INTOLERÂNCIA À LACTOSE: DEFICIÊNCIA DE LACTASE E OS ENTERÓCITOS

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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.17479643


Jéssica de Almeida1
Sarah Aquino da Silva1


RESUMO
Este trabalho aborda a importância de entender o processo fisiológico e fisiopatológico dos enterócitos em relação a Intolerância à Lactose, uma condição muito comum em que o organismo apresenta dificuldade de produzir lactase, a enzima liberada por células denominadas enterócitos, localizadas do intestino delgado, e que é essencial para a digestão dos açúcares presentes no leite ou derivados. A deficiência de lactase pode causar sintomas como inchaço, gases, dores abdominais e diarreia. Por meio de uma revisão bibliográfica buscou-se compreender os seus três tipos de causas (congênita, primária e secundária), apresentar métodos de diagnóstico e estratégias de tratamento e discutir cuidados clínicos e adaptações nutricionais que contribuam para melhorar a qualidade de vida dos pacientes. Foram consultados artigos científicos e materiais acadêmicos, utilizando os descritivos: processos digestivos, impactos da Intolerância à Lactose, Intolerância à Lactose, Alergia à Lactose. Foram consultadas as bases de dados periódicos da Capes, PubMed, BVS. As informações foram reunidas e analisadas para elaborar o trabalho com o objetivo de promover a informação tanto aos pacientes quanto aos estudantes de graduação em Saúde, contribuindo com a formação acadêmica e o entendimento clínico sobre essa condição.
Palavras-chave: Lactose; Lactase; Intolerância, Saúde Intestinal, Enterócitos.

ABSTRACT
This paper addresses the importance of understanding the physiological and pathophysiological process of enterocytes in relation to Lactose Intolerance, a very common condition in which the body has difficulty producing lactase, the enzyme released by cells called enterocytes, located in the small intestine, and which is essential for the digestion of sugars present in milk or dairy products. Lactase deficiency can cause symptoms such as bloating, gas, abdominal pain and diarrhea. Through a literature review, we sought to understand its three types of causes (congenital, primary and secondary), present diagnostic methods and treatment strategies and discuss clinical care and nutritional adaptations that contribute to improving the quality of life of patients. Scientific articles and academic materials were consulted, using the following descriptive terms: digestive processes, impacts of Lactose Intolerance, Lactose Intolerance, Lactose Allergy. The periodical databases of Capes, PubMed, BVS were consulted. The information was gathered and analyzed to prepare the work with the aim of promoting information to both patients and undergraduate health students, contributing to academic training and clinical understanding of this condition.
Keywords: Lactose; Lactase; Intolerance; Intestinal Health; Enterocytes.

INTRODUÇÃO

A intolerância à lactose é um problema digestivo que ocorre quando o corpo não produz quantidade suficiente da enzima lactase, responsável por quebrar a lactose, um açúcar presente no leite e em seus derivados. Essa deficiência pode levar a dificuldades na digestão da lactose, resultando em sintomas como inchaço, produção excessiva de gases, cólicas e diarreia, especialmente após o consumo de laticínios.

A lactose, um tipo de açúcar encontrado em produtos lácteos, é um dissacarídeo formado por duas moléculas: glicose e galactose. Para que o corpo consiga absorver essas moléculas, é fundamental a presença da enzima lactase, que é responsável por quebrar a lactose em suas unidades básicas. Essa enzima é produzida pelos enterócitos, que são células epiteliais localizadas nas microvilosidades do intestino delgado. A principal função da lactase é catalisar a hidrólise da lactose, pois é uma enzima catalisadora.

Além disso, os carboidratos da dieta são digeridos principalmente no intestino delgado. Para serem absorvidos, precisam ser totalmente hidrolisados em monossacarídeos por enzimas específicas chamadas dissacarídeos, como: lactase, sacarase, maltase e trealose, que estão na borda da escova dos enterócitos. Essas enzimas são glicoproteínas ligadas à membrana dos enterócitos e transformam os dissacarídeos em monossacarídeos (glicose, galactose e frutose), que são então transportados para o interior das células para absorção na circulação sanguínea. A deficiência dessas enzimas resulta em má digestão e má absorção dos carboidratos (Opekun et., al 2020). Assim, o principal problema da Intolerância à Lactose (IL) está ligado à deficiência enzimática nos enterócitos, o que prejudica a digestão e absorção da lactose e provoca sintomas leves e podendo agravar ao longo da vida.

Geralmente, é identificada pela ocorrência de distúrbios gastrointestinais após o consumo de alimentos com a presença de lactose (de Carvalho Barone et al., 2024). O diagnóstico é obtido através de exames específicos, como o teste respiratório de hidrogênio expirado considerado o padrão ouro e o teste de curva glicêmica. Esses exames ajudam a determinar com precisão os sintomas e o tratamento, que deve ser individualizado conforme o histórico clínico (Oliveira et al., 2019).

É importante destacar que a IL é frequentemente confundida com a alergia ao leite, que é uma resposta imunológica às proteínas do leite, como a caseína. A principal diferença entre essas duas condições reside na origem e no mecanismo das reações: enquanto a intolerância à lactose envolve o sistema digestivo e a incapacidade de digerir o açúcar do leite, a alergia ao leite envolve o sistema imunológico (Carvalho et al., 2022).

Desse modo, a IL leva a sintomas gastrointestinais, como gases, inchaço, cólicas e diarreia. Por outro lado, a alergia à proteína do leite pode provocar uma variedade de sintomas, que vão desde erupções cutâneas e dor abdominal até reações mais graves, como anafilaxia. Na intolerância, geralmente é possível consumir pequenas quantidades de laticínios, especialmente se forem produtos sem lactose. Em contraste, na alergia, é necessária a exclusão total do leite e de seus derivados da dieta, com acompanhamento médico rigoroso (Silva; Coelho, 2024).

No Brasil, a prevalência da IL é significativamente elevada. Um estudo com 567 adultos identificou que a forma primária da condição afeta cerca de 57% dos brancos e mulatos, e 80% dos negros. Outro levantamento aponta que 60,8% da população do Sudeste apresenta intolerância (Batista et al., 2018). Embora o SUS disponibilize exames diagnósticos, ainda não existem políticas públicas efetivas que garantam o fornecimento gratuito de alimentos sem lactose ou suplementos enzimáticos, o que contribui para o agravamento das desigualdades sociais e alimentares.

Dessa maneira, propõe-se, por meio deste artigo, a realização de uma revisão bibliográfica baseada em evidências científicas, voltada principalmente aos estudantes de graduação da área da Saúde, com o intuito de ampliar o conhecimento sobre a fisiopatologia da intolerância à lactose. O trabalho tem como objetivo analisar os aspectos fisiológicos e clínicos da condição, com ênfase na atuação dos enterócitos na produção da enzima lactase, além de discutir os impactos sociais e econômicos associados, especialmente no contexto da indústria de alimentos e da acessibilidade no sistema público de saúde brasileiro (SUS)

METODOLOGIA

Este trabalho trata-se de uma revisão bibliográfica narrativa, de caráter descritivo e exploratório, com o objetivo de reunir e analisar informações científicas sobre os aspectos fisiológicos, clínicos, epidemiológicos e sociais relacionados à Intolerância à Lactose. Para a construção do referencial teórico, foram selecionados artigos científicos publicados entre os anos de 2015 a 2025, disponíveis em bases de dados como SciELO, PubMed, Google Acadêmico e LILACS. Os descritores utilizados na busca foram: Intolerância à Lactose, lactase, enterócitos, diagnóstico, tratamento, indústria alimentícia e impactos sociais. A seleção dos estudos considerou a relevância para os objetivos do trabalho, a atualidade das informações e a qualidade metodológica das publicações. Foram incluídos artigos em português, inglês e espanhol. Fontes institucionais e documentos oficiais também foram utilizados para complementar os dados epidemiológicos e políticas de saúde pública no Brasil.

DESENVOLVIMENTO

O leite é rico em proteínas de alto valor nutricional, vitaminas e minerais, como o cálcio e o fósforo, dessa forma, nota-se uma forte presença desses nutrientes em grande parte de seus produtos derivados. Por isso, eliminá-lo totalmente da alimentação pode trazer prejuízos nutricionais, por exemplo, aumentar o risco de osteoporose e raquitismo, doenças que comprometem a densidade óssea e a força. De acordo com Branco (2018), em seu texto “Classificação da intolerância à lactose: uma visão geral”, para evitar esse tipo de deficiência, “é recomendado que seja realizada a reintrodução da lactose na dieta de forma gradual, respeitando a tolerância e os sintomas de cada pessoa”. Ou seja, o consumo do leite ou de seus derivados, mesmo que limitado, é fundamental para prevenir doenças ósseas e garantir saúde a longo prazo.

Além disto, segundo o texto “Lactose em alimentos industrializados: avaliação da disponibilidade da informação de quantidade”, no Brasil, a prevalência da intolerância à lactose afeta aproximadamente de 57% dos brancos e mulatos e 80% dos negros. No Sul do país, um estudo com 1.088 indivíduos revelou uma prevalência de 44,1%. Já na região Sudeste, os dados indicam que 60,8% da população apresenta essa condição.

Em um processo de digestão normal, a lactose é reconhecida pelos enterócitos, que liberam a lactase, promovendo a digestão da lactose e a subsequente absorção dos açúcares resultantes que são transportados para a corrente sanguínea e levados ao fígado para serem utilizados como fonte de energia ou armazenados. Sobre esse processo, o Estudo complementar em gastroenterologia: Aspectos anatômicos e Clínicos diz:

Com relação à lactose, que é o principal carboidrato presente nesse alimento, a sua digestão ocorre no intestino delgado, dependendo da enzima lactase, uma β-galactosidase localizada na borda em escova dos enterócitos e mucosa intestinal. Sua função é hidrolisar em dois monossacarídeos simples: glicose e galactose (UNIFENAS, 2017, p. 78-79) (Figura 1)

Figura 1: Representação esquemática dos dois açúcares simples.

https://lh7-rt.googleusercontent.com/docsz/AD_4nXfSC_8qVOgdbCZLNCwoCg4Q4CI3znEL7yZ8CgkSKAVNghZftKbkmsWW-h3VlNF9bIw5freaHsXE6XPuPvdfWZdggSANVPoqIfyoRhSDlnKX_f_xf9poJ1qud_jQ3xXrNaXp3Y7h?key=56aD9FEsohOlADQYjtTlC4Mb
Fonte: IGASTROPED – Instituto de Gastroenterologia Pediátrica de São Paulo. Intolerância à Lactose: História, Genética, Prática Clínica, Diagnóstico e Tratamento.

Esses monossacarídeos simples são essenciais para o fornecimento de energia. Os enterócitos não apenas absorvem nutrientes, mas também secretam enzimas que atuam na digestão final dos alimentos. Uma das enzimas produzidas por eles é a lactase, e sua deficiência resulta na intolerância à lactose. Isso evidencia como a presença dos enterócitos tem relevância nas pesquisas sobre essa condição. Como ressalta Yang em seu texto: Avanços na interação do epitélio intestinal e da microbiota intestinal.

A importância dos enterócitos vai além da absorção de nutrientes. Eles são essenciais para a saúde intestinal e o equilíbrio da microbiota, mantendo a integridade do epitélio através de junções apertadas e colaborando com outras células intestinais, como as células de Paneth, caliciformes. Essas interações reforçam a defesa contra patógenos e facilitam a tolerância imune à microbiota comensal (YANG et al., 2025)

Esses enterócitos são células epiteliais localizadas na mucosa do intestino delgado, e sua principal função é a absorção de nutrientes. Essas células possuem microvilosidades apicais, formando a chamada “borda em escova”, que aumenta significativamente a superfície de contato com o quimo (mistura pastosa de alimento parcialmente digerido com suco gástrico produzido no estômago). Essa estrutura permite a absorção eficiente de aminoácidos, monossacarídeos e ácidos graxos. Conforme descrito por Montanari (2023, p. 8), “as células epiteliais com microvilosidade são chamadas enterócitos que contém várias enzimas, como peptidases, dissacarídeos (lactase, sacarase e maltase), lipases e fosfatase alcalina. Essas células finalizam a digestão e realizam a absorção dos nutrientes”.

Para facilitar a visualização da estrutura e função dessas células, apresenta-se a seguir uma ilustração que evidencia características morfológicas dos enterócitos.

Figura 2: Representação esquemática da morfologia dos enterócitos, destacando sua localização na mucosa do intestino delgado e a presença de microvilosidades na superfície apical.

https://lh7-rt.googleusercontent.com/docsz/AD_4nXdQ-B-S-NEaEFEYCE5nDCVDPeLVANMiGQDSkGT4QGjbldipHSb7HrJjQBoaNtGdRHCaQr7iMDYKDMyWgOBGyGsZ4TpUTbqg5hpoRWnnCqcU4uyJ-6jZeFc3kIbU8mUuu5SN248LFQ?key=56aD9FEsohOlADQYjtTlC4Mb
Fonte: MEGIAS, et al.,2023

No entanto, em pessoas com intolerância à lactose, a produção de lactase é insuficiente. Quando a lactase não está disponível em quantidade suficiente, a lactose não é adequadamente digerida e permanece no intestino delgado, onde pode causar sintomas gastrointestinais, como gases, inchaço, cólicas e diarreia. Além disso, alterações na estrutura das microvilosidades dos enterócitos podem estar associadas a processos inflamatórios, agravando a condição de intolerância.

Existem três tipos de intolerância à lactose, começando pela primária, que está relacionada principalmente à diminuição natural da produção de lactase no organismo. A secundária, que ocorre devido a lesões no intestino delgado causadas por doenças como gastroenterite, doença celíaca, Crohn, colite ulcerativa, dentre outros e a terceira forma desta condição é mais rara é transmitida de forma congênita, por meio de uma herança autossômica recessiva, sendo causada por mutações que alteram os alelos do gene que codifica a lactase.

Na intolerância primária, os enterócitos apesar de estarem estruturalmente íntegros, há uma diminuição fisiológica da produção da enzima lactase, determinada geneticamente. Isso ocorre porque, com o avanço da idade, a expressão do gene responsável pela produção da lactase é reduzida, tornando o organismo menos capaz de digerir a lactose.

A intolerância à lactose secundária surge como um reflexo de algo mais profundo acontecendo no organismo. Diferente da forma primária, que ocorre naturalmente ao longo da vida, essa variação é provocada por agressões diretas ao intestino delgado, onde é produzida a enzima lactase. Quando essa região está inflamada ou lesionada por doenças como gastroenterite, doença celíaca, colite ulcerativa ou doença de Crohn os enterócitos, células responsáveis pela produção da lactase, ficam comprometidos em sua função.

A intolerância congênita à lactose é uma condição extremamente rara, causada por mutações no gene. Ela é herdada de forma autossômica recessiva, ou seja, para que a doença se desenvolva, os pais precisam ser portadores dessa mutação. Dessa forma, essa condição é mais frequente em populações pequenas ou em relações consanguíneas, por exemplo, e manifesta-se logo nos primeiros dias após o nascimento, quando o recém-nascido começa a ser alimentado com leite materno ou fórmulas contendo lactose. Os sintomas aparecem de forma intensa e imediata, incluindo diarreia aquosa grave, desidratação e irritabilidade.

Nessa forma de intolerância, os enterócitos apesar de formados não produzem lactase funcional, impossibilitando completamente a digestão da lactose. Como consequência, o bebê não consegue ganhar peso e apresenta sinais de desnutrição rapidamente, exigindo uma mudança imediata na dieta, com fórmulas sem lactose.

Reconhecer os tipos de intolerância à lactose permite não apenas oferecer um tratamento mais eficaz, mas também promover qualidade de vida e bem-estar aos indivíduos afetados, desde os primeiros dias de vida até a vida adulta.

Portanto, o estudo dos enterócitos e da lactase não só aprofunda a compreensão sobre a intolerância à lactose, como também evidencia a importância científica das investigações nesse campo, com potencial para melhorar a qualidade de vida dos indivíduos afetados e fortalecer a saúde intestinal.

Os sintomas clínicos da intolerância à lactose (IL) variam de acordo com o grau de deficiência enzimática e a sensibilidade individual, e que variam em intensidade conforme a quantidade de lactose ingerida e a tolerância de cada indivíduo. Dentre os mais comuns, destacam- se:

Os principais sintomas da IL são: dores abdominais, fezes fétidas, pastosas, enrijecidas e náuseas. Pela variabilidade de sintomas e de acordo com cada organismo, pode-se ser diferenciado em razão de fatores presentes nos alimentos, como gordura e osmolaridade, pois conduzem a redução do esvaziamento gástrico, encurtando a severidade dos sintomas. Entretanto, sobre o tempo de ação dos sintomas, podem chegar a minutos ou horas para o aparecimento (BRANCO et al., 2018).

A Organização Mundial da Saúde recomenda a amamentação exclusiva nos primeiros seis meses de vida, pois muitos problemas de saúde relacionados à nutrição podem ser evitados com a prática adequada do aleitamento materno e a introdução correta da alimentação complementar, mantendo a amamentação até os dois anos ou mais. O leite materno fornece não apenas todos os nutrientes essenciais, mas também anticorpos que reforçam o sistema imunológico do bebê, protegendo-o contra infecções respiratórias e gastrointestinais. Segundo o Ministério da Saúde (2015), “o aleitamento materno é a mais sábia estratégia natural de vínculo, afeto, proteção e nutrição para a criança e constitui a mais sensível, econômica e eficaz intervenção para redução da morbimortalidade infantil”. Embora existam casos raros de hipogalactia, a maioria das dificuldades com a amamentação está relacionada a fatores emocionais e culturais.

Dessa forma, realizando o acompanhamento nutricional da Intolerância à Lactose, deve-se priorizar a amamentação, buscando alternativas alimentares que ofereçam valores nutricionais durante o tratamento.

O sistema Único de Saúde (SUS) desenvolve, por meio de programas como a Rede Cegonha suporte às mães e gestantes, promovendo acesso à informação e cuidados adequados. No entanto, apesar de disponibilizar exames diagnósticos, ainda não existem políticas públicas efetivas que garantam o fornecimento gratuito de alimentos sem lactose ou suplementos enzimáticos. Essas iniciativas são essenciais para assegurar que todas as crianças tenham acesso a uma alimentação saudável e adequada, afinal reconhecer os tipos de intolerância à lactose permite não apenas oferecer um tratamento mais eficaz, mas também promover qualidade de vida e bem-estar aos indivíduos afetados, desde os primeiros dias de vida até a vida adulta.

TESTES E DIAGNÓSTICOS

Dentre os testes disponíveis para diagnosticar a IL, estão o de curva glicêmica e hidrogênio expirado. Com relação ao teste de curva glicêmica, é realizado inicialmente através de jejum, sendo recomendado em torno de 10 horas. Nisso, para o paciente realizar o exame, é necessário ingerir uma quantidade específica de lactose (20-25 g), com pausas entre 30, 60 e 90 minutos, resultando na medição da quantidade de glicose contida no sangue. Assim, após finalizar a coleta sanguínea, é avaliado se ocorreu um aumento da glicemia basal menor que 20 mg/% durante o exame, podendo diagnosticar a Intolerância à Lactose (BRANCO, et al. 2018). Já o teste de hidrogênio expirado, o jejum deve ser entre 8 e 12 horas, sendo recomendado algumas restrições, como não fumar, evitar a prática de atividades físicas, ingestão de leite, entre outros; para obter precisão no diagnóstico sem interferência (REZAIE et al., 2017). Em suma, para a realização do teste, é necessário que o paciente consuma 25g de lactose. Com isso, em casos de menor absorção, quando a lactose entra no intestino grosso, ocorre a confecção do hidrogênio que passa pela mucosa intestinal, segue para o sangue e consequentemente é excretado através dos pulmões. Assim, a análise desse ar ocorre a cada trinta minutos. Desse modo, é utilizado como referência o valor basal, o qual é menor que 20 ppm (partes por milhão) do hidrogênio, sendo comparado com valor obtido através das amostras de ar e caso ocorra o aumento de 20 ppm em torno de 3 horas, pode-se resultar em positivo para Intolerância à lactose (MISSELWITZ et al., 2019).

TRATAMENTO

Como visto anteriormente, a intolerância à lactose requer cuidados especiais que envolvem não somente uma dieta e medicamentos, mas também o acompanhamento médico, a orientação nutricional e o desenvolvimento de um planejamento alimentar personalizado para indivíduos intolerantes. Esse tratamento frequentemente começa com a diminuição da ingestão de leite e de seus derivados. Deve-se, contudo, se atentar na exclusão total destes alimentos, para que não ocorram complicações no diagnóstico do paciente, como deficiências nutricionais, a guisa de exemplo. Sobre isso, Silva Diz:

Por isso, é importante consumir menores quantidades durante o dia e se possível em conjunto com outros alimentos para minimizar os sintomas. Assim, há produtos com menor composição de lactose, como por exemplo: leites fermentados. Por outro lado, diversos alimentos podem funcionar como opções para reposição de cálcio, como feijão, brócolis, espinafre e outras verduras escuras (SILVA et al., 2020).

Outra alternativa eficaz para o tratamento é o uso da enzima lactose exógena (+β-galactosidase), que deve ser administrada por via oral antes das refeições, repondo-a no organismo. Isso pode auxiliar na redução dos sintomas, a fim de evitar também deficiências nutricionais futuras quando introduzida da forma correta e indicada pelo médico especializado.

Portanto, vale ressaltar que o acompanhamento de um farmacêutico também é muito importante. Segundo a RDC n° 98, de 01 de agosto de 2016, Art. 2º, inciso I, “é permitido dispensar medicamentos isentos de prescrição (MIPs)”, e assim, esse profissional pode sugerir medicamentos específicos para aliviar os desconfortos causados pela IL, como a Simeticona que auxilia na redução de gases, e Buscopan, para alívio da dor abdominal, mas seguindo também uma avaliação médica especializada. Nesse sentido, caso ocorra com frequência os sintomas, mesmo com a utilização da enzima e dieta com a diminuição da lactose, pode-se averiguar se está pressuposto outras doenças, como por exemplo, a síndrome do intestino irritável.

DISCUSSÃO

Sobre a Intolerância à Lactose (IL) destaca-se a importância do diagnóstico correto da condição e suas implicações na saúde e qualidade de vida dos afetados. A IL resulta da deficiência da enzima lactase, causando sintomas gastrointestinais que impactam o cotidiano no Brasil, especialmente entre diferentes grupos étnicos, ressaltando a necessidade de uma abordagem informada e inclusiva.

Além disso, é crucial distinguir entre intolerância à lactose e alergia à proteína do leite, já que essa confusão pode levar a diagnósticos incorretos e tratamentos ineficientes. A ausência de políticas públicas estruturadas para garantir o acesso a alimentos isentos de lactose e suplementos enzimáticos agrava as desigualdades sociais e limita as opções alimentares das populações mais vulneráveis. Essa lacuna pode causar não apenas deficiências nutricionais, mas também exclusão social, estigmatização e impactos psicológicos, especialmente em crianças e adolescentes.

Apesar disto, nota-se que o Sistema Único de Saúde (SUS) oferece suporte a gestantes e mães por meio de programas gratuitos, como a Estratégia Saúde da Família, Rede Cegonha e campanhas como o Agosto Dourado, que ocorre anualmente com o objetivo de promover e valorizar a amamentação. O mês de agosto foi escolhido para conscientizar a sociedade sobre a importância do leite materno, que visa promover um cuidado integral e contínuo desde o prénatal até os primeiros anos de vida da criança. O dourado, cor do símbolo da campanha, representa o padrão ouro da alimentação infantil. Esses programas garantem o acompanhamento de profissionais de saúde, fornecem orientações sobre amamentação, alimentação complementar e identificação precoce de alergias e intolerâncias alimentares. Esses cuidados deveriam ser amplamente difundidos e estendidos a toda população para garantir um cuidado integral e humanizado às mães e seus filhos.

O uso de enzimas exógenas, por exemplo, quando feito sem a devida orientação profissional, pode levar à automedicação ineficaz ou à falsa sensação de segurança alimentar. Por isso, a atuação de uma equipe multidisciplinar é fundamental. A colaboração entre médicos, biomédicos , nutricionistas e farmacêuticos é essencial para desenvolver planos de tratamento individualizados, baseados na avaliação clínica e no estilo de vida de cada paciente.

Consequentemente, a ausência de apoio institucional mais abrangente contribui para a perpetuação do problema. A promoção de pesquisa e educação em saúde é fundamental não apenas para aumentar a conscientização sobre a intolerância à lactose, mas também para desenvolver estratégias de intervenção que melhorem a qualidade de vida dos indivíduos afetados e promovam ambientes mais inclusivos, onde haja acesso equitativo a informações, diagnósticos e alternativas alimentares adequadas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante disso, este estudo permitiu uma compreensão mais ampla sobre a intolerância à lactose e os processos fisiológicos relacionados à deficiência da enzima lactase, produzida pelos enterócitos no intestino delgado. para a digestão da lactose. A condição vai além dos sintomas gastrointestinais, impactando a qualidade de vida e o bem-estar nutricional dos pacientes. O diagnóstico preciso é fundamental para diferenciar a intolerância de outras condições, como a alergia à proteína do leite. Além das adaptações alimentares, o suporte de profissionais de saúde é essencial para oferecer orientações adequadas e humanizadas. Alterações nos enterócitos, causadas por fatores genéticos, inflamatórios ou infecciosos, podem reduzir a produção de lactase, agravando os sintomas. Compreender o papel dos enterócitos contribui para práticas clínicas mais empáticas e para a formação acadêmica. Por fim, a revisão reforça a necessidade de educação em saúde, pesquisa e políticas públicas que garantam acesso ao diagnóstico, tratamento e alimentação adequada, promovendo melhor qualidade de vida para os afetados.

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Projeto de pesquisa apresentado ao curso de Farmácia do Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocínio como requisito para obtenção do grau de bacharel em Farmácia, sob a orientação da Profa. Vivian Araújo Barbosa de Oliveira e Co-orientação da Msc. Mariana Cruz Delcorso

1 Alunos do Curso de Farmácia do Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocínio (CEUNSP - Cruzeiro do Sul).