TEORIA DA CARÊNCIA CULTURAL: DESAFIOS E POSSIBILIDADES NA EDUCAÇÃO DE ALUNOS DE CLASSES POPULARES

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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.13846632


Elizabeth Ivone Santos Nunez1
Nerilton Vidal de Almeida2


RESUMO
Este artigo explora a Teoria da Carência Cultural e suas implicações no desempenho escolar de alunos de classes populares, destacando como essa perspectiva contribui para a exclusão e estigmatização desses estudantes. A pesquisa, realizada por meio de uma revisão bibliográfica de obras relevantes na área, teve como objetivo analisar criticamente as narrativas que associam o fracasso escolar à falta de recursos culturais no ambiente familiar. Os resultados demonstraram que essa teoria ignora as barreiras sociais e econômicas que influenciam o aprendizado, transferindo a responsabilidade pelo fracasso escolar para as famílias e os alunos. Além disso, a pesquisa revelou que a adoção dessa visão perpetua uma cultura educacional que marginaliza saberes e práticas culturais das classes populares, legitimando desigualdades. As conclusões apontam para a necessidade de uma reavaliação das práticas pedagógicas, que devem valorizar a diversidade cultural e promover um ambiente inclusivo. O estudo sugere que, para transformar a educação em um espaço de inclusão, é essencial que as instituições reconheçam e valorizem os saberes dos alunos, desafiando as estruturas que perpetuam a desigualdade. Por fim, a pesquisa destaca a urgência de práticas educativas que contemplem as realidades socioculturais dos estudantes, promovendo uma educação mais equitativa e acessível.
Palavras-chave: Carência Cultural. Educação Inclusiva. Fracasso Escolar. Diversidade Cultural.

ABSTRACT
This article explores the Theory of Cultural Deficiency and its implications for the academic performance of students from popular classes, highlighting how this perspective contributes to the exclusion and stigmatization of these students. The research, carried out through a bibliographical review of relevant works in the area, aimed to critically analyze the narratives that associate school failure with the lack of cultural resources in the family environment. The results demonstrated that this theory ignores the social and economic barriers that influence learning, transferring responsibility for school failure to families and students. Furthermore, the research revealed that the adoption of this vision perpetuates an educational culture that marginalizes knowledge and cultural practices of the popular classes, legitimizing inequalities. The conclusions point to the need for a reassessment of pedagogical practices, which must value cultural diversity and promote an inclusive environment. The study suggests that, to transform education into a space of inclusion, it is essential that institutions recognize and value students' knowledge, challenging the structures that perpetuate inequality. Finally, the research highlights the urgency of educational practices that take into account the sociocultural realities of students, promoting a more equitable and accessible education.
Keywords: Cultural Deficiency. Inclusive Education. School Failure. Cultural Diversity.

1 INTRODUÇÃO

A educação é um dos pilares fundamentais para o desenvolvimento social e econômico de um país. No entanto, o fracasso escolar de crianças provenientes de classes populares tem sido um tema recorrente nas discussões sobre desigualdade educacional. A Teoria da Carência Cultural se destaca nesse contexto, sendo amplamente utilizada para explicar o desempenho inferior dessas crianças em relação aos seus pares de classes mais altas. Segundo essa teoria, o baixo rendimento escolar seria atribuído à suposta falta de recursos culturais em suas famílias, o que geraria um descompasso entre os alunos e os padrões esperados pela escola. Essa visão, que frequentemente culpa as famílias e os alunos, ignora as barreiras sociais e econômicas que permeiam o sistema educacional, criando um ciclo de exclusão que prejudica o aprendizado e a inclusão social.

Diversas pesquisas têm sido realizadas para investigar a relação entre classe social, cultura e desempenho escolar, revelando preocupações sobre a forma como as instituições educacionais lidam com a diversidade cultural presente entre os alunos. Autores como Maria Helena Souza Patto (1997, 1999), Michael Apple (1989) e Renata M. C. Libório (1999) criticam a Teoria da Carência Cultural, ressaltando que essa abordagem não só estigmatiza as crianças de classes populares, mas também desvia a atenção das reais causas do fracasso escolar, que estão enraizadas nas estruturas sociais e econômicas que perpetuam a desigualdade. Essa crítica evidencia a necessidade de um olhar mais atento para as práticas pedagógicas e as políticas educacionais, que muitas vezes falham em reconhecer e valorizar a pluralidade de saberes e experiências que os alunos trazem de seus contextos.

Diante desse cenário, a presente pesquisa se propõe a investigar como a Teoria da Carência Cultural impacta as práticas educacionais e as percepções sobre o desempenho escolar de alunos de classes populares. O problema central reside na naturalização da exclusão e na responsabilização dos alunos e suas famílias pelo fracasso escolar, sem que se questione a estrutura da própria escola e suas práticas pedagógicas. Justifica-se a relevância deste estudo pela urgência de promover uma educação mais inclusiva e equitativa, que reconheça e valorize a diversidade cultural dos alunos, permitindo que todos tenham acesso a oportunidades de aprendizado significativas. A pesquisa pretende contribuir para a construção de um entendimento mais aprofundado sobre a relação entre cultura, classe social e educação, oferecendo subsídios para o desenvolvimento de práticas pedagógicas que favoreçam a inclusão e a democratização do ensino.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA OU REVISÃO DA LITERATURA

A Teoria da Carência Cultural foi amplamente discutida por Maria Helena Souza Patto (1997) em seu trabalho sobre a relação entre famílias pobres e a escola pública. Segundo essa teoria, o fracasso escolar de crianças de classes menos favorecidas é frequentemente explicado pela falta de recursos culturais adequados em suas famílias. Defensores dessa perspectiva acreditam que as crianças pobres não possuem o vocabulário, os hábitos de estudo e os comportamentos valorizados pela escola, o que resultaria em um desempenho inferior quando comparadas às crianças de classes mais altas. A escola, nesse sentido, seria vista como neutra, cabendo aos alunos a responsabilidade de se adequar aos seus padrões.

Entretanto, Patto (1997) critica essa visão por ser uma abordagem que responsabiliza as famílias e as crianças pela exclusão e pelo fracasso escolar, sem questionar as práticas e os valores da própria escola. A Teoria da Carência Cultural reforça estigmas sobre as famílias de classes populares, tratando-as como deficientes ou incapazes de fornecer o suporte necessário ao desenvolvimento educacional de seus filhos. Essa perspectiva ignora as barreiras estruturais, como a desigualdade social e econômica, que impactam diretamente o desempenho escolar das crianças, ao mesmo tempo que absolve a escola de sua responsabilidade de adaptação e inclusão.

A influência da Teoria da Carência Cultural na educação se reflete em práticas pedagógicas que desconsideram as diferentes realidades socioculturais dos alunos. Ao adotar essa abordagem, o sistema educacional tende a reforçar a marginalização de estudantes das classes populares, ao invés de promover uma educação que valorize a diversidade cultural e que ofereça oportunidades equitativas de aprendizado. Para Patto (1997), é fundamental que a escola repense suas práticas e se torne um espaço de inclusão, onde o foco esteja na superação das desigualdades e na construção de uma educação mais democrática e acessível.

A Teoria da Carência Cultural, conforme analisada por Maria Helena Souza Patto (1999) em sua obra A produção do fracasso escolar: histórias de submissão e rebeldia, atribui o fracasso escolar de crianças pobres à suposta falta de estímulos culturais adequados no ambiente familiar. De acordo com essa teoria, crianças de classes populares não teriam acesso ao capital cultural necessário para alcançar sucesso no ambiente escolar, sendo vistas como carentes de experiências, valores e conhecimentos que facilitariam sua adaptação às exigências acadêmicas. A escola, por sua vez, seria encarada como um espaço neutro, onde a função de ensinar e aprender deveria ser igualmente acessível a todos, bastando que os alunos se encaixassem nas normas estabelecidas.

Patto (1999) critica duramente essa perspectiva, argumentando que a Teoria da Carência Cultural transfere a responsabilidade pelo fracasso escolar para a família e o indivíduo, ao invés de questionar o papel das instituições escolares e as desigualdades sociais mais amplas. Para ela, essa visão naturaliza as dificuldades enfrentadas por alunos das classes populares, culpabilizando-os por seu desempenho escolar, ao mesmo tempo que isenta o sistema educacional de qualquer autocrítica ou responsabilidade pelas suas próprias falhas. A teoria ignora os fatores sociais, econômicos e históricos que influenciam o sucesso ou fracasso dos estudantes, incluindo as práticas pedagógicas excludentes que desconsideram a realidade e o contexto dos alunos.

As influências da Teoria da Carência Cultural no campo educacional são profundas e prejudiciais. Ao sustentar que as crianças pobres falham por falta de um repertório cultural específico, as políticas educacionais e as práticas pedagógicas passam a desconsiderar a diversidade cultural e a pluralidade de saberes presentes nas diferentes camadas sociais. Isso perpetua um sistema que reforça as desigualdades ao invés de criar um ambiente mais inclusivo. Para Patto (1999), é crucial que a escola supere essa lógica excludente, reconhecendo a necessidade de uma educação que considere as particularidades e os contextos dos alunos, promovendo assim uma verdadeira democratização do ensino.

Na obra Educação e Poder, Michael Apple (1989) critica as visões tradicionais que associam o fracasso escolar de certos grupos ao conceito de Carência Cultural. Segundo essa teoria, os estudantes que não se adaptam às exigências acadêmicas são considerados carentes de habilidades, valores e práticas culturais adequadas para o sucesso escolar. A explicação dada pela teoria é que esses alunos, principalmente de camadas populares, trazem de seus lares uma bagagem cultural insuficiente ou inadequada para se adequarem ao que a escola exige. Essa visão tende a isentar o sistema educacional de suas responsabilidades, culpando as famílias e os próprios alunos pelo fracasso escolar.

Apple (1989) rejeita essa abordagem e argumenta que a Teoria da Carência Cultural é uma forma de mascarar as verdadeiras causas do fracasso escolar, que estão enraizadas nas estruturas de poder e nas desigualdades sociais. Para ele, a escola não é uma instituição neutra, mas sim um espaço que reflete e reforça as hierarquias sociais e econômicas dominantes. Ao adotar a Teoria da Carência Cultural, as escolas perpetuam uma cultura dominante que privilegia as classes mais altas, validando seu capital cultural e deslegitimando as formas de conhecimento e experiência dos grupos marginalizados. Dessa forma, a teoria não reconhece que o problema está na própria estrutura educacional, que é excludente e seletiva, mantendo a reprodução das desigualdades.

A influência e tal ideologia na educação, portanto, reside em sua capacidade de desviar o foco das condições sociais e políticas que afetam o aprendizado. Em vez de questionar o currículo, as práticas pedagógicas ou a organização da escola, coloca a culpa nas famílias e nas culturas dos alunos, desconsiderando que a própria escola favorece certas classes sociais. Apple (1989) defende que uma análise crítica do sistema educacional deve reconhecer que a educação é um campo de luta pelo poder, onde o controle sobre o que se ensina e quem pode aprender é uma questão política. Ele propõe que, ao invés de responsabilizar os alunos e suas culturas, é necessário transformar as estruturas educacionais para que elas sejam mais inclusivas e equitativas.

Na obra de Renata M. C. Libório (1999), Fracasso escolar: reflexões sobre sua repercussão na vida dos estudantes, a autora explora como a Teoria da Carência Cultural é utilizada para explicar o fracasso escolar de alunos oriundos de classes populares. Segundo essa teoria, o baixo desempenho desses estudantes estaria relacionado à falta de estímulos culturais e de condições familiares adequadas para apoiar o processo de aprendizagem. A visão predominante é que essas crianças não têm contato com o tipo de capital cultural valorizado pela escola, como práticas de leitura e linguagem formal, o que dificultaria sua adaptação ao ambiente escolar e resultaria em fracasso.

Da mesma forma, Libório (1999) critica essa teoria por sua tendência a responsabilizar o aluno e sua família, sem levar em consideração os fatores estruturais que impactam o desempenho escolar. Ao adotar a Teoria da Carência Cultural, o sistema educacional desconsidera as barreiras socioeconômicas e culturais enfrentadas pelas crianças de classes populares, transferindo para o indivíduo a culpa por seu fracasso. Esse pensamento também contribui para a estigmatização desses alunos, que passam a ser vistos como "deficientes" em relação aos padrões da escola, o que pode gerar sentimentos de inadequação e exclusão. Além disso, ao não questionar a estrutura da própria escola e suas práticas pedagógicas, perpetua-se uma visão elitista e excludente da educação.

As influências da Teoria da Carência Cultural na educação se manifestam, portanto, na manutenção de um sistema que ignora a diversidade cultural e reforça as desigualdades sociais. A partir dessa perspectiva, as escolas falham em adaptar-se às realidades dos alunos e acabam por reproduzir as diferenças de classe, ao invés de oferecer um ambiente de inclusão e igualdade de oportunidades. Libório (1999) sugere que a superação dessa lógica requer uma revisão das práticas educacionais, que devem valorizar o repertório cultural de todos os alunos e desenvolver estratégias pedagógicas que promovam a equidade, criando condições para que crianças de diferentes origens possam ter sucesso escolar sem serem culpabilizadas por sua condição socioeconômica.

Na obra de Alceu R. Ferraro (2004), Escolarização no Brasil na ótica da Exclusão, a esta questão é abordada como uma explicação recorrente para o fracasso escolar de alunos de classes populares. Segundo o estudo do autor relacionado à carência cultural, o desempenho inferior dessas crianças seria consequência da falta de vivências culturais e estímulos intelectuais adequados em seu ambiente familiar. O sistema escolar, ao adotar essa perspectiva, vê os alunos de famílias mais pobres como culturalmente "carentes", o que justificaria as dificuldades de aprendizagem e a falta de adaptação aos padrões exigidos pela escola. A educação, nesse modelo, acaba por reforçar a ideia de que o sucesso depende de se conformar a uma cultura específica – a cultura dominante, frequentemente associada às classes médias e altas.

Ferraro (2004), contudo, critica essa abordagem por sua visão simplista e excludente, que não considera as dinâmicas mais amplas de exclusão social e econômica. Ele argumenta que a Teoria da Carência Cultural desvia a atenção das falhas do próprio sistema educacional e do contexto de desigualdade social em que os alunos estão inseridos. Ao atribuir o fracasso escolar a uma suposta deficiência cultural, a escola legitima um processo de exclusão que responsabiliza os alunos e suas famílias, enquanto mantém intocados os fatores estruturais que contribuem para essa exclusão, como a organização pedagógica inadequada, o currículo descontextualizado e a falta de políticas inclusivas. Assim, ao invés de promover a inclusão e a democratização do ensino, a teoria reforça estigmas e naturaliza a desigualdade educacional.

As influências dessa teoria na educação, segundo Ferraro (2004), são profundas e prejudiciais, pois sustentam práticas pedagógicas que reforçam a marginalização dos alunos mais pobres. Mascara as reais causas do fracasso escolar, que estão ligadas à exclusão social e à falta de oportunidades de aprendizado igualitárias. Ao considerar as crianças das classes populares como culturalmente deficitárias, o sistema educacional perpetua a desigualdade, ao invés de buscar formas de integrar esses alunos e valorizar seus saberes e vivências. Ferraro (2004) defende que, para superar esse ciclo de exclusão, é essencial que a escola reconheça a pluralidade cultural e adote práticas pedagógicas mais inclusivas, capazes de lidar com a diversidade de seus alunos e promover uma educação verdadeiramente equitativa.

Na obra de Maria Lúcia de Arruda Aranha (2006), História da educação e da pedagogia: geral e Brasil, a Teoria da Carência Cultural é vista como uma explicação historicamente recorrente para o fracasso escolar de alunos oriundos de classes menos favorecidas. De acordo com essa teoria, as dificuldades enfrentadas por essas crianças no ambiente escolar seriam resultado de uma suposta "falta" de bagagem cultural em seus lares, o que as impediria de acompanhar o ritmo e os conteúdos exigidos pela escola. A escola, em contrapartida, é tratada como um ambiente neutro, no qual o sucesso ou fracasso do aluno dependeria exclusivamente da adequação deste aos padrões estabelecidos pelo sistema educacional.

Aranha (2006) critica essa abordagem ao apontar que ignora a diversidade de contextos culturais e as profundas desigualdades sociais que impactam o desempenho escolar. Ao tratar a cultura das classes populares como insuficiente, essa teoria não só desvaloriza os saberes e práticas culturais dessas famílias, como também encobre o papel da própria escola na reprodução das desigualdades. A visão de que os alunos de classes mais baixas são "deficitários" em termos culturais transfere a responsabilidade pelo fracasso escolar para o indivíduo e sua família, sem que se questione a adequação do currículo, das práticas pedagógicas ou das condições estruturais da escola em si. Isso perpetua uma lógica de exclusão, na qual os alunos que não se conformam às normas da escola são marginalizados.

A influência desta concepção na educação se manifesta, portanto, na perpetuação de um sistema educacional que valida e reforça os padrões culturais dominantes, marginalizando as culturas populares. Ao culpabilizar os alunos por seu desempenho, a escola deixa de questionar suas próprias práticas e, em vez de promover a inclusão, legitima a exclusão. Aranha (2006) defende que uma mudança de paradigma é necessária para valorizar a diversidade cultural e criar políticas pedagógicas que sejam sensíveis às realidades vividas pelos alunos de diferentes origens sociais. Somente assim a educação poderá desempenhar um papel verdadeiramente transformador e inclusivo na sociedade.

A partir da perspectiva de Vygotsky (1988), apresentada em Formação Social da Mente, a essa Teoria pode ser criticada com base na compreensão de que o desenvolvimento cognitivo é um processo social e culturalmente mediado. Assim, o fracasso escolar de crianças de classes populares seria explicado por uma suposta "falta" de recursos culturais em suas famílias, o que dificultaria sua adaptação ao ambiente escolar. No entanto, Vygotsky (1988) destaca que a aprendizagem ocorre por meio da interação social, e que todo ser humano é influenciado por seu contexto cultural. Assim, ao contrário do que propõe a Teoria da Carência Cultural, não há uma hierarquia de culturas em termos de valor para o desenvolvimento cognitivo; cada contexto sociocultural tem seus próprios modos de aprendizagem e formas de mediação que podem ser igualmente válidos.

Vygotsky (1988) enfatiza que o desenvolvimento da criança está intrinsecamente ligado às interações que ela estabelece com outras pessoas mais experientes dentro de seu ambiente, como familiares, amigos e professores, e que a aprendizagem ocorre de forma colaborativa. Sob essa perspectiva, a Teoria da Carência Cultural falha ao desconsiderar que as crianças trazem consigo conhecimentos e habilidades adquiridos em seu contexto cultural, que poderiam ser valorizados e utilizados como pontes para novas aprendizagens. O problema, portanto, não é a ausência de cultura, mas sim a desvalorização e a falta de reconhecimento, por parte da escola, desses saberes que as crianças de classes populares possuem. Ao ignorar essas potencialidades, a escola acaba por impor um modelo homogêneo e excludente, que favorece apenas aqueles que já estão familiarizados com a cultura dominante.

A influência de tal ideologia na educação, sob a ótica de Vygotsky (1988), é prejudicial, pois reforça a exclusão ao não levar em consideração a diversidade de contextos socioculturais que compõem o ambiente escolar. Vygotsky (1988) sugere que a educação deve ser mediadora entre o conhecimento científico e os conhecimentos que os alunos trazem de seu meio social, promovendo o desenvolvimento por meio da interação e da valorização de suas experiências culturais. Para que a escola seja inclusiva, é necessário que ela reconheça e trabalhe com a zona de desenvolvimento proximal de cada aluno, aproveitando os saberes que eles trazem de sua realidade e criando oportunidades para que avancem em seu aprendizado. A superação da Teoria da Carência Cultural exige, portanto, uma mudança na forma como a escola enxerga e se relaciona com a diversidade cultural presente entre seus alunos.

3 METODOLOGIA

A presente pesquisa se configura como uma revisão bibliográfica, tendo como objetivo analisar a Teoria da Carência Cultural e suas implicações nas práticas educacionais, especialmente no que se refere ao desempenho escolar de alunos de classes populares. Esse tipo de pesquisa foi escolhido devido à sua capacidade de proporcionar uma compreensão aprofundada do tema, reunindo e sistematizando diferentes abordagens teóricas e estudos já realizados na área.

A população-alvo desta pesquisa compreende a produção acadêmica relacionada à Teoria da Carência Cultural, com ênfase em obras de autores que criticam essa perspectiva, como Maria Helena Souza Patto, Michael Apple, Renata M. C. Libório e Alceu R. Ferraro. A amostragem será realizada por meio da seleção de artigos, livros e dissertações que abordem o fracasso escolar sob a ótica da carência cultural, a exclusão educacional e a diversidade cultural no contexto escolar. Serão considerados textos publicados entre 1990 e 2023, garantindo uma abordagem contemporânea e relevante.

Os instrumentos de coleta de dados consistirão em uma busca sistemática em bases de dados acadêmicas, como Google Academico, Scielo e JSTOR, utilizando palavras-chave como "Teoria da Carência Cultural", "fracasso escolar", "diversidade cultural" e "exclusão educacional". Serão selecionados textos que ofereçam uma crítica à Teoria da Carência Cultural e que apresentem evidências empíricas sobre suas consequências nas práticas pedagógicas. Além disso, a análise de dados incluirá a coleta de informações de relatórios de instituições educacionais e documentos oficiais que discutam a inclusão e a diversidade no ensino.

Os dados coletados serão tabulados de maneira qualitativa, utilizando técnicas de análise de conteúdo para identificar os principais temas e categorias emergentes nas obras selecionadas. A análise buscará mapear as críticas à Teoria da Carência Cultural, ressaltando como essas discussões se conectam com as práticas educacionais e as experiências de alunos de classes populares. As informações serão organizadas em quadros e tabelas, facilitando a visualização das relações entre os diferentes autores e suas contribuições para o entendimento do problema em questão. Além disso, será realizado um levantamento das propostas de intervenções pedagógicas que visem a superação das barreiras impostas pela visão da carência cultural, contribuindo para a formulação de recomendações que promovam a inclusão e a equidade no ensino.

A metodologia delineada permitirá uma compreensão abrangente das influências da Teoria da Carência Cultural na educação, contribuindo para a formação de um entendimento crítico sobre as práticas pedagógicas e as estruturas que sustentam a exclusão social no ambiente escolar.

4 RESULTADOS E DISCUSSÕES OU ANÁLISE DOS DADOS

A análise dos dados coletados revelou uma série de percepções sobre a Teoria da Carência Cultural e suas implicações nas práticas educacionais. As obras revisadas apresentaram uma crítica contundente à forma como esse pensamento tem sido utilizado para explicar e justificar o fracasso escolar de alunos de classes populares, revelando padrões de exclusão e estigmatização que permeiam o ambiente escolar.

Os dados indicam que a Teoria da Carência Cultural contribui para uma visão deficitária das culturas populares, caracterizando-as como inadequadas para o contexto escolar. Essa perspectiva foi evidenciada em diversos estudos, onde se observou que os alunos de classes sociais mais baixas frequentemente são rotulados como “carentes” de habilidades e conhecimentos valorizados pela escola. Patto (1997) e Libório (1999) destacam que essa estigmatização resulta em experiências negativas de aprendizagem, levando a um ciclo de exclusão que impacta não apenas o desempenho acadêmico, mas também a autoestima dos estudantes.

Além disso, a análise de conteúdo revelou que, ao responsabilizar as famílias e os alunos pela falta de sucesso escolar, a escola se isenta de sua responsabilidade em adaptar suas práticas pedagógicas. Autores como Michael Apple (1989) e Alceu R. Ferraro (2004) argumentam que essa abordagem ignora as desigualdades sociais e econômicas que influenciam diretamente o desempenho escolar. Os dados coletados indicam que as políticas educacionais baseadas na Teoria da Carência Cultural perpetuam a marginalização de alunos, reforçando hierarquias sociais ao invés de promover um ambiente inclusivo.

Os resultados encontrados corroboram a hipótese inicial de que a Teoria da Carência Cultural serve como um mecanismo de reprodução das desigualdades sociais dentro do sistema educacional. A crítica a essa teoria, conforme discutido por Vygotsky (1988), destaca a importância de reconhecer o valor das diferentes culturas e saberes que os alunos trazem de suas experiências. Em vez de vê-las como deficiências, a escola deve explorar essas diversidades como recursos para enriquecer o processo de aprendizagem.

Comparando com outras pesquisas na área, como as de Aranha (2006) e Ferraro (2004), observa-se um consenso de que a educação deve ser reestruturada para ser verdadeiramente inclusiva. Isso implica não apenas a valorização da cultura dos alunos, mas também a reavaliação das práticas pedagógicas, que muitas vezes são descontextualizadas e não atendem às necessidades dos estudantes. As discussões sugerem que uma abordagem pedagógica crítica e contextualizada pode contribuir para a democratização do ensino e a superação das desigualdades.

Em síntese, os dados indicam que a superação desta concepção requer um esforço conjunto entre educadores, gestores e formuladores de políticas para criar um sistema educacional que reconheça e valorize a diversidade cultural. É essencial promover práticas pedagógicas que considerem as realidades socioculturais dos alunos, fomentando um ambiente em que todos possam aprender e prosperar. A pesquisa evidencia a urgência de um olhar crítico sobre as estruturas educacionais e uma reavaliação das abordagens que têm sido historicamente adotadas em relação aos alunos de classes populares.

5 CONCLUSÃO/CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa sobre a Teoria da Carência Cultural e suas implicações na educação revelou conclusões significativas que confirmam as preocupações levantadas na introdução. Os objetivos propostos foram alcançados, demonstrando que a teoria, ao responsabilizar as famílias e os alunos pelo fracasso escolar, perpetua estigmas e contribui para a exclusão de estudantes de classes populares. As análises indicaram que a educação, ao se basear nessa visão, ignora as barreiras sociais e econômicas que afetam o aprendizado, reforçando a marginalização dos alunos.

As contribuições teóricas deste trabalho são evidentes, uma vez que a pesquisa oferece uma reavaliação crítica da Teoria da Carência Cultural, destacando a necessidade de uma abordagem mais inclusiva e contextualizada na educação. Ao evidenciar que a cultura dos alunos deve ser valorizada e reconhecida, o estudo propõe uma mudança de paradigma nas práticas pedagógicas, sugerindo que a educação deve ser um espaço de inclusão que promova a diversidade cultural em vez de reproduzir desigualdades.

No entanto, o estudo também apresenta limitações. A dependência de uma revisão bibliográfica pode restringir a profundidade da análise empírica, sugerindo a necessidade de futuras pesquisas que incluam métodos qualitativos, como entrevistas e observações em sala de aula, para uma compreensão mais rica das realidades enfrentadas pelos alunos. Além disso, recomenda-se a ampliação do escopo da pesquisa para incluir diferentes contextos sociais e geográficos, a fim de enriquecer a discussão sobre a carência cultural e suas implicações.

Em suma, a pesquisa não apenas confirma as hipóteses formuladas, mas também aponta para um caminho a ser seguido na busca por práticas educacionais mais justas e equitativas, reafirmando a importância de um olhar crítico sobre as estruturas que moldam o ensino e o aprendizado na contemporaneidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

APPLE, Michael. Educação e poder. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989. 201 p.

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. História da educação e da pedagogia: geral e Brasil. 3.ed. São Paulo: Moderna, 2006. 384.

FERRARO, Alceu R. Escolarização no Brasil na ótica da Exclusão. In: MARCHESI, Álvaro; GIL, Carlos Hernández (Org). Fracasso Escolar: uma perspectiva multicultural. Porto Alegre: Artmed, 2004. p. 48-75.

LIBÓRIO, Renata M. C. Fracasso escolar: reflexões sobre sua repercussão na vida dos estudantes. Nuances, Presidente Prudente, v.5, p.56- 63, julho. 1999.

Patto, M. H. S. (1997). A família pobre e a escola pública: anotações sobre um desencontro. In M. H. S Patto (Org.), Introdução à psicologia escolar (3a ed., p. 281-296). São Paulo: Casa do Psicólogo.

Patto, M. H. S. (1999). A produção do fracasso escolar: histórias de submissão e rebeldia São Paulo: Casa do Psicólogo.

Vygotsky, L. S. (1988). Formação social da mente São Paulo: Martins Fontes.


1 Licenciada em Letras Português - Espanhol, graduanda em Sociologia, pós graduada em Psicopedagogia, mestranda em Ciências da Educação pela UNISAL. email: [email protected]

2 Licenciado em Matemática, Bacharel em Engenharia Civil, pós graduado em Gestão Pública, especialização em Engenharia de Segurança do Trabalho, Mestrando em Administração de Empresas pela Must University. E-mail: [email protected]