QUÍMICA DO COTIDIANO E DO SISTEMA PRODUTIVO: USO DA METODOLOGIA WORD CAFÉ
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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.13287190
Francisco José Mininel1
Silvana Márcia Ximenes Mininel2
RESUMO
Neste trabalho, utilizou-se a metodologia ativa Word Café (WC). Essa metodologia ativa, estimula a argumentação, a criticidade e envolve o contexto dos estudantes. A metodologia possui sete princípios: definição do contexto; criação de um espaço de acolhimento; exploração de perguntas que façam sentido ao propósito do encontro; incentivo para a contribuição de todos os participantes; conexão de perspectivas diversas; ouvir os outros por padrões e por insights; compartilhar descobertas coletivas. As atividades foram desenvolvidas a partir de temas e questionamentos relacionados à Química do cotidiano e do setor produtivo. Os resultados obtidos são satisfatórios e apontam que ocorreu o envolvimento, a argumentação, o aprendizado e aprofundamento dos conceitos químicos em estreita relação com o contexto dos estudantes.
Palavras-chave: Metodologia ativa, Contexto, Cotidiano, Setor produtivo.
ABSTRACT
In this work, the active Word Café (WC) methodology was used. This active methodology encourages argumentation, criticality and involves the students' context. The methodology has seven principles: definition of the context; creation of a welcoming space; exploration of questions that make sense of the purpose of the meeting; encouragement for the contribution of all participants; connecting diverse perspectives; listen to others for patterns and insights; share collective discoveries. The activities were developed based on themes and questions related to everyday chemistry and the production sector. The results obtained are satisfactory and indicate that involvement, argumentation, learning and deepening of chemical concepts occurred in close relation with the students' context.
Keywords: Active methodology, Context, Daily life, Production sector.
1 INTRODUÇÃO
Este trabalho foi elaborado tendo como pressuposto básico que a função da escola é fazer com que o aluno assimile ativamente os conceitos químicos de modo que avalie criticamente o conhecimento, sistematizando o saber. Nesse processo, o professor é mediador entre o individual e o social, entre os alunos e as matérias de estudo e, no seu ato pedagógico, deverá então considerar que o aluno traz para a escola a sua experiência concreta que é o ponto de partida para encaminhá-lo para o saber sistematizado e proceder à reavaliação do conhecimento.
Assim sendo, não basta que os conteúdos sejam apenas ensinados, ainda que bem ensinados; é preciso que se liguem, de forma indissociável, à significação humana e social (LIBÂNEO, 1985).
É necessário que se inicie o ensino pela análise de situações reais, de modo que além de despertar o interesse do aluno, devemos reconhecer que ele, ao entrar na escola, já sabe um bocado sobre elas.
Tendo em vista as considerações acima e objetivando-se que o ensino de Química não se resuma em uma simples transmissão de conteúdos, mas na aquisição, por parte do aluno, de conteúdos contextualizados, isso é, que tenham significação humana e social, propõe-se então, que se tome como ponto de partida situações de interesse imediato do aluno, o que ele vive, conhece ou sofre influências e que se atinjam os conhecimentos químicos historicamente elaborados, de modo que lhe permitam analisar criticamente a aplicação destes na sociedade.
Na análise dessa aplicação é indispensável que o aluno perceba as relações entre ciência e tecnologia, compreenda e avalie o avanço científico-tecnológico. Mas, ao se tratarem os aspectos tecnológicos relacionados a um determinado conhecimento químico, é importante que o professor mostre as especificidades da tecnologia: o caráter da atividade prática que busca mais alterar do que compreender o mundo e a preocupação com a eficiência. Daí, não se trata de transformar o ensino de Química em um ensino de tecnologia química, mas de inserir nesse ensino o estudo das relações entre ciência e tecnologia.
O ensino de Química, além de significativo e crítico, pode ser contextualizado. Os conteúdos científicos contextualizados devem estar vinculados aos conteúdos curriculares e as ligações dos conhecimentos cotidianos e partir de situações reais e de interesse dos estudantes (SANTOS, 2007).
Dessa forma, é necessário que ocorra uma reflexão e um repensar quanto as metodologias empregadas e a sua finalidade, formar cidadãos críticos, no contexto do ensino de Química. O uso de metodologias ativas no ensino vem apresentando resultados satisfatórios e sendo utilizado nas diferentes áreas e, em especial, no ensino de Química.
Portanto, na busca por oferecer um ensino de Química que possibilite a construção do conhecimento de forma significativa, o pensamento crítico e fomentar discussões, este trabalho tem como objetivo primordial, apresentar uma proposta didática a partir do uso da metodologia World Café (WC) no ensino de aspectos da Química de forma geral.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
De acordo com Zimmerman (1997), um agrupamento se caracteriza por um conjunto de pessoas que partilha de um mesmo espaço e tem interesses comuns, podendo vir a tornar-se um grupo. A passagem de um agrupamento a um grupo propriamente dito resultaria, segundo o autor, da transformação de interesses comuns em interesses em comum; isto é, os integrantes de um grupo reúnem-se em torno de uma tarefa e de um objetivo comum ao interesse de todos. Além dessa peculiaridade, o autor enumera outras características de um grupo: forma uma nova entidade, com leis e mecanismos próprios; garante, além de uma identidade própria, as identidades específicas; preserva a comunicação; garante espaço, tempo e regras que normatizam a atividade proposta; organiza-se em função de seus membros, e esses organizam-se em função do grupo; apresenta duas forças contraditórias, uma tendendo à coesão e outra à desintegração; apresenta interação afetiva e distribui posições de modo hierárquico.
Conter & Alves (2018) defende que grupo é uma relação significativa entre duas ou mais pessoas. Com isso, entendemos grupo como um conjunto de pessoas que, tendo um objetivo comum, desempenham juntas determinadas atividades, passando por diferentes processos de interação, em um dado tempo e espaço.
Concordamos com Vygotsky (1987), quando coloca que a relação com o outro é, portanto, imprescindível. Sem o outro, o homem não mergulha no mundo sígnico, não penetra na corrente da linguagem, não se desenvolve, não realiza aprendizagens, não ascende às funções psíquicas superiores, não forma a sua consciência, enfim não se constitui como sujeito.
Nas palavras de Teresa Cristina Rego (2002, p. 98), ao descrever a Teoria Vygotskyana:
Em síntese, nessa abordagem, o sujeito produtor de conhecimento não é um mero receptáculo que absorve e contempla o real nem o portador de verdades oriundas de um plano ideal; pelo contrário, é um sujeito ativo que em sua relação com o mundo, com seu objeto de estudo, reconstrói (no seu pensamento) este mundo.
Assim sendo, a utilização de metodologias ativas evidencia a mudança de papel do estudante. Esta precisa responsabilizar-se por sua aprendizagem, ser capaz de apresentar questionamentos relevantes para o contexto, além de buscar solucioná-los por meio de diferentes maneiras. O professor passa a ser visto como um facilitador da aprendizagem, um parceiro que colabora com o aluno ajudando-o a compreender em vez de impor seu ponto de vista. Com isso, o aluno passa a ser um explorador autônomo que desenvolve opiniões e pensamentos próprios e não um mero reprodutor de ideias (SINGER; MOSCOVICI, 2008).
Dessa forma, é importante que o professor busque apresentar como o conteúdo pode ser relevante para sua formação social, pessoal e profissional. Apresente-o de forma que ele possa conectar ao seu dia a dia, aos seus anseios, aos seus desejos e curiosidade. Uma sugestão de Moran e Bacich (2018, p. 181) “é permitir que os estudantes participem na escolha dos conteúdos e temas de estudo como um dos aspectos da construção mediada da sua autonomia.”
Portanto, uma das maneiras de se alcançar tais objetivos seria o trabalho em grupos de modo que, uma das metodologias que podem propiciar o diálogo sobre temas relevantes para os alunos é a metodologia denominada Word Café. O (WC) é um processo criativo baseado em diálogos entre indivíduos, numa elaboração coletiva e colaborativa para responder questões de grande relevância. Os participantes são divididos em grupos para conversar sobre um determinado tema previamente escolhido. As conversas acontecem em rodadas com duração determinada e, ao final de cada uma, os grupos são redefinidos de maneira que os participantes vão se misturando ao conversar com diferentes pessoas.
A aplicação de atividades desse tipo destaca a incrível capacidade de aproveitar a diversidade de pensamentos, conhecimentos e pontos de vista existentes em um grupo. Desse modo, é possível fazer emergir da inteligência coletiva um sem-número de insights criativos que levarão à solução de um assunto em debate.
O objetivo do trabalho em grupo é instrumentalizar o sujeito para uma prática de transformação de si, dos outros e do contexto em que estão inseridos. Ele defende também que aprendizagem é sinônimo de mudança, na medida em que deve haver uma relação dialética entre sujeito e objeto, e não uma visão unilateral, estereotipada e cristalizada. A noção de aprendizagem centrada nos processos grupais, defendida por Pichon (2000), coloca em evidência a possibilidade de uma nova elaboração de conhecimento, de integração e de questionamentos acerca de si e dos outros. Para ele, a aprendizagem é um processo contínuo, em que comunicação e interação são indissociáveis, na medida em que aprendemos a partir da relação com os outros, e aprender em grupo significa ter uma leitura crítica da realidade, uma atitude investigadora, uma abertura para as dúvidas e para as novas inquietações.
3 METODOLOGIA
O World Café (WC) foi criado por Juanita Brown David Isaacs, em 1995 na Califórnia/EUA. A técnica é muito útil para estimular a criatividade, para responder questões de grande relevância para comunidades e negócios e criar espaço para que a inteligência coletiva possa emergir. O nome Café aparece justamente para convidar as pessoas a conversarem de uma forma informal, descontraída, como se estivessem em uma mesa de um café/restaurante. O foco aqui é descobrir e gerar conhecimento coletivo (BROWN & ISAACS, 2007).
Trata-se de um processo de diálogo em grupos (Figura 1), que pode levar de algumas horas a alguns dias, nos quais participantes se dividem em diversas mesas, e conversam em torno de uma pergunta central. O processo é organizado de forma que as pessoas circulem entre os diversos grupos e conversas, conectando e polinizando as ideias, tornando visível a inteligência e a sabedoria do coletivo.
A metodologia Word Café (WC) foi aplicada em uma sala de 3º Ano do Ensino Médio, com um total de 20 alunos, em uma Escola do Programa Ensino Integral (PEI) no município de Fernandópolis-SP. A metodologia desta investigação se deu em três momentos específicos, sendo estes: 1º Momento: Apresentação da metodologia “World Café” – a professora, apresentou a técnica, instigou os estudantes e organizou o material a ser utilizado para discussões a partir dos interesses prévios dos estudantes. Foi distribuído a cada um dos alunos da sala um cartão onde deveriam escrever sobre um tema de Química do cotidiano que gostariam de compreender melhor. Após coleta dos cartões, a professora dispôs os mesmos na lousa, solicitando que escolhessem entre todos, cinco temas, os quais seriam entregues uma para cada grupo formado. Os temas escolhidos versavam sobre: (a) Ação dos repelentes; (b) Medicamentos para emagrecer; (c) Química Forense; (d) Produção do Aço; (e) Perfumes e desodorantes. Dessa forma, montou-se cinco grupos com 04 alunos. Num 2º Momento: Execução da metodologia “World Café” – os estudantes, organizados em cinco grupos, executaram a técnica, fomentando discussões e argumentações. No 3º Momento: ocorrerá a apresentação dos grupos e discussões coletivas perante os assuntos.
A coleta de dados se deu por meio dos registros escritos dos estudantes e registros de falas dos alunos, transcritos pela professora. A Análise Textual Discursiva (ATD) proposta por Moraes e Galiazzi (2013) é empregada neste trabalho na análise da linguagem presente nos instrumentos de coleta de dados produzidos pelos sujeitos envolvidos na pesquisa. A análise textual discursiva é uma abordagem de análise de dados que transita entre duas formas consagradas de análise na pesquisa qualitativa que são a análise de conteúdo e a análise de discurso. Existem inúmeras abordagens entre estes dois polos, que se apoiam de um lado na interpretação do significado atribuído pelo autor e de outro nas condições de produção de um determinado texto. Ainda que o termo análise textual, segundo Titscher et al. (2002), possa relacionar-se a uma diversidade de abordagens de análise, incluindo-se nisto a análise de conteúdo e as análises de discurso. Esta é uma metodologia bastante exigente, solicitando intensa impregnação do pesquisador. Este, ao longo do processo, é desafiado a reconstruir seus entendimentos de ciência e de pesquisa, no mesmo movimento em que reconstrói e torna mais complexas suas compreensões dos fenômenos que investiga.
A metodologia Word Café (WC) tem caráter bastante livre. Porém, é importante saber que ela envolve alguns princípios fundamentais (Figura 2), conforme segue:
Defina perguntas ou questões que genuinamente importam para a vida dos estudantes.
Acomode quatro ou cinco pessoas em pequenas mesas.
Estabeleça rodadas de diálogo (geralmente três) de aproximadamente 20 a 30 minutos cada.
Encoraje tanto os anfitriões de mesa quanto os participantes a escrever, rabiscar e desenhar ideias-chave nas folhas que estão sobre a mesa ou anotar ideias chave em grandes fichas, post-its.
Após completar a rodada inicial de diálogo, peça para que uma pessoa permaneça na mesa como a “anfitriã”, enquanto as outras atuam como viajantes.
Peça para que o anfitrião da mesa dê boas-vindas aos novos convidados e brevemente compartilhe as ideias principais, temas e perguntas da rodada inicial. Incentive os convidados a ligarem e conectar ideias provenientes das conversas das mesas anteriores.
Na terceira rodada de diálogo, as pessoas podem voltar às suas mesas iniciais para sintetizar suas descobertas, ou podem continuar viajando às outras mesas, deixando o mesmo ou um novo anfitrião à mesa. Às vezes, uma nova pergunta que ajuda a aprofundar a investigação é colocada para a terceira rodada de conversa.
Depois de diversas rodadas de diálogo, inicie um período de compartilhamento de descobertas e insights em uma conversação entre todos os grupos. São nessas conversas estilo “plenária ou assembleia” que os padrões podem ser identificados, o conhecimento coletivo cresce e as possibilidades para ação surgem.
4 RESULTADOS E DISCUSSÕES
Por meio do World Café (WC), são realizadas conexões e contribuições sobre o assunto discutido. Falamos que há uma polinização de ideias, que são filtradas em cada rodada, de 20 a 30 minutos. Se há divergências, essas são postas à mesa e iluminadas. Como metodologia ativa, mostra que é possível aprender com os colegas, além dos professores. Por meio do diálogo, surgem ideias e propostas. Há uma inteligência coletiva, e o aprendiz não precisa aprender sozinho.
Cada participante foi disposto em um grupo, que escolheu um anfitrião. Este seria o responsável por transmitir os conteúdos discutidos no grupo, nas rodas de discussão coletivas. O anfitrião é o único participante de caráter fixo nas mesas, encarregado da pulverização total do conteúdo discutido, ou seja, fica incumbido de compartilhar o conteúdo discutido acrescido dos conhecimentos e ideias do grupo que representa.
Um anfitrião no World Café (WC) é o líder de mesa que desempenha o papel importante de facilitador. Espera-se que ele escute o significado real por trás de diferentes comentários e, depois, os transforme em um discurso que produza sentido para os participantes, de modo a encontrar um equilíbrio entre participação dinâmica e reflexão mútua de todos ali presentes (CHANG & CHEN, 2015).
A técnica do WC exige um ambiente acolhedor, que se aproxime de uma conversa despretensiosa entre amigos, como um encontro para o café ou chá da tarde. Para atingir esse objetivo, a sala foi preparada com mesas em disposição circular a fim de facilitar o fluir das conversas e de permitir que todos estivessem dentro do campo de visão uns dos outros. As mesas foram cobertas com toalhas e abastecidas de canetas, post-its, cartolinas e canetas hidrocor. Em uma mesa específica, foi colocado o café com alimentos leves, como frutas e sucos, a fim de que os participantes se movimentassem até a mesa em meio às discussões.
Todos os estudantes percorreram e discutiram com todos os grupos, registrando suas principais opiniões, conhecimentos, argumentos. Ao final, o grupo inicial de cada tópico, organizou as principais ideias e ocorreu a apresentação ao grande grupo (plenária).
Dessa forma, a professora organizou para cada grupo o material instrucional apresentando textos diversos sobre o tema a ser tratado no grupo, servindo esse como referencial teórico para aprofundamento da temática, bem como fez os questionamentos referentes aos temas escolhidos pelos alunos no primeiro momento. Assim sendo, para o Grupo 1, fez-se o seguinte questionamento: “Como os repelentes agem na proteção da pele contra picadas de insetos?” Para o Grupo 2, questionou-se: “Qual o mecanismo de ação dos medicamentos utilizados no emagrecimento? Como funcionam no organismo?”. Ao Grupo 3, perguntou-se: “O que vocês entendem por Química Forense? Saberiam responder sobre alguma técnica utilizada para desvendar um crime?”. Para o Grupo 4, fez o seguinte questionamento: “Como ocorre o processamento do minério de ferro nas siderúrgicas? Como é produzido o aço?”. Para o Grupo 5, questionou: “O que vocês entendem sobre a Química das essências? Como é fabricado um perfume?”.
Podemos inferir que os resultados obtidos com a proposta foram bastante satisfatórios, uma vez que, os estudantes mostraram-se envolvidos, questionadores e argumentativos. Foi possível identificar pelas suas falas o interesse pelas temáticas discutidas e a relação com o cotidiano motivou muito mais as discussões. Aqui identificaremos os alunos nos diferentes Grupos como A1, A2, A3, A4 e A5 etc. Abaixo segue algumas das falas dos alunos sobre cada um dos temas:
A1: “Eu sei que muitos repelentes são extraídos de plantas. As plantas de certas espécies têm substâncias que repelem os insetos. A indústria usa essas plantas para retirar essas substâncias que fixam na pele e espanta os insetos.”
A2. “Acho que os repelentes ficam presos na pele e o cheiro impede os insetos de se aproximar. Deve formar uma camada na pele que protege a gente das picadas. A minha vó planta citronela e usa ela para espantar mosquitos”.
A3: “Minha irmã tomou remédios para emagrecer, então, eu acho que esses remédios não deixam absorver os alimentos no organismo. Quando tomava o remédio, ia muito no banheiro”.
A4: “Já li em revistas que tem o remédio chamado Xenical que tira gordura do corpo. Esse remédio dá muita diarreia”.
A5: “Eu acho muito interessante essa parte de saber sobre o desvendamento de crimes. Já assisti uma série que falava sobre o luminol. Achei muito bacana quando eles colocaram na roupa e por conta do sangue apareceu luminosidade e descobriram o crime. Teve uma reação química do luminol com o sangue. Assisti e recomendo a Série “CSI Miami” no episódio 11 da 5ª temporada. Eles identificam o crime a partir do uso do luminol”.
A6: “Nessa parte de crimes eu já vi numa série sobre aeroportos que a polícia prende as pessoas que trazem droga nas malas e o cachorro descobre. Depois eles abrem a mala e quando tiram o pó branco de droga, eles pingam um líquido que se fica azul é porque é a cocaína. Isso é muito interessante”
A7: “Eu sei que a indústria que faz o processamento do ferro para virar aço chama-se Siderúrgica. Nela o ferro é extraído da rocha e é refinado para virar aço. Já li sobre isso. É muito interessante o processo”.
A8: “Nossa! Eu me lembro da aula do 1º Ano do Ensino Médio que o minério do ferro é chamado de hematita. É dele que sai o ferro e vai ser processado para virar o aço”.
A9: “Pelo que eu sei, os perfumes são feitos de plantas e das suas essências e elas são retiradas das plantas e transformadas nos perfumes.”
A10: “Li outro dia que a indústria do perfume é uma das mais lucrativas do mundo, com vendas que ultrapassam bilhões de dólares anualmente”.
À medida que as discussões nos Grupos iam acontecendo, tanto os alunos quanto os anfitriões anotavam as falas (insights), registrando os pontos principais discutidos, de modo a levar para as discussões finais no grande Grupo (conexão do conjunto ou plenária), onde ocorreria a sistematização e o aprofundamento das ideias em mediação feita pelo professor. Foi interessante observar que os alunos, ao mudar de Grupo levavam suas opiniões acerca dos temas e discutiam envolvendo-se com os demais membros dos outros Grupos. Opiniões e falas diversas afloraram o que permitia uma acalorada conversa entre todos.
Portanto, ao término da discussão de cada questão, os participantes trocavam de mesas para responder à questão seguinte, deixando na mesa todo o material produzido nas discussões para ser complementado pelo próximo grupo a sentar-se nesse local. O material produzido pode se apresentar em forma de relatório, anotações, pinturas, rabiscos, o que quer que os participantes tenham utilizado para manifestar suas ideias, pois toda essa produção é riquíssima em conteúdo e é utilizada na análise.
Ao trocarem de mesas de forma aleatória, os grupos se misturavam e, ao serem recebidos pelo anfitrião, tinham cinco minutos para compartilhar os assuntos discutidos nos grupos em que estavam anteriormente. Essas rodadas seguiram assim até o término das perguntas e a passagem de todos os participantes por todos os Grupos.
No final foi apresentado pelo anfitrião de cada Grupo, um relatório com as discussões ocorridas. Esse relatório serviu de base para o aprofundamento dos temas a ser feito pelo professor e preparação da aula final na plenária. Dessa forma, o professor, na plenária final embasado pelos relatórios produzidos sistematizou os conhecimentos sobre aspectos relevantes da Química do cotidiano e sua aplicabilidade no setor produtivo.
Dessa forma, em aulas preparadas em PowerPoint, o professor aprofundou os temas discutidos, de modo a trabalhar os principais conceitos químicos inerentes a cada um dos temas discutidos nos Grupos pelos alunos.
Em relação aos repelentes, colocou em slide que, “os produtos com ação de repelência agem inibindo o sistema neurológico do mosquito. Existem cinco formas disso acontecer: inibição neural seletiva, quando os neurônios responsáveis pela atração são inibidos evitando a picada; estímulo dose independente, com o estímulo do neurônio forte e fraco, causando repelência; estímulo neurônio inibitório, onde ocorre a ativação do sistema receptor, afastando os insetos do sangue; noticepção direta, quando o sistema nervoso do inseto provoca dor ao mesmo; e, por fim, fluxo de dados, quando o estímulo da atração é confundido com os demais estímulos sensoriais do animal (RODRIGUES et al., 2020). Esses repelentes podem ser de origem sintética ou natural. Os sintéticos, em sua maioria, possuem em sua composição N,N-dietil-meta-toluamida, etil-butilacetilaminopropionato ou Icaridina. Já os naturais possuem em sua formulação óleos ou substâncias provenientes de plantas ou seres vivos (VILAR, 2018)”. É interessante destacar, que num dos slides a professora representou a fórmula estrutural de um dos compostos com ação repelente, conforme indicado na Figura 3.
Ao apresentar a fórmula do composto químico, pôde discutir com os alunos conceitos importante da Química, tais como fórmulas estruturais, fórmulas moleculares, tetravalência do átomo de carbono, funções da Química Orgânica. Dessa forma, a metodologia adotada serviu como ponte para que os alunos reelaborassem os seus conhecimentos, utilizando para isso conhecimentos de química e de outras áreas, construindo significativamente os conceitos químicos.
Em relação ao questionamento sobre os medicamentos para emagrecer, montou um slide com o mecanismo de ação do medicamento Xenical®. Dessa forma, coloca as seguintes informações “Orlistat (Xenical®) é um potente inibidor irreversível das lípases gastrintestinais que hidrolisa os triacilgliceróis (triglicérides) no trato gastrintestinal em ácidos graxos livres e monoacilgliceróis, promovendo dessa forma a sua excreção (TAYLOR, 2010). Seu efeito terapêutico é exercido na cavidade gástrica e na luz do intestino delgado mediante formação de uma ligação covalente no sítio ativo da serina das lipases gástrica e pancreática. A inativação enzimática impede a hidrólise das gorduras, em forma de triglicerídeos, para originar ácidos graxos livres e monoglicerídeos absorvíveis. Por ação do Orlistat sobre as lipases, mais de 30% das gorduras ingeridas na alimentação atravessam o tubo digestivo sem ser digeridas nem absorvidas. Deste modo, o organismo não pode transformar estas calorias em excesso em tecido adiposo de reserva”.
A explicação foi seguida da visualização do slide explicativo do mecanismo de ação (Figura 4) do Orlistat (Xenical®). Esse fato permitiu que os alunos entendessem o que são os triacilgliceróis e a formação de ácidos graxos livres, conceitos importantes em Bioquímica.
Outro assunto que provocou muito interesse e gerou bastante discussão nos Grupos foi a Química Forense e o desvendamento de crimes. Visando ampliar os conhecimentos, a professora apresenta nos slides o mecanismo de ação do luminol indicando as reações químicas que ocorrem quando da sua ação. Esse fato serviu para que explicasse aos alunos os processos de transformação química da matéria, bem como o consumo dos reagentes e formação dos produtos numa transformação, oxidação-redução, características do anel aromático e funções orgânicas.
Dessa forma, explicou: “O luminol é uma substância em pó, utilizada em possíveis cenas de crime, que é composta de átomos de carbono, hidrogênio, oxigênio e nitrogênio — apresentando a seguinte fórmula: C8H7N3O2. No entanto, ele é diluído em água e água oxigenada para o uso prático. A solução em contato com pequenas quantidades de íons ferro (catalisador da oxidação do luminol) desenvolve uma reação química chamada de quimiluminescência. É devido a essa reação de oxidação do luminol catalisada por íons de ferro que surgem manchas azuladas no local onde havia sangue, possibilitando sua identificação pela perícia forense. A reação é tão sensível que mesmo lavando a área onde tinha sangue, a pequena quantidade de sangue residual contendo átomos de ferro é suficiente para desencadear a reação (Figura 5)”.
Em relação à Química e o processo produtivo, fez-se a pergunta sobre o processamento do ferro nas siderúrgicas e a transformação em aço. Houveram muitas discussões nos Grupos. Os alunos levavam suas observações sobre essa discussão à medida que trocavam de Grupos. Nesse momento, alguns alunos consultavam o material (artigos, textos e figuras) disponibilizados no Grupo pela professora. Alguns alunos questionavam sobre as equações químicas do processamento do ferro, inclusive anotando dúvidas no post-its. Em vista disso, a professora aproveitou o momento da discussão na plenária para explicar as equações químicas do processo, incluindo o balanceamento das mesmas. Dessa forma, montou slides indicando o processamento do ferro a partir da hematina nas siderúrgicas (Figura 6), conforme segue:
Outro assunto que gerou bastante discussões à medida que faziam trocas nos diferentes Grupos, foi a Química dos perfumes ou essências. Os alunos dialogavam sobre o processamento, muitos deles indicando que os perfumes seriam extraídos da natureza, principalmente plantas e flores. Aproveitando-se do grande interesse gerado pelo tema, a professora indicou nos slides preparados para a plenária final, o esquema do processamento dos aromas e perfumes na indústria química, explicando que, a destilação a vapor é o mais comum método de extração de óleos essenciais, matéria prima para produção de perfumes. É mais comum a utilização deste método para obter óleos essenciais de folhas, sementes, raízes, madeiras e algumas flores, tais como as rosas. O destilador é constituído de três partes: dorna, recipiente onde o material vegetal é compactado e passa pela ação do vapor, o condensador ou serpentina, onde o material é resfriado e o vaso separador, onde o produto resultante é separado (Figura 7).
Dessa forma, a aprendizagem significativa ocorre a partir de uma perspectiva de diálogo e mediação entre professores e alunos e destes com seus pares. Considera-se o aluno como elemento central do processo educativo e, por isso, sua história de vida e os aspectos culturais e sociais de seu contexto são fundamentais. Parte-se do pressuposto de que o conhecimento é, em sua essência, interdisciplinar e que, por isso, o ensino se configura a partir da complexidade e do conhecimento em rede.
Pôde-se verificar que a partir da utilização da metodologia Word-Café (WC), que essa proposta de metodologia ativa, auxiliou a desenvolver capacidades democráticas num processo de empoderamento a partir do diálogo onde, tanto docentes como discentes, se constroem.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A metodologia ativa Word-Café (WC) foi construída sobre a suposição de que as pessoas já possuem dentro delas a sabedoria e criatividade para confrontar até mesmo os desafios mais difíceis. Dado o contexto e foco adequado, é possível acessar e usar este conhecimento mais profundo sobre o que é mais relevante.
Percebeu-se ao longo da aplicação da metodologia, que a oportunidade dos alunos passear entre as mesas, conhecer novas pessoas, contribuiu ativamente com o seu pensamento ao ligar a essência das suas descobertas aos círculos de pensamento em constante ampliação, sendo essa uma das características marcantes da metodologia (WC). Enquanto os participantes levam ideias-chave ou temas para novas mesas, compartilham perspectivas, enriquecendo a possibilidade de insights surpreendentemente novos.
Ao dar voz aos discentes em mediação pela docente, observou-se que as diferenças são atenuadas, ressaltando o protagonismo. A partir de multimeios, como espaços de debate e discussão nas mesas, constrói-se formas de acesso aos saberes acadêmicos formalizados, cotidianos e informais, seja pela escrita, fala, imagens, etc. Nesse sentido, o professor mediador agiu como um facilitador e ao mesmo tempo desafiador para novos conhecimentos. Ao se fazer a sistematização das experiências na plenária, discutiu-se: o que, como, por que se dá o problema pesquisado, propôs vários tipos de registro para que sejam compartilhadas as aprendizagens, como já dito, ampliando as formas de expressão e construindo os conceitos químicos a partir do interesse manifestado pelos alunos em relação ao cotidiano e ao sistema produtivo.
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1 Discente do Curso Superior de Engenharia Química da Universidade Brasil, Campus Fernandópolis-SP e-mail: [email protected]. Doutor em Química pelo Instituto de Química da UNESP-Araraquara-SP.
2 Docente do Curso Superior de Engenharia Química da Universidade Brasil, Campus Fernandópolis-SP. e-mail: [email protected]. Mestre em Química pelo Instituto de Química da UNESP-Araraquara-SP.