INTERVENÇÃO PRECOCE NO AUTISMO EM RELAÇÃO AO DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM

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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.12697111


Valquíria Aparecida Trevesani1


RESUMO
O Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) é um distúrbio do desenvolvimento neurológico, caracterizado por um conjunto de condições comportamentais com comprometimentos em dois domínios principais: sociocomunicativos e comportamentais, com o aparecimento de sintomas que ocorrem desde o nascimento ou precocemente na infância. Os tratamentos baseados nos princípios da ciência da análise de comportamento aplicada (Applied Behavior Analysis - ABA) demonstraram ser eficientes, permitindo melhorias significativas na comunicação e, consequentemente, melhor qualidade de vida para esses pacientes. Qualquer proposta de intervenção pode ser considerada mais eficiente ou produtiva que outras. Desta forma, o objetivo geral da pesquisa é analisar a eficácia da intervenção precoce no autismo em relação ao desenvolvimento da linguagem. Neste trabalho foram utilizadas as bases Scielo, Lilacs, Medline, Portal CAPES e Google Academics nos últimos 10 anos, para a investigação. Até agora as evidências não permitem concluir que uma intervenção psicossocial é superior a outra; é importante não ignorar o papel de estratégias terapêuticas, como as mediadas pelos pais, que demonstraram alguma evidência para o bem-estar das crianças com TEA e suas famílias. Da mesma forma, deve-se lembrar da utilidade de intervenções farmacológicas no controle de alguns sintomas que facilitam a conquista de intervenções psicossociais, como a da ABA.
Palavras-chaves: Transtorno do Espectro Autista. Intervenção Precoce. Análise do comportamento aplicada. Linguagem.

1 INTRODUÇÃO

Os distúrbios do espectro do autismo (TEA) são distúrbios do desenvolvimento neurológico definidos por níveis prejudiciais de comprometimento social e de comunicação, juntamente com padrões repetitivos e estereotipados de comportamento e interesses, de acordo com a American Psychiatric Association (APA, 2013). A idade média do diagnóstico nos EUA é de 4 anos (CHRISTENSEN et al., 2016). No entanto, o TEA pode ser detectado a partir dos 14 meses de idade em algumas crianças (LANDA et al., 2013); a estabilidade do diagnóstico é alta aos 18 meses de idade, embora muitas crianças com sinais de risco para TEA não sejam detectadas ou diagnosticadas nessa idade (OZONOFF et al., 2015). A capacidade de detectar o risco de TEA em idades mais jovens está aumentando a demanda por serviços de intervenção precoce (IP). Para apoiar a tomada de decisão de IP dos clínicos, a literatura de IP, conforme relatada nos últimos 10 anos, é revisada aqui.

O Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) é um distúrbio do desenvolvimento neurológico, caracterizado por um conjunto de condições comportamentais com comprometimentos em dois domínios principais: sociocomunicativos e comportamentais (comportamentos restritos ou repetitivos), com o aparecimento de sintomas que ocorrem desde o nascimento ou precocemente na infância. Essa definição é baseada na nova classificação descrita no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5) (APA, 2013), que padroniza o diagnóstico e visa aumentar a especificidade do diagnóstico de TEA. Nessa nova classificação, autismo clássico, transtorno de Asperger, distúrbio desintegrativo infantil e distúrbio do desenvolvimento sem outra especificação estão incluídos no TEA (ASSUMPÇÃO JÚNIOR, 2015).

As alterações de linguagem, embora não sejam um critério diagnóstico exclusivo para o autismo, desempenham papel central na caracterização do TEA, pois geralmente há atrasos e desvios no desenvolvimento do autismo, observando maior comprometimento no nível pragmático e nos aspectos não verbais. É possível notar ainda nos primeiros meses de vida a ausência de contato ocular, número reduzido de gestos e expressões faciais, tagarelice e resposta a sons (KLINTWALL et al., 2012).

Além disso, precursores da linguagem falada, como a capacidade de imitar comportamentos, brincar com objetos e atenção compartilhada (atenção triádica), são prejudicados em crianças com autismo. Também são observadas ecolalia (imediata ou tardia), uso inadequado de pronomes, estrutura gramatical imatura e rigidez de significados (LOCATELLI, SANTOS, 2016).

Os tratamentos de primeira linha para crianças e adolescentes com autismo devem incluir tratamentos psicossociais e intervenções educacionais, com o objetivo de maximizar a aquisição da linguagem, melhorar as habilidades sociais e comunicativas e acabar com comportamentos desruptivos. Apesar do apoio empírico limitado, o tratamento psicofarmacológico parece ser comum na prática clínica e tem como alvo sintomas específicos que acompanham os sintomas nucleares e que prejudicam gravemente o funcionamento do indivíduo. Isso geralmente não permite intervenções educacionais e comportamentais (agressão, comportamento autodestrutivo, rituais compulsivos, baixa tolerância à frustração com ataques explosivos, hiperatividade etc.) (ASSUMPÇÃO JÚNIOR, 2015).

Os tratamentos baseados nos princípios da ciência da Análise do Comportamento Aplicada (Applied Behavior Analysis - ABA) demonstraram ser eficientes, permitindo melhorias significativas na comunicação e, consequentemente, melhor qualidade de vida para esses pacientes.

Desta forma, o objetivo geral da pesquisa é analisar a eficácia da intervenção precoce no autismo em relação ao desenvolvimento da linguagem.

O seguinte trabalho se classifica como uma revisão de literatura definida por Gil (2008) como aquela que utiliza textos (ou outro material intelectual impresso ou gravado) como fontes primárias para obter seus dados. Não é apenas uma coleção de dados contida em livros, mas, ao contrário, concentra-se na reflexão inovadora e crítica de certos textos e dos conceitos levantados neles, no qual foi realizada uma consulta a livros, dissertações e por artigos científicos selecionados através de busca nos seguintes base de dados (livros, sites de banco de dados, etc...). Neste trabalho foram utilizadas as bases Scielo, Lilacs, Medline, Portal CAPES e Google Academics para a investigação. O período dos artigos pesquisados serão os trabalhos publicados nos últimos “10” anos. As palavras-chave utilizadas na busca foram: “transtorno do espectro autista”, “intervenção precoce”, “TEA” e “Linguagem”. “Análise do comportamento aplicada”.

2 TRANSTORNO DE ESPECTRO AUTISTA (TEA)

Nos últimos anos, tem havido um interesse crescente de pesquisa na detecção precoce de sinais de transtorno do espectro do autismo (TEA) em bebês e crianças pequenas. A detecção precoce do TEA pode oferecer uma oportunidade importante para intervenção oportuna, considerada essencial para alcançar os melhores resultados (KLINTWALL et al., 2012). Neste capítulo descreve-se brevemente o transtorno do espectro autista e sua influência na linguagem e comunicação.

2.1 BREVE DESCRIÇÃO DO TRANSTORNO DE ESPECTRO AUTISTA (TEA)

Kanner descobriu o "autismo infantil precoce" baseado no estudo de 11 crianças que apresentaram "(a) falta de habilidade, desde o início da vida, de se relacionar com pessoas e situações de maneira comum e (b) um desejo obsessivo e ansioso pela preservação da rotina "(KANNER, 1971, p.140). Ele sugeriu a possibilidade de um determinante cultural-ambiental na etiologia do transtorno, observando que as famílias das crianças estudadas, embora tivessem interesse nos campos artístico e intelectual, não demonstraram interesse pelo povo.

No ano seguinte, em 1944, Asperger reconheceu a "psicopatia autista", observando um grupo de crianças teve o desenvolvimento da linguagem adequada e, muitas vezes avançado para sua idade, mas mostrou dificuldade na reciprocidade social e emocional. Ao apresentar certas semelhanças com autismo infantil Kanner, Asperger disse que ele estava falando de diferentes entidades, uma vez que o problema fundamental do autismo é a interação social, enquanto a psicopatia autista comportamentos estereotipados e restritos predominam. O autismo também foi entendido como sendo uma forma de completa ausência de fronteira psíquica devido à falta de diferenciação entre o animado e o inanimado (ALEXANDRE, 2010).

No DSM-5 (2014) o Transtorno do Espectro Autista está incluído nos transtornos do neurodesenvolvimento, caracterizado por deficiências persistentes na comunicação e interação social em vários contextos; padrões repetitivos de comportamento, interesses ou atividades (movimentos, fala ou uso de objetos estereotipados, inflexibilidade a rotinas, hiper ou hiporreatividade a estímulos sensoriais). Incluído dentro do TEA autismo infantil, Kanner autismo, autismo de alto funcionamento, autismo atípico, transtorno invasivo do desenvolvimento não especificado de outro modo, desordem desintegrativa da infância e da desordem de Asperger. O referido manual afirma que os sintomas devem ser apresentados nas primeiras fases do período de desenvolvimento e causar uma deterioração significativa no trabalho, social, etc. As manifestações do distúrbio variam de acordo com o nível de desenvolvimento, a idade cronológica e a gravidade da afecção autista, a que o termo espectro é devido (DSM-5, 2014).

Existem diferenças entre os autores sobre a definição de autismo, de acordo com a manifestação do distúrbio que se destaca (distúrbio de comunicação - Kanner, distúrbio de linguagem - Mazet e Lebovici). Vemos como a dimensão da inclusão social aparece desde as primeiras concepções sobre diagnóstico. (COSTA, 2017)

Pessoas com TEA costumam ter sintomas secundários associados, como distúrbios alimentares, convulsões, impulsividade, hiperatividade, distúrbios do sono. É comum observar comportamentos inadequados em pessoas com TEA. Estes podem ser externalizantes como choro, gritaria, birra ou auto e heteroagressão, ou internalizando onde tendem a inibir a ação: negativismo, retração, etc. A intervenção sobre comportamento inadequado consiste em substituí-lo por um mais adequado, ensinando assim à pessoa uma forma alternativa de comunicação. O que impressiona nos TEAs não é a linguagem limitada ou a falta dela relacionada à sua idade, mas a ausência de comportamentos sociais tão característicos do ser humano. Isso abre o desafio de pensar sobre a inclusão educacional dessas crianças, seus benefícios e dificuldades em nosso meio ambiente. (ALEXANDRE, 2010)

O desenvolvimento cognitivo de pessoas com TEA apresenta dificuldades principalmente na área da imaginação e na capacidade de simbolização. Na maioria há ausência de brincadeiras simbólicas e padrões de jogos repetitivos são dados. Essas dificuldades e características devem ser levadas em consideração no processo de ensino dessas crianças (ASSUMPÇÃO JÚNIOR, 2015).

Alguns estudos investigaram o tamanho da amígdala em crianças de 2,5 anos de idade em risco de desenvolver autismo em comparação com crianças com desenvolvimento típico usando ressonância magnética. Eles descobriram que as crianças com autismo tinham supercrescimento tonsilar, desenvolvendo-se antes dos 3 anos. Esses achados nos permitem compreender as dificuldades na regulação emocional que as crianças com TEA apresentam. No nível bioquímico, foram encontradas alterações na transmissão serotoninérgica e de outros neurotransmissores (KLINTWALL et al., 2012).

A educação no tratamento de crianças com TEA tem como objetivo melhorar suas habilidades de comunicação e conhecimento social e alcançar maior controle sobre seu comportamento, bem como sobre o comportamento adequado ao meio ambiente. Ao ensinar um conceito ou habilidade para executar uma tarefa, ela deve ser treinada em seu uso de uma maneira funcional, espontânea e apropriada. (ALEXANDRE, 2010).

Sabe-se que existem muitas áreas alteradas em uma criança com TEA, sendo diferentes em cada caso. É por isso que essas distinções devem ser levadas em conta ao propor uma intervenção terapêutica ou educacional. Como exemplo, mesmo em um curto período de dois anos de escolaridade, melhora o desenvolvimento educacional de crianças com TEA; e deve-se notar que aqueles que apresentam um progresso educacional tendem a um melhor prognóstico (COSTA, 2017).

Os métodos de intervenção das crianças com autismo, segundo Assumpção Júnior (2015), devem ser estruturados e baseados no conhecimento desenvolvido pela modificação do comportamento; devem ser evolutivas e adaptadas às características pessoais dos alunos, funcionais e com definição explícita de sistemas de generalização; e devem envolver a família e a comunidade, sendo intensivas e precoces.

As pessoas com autismo geralmente têm dificuldades em tomar iniciativas na comunicação, portanto a intervenção deve priorizar o ensino da expressão das intenções comunicativas e o uso espontâneo e funcional da linguagem. Essa intervenção deverá incentivar a espontaneidade deve ser uma reestruturação dos contextos em que os estudantes se movem, tendo estímulos interessantes para ele e uma diminuição progressiva no estímulo discriminativo que desencadeiam a comunicação, ou seja, para evitar os sinais, perguntas ou ajuda do resto; garantir a generalização da aprendizagem, pois normalmente mantêm a aprendizagem exclusivamente contra os estímulos com os quais estavam associados nos estágios iniciais da aprendizagem; definir objetivos funcionais, desenvolver uma competência linguística; e adaptar-se ao nível atual de desenvolvimento (ALEXANDRE, 2010).

Em relação à aprendizagem de crianças com TEA, Costa (2017) afirma que é necessário elaborar um plano específico baseado em um sistema de planejamento voltado para a pessoa com objetivos claros e mensuráveis. Estratégias visuais como desenhos, fotos ou símbolos auxiliam na aprendizagem, no desenvolvimento da comunicação e na regulação do comportamento de crianças com TEA.

2.2 AUTISMO E LINGUAGEM

Os problemas de comunicação no autismo variam de acordo com o desenvolvimento social e intelectual da pessoa. Alguns têm vocabulários muito ricos e podem estabelecer conversas com tópicos de interesse, e outros não são capazes de falar. Eles podem achar difícil usar a linguagem corretamente e muitos têm dificuldade com o significado da palavra e da frase, o ritmo e a entonação. É frequente que as pessoas com autismo que podem falar falem coisas sem conteúdo ou apresentem ecolalia: repetição de algo ouvido anteriormente (LOCATELLI, SANTOS, 2016).

Alterações na linguagem e comunicação desempenham um papel central na compreensão e tratamento do transtorno do espectro do autismo. A gênese da comunicação e da linguagem está relacionada à aquisição de habilidades e habilidades intersubjetivas e simbólicas. O autismo é essencialmente um distúrbio no qual a afetação das habilidades intersubjetiva e simbólica está localizada no núcleo central do distúrbio (ALEXANDRE, 2010).

A caracterização neuropsicológica das alterações na linguagem que as crianças com TEA sofrem apresenta um grande problema, pois é um salto relacionar comportamentos observáveis com processos alterados e suas correspondentes bases neurológicas. A avaliação dos distúrbios do desenvolvimento cognitivo reflete não apenas os efeitos diretos de alterações neuro funcionais causadas ou não por danos cerebrais, mas também os mecanismos de compensação do sistema nervoso em um contexto de aprendizado. A isto deve ser adicionada a diversidade de graus no contínuo do transtorno do espectro do autismo. Com isso, entende-se a dificuldade de fazer uma abordagem universal às alterações cerebrais apresentadas por pessoas com TEA (ASSUMPÇÃO JÚNIOR, 2015).

Como em muitos outros distúrbios do desenvolvimento, a intervenção precoce no autismo é uma condição necessária para alcançar uma boa qualidade de vida nos anos posteriores e para as pessoas com autismo alcançarem o desenvolvimento da capacidade total. Foi considerado durante anos como um distúrbio com um prognóstico muito ruim e com poucas chances de melhora. No entanto, sabemos hoje que, se houver uma detecção precoce e uma intervenção nos primeiros meses e anos de vida, há margem para enormes melhorias na evolução dessas crianças (DAWSON, BERNIER, 2013). No caso do autismo, o paradigma da intervenção precoce na criança, na família e no meio ambiente é claramente aplicável.

As recomendações gerais para a intervenção do autismo indicam que é necessário agir precocemente e intensivamente com a criança, mas que não faz sentido fazê-lo sem ter sua família e que se deve modificar os ambientes para otimizar seu aprendizado e inclusão. Agora, a intervenção do autismo tem seu próprio conjunto de complexidades e especificidades. Para começar, nos faltam preditores confiáveis, embora inexistentes, durante os primeiros doze meses de vida (GLIGA et al., 2014).

Os objetivos e metas de qualquer intervenção são o ponto de partida dela. No caso do autismo, eles pareceriam óbvios: trata-se de abordar os aspectos nos quais as crianças têm mais dificuldades, otimizar sua qualidade de vida presente e futura. Fica claro, portanto, que é necessário trabalhar com as dimensões que estão mais claramente relacionadas ao diagnóstico do autismo. Isso nos levaria a trabalhar em áreas como dificuldades no desenvolvimento social e falta de flexibilidade cognitiva e comportamental. Portanto, espera-se que qualquer intervenção no autismo atue para limitar o impacto e reduzir dificuldades como as seguintes (CHRISTENSEN et al., 2012):

  • Dificuldades na reciprocidade socioemocional, isto é, problemas para compartilhar interesses ou emoções, ou responder a eles, ou dificuldades em interagir socialmente com os outros.

  • Problemas na comunicação não verbal, como contato visual ou uso de gestos anormais ou problemas de entendimento.

  • Limitações na manutenção de amizades ou falta de interesse em outras crianças.

  • Comportamentos, fala ou uso de objetos repetitivos ou estereotipados.

  • Falta de flexibilidade e aderência a padrões de comportamento, rotinas ou rituais específicos, verbais e não verbais. Interesses altamente restritos e anômalos em sua intensidade.

  • Hipo ou hiper-reatividade a certos estímulos ou interesses muito focados em alguns aspectos do ambiente.

Pessoas com autismo são caracterizadas por seus déficits na capacidade de se comunicar, além de atrasos e desvios em relação ao padrão normal de desenvolvimento da linguagem, mas, devido ao início precoce do quadro, geralmente apresentam alterações severo em diferentes habilidades de comunicação consideradas pré-verbais e básicas para o desenvolvimento subsequente da linguagem. Essas ideias são importantes na medida em que nos dão pistas para focar nossos objetivos em comportamentos que vão além do ensino de idiomas (GONÇALVES et al., 2017).

O desenvolvimento da comunicação está intimamente relacionado ao desenvolvimento social e ao desenvolvimento cognitivo. Meninos e meninas com TEA têm distúrbios sociais e dificuldades cognitivas. Avaliar e intervir na comunicação envolve avaliar e intervir em aspectos sociais e cognitivos.

A raiz da intervenção é considerar a comunicação, entendida como comunicação social, como um conjunto entrelaçado de sequências de ação e reação, seja em um nível simples, atos ou gestos, seja em uma linguagem complexa. O objetivo do profissional será dar intenção e significado às ações do menino ou da menina, ações que existem no seu repertório ou as ensinamos. Que dar intenção e significado, dar sentido aos comportamentos da criança é obtido através das reações que ela percebe nos outros e no ambiente quando as executa; de modo que, quando a criança age e responde de maneira estável a essas ações, ele ou ela percebe que há uma relação causal entre seu ato e a resposta do ambiente. Diríamos que o eixo central da intervenção reside na criação de esquemas de causalidade social nos quais a criança é o ator (CHRISTENSEN et al., 2012).

O autismo é um distúrbio com uma grande diversidade de manifestações, com uma incidência muito variável no desenvolvimento, e que produz as duas mudanças qualitativas no curso evolutivo. As características do transtorno do espectro autista (TEA) incluem déficits persistentes na interação e comunicação social, juntamente com padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades. Muitas das características que permitem um diagnóstico não são muito evidentes nos primeiros anos de vida, mas isso não impede de começar a intervir naquele momento. Uma dificuldade final adicionada é a existência de multiplicidade de intervenções e propostas, muitas das quais são duvidosas (GONÇALVES et al., 2017).

3 INTERVENÇÃO PRECOCE PELA CIÊNCIA ABA (Applied Behavior Analysis)

De acordo com o grau de dificuldade e as peculiaridades do TEA, a intervenção inicial deve se concentrar no desenvolvimento da intenção comunicativa, focando a intervenção nas primeiras funções comunicativas, como a função de solicitação e rejeição, por meio de conteúdos simples, como alimentos, objetos, atividades e ações dos outros e com base na modalidade que a criança sabe usar (LÖHR, ROGERS, DAWSON, 2014).

Também será necessário levar em consideração que, independentemente do nível de desenvolvimento formal que o menino ou menina alcançou, o objetivo inicial de qualquer intervenção será o de promover o aprendizado de formas apropriadas de regulação de outras pessoas, como alternativas para uso de formas inadequadas de comunicação. O ensino de comportamentos comunicativos funcionalmente equivalentes pode gerar mudanças positivas de importância no contexto vital de nossos filhos (LOCATELLI, SANTOS, 2016).

O método ABA (Applied Behavior Analysis) é uma intervenção na qual os princípios da teoria da aprendizagem são aplicados de maneira sistemática e mensurável para aumentar, diminuir, manter ou generalizar determinados comportamentos objetivos, como leitura, habilidades acadêmicas, habilidades sociais, de comunicação e vida cotidiana. Ajuda as crianças a aumentar comportamentos, aprender novas habilidades, manter comportamentos, generalizar ou transferir comportamentos para outra situação, restringir ou diminuir as condições em que os comportamentos desadaptativos ocorrem e reduzir esses comportamentos (MATOS, 2015).

ABA é uma intervenção que utiliza métodos derivados de princípios cientificamente estabelecidos sobre comportamento. Utiliza os fundamentos da teoria da aprendizagem para melhorar as habilidades humanas socialmente significativas. Seu foco e objetivo principal é aumentar a conquista de comportamentos adaptativos e reduzir comportamentos inapropriados, conseguindo uma melhor integração da criança com o ambiente. Sua aplicação requer a participação de um profissional treinado, que deve planejar as estratégias a serem utilizadas em cada caso individual e verificar a evolução comportamental (LÖHR, ROGERS, DAWSON, 2014).

O primeiro passo da abordagem da ABA é realizar uma análise geral dos comportamentos e habilidades do sujeito para intervir; essa avaliação deve incluir diferentes áreas como acadêmica, ocupacional, lazer, autocuidado e social. Embora existam alguns princípios gerais, deve-se ter em mente que cada criança é única e trabalha em um ritmo diferente (MATOS, 2015).

A diretriz geral da intervenção da ciência ABA é a promoção de comportamentos adaptativos e a supressão ou redução daqueles que são perturbadores para si ou para os outros; para isso, utiliza reforços positivos que estimulam o comportamento adequado. Além disso, são criadas múltiplas e repetidas oportunidades para propiciar e praticar os diferentes tipos de habilidades que o paciente adquire. Da mesma forma, busca-se que, à medida que os comportamentos funcionais sejam adquiridos e consolidados, seja gerada uma independência progressiva do terapeuta (CHRISTENSEN et al., 2012).

De acordo com a abordagem da terapia baseada na ciência ABA, na maioria dos casos, comportamentos indesejados são adquiridos; eles são repetidos porque a criança aprendeu que, com sua execução, consegue o que deseja. Para abordar comportamentos inadequados, propõe-se inicialmente uma análise intensiva dos possíveis desencadeadores, que podem ser de origem fisiológica (fome, dor) ou relacionados ao ambiente externo. É então decidido identificá-los mais cedo e evitá-los. Essa estratégia pode ser suficiente em muitos casos; se um gatilho claro não for evidente ou se o comportamento persistir, apesar das correções, é recomendável usar outro tipo de estratégia, como ignorar o comportamento ou aplicar consequências indesejáveis; também ensina a alcançar os mesmos objetivos através de comportamentos mais apropriados (GRANPEESHEH et al., 2010).

De particular importância na análise comportamental de crianças com TEA é identificar se o comportamento que se pretende modificar está cumprindo uma função de comunicação ou socialização, por exemplo, escapando de uma situação aversiva, comunicando uma preferência ou buscando auto estimulação. Em geral, pode-se afirmar que o objetivo geral é tornar o paciente bem-sucedido em suas atividades diárias. A complexidade das atividades aumenta à medida que o paciente obtém os objetivos propostos. Propõe-se o acompanhamento permanente de um analista de comportamento que verifique o progresso ou dificuldades no tratamento e faça as modificações pertinentes (LÖHR, ROGERS, DAWSON, 2014).

Várias técnicas foram propostas para ensinar as diferentes atividades; uma delas é o estudo direto e individualizado (terapeuta - paciente), usando instruções breves e claras, reforçando e repetindo a ação. O ensino e a prática de uma atividade são obtidos dividindo o comportamento complexo em partes mais simples; por exemplo: se você deseja ensinar a criança a lavar as mãos, ela começa indicando que elas devem se aproximar da pia, abra a torneira, molhe as mãos e assim por diante; Não deve ser levado para a próxima etapa sem que a anterior seja realizada satisfatoriamente. À medida que cada etapa é executada, ela deve ser reforçada e, finalmente, após a conclusão de toda a sequência, uma recompensa mais significativa deve ser dada. Depois disso, pode ser praticado em um pequeno grupo, posteriormente em um grupo maior e, finalmente, no ambiente natural da criança (LOCATELLI, SANTOS, 2016).

Após atingir as metas propostas, o plano estratégico deve ser continuado, ou seja, continuar em uma fase de manutenção. Da mesma forma, propõe-se que os efeitos positivos não sejam limitados ao cenário terapêutico, mas generalizados para outros ambientes (LÖHR, ROGERS, DAWSON, 2014).

Quanto às evidências existentes sobre os benefícios da terapia pela ciência ABA, estão disponíveis inúmeras publicações baseadas em pesquisas com diversas metodologias e conclusões. Alguns guias internacionais sobre TEA recomendam seu uso em crianças e adolescentes (APA, 2013).

Granpeesheh et al. (2010) realizaram uma revisão sobre a aplicação de ABA em crianças com TEA. Esses autores diferenciam as intervenções ABA para crianças pequenas (crianças em idade pré-escolar) e para crianças mais velhas ou adolescentes. No primeiro grupo, eles falam sobre intervenção precoce, ou seja, o início da ABA em tenra idade; nesse tipo de abordagem, trabalhamos nas áreas de habilidades sociais, brincadeiras, realizações motoras, idioma, habilidades acadêmicas e promoção da vida independente. A busca realizada leva-os a concluir que a intervenção precoce leva a conquistas significativas nas diferentes áreas submetidas à intervenção, esclarecendo que não há informações suficientes sobre a intensidade e a duração da terapia; no entanto, extrapolam os achados de alguns estudos e propõem a opção de garantir uma intensidade entre 30 e 40 horas por semana e uma duração total de mais de 2 anos. Por outro lado, em crianças mais velhas e adolescentes, eles comentam que a ABA visa solucionar problemas específicos; dada a falta de pesquisas, eles mencionam que não é possível gerar recomendações. Por fim, enfatizam a importância de uma comunicação adequada entre a área da psiquiatria e os profissionais treinados da ABA, uma vez que a interdisciplinaridade beneficia o paciente.

Em outra publicação, Foxx (2008), fornece uma descrição completa sobre os fundamentos e processos da ABA em crianças com TEA; observa que existem provas exaustivas a este respeito, baseadas na trajetória histórica da sua aplicação nesses pacientes, com mais de 40 anos; por outro lado, indica que é a única abordagem terapêutica endossada pelo Departamento de Saúde do Estado de Nova York e pelo Cirurgião Geral dos Estados Unidos.

Alguns estudos e revisões documentam benefícios no QI, funcionalidade adaptativa, comportamento motor, linguagem e funcionamento geral, porém questionam o rigor metodológico e, portanto, a validade e a confiabilidade desses resultados (LÖHR, ROGERS, DAWSON, 2014).

Lindgren et al. apresentaram uma pesquisa com o objetivo de avaliar a eficácia da ABA na redução dos comportamentos desafiadores de 107 crianças diagnosticadas com TEA cuja idade média foi de 50 meses. Os autores observaram a eficácia da intervenção, independentemente de o treinamento para os pais ser presencial ou virtual. Esse tipo de intervenção persegue, através de reforço positivo, extinção, tempo limite ou punição, estabelecendo comportamentos adaptativos e eliminando comportamentos problemáticos em crianças com autismo. Além disso, defende a intervenção precoce e o treinamento dos pais nas técnicas de modificação de comportamento. Lindgren et al. (2016) destacam os efeitos positivos da ciência ABA sobre problemas comportamentais manifestados por crianças com TEA entre 21 e 84 meses.

Ejiyeh et al. (2015) fizeram uma meta-análise sobre a eficácia da terapia comportamental em crianças iranianas diagnosticadas com TEA. Os autores revisaram um total de 142 artigos publicados entre 2005 e 2013, destacando, finalmente, o efeito positivo da ABA no tratamento de crianças diagnosticadas com autismo. Com as mesmas conclusões, Vismara e Rogers (2010) apresentaram um estudo que mostra a eficácia da terapia comportamental no tratamento do autismo. Os autores enfatizam que duas das características que garantem a eficácia da análise comportamental aplicada são o início precoce (antes dos cinco anos) e a natureza intensiva (pelo menos vinte horas de intervenção por semana, durante pelo menos dois anos).

Um estudo realizado na Califórnia, EUA, determinou que a terapia intensiva de intervenção precoce é eficaz para melhorar as habilidades de percepção e linguagem em crianças com autismo a partir dos 18 meses. Além disso, ele normaliza sua atividade cerebral e melhora suas habilidades sociais. Especificamente, este estudo randomizado, controlado por caso, realizado em vários centros, descobriu que crianças que receberam a intervenção do Modelo de Início Precoce de Denver (ESDM) que é baseado na ciência ABA, exibiram maior ativação cerebral ao ver rostos em local dos objetos, uma resposta típica de crianças sem autismo no estudo, mas contrária às crianças com autismo que receberam uma intervenção diferente (ROGERS, DAWSON, 2014). O Modelo de Denver é um método de intervenção desenvolvido em 2000 por Rogers e Dawson (2014). A terapia combina métodos de ensino intensivos de análise aplicada do comportamento com abordagens "baseadas em relacionamento" para o desenvolvimento.

O Early Start Denver Model (ESDM) é uma abordagem para uma intervenção comportamental abrangente precoce para crianças com autismo com idades entre 12 e 48 meses. O programa inclui um currículo de desenvolvimento, que define as competências que devem ser ensinadas em um determinado momento, bem como um conjunto de procedimentos de ensino. Pode ser realizado por equipes de terapia e / ou pais em programas de grupo ou em sessões individuais de terapia, em uma clínica ou em casa da criança (MATOS, 2015).

As psicólogas Sally Rogers e Geraldine Dawson desenvolveram o Modelo de Início Precoce de Denver como uma extensão para as primeiras idades do Modelo de Denver que Rogers e seus colegas de classe desenvolveram e refinaram. Esse programa de intervenção precoce integra um modelo de desenvolvimento focado no relacionamento com as práticas de ensino validadas corretamente na Análise de Comportamento Aplicada (ABA). Estas são suas principais características (ROGERS, DAWSON, 2014):

- Estratégias de análise do comportamento aplicado naturalista (devido a problemas de generalização).
- Sensível à sequência normal de desenvolvimento.
- Grande participação e envolvimento dos pais.
- Concentre-se na troca interpessoal e no afeto positivo (crie estados emocionais positivos)
- Compromisso compartilhado com atividades conjuntas.
- Linguagem e comunicação ensinadas dentro de um relacionamento baseado em afetos positivos.
- Terapia intensiva (porque eles têm menos oportunidades de aprendizado).
- Jogue como uma estrutura de intervenção (o adulto deve se tornar um bom companheiro de brincadeira).
- Intervenção baseada em relacionamento interpessoal.

A qualidade do desenvolvimento depende do afeto positivo, reciprocidade, sensibilidade e responsabilidade do adulto em relação à criança. As alterações biológicas dos TEAs implicam uma deficiência básica de motivação social, como resultado da falta de sensibilidade ao reforço social dessas pessoas (hipótese da motivação social). Essa falta de sensibilidade se deve a uma falha na preferência por informações sociais em seu ambiente: os rostos dos outros, vozes, gestos e fala (GONÇALVES et al., 2017).

Fulton et al. (2014), com um design teste-reteste, demonstraram uma diminuição nos problemas comportamentais, bem como um aumento significativo na capacidade da criança de cooperação e colaboração após participar de um programa de ESDM em grupo. Os resultados obtidos em todos esses estudos sugerem que o modelo DENVER é eficaz no tratamento de vários sintomas precoces do TEA, bem como na melhoria dos resultados dessas crianças.

A atenção precoce utilizando o método ESDM diminui os sintomas negativos causados pelo autismo e aumenta o aprendizado com imitações, brincadeiras, atenção compartilhada, comunicação verbal e não verbal, desenvolvimento social e emocional, habilidades cognitivas e motoras.

4 CONCLUSÃO

Considerando a complexidade dos TEAs, os domínios de desenvolvimento comprometidos nos sujeitos que sofrem e suas repercussões familiares, sociais e econômicas, é necessário perguntar quais aspectos são buscados para impactar com as abordagens terapêuticas disponíveis, que indicação eles podem ter em um momento dada e a relação custo / benefício. Isso é ainda mais significativo ao lembrar que os TEA envolvem alterações importantes da linguagem e até distúrbios do pensamento que envolvem dificuldade no desenvolvimento pessoal e na interação social.

É importante não ignorar o papel de estratégias terapêuticas, como as mediadas pelos pais, que demonstraram alguma evidência para o bem-estar das crianças com TEA e suas famílias. Da mesma forma, deve-se lembrar da utilidade de intervenções farmacológicas no controle de alguns sintomas que facilitam a conquista de intervenções psicossociais, como a ABA.

O ABA deve ser aplicado de forma individualizada, estruturada, intensiva e extensiva, ou seja, abrange todos os contextos da pessoa com TEA e deve envolver todos: família, professores, terapeutas, colegas etc. A ESDM é uma prática baseada em evidências e a pesquisa mostra que mitiga o impacto dos sintomas e melhora a qualidade de vida da pessoa que sofre da doença, além de aumentar as habilidades de comunicação e a pontuação do quociente intelectual. O programa inclui um currículo de desenvolvimento que define as habilidades específicas que precisariam ser adquiridas em um determinado período e uma série de estratégias de aprendizado específicas para ensiná-las.

O modelo ESDM é uma abordagem global para a criança e sua família, é uma abordagem orientada para a família na qual a tríade criança-pai é o cenário fundamental para alcançar um progresso adequado que requer um profundo compromisso de sua parte. Utiliza estratégias de análise comportamental de uma perspectiva naturalista, ou seja, trabalha no e com o ambiente da criança. O acompanhamento é realizado através de uma sequência de desenvolvimento progressivo, onde o progresso pode ser avaliado dia a dia e identificar se há ou não progresso. Ele se concentra no intercâmbio interpessoal dentro das rotinas da atividade conjunta, com o compromisso indispensável de ambos os companheiros de brincadeira. O ensino da linguagem e da comunicação ocorre dentro de uma relação positiva baseada no carinho. O aspecto mais proeminente do modelo é sua flexibilidade na implementação, uma vez que pode ser aplicado em diferentes contextos, como escritório, centro integrado, casa ou escola.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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1 Pedagoga: Ensino Fundamental e Educação Infantil, Pós Graduada:Psicopedagoga Clínica e Institucional, em Educação Especial e Inclusiva, Alfabetização e Letramento. [email protected]