permeiam muitas instituições e dificultam a emergência de práticas mais democráticas e equitativas de condução dos processos internos (MALVEIRA, 2021).
É fundamental considerar que a forma como os gestores exercem sua liderança impacta diretamente não apenas na produtividade, mas também na saúde mental e emocional dos trabalhadores. A supervisão constante, típica do microgerenciamento, gera estresse, reduz a autoestima e inibe a tomada de decisão por parte dos colaboradores. Em tempos de transformação digital e trabalho remoto, tais práticas revelam-se ainda mais inadequadas, pois desconsideram as especificidades dos novos arranjos laborais, baseados na confiança mútua e na entrega de resultados, e não na presença física ou no cumprimento estrito de horários (GOMIDE; MACHADO; LINS, 2022).
A sociologia, enquanto ciência que estuda as relações humanas em seus múltiplos contextos, contribui sobremaneira para a compreensão do papel que a cultura organizacional exerce na perpetuação do microgerenciamento. Muitas vezes, esse comportamento está enraizado em crenças arcaicas sobre autoridade e controle, sendo reproduzido de forma automática e inconsciente por gestores que não foram capacitados para atuar sob os paradigmas da nova gestão de pessoas. A desconstrução dessas práticas exige um esforço sistemático de formação, sensibilização e mudança cultural, no qual a escuta ativa e o feedback construtivo ganhem centralidade (KOPLIN, 2021).
A gestão de capital humano, portanto, não pode mais ser compreendida apenas como um setor operacional ou técnico dentro das organizações. Trata-se de um campo estratégico, cujo sucesso depende da capacidade de alinhar metas institucionais aos anseios individuais dos colaboradores. Nesse sentido, práticas de microgerenciamento demonstram-se contraproducentes, pois geram um ambiente de trabalho tóxico, pautado pela vigilância e pelo medo, em detrimento da criatividade, da colaboração e da motivação coletiva (BORGES et al., 2024).
Ao analisar o microgerenciamento sob a lente da sociologia organizacional, evidencia-se que esse comportamento gerencial está frequentemente atrelado a falhas estruturais nas formas de comunicação interna, ausência de processos transparentes e concentração de poder decisório. A falta de clareza sobre os papéis e responsabilidades de cada membro da equipe contribui para o aumento da interferência direta do gestor, que, por insegurança ou falta de preparo, opta por um modelo de gestão pautado no controle e na supervisão detalhista, ao invés de promover a autonomia e a responsabilidade compartilhada (DE ÁVILA GOMIDEA; MACHADOA; DA SILVA LINSA, 2022).
A crise do microgerenciamento também reflete, em grande medida, a falta de investimento na formação de lideranças humanizadas e capacitadas para lidar com a complexidade das relações interpessoais nas organizações contemporâneas. Em muitos contextos, os gestores são alçados a posições de comando sem o devido preparo emocional e técnico, o que os leva a adotar posturas defensivas, centralizadoras e pouco eficazes. A construção de um novo perfil de liderança, mais empática, escutativa e colaborativa, é, portanto, um dos grandes desafios da administração de recursos humanos no século XXI (DOS SANTOS JÚNIOR et al., 2022).
É nesse contexto que se torna indispensável refletir sobre os modelos de gestão adotados, especialmente em tempos marcados pela valorização da diversidade, da inclusão e da sustentabilidade organizacional. O microgerenciamento, ao reforçar a hierarquia e suprimir a individualidade, contrapõe-se frontalmente aos princípios de uma governança mais horizontal e participativa, que valorize o potencial criativo de cada colaborador e promova relações laborais mais justas e equilibradas (NPGA; XAVIER, 2022).
Além disso, o avanço das tecnologias digitais e o fortalecimento de metodologias ágeis no ambiente corporativo exigem um novo olhar sobre a gestão de pessoas, centrado na confiança, na descentralização e na flexibilidade. A manutenção de práticas microgerenciais, neste contexto, não apenas compromete a inovação, como também enfraquece o vínculo entre os profissionais e a organização, aumentando os índices de rotatividade e desengajamento (DO NASCIMENTO GONÇALVES; VASCONCELLOS; SILVA, 2023).
Ao compreender a administração de recursos humanos como uma prática relacional e estratégica, torna-se evidente que o microgerenciamento não possui mais espaço nas organizações que almejam sustentabilidade, inovação e competitividade. A transformação dos modelos de liderança e a adoção de uma cultura organizacional mais aberta e inclusiva são imperativos para a superação desse paradigma ultrapassado. É necessário, portanto, investir na capacitação contínua dos líderes, fomentar a comunicação transparente e construir ambientes laborais pautados pela confiança, colaboração e reconhecimento mútuo (NASCIMENTO et al., 2023).
Cabe destacar, por fim, que a superação do microgerenciamento depende não apenas de mudanças individuais nos comportamentos dos gestores, mas de transformações estruturais nas práticas e políticas organizacionais. A valorização do diálogo, a descentralização de decisões e a promoção da corresponsabilidade são caminhos viáveis e desejáveis para o fortalecimento da gestão de pessoas e a promoção de ambientes de trabalho mais saudáveis, produtivos e éticos (MACHADO, 2022).
Neste panorama, a administração de recursos humanos se reinventa, incorporando conceitos e metodologias oriundas das ciências sociais, que permitem uma compreensão mais ampla, crítica e humana das dinâmicas organizacionais. Ao rejeitar práticas autoritárias e promover modelos participativos, a gestão contemporânea dá um passo fundamental rumo à construção de organizações mais justas, inovadoras e comprometidas com o desenvolvimento integral de seus colaboradores (AZEVEDO, 2023).
A adoção de modelos de liderança baseados na confiança, no empoderamento e na responsabilidade coletiva é, assim, não apenas uma tendência, mas uma necessidade para organizações que pretendem se destacar em um mercado cada vez mais dinâmico e complexo. A análise sociológica do microgerenciamento revela as limitações desse modelo e aponta caminhos possíveis para uma gestão mais eficaz, ética e sintonizada com os desafios do presente (KERZNER, 2021).
Considerando os aprendizados obtidos durante a pandemia de Covid-19, especialmente com o advento do teletrabalho, reforça-se a urgência de repensar o papel do gestor e os mecanismos de controle nas organizações. A experiência do trabalho remoto demonstrou que é possível manter, e até mesmo aumentar, a produtividade com base na autonomia, na confiança e na clareza de objetivos, invalidando os pressupostos que sustentam o microgerenciamento (OLIVEIRA, 2023).
Nesse sentido, é imprescindível que a administração de recursos humanos assuma um papel protagonista na transformação das práticas de liderança, orientando gestores para o desenvolvimento de habilidades interpessoais, inteligência emocional e pensamento crítico. A superação do microgerenciamento é, portanto, uma construção coletiva, que exige compromisso, formação contínua e mudança cultural em todos os níveis hierárquicos (SEGATTO; EUCLYDES; ABRUCIO, 2021).
Por fim, reforça-se que a análise sociológica do microgerenciamento não visa apenas criticar uma prática gerencial específica, mas contribuir para a construção de novos paradigmas de gestão, mais humanos, democráticos e eficazes. A administração contemporânea, ao integrar saberes interdisciplinares, se fortalece como campo de conhecimento essencial para a promoção de organizações mais justas, produtivas e alinhadas com os valores da sociedade contemporânea (DE SOUZA; DA SILVA, 2022).
A compreensão crítica dos efeitos do microgerenciamento no contexto das relações de trabalho é, portanto, essencial para a construção de modelos organizacionais mais saudáveis e sustentáveis, capazes de valorizar o potencial humano em sua totalidade e fomentar culturas corporativas baseadas no respeito, na inclusão e na inovação (LIMA; FREITAS, 2025).
2 METODOLOGIA
A presente investigação adota como método a revisão bibliográfica, instrumento fundamental no campo das ciências sociais aplicadas, especialmente quando o objetivo central é compreender fenômenos complexos sob múltiplas perspectivas teóricas e empíricas. A escolha por essa abordagem se justifica diante da necessidade de consolidar, analisar e discutir produções acadêmicas e científicas já existentes sobre a temática da administração de recursos humanos, com ênfase nas práticas de microgerenciamento, interpretadas sob a ótica sociológica. A revisão bibliográfica permite não apenas o levantamento e a sistematização de dados secundários, mas também a identificação de lacunas, contradições e consensos que permeiam o debate sobre estilos de liderança, estruturas de poder nas organizações e seus efeitos sobre a produtividade e o bem-estar dos trabalhadores (TORELLI et al., 2024).
Nesse contexto, a metodologia da revisão bibliográfica se estrutura a partir da análise minuciosa de fontes relevantes e atualizadas, que possibilitam a construção de um panorama amplo e crítico sobre o tema em questão. Foram consideradas obras acadêmicas, artigos científicos, trabalhos de conclusão de curso, dissertações, publicações em periódicos especializados e anais de congressos. A seleção dos materiais seguiu critérios de relevância, atualidade, credibilidade e aderência ao escopo da pesquisa, assegurando assim a consistência e a validade dos dados discutidos. Os estudos analisados contemplam diferentes visões sobre a gestão de pessoas, com especial atenção àqueles que abordam o papel das lideranças, a estruturação das equipes, as formas de controle e os efeitos organizacionais do microgerenciamento (GOMIDE; MACHADO; ALBUQUERQUE, 2021).
A estratégia metodológica adotada envolveu uma leitura exploratória inicial do acervo bibliográfico selecionado, com posterior categorização temática dos conteúdos encontrados. Essa etapa permitiu a identificação dos principais conceitos, abordagens teóricas e práticas associadas ao microgerenciamento e à administração de recursos humanos. Em seguida, foi realizada uma leitura analítica e interpretativa dos textos, com o objetivo de relacionar as informações extraídas aos objetivos da pesquisa e ao seu referencial teórico. Essa abordagem qualitativa se mostrou adequada para capturar a complexidade dos fenômenos estudados, possibilitando uma análise crítica e aprofundada dos conteúdos investigados (PORT et al., 2024).
Importa destacar que a revisão bibliográfica não se limita a uma simples compilação de informações já disponíveis, mas se propõe como um exercício de reflexão e síntese, no qual o pesquisador assume o papel de mediador entre os diversos autores, contextos e visões de mundo. Ao reunir, contrastar e dialogar com diferentes perspectivas, a pesquisa adquire densidade analítica e contribui para o avanço do conhecimento científico sobre o tema em pauta. A metodologia escolhida também favorece o desenvolvimento de um arcabouço conceitual sólido, que fundamenta as discussões subsequentes e orienta a construção das conclusões e recomendações finais do estudo (PEREIRA; CITADINI, 2024).
A escolha pela revisão bibliográfica também se alinha ao caráter exploratório e teórico da pesquisa, que não pretende mensurar variáveis ou testar hipóteses por meio de instrumentos quantitativos, mas sim compreender, de forma abrangente, os sentidos e implicações das práticas de microgerenciamento na administração de pessoas. Trata-se, portanto, de uma investigação de natureza qualitativa, voltada à compreensão dos significados atribuídos pelos autores aos fenômenos analisados, e fundamentada na análise crítica dos discursos e argumentos presentes nas fontes selecionadas (MALVEIRA, 2021).
Outro aspecto metodológico relevante foi a adoção de uma abordagem interdisciplinar, que considera aportes teóricos oriundos da administração, da sociologia, da psicologia organizacional e da ciência política. Essa escolha se justifica pela complexidade do objeto de estudo, que envolve tanto aspectos estruturais das organizações quanto dinâmicas subjetivas das relações humanas no ambiente de trabalho. A diversidade de olhares enriquece a análise e possibilita uma compreensão mais holística dos efeitos do microgerenciamento sobre a cultura organizacional, a liderança e o desempenho dos indivíduos e das equipes (GOMIDE; MACHADO; LINS, 2022).
A delimitação temporal das fontes priorizou publicações dos últimos cinco anos, com o intuito de captar as transformações mais recentes ocorridas no campo da gestão de pessoas, especialmente em função das mudanças impostas pela pandemia de Covid-19, que intensificou o uso do teletrabalho e provocou uma reconfiguração das relações hierárquicas e dos estilos de liderança. Contudo, também foram incorporadas obras clássicas e publicações anteriores, desde que consideradas fundamentais para a contextualização e fundamentação do problema de pesquisa (KOPLIN, 2021).
A sistematização das informações coletadas foi realizada com o auxílio de fichamentos e quadros comparativos, que permitiram identificar convergências e divergências entre os autores, bem como mapear os principais conceitos e categorias analíticas presentes na literatura. A organização dos dados possibilitou a construção de uma narrativa coerente e fundamentada, que articula os diversos pontos de vista encontrados, ao mesmo tempo em que evidencia os desafios e oportunidades relacionados à superação do microgerenciamento nas organizações contemporâneas (BORGES et al., 2024).
Cabe ressaltar que a revisão bibliográfica também contempla uma análise crítica das metodologias utilizadas pelos autores consultados, de modo a avaliar a robustez de suas conclusões e a aplicabilidade de seus achados em diferentes contextos organizacionais. Essa análise reflexiva é essencial para evitar generalizações apressadas e para garantir que as proposições do presente estudo estejam embasadas em evidências sólidas e em interpretações coerentes com a realidade investigada (DE ÁVILA GOMIDEA; MACHADOA; DA SILVA LINSA, 2022).
Além disso, a pesquisa foi orientada por princípios éticos que garantem o respeito à integridade intelectual dos autores citados, a fidedignidade das informações utilizadas e a transparência na exposição dos resultados. Todas as fontes foram devidamente referenciadas conforme as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT, 2023), assegurando a rastreabilidade das informações e o reconhecimento das contribuições teóricas e empíricas que sustentam a argumentação desenvolvida (DOS SANTOS JÚNIOR et al., 2022).
A revisão bibliográfica, ao permitir o acesso a um amplo repertório de conhecimentos consolidados, também favorece a construção de hipóteses explicativas e a proposição de caminhos alternativos para o enfrentamento das problemáticas identificadas. No caso específico deste estudo, a metodologia adotada permite identificar boas práticas de gestão, estratégias de desenvolvimento de lideranças mais humanizadas e modelos organizacionais que privilegiam a confiança e a autonomia, em contraposição às práticas microgerenciais (NPGA; XAVIER, 2022).
Dessa forma, a revisão bibliográfica se consolida como um instrumento metodológico eficaz e pertinente para o alcance dos objetivos da pesquisa, permitindo a identificação de padrões, a análise de discursos e a construção de um referencial crítico sobre a administração de recursos humanos e o microgerenciamento. Ao sistematizar o conhecimento existente, essa abordagem oferece subsídios teóricos para a formulação de novas reflexões e contribui para o aperfeiçoamento das práticas organizacionais, em consonância com os princípios da equidade, da eficiência e do bem-estar coletivo (DO NASCIMENTO GONÇALVES; VASCONCELLOS; SILVA, 2023).
Com isso, reafirma-se a importância de pesquisas baseadas na revisão bibliográfica como forma de aprofundar a compreensão de fenômenos complexos e de subsidiar a formulação de políticas e estratégias mais eficazes de gestão de pessoas. Ao reunir múltiplas vozes e perspectivas, esse método fortalece a análise crítica e contribui para o desenvolvimento de organizações mais justas, humanas e inovadoras, preparadas para enfrentar os desafios do presente e do futuro (NASCIMENTO et al., 2023).
3 REFERENCIAL TEÓRICO
A administração de pessoas, como campo estratégico da gestão organizacional, tem se transformado significativamente diante das demandas contemporâneas de inovação, flexibilidade e produtividade. No entanto, práticas como o microgerenciamento ainda persistem como resquícios de modelos hierárquicos tradicionais que, muitas vezes, colidem com os princípios modernos de autonomia e confiança mútua no ambiente corporativo (TORELLI et al., 2024).
O microgerenciamento, enquanto forma de controle minucioso e constante sobre subordinados, pode ser compreendido, na perspectiva sociológica, como um reflexo de estruturas de poder verticalizadas, em que a figura do gestor assume um papel centralizador e autoritário. Essa abordagem, além de afetar o moral dos colaboradores, fragiliza a construção de vínculos profissionais baseados na corresponsabilidade e na motivação intrínseca, comprometendo o desenvolvimento de competências e habilidades que exigem liberdade para a experimentação e aprendizado contínuo (GOMIDE; MACHADO; ALBUQUERQUE, 2021).
Sob o ponto de vista organizacional, a cultura do microgerenciamento revela uma falha na internalização de práticas de liderança moderna. A figura do líder inspirador, que estimula a inovação e incentiva o protagonismo dos profissionais, é substituída por perfis de gestores que se apegam a processos rígidos e ao controle exacerbado. Essa conduta cria ambientes de trabalho tensos, inibe a criatividade e desestimula a iniciativa, fatores fundamentais para o desempenho sustentável das equipes (PORT et al., 2024).
Além disso, a prática do microgerenciamento está diretamente relacionada a modelos de governança interna que priorizam o desempenho a qualquer custo, negligenciando os aspectos humanos da gestão. Essa lógica produtivista pode ser associada ao conceito de racionalidade instrumental, descrita por sociólogos como Max Weber, em que a eficácia dos meios se sobrepõe à reflexão crítica sobre os fins. Em organizações que operam sob essa lógica, os colaboradores deixam de ser vistos como sujeitos ativos e passam a ser tratados como meros executores de tarefas (PEREIRA; CITADINI, 2024).
O impacto sociológico do microgerenciamento também pode ser analisado a partir da teoria da burocracia. No contexto brasileiro, estudos recentes apontam para a existência de um aparato estatal que ainda conserva práticas burocráticas engessadas, dificultando a adoção de modelos mais flexíveis e colaborativos de administração de pessoas. O apego às normas e à hierarquia tradicional impede que os servidores públicos, por exemplo, desenvolvam suas potencialidades de maneira plena, reproduzindo práticas de controle semelhantes às observadas na iniciativa privada (MALVEIRA, 2021).
No cenário das startups e organizações inovadoras, o microgerenciamento aparece como um paradoxo. Por um lado, essas empresas se estruturam em torno de princípios ágeis e dinâmicos, mas, por outro, muitos líderes ainda recorrem a práticas centralizadoras por insegurança ou despreparo. Esse comportamento reflete uma incongruência entre discurso e prática, demonstrando que a transformação cultural organizacional não se efetiva apenas com a adoção de novas metodologias, mas exige uma mudança de mentalidade por parte da liderança (BORGES et al., 2024).
A sociologia das organizações aponta que o comportamento do gestor é influenciado por estruturas sociais mais amplas, incluindo normas culturais, valores e sistemas educacionais. A formação de lideranças autoritárias pode ser resultado de um contexto histórico em que o comando e o controle eram valorizados como sinônimos de eficiência. Mesmo em ambientes que pregam horizontalidade e gestão participativa, o hábito de supervisionar todos os detalhes permanece, evidenciando a força de estruturas simbólicas e culturais que perpetuam práticas retrógradas (GOMIDE; MACHADO; LINS, 2022).
Outro aspecto importante é a relação entre o microgerenciamento e a saúde organizacional. Ambientes de trabalho pautados por vigilância excessiva tendem a apresentar maiores índices de estresse, rotatividade e absenteísmo. A falta de confiança e autonomia gera desmotivação, prejudica o engajamento e cria uma cultura de medo, na qual os profissionais evitam assumir riscos ou propor melhorias por receio de represálias. Essa dinâmica impacta diretamente a produtividade e a satisfação dos trabalhadores, evidenciando a necessidade de repensar os modelos de gestão vigentes (DOS SANTOS JÚNIOR et al., 2022).
Do ponto de vista técnico, o microgerenciamento compromete a eficiência dos processos organizacionais, uma vez que sobrecarrega os gestores com tarefas operacionais e reduz o tempo disponível para atividades estratégicas. Essa abordagem resulta em uma má alocação de recursos humanos e materiais, reduzindo a capacidade de inovação da organização e sua adaptabilidade frente às mudanças do mercado. Em contraste, a delegação responsável e o empoderamento das equipes demonstram ser estratégias mais eficazes para o alcance de metas institucionais (NPGA; XAVIER, 2022).
A análise sociológica do microgerenciamento também revela tensões entre os modelos tradicionais de comando e os princípios da gestão por competências. Enquanto o primeiro se baseia em hierarquias rígidas e controle contínuo, o segundo prioriza o reconhecimento das potencialidades individuais e coletivas, estimulando a autonomia e o desenvolvimento integral do capital humano. Essa incompatibilidade de paradigmas gera conflitos organizacionais que impactam a qualidade do clima institucional e dificultam a construção de ambientes de trabalho saudáveis e colaborativos (DO NASCIMENTO GONÇALVES; VASCONCELLOS; SILVA, 2023).
A introdução do teletrabalho e das tecnologias digitais trouxe à tona novas formas de microgerenciamento, agora mediados por plataformas de monitoramento e comunicação remota. Embora essas ferramentas possam ser úteis para a coordenação de equipes dispersas, seu uso indiscriminado pode intensificar práticas de vigilância e controle, comprometendo a privacidade e o bem-estar dos trabalhadores. Esse cenário exige uma reflexão ética sobre os limites do gerenciamento virtual e a importância de se construir relações de trabalho baseadas na confiança e no respeito mútuo (NASCIMENTO et al., 2023).
Nesse contexto, torna-se essencial considerar o papel da liderança transformacional como alternativa ao microgerenciamento. Líderes que adotam uma postura inspiradora e motivacional são capazes de fomentar o comprometimento e a inovação, mesmo em cenários desafiadores. Essa abordagem está alinhada com as demandas contemporâneas por gestão humanizada e centrada no desenvolvimento integral das pessoas. A valorização do diálogo, da escuta ativa e do reconhecimento de conquistas são práticas que substituem o controle excessivo por uma liderança baseada em propósito e conexão (LIMA; FREITAS, 2025).
A análise do microgerenciamento sob a ótica sociológica, especialmente no âmbito da administração de recursos humanos, exige um resgate histórico das práticas gerenciais e de suas transformações ao longo do tempo. Ao considerar a evolução das formas de organização do trabalho, percebe-se que o microgerenciamento não surgiu por acaso, mas é herança de um modelo de gestão que tem suas raízes fincadas na Revolução Industrial, nos primórdios da modernidade e na ascensão do capitalismo como sistema econômico dominante. Com o advento das fábricas e o crescimento da produção em larga escala, tornou-se necessário controlar rigidamente os processos produtivos, as tarefas dos operários e os tempos de execução. Esse contexto deu origem a formas de gerenciamento voltadas essencialmente à maximização da eficiência e à padronização da produtividade (TORELLI et al., 2024).
A partir do final do século XIX, nomes como Frederick Winslow Taylor, com sua Teoria da Administração Científica, contribuíram para sistematizar essas práticas. Taylor propôs o fracionamento das atividades em tarefas simples e repetitivas, cujos tempos e movimentos deveriam ser cronometrados para alcançar o maior rendimento possível. Nesse modelo, os trabalhadores eram percebidos como peças de uma engrenagem mecânica, e o papel do gestor consistia em supervisionar detalhadamente cada etapa, intervindo sempre que houvesse desvio do padrão estabelecido. É nesse cenário que o microgerenciamento se institucionaliza como parte do exercício da autoridade gerencial, sendo legitimado por discursos técnicos e científicos (GOMIDE; MACHADO; ALBUQUERQUE, 2021).
A abordagem taylorista, ao influenciar significativamente os modelos de gestão do século XX, encontrou respaldo na lógica fordista de produção em massa. Henry Ford, ao implementar linhas de montagem automatizadas e altamente controladas, aprofundou a divisão do trabalho e o controle centralizado, intensificando a supervisão direta dos operários. O ambiente fabril era caracterizado por vigilância constante e ausência de autonomia, reforçando a ideia de que a produtividade estava diretamente relacionada à disciplina e ao cumprimento estrito de tarefas. Esse paradigma contribuiu para a cristalização de estruturas hierárquicas rígidas, nas quais a autoridade do chefe não era questionada e o trabalhador era desprovido de voz ativa nas decisões (PORT et al., 2024).
Com o passar das décadas, as mudanças econômicas e sociais exigiram adaptações nos modelos de gestão. A partir da década de 1970, com a crise do fordismo e a emergência do pós-fordismo, surge a necessidade de repensar o papel da força de trabalho e da liderança. A automação, a globalização e a crescente competitividade entre empresas impulsionaram a busca por modelos mais flexíveis e dinâmicos. Nesse momento, ganha força a valorização do capital humano, e conceitos como qualidade de vida no trabalho, motivação e clima organizacional começam a ser incorporados ao discurso gerencial. Ainda assim, muitas organizações, mesmo adotando um vocabulário moderno, continuaram a reproduzir práticas centralizadoras, muitas vezes disfarçadas sob a roupagem da “liderança ativa” (PEREIRA; CITADINI, 2024).
Na perspectiva sociológica, essa permanência do microgerenciamento revela a força das estruturas institucionais e das ideologias gerenciais que moldam o comportamento organizacional. A naturalização da autoridade e da hierarquia, somada ao medo de perder o controle e à desconfiança sobre a autonomia dos subordinados, sustenta práticas que limitam a participação e a expressão individual no ambiente de trabalho. Em muitos casos, a resistência à delegação de tarefas está relacionada à insegurança do gestor, que acredita que apenas com supervisão constante será possível garantir resultados. Isso revela uma dimensão psicológica do microgerenciamento, mas também aponta para um pano de fundo histórico que legitima o controle como ferramenta essencial da administração (MALVEIRA, 2021).
Na administração pública brasileira, por exemplo, as estruturas burocráticas herdadas do modelo weberiano ainda influenciam fortemente as práticas de gestão. A burocracia, concebida como um instrumento de racionalização e impessoalidade, se transformou em um sistema muitas vezes engessado, com baixa capacidade de adaptação e resistência à inovação. O microgerenciamento, nesse contexto, emerge como um mecanismo de compensação frente à ausência de sistemas eficazes de avaliação e desempenho, substituindo a confiança por procedimentos e rotinas inflexíveis. Assim, ao invés de promover o desenvolvimento dos servidores, o sistema acaba por limitar suas iniciativas e engessar a tomada de decisão (BORGES et al., 2024).
Nos últimos anos, a ascensão das metodologias ágeis e das práticas associadas ao gerenciamento de projetos — como o Scrum, o Kanban e outras — trouxe um novo fôlego à discussão sobre autonomia, responsabilidade e auto-organização das equipes. Tais abordagens propõem ciclos de trabalho curtos, avaliações constantes e o empoderamento dos membros da equipe como estratégia para melhorar a eficiência e a entrega de valor. No entanto, mesmo nessas abordagens, o microgerenciamento pode reaparecer sob outras formas, especialmente quando gestores utilizam ferramentas ágeis apenas como fachada, mantendo práticas tradicionais de vigilância e controle nos bastidores (GOMIDE; MACHADO; LINS, 2022).
Historicamente, o microgerenciamento sempre esteve atrelado à crença de que o líder precisa ser onipresente e controlador. Essa figura centralizadora foi, por muito tempo, exaltada como exemplo de competência e comprometimento. No entanto, os tempos contemporâneos exigem uma redefinição desse papel. A liderança transformacional e situacional, por exemplo, se apresentam como alternativas que priorizam o desenvolvimento das pessoas, o fortalecimento dos vínculos sociais e a adaptação dos estilos de gestão conforme o perfil dos liderados. Essas novas abordagens visam substituir o controle excessivo pela construção de relações baseadas em confiança mútua e reconhecimento (DOS SANTOS JÚNIOR et al., 2022).
As transformações recentes do mundo do trabalho, intensificadas pela pandemia da COVID-19, evidenciaram ainda mais a inadequação do microgerenciamento diante das novas realidades laborais. O trabalho remoto, que se tornou uma necessidade para muitas organizações, obrigou os gestores a reconfigurar sua forma de acompanhar o desempenho das equipes. A ausência física dos subordinados impôs desafios à supervisão direta, levando muitos líderes a desenvolverem habilidades de gestão mais voltadas à comunicação clara, à definição de metas e à escuta ativa. Por outro lado, também estimulou práticas abusivas, como o monitoramento por softwares de rastreamento e o excesso de reuniões virtuais, revelando a dificuldade de alguns gestores em abrir mão do controle (NPGA; XAVIER, 2022).
A reflexão sociológica sobre esses fenômenos indica que a superação do microgerenciamento não se dá apenas pela adoção de novas ferramentas, mas exige uma mudança de paradigma cultural. É necessário romper com a tradição autoritária que marcou a história das relações de trabalho e construir um novo modelo de liderança que valorize a autonomia, o diálogo e a corresponsabilidade. Esse processo passa, necessariamente, por um investimento em educação gerencial, políticas organizacionais coerentes e mecanismos de avaliação que valorizem o desempenho baseado em resultados, e não apenas em presença ou obediência (DO NASCIMENTO GONÇALVES; VASCONCELLOS; SILVA, 2023).
Sob a ótica da teoria institucional, compreende-se que práticas como o microgerenciamento se perpetuam porque estão enraizadas nas rotinas e normas organizacionais, e muitas vezes são reproduzidas sem reflexão crítica. A mudança exige, portanto, não apenas novas práticas, mas também a desconstrução de velhos hábitos, o que envolve tempo, esforço e, sobretudo, vontade política por parte das lideranças. A substituição do controle pela confiança é um dos principais desafios da gestão contemporânea, mas também representa uma das maiores oportunidades para criar ambientes de trabalho mais justos, eficientes e humanos (NASCIMENTO et al., 2023)
A compreensão do microgerenciamento dentro do campo da administração de recursos humanos pode ser significativamente aprofundada a partir das contribuições teóricas de dois grandes pensadores da sociologia: Paul-Michel Foucault e Karl Marx. Ambos, com perspectivas distintas, lançam luz sobre as dinâmicas de poder, controle e dominação presentes nas organizações contemporâneas, permitindo compreender como o microgerenciamento não é apenas uma prática de gestão, mas uma expressão concreta de estruturas mais amplas e profundas que atravessam a sociedade e o mundo do trabalho. Por meio de seus aportes, é possível enxergar essa prática como resultado de construções históricas, ideológicas e institucionais que ultrapassam o campo técnico e adentram as dimensões políticas e simbólicas do cotidiano corporativo.
Paul-Michel Foucault, em suas análises sobre o poder disciplinar, oferece um instrumental valioso para se entender como o microgerenciamento se estrutura como uma tecnologia de controle voltada à conformação dos sujeitos. Para Foucault, o poder moderno não opera unicamente pela repressão, mas pela disciplina, um mecanismo que molda comportamentos, internaliza normas e estabelece padrões de conduta por meio da vigilância constante, da normatização e da hierarquização (FOUCAULT, 1975). No contexto das organizações, o microgerenciamento atua precisamente como uma técnica disciplinar, que busca monitorar continuamente o desempenho dos trabalhadores, regular seus gestos, controlar suas ações e antecipar suas decisões. Essa lógica se aproxima do que Foucault descreve como "panoptismo", ou seja, um sistema em que a possibilidade permanente de ser observado induz o indivíduo a se autocontrolar, mesmo na ausência direta de um superior.
Na administração de recursos humanos, isso se manifesta por meio de ferramentas de avaliação de desempenho altamente detalhadas, de sistemas de metas milimetricamente definidas e de um acompanhamento constante das atividades laborais. O gestor que microcontrola não apenas observa, mas educa, corrige, forma e disciplina o colaborador para que este se adeque aos padrões considerados ideais pela organização. A subjetividade do trabalhador, nesse processo, é moldada pela lógica do controle, o que limita sua criatividade, sua autonomia e, em muitos casos, sua saúde mental. A produção de sujeitos disciplinados, conforme Foucault, é essencial à manutenção das estruturas de poder, e o microgerenciamento revela-se como uma peça fundamental dessa engrenagem (TORELLI et al., 2024).
A crítica foucaultiana também chama atenção para o fato de que as práticas de microgerenciamento se apresentam como neutras, técnicas e objetivas, quando na verdade são profundamente ideológicas. Elas carregam uma visão de mundo que valoriza a obediência, a previsibilidade e a padronização, em detrimento da pluralidade, da criatividade e da subjetividade. Essa normatividade, que se oculta sob o discurso da eficiência, revela o caráter político da gestão, pois impõe uma determinada concepção de homem, de trabalho e de organização. Sob essa ótica, a administração de recursos humanos não é apenas um campo funcional, mas um dispositivo de poder que estrutura relações sociais, produz verdades e sustenta hierarquias (GOMIDE; MACHADO; ALBUQUERQUE, 2021).
Já Karl Marx, ao elaborar sua crítica da economia política, contribui com outra chave de leitura essencial para o entendimento do microgerenciamento: a exploração do trabalho e a alienação. Para Marx, o capitalismo se fundamenta na extração do excedente do trabalho humano em prol do lucro do capitalista. Nesse processo, o trabalhador é reduzido a um mero instrumento da produção, alienado de sua atividade, do produto que gera, de si mesmo e dos demais. A divisão do trabalho, nesse sistema, não visa apenas a eficiência, mas sobretudo o controle: quanto mais fragmentadas forem as tarefas, mais fácil será substituí-las, fiscalizá-las e subordiná-las à lógica do capital (PORT et al., 2024).
O microgerenciamento, nesse sentido, é uma atualização moderna do princípio da alienação. Ele retira do trabalhador o controle sobre seu próprio tempo e sua própria atividade, impondo-lhe uma relação de subordinação extrema ao gestor e à estrutura organizacional. Cada passo deve ser aprovado, cada decisão deve ser autorizada, cada ação deve ser registrada. Essa fragmentação do poder de ação produz um sujeito dependente, impotente, desprovido de agência. Ao invés de desenvolver suas potencialidades, o trabalhador se vê compelido a seguir ordens, a obedecer comandos, a agir conforme o script pré-estabelecido pelo sistema (PEREIRA; CITADINI, 2024).
Para Marx, essa alienação tem implicações não apenas econômicas, mas existenciais. Ela desumaniza o trabalhador, reduzindo-o a uma função, a uma peça descartável da engrenagem produtiva. No microgerenciamento, essa desumanização é levada ao extremo, pois não se trata apenas de organizar o trabalho, mas de controlar a própria experiência do trabalhador, seu modo de pensar, seu ritmo, sua iniciativa. Isso aprofunda a cisão entre o sujeito e sua prática, tornando o ambiente de trabalho um espaço de sofrimento e opressão, onde a criatividade e a autonomia são sufocadas em nome da ordem e da previsibilidade (MALVEIRA, 2021).
Ao trazer Foucault e Marx para o centro da análise, compreende-se que o microgerenciamento não é simplesmente uma má prática de liderança ou um erro de gestão individual, mas um sintoma de lógicas sociais estruturantes. De um lado, Foucault nos mostra como o poder se infiltra nos corpos e nas condutas, produzindo sujeitos dóceis e úteis por meio de dispositivos de vigilância e disciplina. De outro, Marx revela como essa docilidade é funcional ao sistema capitalista, que necessita de trabalhadores disciplinados para extrair valor de sua força de trabalho. Juntos, esses autores nos convidam a ir além da superfície das práticas organizacionais e enxergar nelas os efeitos de relações históricas de dominação e exploração (GOMIDE; MACHADO; LINS, 2022).
Na prática da administração de recursos humanos, essa compreensão implica reconhecer que a luta contra o microgerenciamento não se dá apenas com cursos de liderança ou manuais de boas práticas, mas exige uma transformação profunda da cultura organizacional e das estruturas de poder que nela se reproduzem. É necessário construir ambientes em que a autonomia seja valorizada, a participação seja incentivada e o sujeito seja reconhecido como agente ativo de seu trabalho. Isso requer um reposicionamento político das lideranças, que devem abandonar o papel de controladores para assumir o de facilitadores, mediadores e inspiradores de processos coletivos (BORGES et al., 2024).
Ademais, essa abordagem crítica denuncia a tendência de responsabilizar o indivíduo por problemas que são, na verdade, estruturais. Frequentemente, o gestor é acusado de ser centralizador ou controlador, sem que se leve em conta que ele também está inserido em uma cadeia de comando que valoriza resultados imediatos, que pune erros com severidade e que recompensa o controle com reconhecimento e promoção. Assim, tanto o microgerenciado quanto o microgerente são produtos de um sistema que privilegia o controle em detrimento da confiança. A crítica marxista e foucaultiana nos permite, portanto, deslocar o foco da responsabilidade individual para a análise das estruturas sociais que produzem esses comportamentos (DOS SANTOS JÚNIOR et al., 2022).
Por fim, a contribuição desses dois autores nos instiga a repensar o próprio sentido do trabalho e da gestão nas sociedades contemporâneas. O trabalho não pode ser reduzido a uma simples obrigação funcional; ele é parte constitutiva da identidade humana, um espaço de criação, de realização e de encontro com o outro. Quando submetido ao microgerenciamento, o trabalho perde essa dimensão existencial e se torna mera execução mecânica. Cabe, portanto, às ciências sociais e à administração crítica, resgatar essa dimensão perdida, promovendo práticas que valorizem o trabalhador em sua totalidade, reconhecendo sua inteligência, sua sensibilidade e sua capacidade de contribuir com o coletivo (DO NASCIMENTO GONÇALVES; VASCONCELLOS; SILVA, 2023).
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
A análise crítica dos resultados obtidos a partir da observação de práticas administrativas em diferentes ambientes organizacionais evidencia a presença recorrente do microgerenciamento como uma ferramenta usual, muitas vezes naturalizada e pouco problematizada pelas lideranças. Em muitos contextos empresariais, especialmente em setores que valorizam resultados rápidos e metas rígidas, o microgerenciamento é erroneamente interpretado como uma estratégia eficaz de aumento de produtividade. Essa percepção distorcida ignora os impactos subjetivos e coletivos que esse tipo de conduta acarreta, desconsiderando a autonomia dos trabalhadores e provocando a estagnação do potencial criativo das equipes (TORELLI et al., 2024).
Ao longo das investigações empíricas, notou-se que o excesso de vigilância, característico da microgestão, interfere negativamente na cultura organizacional ao minar a confiança entre líderes e subordinados. Esse ambiente de desconfiança gera climas institucionais tensos, nos quais predomina a insegurança e o medo de retaliações. Como consequência, há uma redução significativa na colaboração espontânea e no engajamento dos indivíduos com os projetos coletivos. Tais efeitos foram confirmados em estudos de clima organizacional que associam práticas autoritárias com aumento dos índices de absenteísmo, rotatividade e adoecimento psicológico dos profissionais (BORGES et al., 2024).
As organizações que adotam modelos de liderança autoritária, centrada no controle extremo e na limitação da autonomia, tendem a apresentar dificuldades em processos de inovação e adaptação a mudanças. Isso ocorre porque o microgerenciamento reprime a proatividade dos colaboradores, uma vez que suas contribuições são constantemente supervisionadas ou descartadas. A insegurança diante da constante avaliação gera conformismo, prejudicando a emergência de novas ideias. Nesse cenário, o papel dos gestores torna-se paradoxal: ao tentar controlar tudo, limitam o desenvolvimento que desejam estimular, gerando resultados aquém do potencial coletivo (PORT et al., 2024).
Do ponto de vista da administração de recursos humanos, os dados apontam para a necessidade de uma reestruturação do papel gerencial. A ênfase deve migrar do controle absoluto para a construção de relações baseadas em confiança mútua e no empoderamento dos indivíduos. Para tanto, é fundamental investir em programas de desenvolvimento de lideranças que promovam habilidades socioemocionais, escuta ativa e pensamento sistêmico. O gestor do século XXI precisa ser menos supervisor e mais facilitador, criando ambientes propícios para a autonomia e a inovação, em consonância com os preceitos contemporâneos de gestão humanizada (PEREIRA; CITADINI, 2024).
A análise também revelou que a prática de microgerenciar, embora muitas vezes associada a líderes inseguros ou despreparados, está inserida em uma estrutura maior de comando e controle que atravessa diversas esferas organizacionais. Isso indica que não se trata apenas de uma escolha individual, mas de uma mentalidade institucional que precisa ser desconstruída. Em empresas nas quais o desempenho é medido de forma mecânica e descontextualizada, a pressão para atingir metas estimula a adoção de práticas excessivamente fiscalizadoras. A cultura do medo, nesse caso, perpetua um ciclo vicioso de vigilância e punição que desumaniza as relações de trabalho (MALVEIRA, 2021).
Ainda segundo os resultados analisados, há uma clara correlação entre o uso sistemático de práticas microgerenciais e o aumento de distúrbios relacionados à saúde mental, como ansiedade, depressão e burnout. Os trabalhadores afetados por essas práticas relatam sentimento de impotência, desvalorização e frustração, sobretudo quando suas capacidades são desconsideradas ou ignoradas por seus superiores. Isso demonstra que o microgerenciamento ultrapassa os limites da eficiência produtiva e alcança dimensões éticas e psicológicas, exigindo uma revisão profunda das práticas de gestão vigentes (DO NASCIMENTO GONÇALVES; VASCONCELLOS; SILVA, 2023).
Outro ponto relevante observado nos dados foi a associação entre microgerenciamento e burocracia excessiva. Em ambientes públicos e corporativos altamente normatizados, a rigidez dos processos favorece a consolidação de comportamentos autoritários, nos quais o gestor se vê compelido a controlar cada etapa do processo sob o pretexto de seguir protocolos e evitar falhas. Essa realidade foi amplamente documentada em estudos sobre capacidades estatais e desempenho na percepção de burocratas brasileiros, nos quais se constatou que a autonomia funcional tende a ser minada por uma cultura de auditoria permanente e desconfiança sistêmica (GOMIDE; MACHADO; ALBUQUERQUE, 2021).
Além disso, ao examinar práticas de microgestão em estruturas públicas, observou-se que a tentativa de uniformizar procedimentos e evitar improvisações acaba reforçando uma cultura de apatia e inércia institucional. Quando o servidor público perde sua capacidade de agir com criatividade e responsabilidade, o serviço prestado à sociedade também se torna mecânico e ineficaz. Isso levanta um debate fundamental sobre como desenvolver políticas públicas que incentivem o protagonismo dos agentes públicos, mesmo diante de estruturas rígidas e hierarquizadas (SEGATTO; EUCLYDES; ABRUCIO, 2021).
Na seara das startups e empresas inovadoras, que por natureza exigem agilidade e adaptabilidade, a prática do microgerenciamento mostra-se particularmente contraditória. Apesar de se apresentarem como organizações horizontais e disruptivas, muitas dessas empresas acabam adotando posturas rígidas sob a justificativa de garantir a escalabilidade e o controle de processos. Essa contradição entre o discurso da liberdade e a prática do controle revela que o microgerenciamento não está restrito a modelos tradicionais de organização, mas também pode ser encontrado em ambientes modernos e tecnológicos, o que reforça sua natureza estrutural (AZEVEDO, 2023).
Adicionalmente, os dados sugerem que práticas ágeis de gestão, quando mal interpretadas, podem ser transformadas em instrumentos de microgerenciamento disfarçado. O uso intensivo de metodologias como Scrum, por exemplo, pode ser apropriado por líderes como mecanismo de controle exacerbado, quando o objetivo inicial era promover colaboração e transparência. Esse fenômeno foi identificado em experiências com projetos científicos e tecnológicos, onde a ênfase nos rituais metodológicos ultrapassou o propósito pedagógico e se tornou uma nova forma de vigilância (PEREIRA; CITADINI, 2024).
A literatura também aponta para o papel da tecnologia como amplificador das práticas microgerenciais. Ferramentas digitais de rastreamento de produtividade, plataformas de monitoramento em tempo real e sistemas de gestão integrados têm potencializado a capacidade de controle das lideranças, muitas vezes em detrimento da confiança e da privacidade dos colaboradores. A virtualização do trabalho, sobretudo no contexto do teletrabalho, trouxe novas formas de microgerenciar, agora mediadas por algoritmos e softwares que monitoram cliques, tempo de permanência em telas e frequência de comunicação online (NASCIMENTO et al., 2023).
Esse novo modelo de controle, aparentemente objetivo e imparcial, desumaniza ainda mais a relação entre trabalhador e organização, reduzindo a complexidade do trabalho humano a métricas quantitativas. A pressão por resultados mensuráveis desconsidera os aspectos qualitativos da contribuição dos indivíduos, como cooperação, criatividade e resiliência. Ao transformar cada colaborador em uma estatística, as empresas correm o risco de apagar a subjetividade e a diversidade que são, justamente, fontes de inovação e vantagem competitiva (OLIVEIRA, 2023).
Por outro lado, experiências bem-sucedidas em gestão de pessoas demonstram que a substituição do microgerenciamento por modelos de liderança inspiradora gera resultados mais sustentáveis. Ambientes baseados em confiança, reconhecimento e autonomia apresentam índices mais altos de satisfação, lealdade e desempenho. A liderança, nesses casos, atua como promotora de sentido e facilitadora de processos, estimulando a responsabilização individual e coletiva sem recorrer à imposição ou à vigilância constante. Isso confirma a importância de investir em modelos alternativos de gestão que valorizem a liberdade responsável como alicerce da produtividade (TORELLI et al., 2024).
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo deste estudo, foi possível examinar com profundidade a intrincada relação entre a administração de recursos humanos e o fenômeno do microgerenciamento, sob uma ótica sociológica que permitiu ampliar a análise para além de seus aspectos operacionais. A investigação demonstrou que o microgerenciamento é muito mais do que uma simples prática gerencial ineficaz; trata-se de uma expressão concreta de relações de poder, controle e subjetivação presentes nas dinâmicas organizacionais contemporâneas. Essa abordagem proporcionou uma compreensão mais ampla do impacto desse comportamento sobre o ambiente de trabalho, as relações interpessoais e o desempenho institucional.
A natureza do microgerenciamento revela uma tentativa constante de supervisão minuciosa, na qual a autonomia dos colaboradores é frequentemente comprometida. Tal prática interfere diretamente na dinâmica das equipes, reduzindo a capacidade de tomada de decisão independente, sufocando o potencial criativo e limitando a inovação. As consequências são múltiplas: queda no engajamento, aumento do estresse, dificuldades na retenção de talentos e, sobretudo, a formação de um ambiente organizacional pautado pela insegurança e pelo medo de errar. A gestão de pessoas, quando centrada nesse tipo de controle, torna-se contraproducente, pois ao invés de fortalecer os vínculos entre a liderança e os subordinados, fragiliza as conexões humanas que sustentam a colaboração genuína.
Com base nos resultados discutidos, é evidente que o microgerenciamento não pode ser encarado apenas como uma escolha individual dos gestores, mas sim como uma resposta sistemática à lógica produtivista que impera em muitos ambientes corporativos e públicos. Em vez de confiar na competência dos colaboradores, muitos líderes optam por vigiar cada ação, demonstrando uma cultura institucional que prioriza a obediência cega em detrimento da confiança mútua. Essa realidade escancara a urgência de se repensar o papel das lideranças no século XXI, especialmente frente às transformações tecnológicas e sociais que exigem novas posturas, mais flexíveis e colaborativas.
A perspectiva histórica analisada demonstrou como o controle do trabalho sempre esteve presente nos modelos organizacionais, ainda que com roupagens distintas. Desde os primórdios da industrialização, a padronização de tarefas e o controle rigoroso dos tempos e movimentos refletiam um desejo por eficiência absoluta. Hoje, embora os discursos empresariais falem em inovação, horizontalidade e autonomia, muitas práticas ainda reproduzem lógicas antigas, travestidas de modernidade. O microgerenciamento, nesse sentido, aparece como uma herança mal resolvida do modelo de comando e controle, que ainda persiste mesmo em ambientes inovadores, como startups e empresas tecnológicas.
Os teóricos analisados contribuíram de forma significativa para a construção crítica desse debate. A abordagem de Karl Marx, por exemplo, foi fundamental para compreender como a alienação do trabalhador se manifesta nas estruturas que o impedem de se reconhecer como agente criador no processo produtivo. O microgerenciamento intensifica essa alienação, pois reduz o papel do indivíduo a mero executor de ordens, eliminando sua capacidade de refletir, propor e transformar. Já Michel Foucault, ao discutir os mecanismos de poder e vigilância, ofereceu ferramentas conceituais importantes para entender como a disciplina se infiltra nas relações organizacionais, moldando subjetividades e naturalizando a dominação sob o pretexto de eficiência.
Diante desse cenário, torna-se evidente a necessidade de revisão das práticas de gestão de pessoas. A construção de ambientes organizacionais saudáveis passa, necessariamente, pela valorização da autonomia, da escuta ativa e do reconhecimento das singularidades dos indivíduos. Promover uma gestão baseada em confiança e desenvolvimento contínuo não significa abrir mão da responsabilidade ou da busca por resultados; ao contrário, implica em criar as condições para que os colaboradores alcancem seu pleno potencial, contribuindo de maneira mais efetiva e criativa para os objetivos institucionais.
É igualmente importante compreender que liderar não é impor, mas inspirar. A figura do gestor precisa se transformar de supervisor rígido para mentor atento, que orienta sem dominar, que orienta sem sufocar. A construção desse novo paradigma demanda formação constante, tanto técnica quanto humana, capaz de desenvolver competências emocionais, éticas e comunicacionais. A liderança, nesse novo horizonte, deixa de ser verticalizada e se torna horizontal, valorizando a contribuição coletiva e abrindo espaço para a diversidade de pensamentos e trajetórias.
Outro aspecto relevante das considerações finais diz respeito à influência das novas tecnologias sobre as práticas de microgerenciamento. A digitalização do trabalho, especialmente com o avanço do trabalho remoto e híbrido, trouxe consigo ferramentas de monitoramento que, se mal utilizadas, podem intensificar ainda mais a vigilância sobre os trabalhadores. Isso exige um olhar crítico sobre os limites entre o acompanhamento saudável e a invasão de privacidade, sendo imprescindível a construção de diretrizes éticas claras que orientem o uso responsável dessas tecnologias.
Além disso, as organizações devem promover uma cultura institucional que valorize o erro como parte do processo de aprendizagem. O medo de errar, típico de ambientes microgerenciados, impede o desenvolvimento da criatividade e da inovação. Quando se permite que as pessoas experimentem, errem e aprendam, promove-se um ambiente mais leve, produtivo e genuinamente comprometido com o crescimento mútuo. A gestão humanizada, portanto, não é uma opção idealista, mas uma necessidade estratégica para organizações que desejam se manter competitivas e sustentáveis no longo prazo.
Cabe destacar também que a superação do microgerenciamento não se dá por decretos ou manuais, mas pela construção diária de relações baseadas na confiança e no respeito mútuo. É preciso cultivar escuta, abrir canais de diálogo e permitir que os colaboradores participem das decisões que impactam suas rotinas. Trata-se de substituir o medo pela coragem, o silêncio pela palavra, o controle pela corresponsabilidade. Essa mudança exige comprometimento institucional e envolvimento dos diferentes níveis hierárquicos, além de um reposicionamento profundo do papel da área de recursos humanos como mediadora de transformações culturais.
Considerar o microgerenciamento como um problema organizacional significa olhar para dentro das estruturas e reconhecer seus limites e contradições. Significa, também, estar disposto a desaprender práticas enraizadas e abrir espaço para novas possibilidades de convivência e produção. A transição para modelos mais horizontais e colaborativos não será imediata, mas precisa ser iniciada com firmeza, clareza de propósito e disposição para o diálogo contínuo. O protagonismo dos trabalhadores deve ser incentivado, pois são eles que conhecem as necessidades concretas do cotidiano e podem apontar caminhos viáveis de mudança.
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1 Graduanda em Recursos Humanos pela Faculdade de Tecnologia de São Paulo, unidade Rubens Lara. E-mail: [email protected]
2 Orientador: Graduado em Gestão Empresarial, professor universitário. E-mail: [email protected]