ENTRE O SAGRADO E O PROFANO: UM RESUMO HISTÓRICO DA FOLHA DE COCA NA CULTURA DOS POVOS ANDINOS
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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10888653
Atila Barros1
RESUMO
Este artigo aborda a história, o uso tradicional e contemporâneo, bem como os desafios enfrentados pela folha de coca nos povos andinos. Desde sua importância na sociedade incaica até sua influência nas práticas contemporâneas, a coca desempenhou um papel crucial na cultura, medicina e rituais religiosos dos povos andinos. Apesar disso, a planta enfrenta estigmatização e proibição, especialmente devido à sua associação com a cocaína e à guerra contra as drogas. O artigo explora debates sobre seu uso medicinal e recreativo, políticas governamentais e perspectivas indígenas sobre a preservação de suas tradições culturais. A análise busca desafiar noções preconcebidas e destacar a importância contínua da coca para as comunidades andinas e para a compreensão da diversidade cultural e botânica do mundo.
Palavras-chave: Diversidade cultural. Folha de coca. Povos andinos.
ABSTRACT
This article addresses the history, traditional and contemporary use, as well as the challenges faced by the coca leaf in the Andean peoples. From its importance in Inca society to its influence on contemporary practices, coca has played a crucial role in the culture, medicine, and religious rituals of the Andean peoples. Despite this, the plant faces stigmatization and prohibition, especially due to its association with cocaine and the war on drugs. The article explores debates about its medicinal and recreational uses, government policies, and indigenous perspectives on preserving their cultural traditions. The analysis seeks to challenge preconceived notions and highlight the ongoing importance of coca to Andean communities and to understanding the world's cultural and botanical diversity.
Keywords: Cultural diversity. Coca leaf. Andean peoples.
INTRODUÇÃO
A folha de coca, ao longo dos séculos, desempenhou um papel considerável na cultura e na medicina dos povos andinos. Sagrada para os Incas e considerada um presente dos deuses, essa planta, conhecida cientificamente como Erythroxylum coca, possui uma história rica e multiforme. No entanto, apesar de sua importância cultural e medicinal, a coca tem sido frequentemente mal compreendida e estigmatizada, especialmente devido à associação com a cocaína e aos esforços de repressão por parte de governos e organizações internacionais.
Explorar e desmistificar essa planta tão venerada e incompreendida é essencial para compreender a complexidade das tradições e práticas dos povos andinos. Ao longo deste artigo, examinaremos em detalhes a história, o uso tradicional e contemporâneo, bem como os desafios enfrentados pela coca, tanto em termos de sua preservação cultural quanto de sua percepção global.
A coca não é apenas uma planta com propriedades medicinais, mas também desempenhou um papel crucial em rituais religiosos, como o da mumificação, e era vista como um amuleto de sorte e um meio de comunicação com divindades. No entanto, apesar de sua relevância cultural e espiritual, a coca tornou-se alvo de estigmatização e proibição, especialmente no contexto da guerra contra as drogas.
Neste artigo, iremos imergir na história da coca, desde sua importância na sociedade incaica até sua influência nas práticas contemporâneas dos povos andinos. Além disso, examinaremos de perto os debates em torno de seu uso medicinal e recreativo, as políticas governamentais que moldaram sua percepção e legalidade, bem como as perspectivas dos próprios povos indígenas sobre a preservação e o resgate de suas tradições culturais. Por meio desta análise histórica, busca-se elucidar a verdadeira natureza e importância da coca, desafiando noções preconcebidas e destacando sua relevância contínua para as comunidades andinas e para a compreensão mais ampla da diversidade cultural e botânica do mundo.
A IMPORTÂNCIA CULTURAL E TRADICIONAL DA FOLHA DE COCA NOS POVOS ANDINOS
A folha de coca, uma planta ancestralmente ligada aos povos Andinos da América do Sul, desempenha um papel heterogêneo que vai além de sua associação controversa com a cocaína. Para entender verdadeiramente a relevância desta planta na vida e na cultura dessas comunidades, é necessário explorar suas raízes históricas, seus usos tradicionais e seu impacto atual nas sociedades Andinas.
A folha de coca, em sua forma natural, possui uma longa história de uso cultural e ancestral, aparentemente inofensivo à saúde. Tradicionalmente, é consumida por meio da mastigação direta ou da preparação de chás. No entanto, devido à presença de quantidades, ainda que mínimas, de cocaína em suas propriedades naturais, a folha de coca é frequentemente associada ao narcotráfico, uma percepção muitas vezes reforçada pela cobertura midiática indiscriminada (Barreto, 2013).
Essa representação compartilhada e os debates em torno dos potenciais danos à saúde resultaram em iniciativas políticas para controlar a produção da folha de coca e combater o tráfico de drogas. Entre as principais medidas propostas estão a erradicação de cultivos ilegais, incentivos para a substituição de cultivos ilícitos por culturas alternativas, regulamentação e controle de insumos químicos, intensificação da fiscalização em portos e águas internacionais, extradição de líderes do tráfico andino, fortalecimento do sistema judiciário e da aplicação da lei, e programas de capacitação para as forças armadas e policiais (Barreto, 2013).
Diante desse contexto, surge o questionamento sobre o propósito e as implicações da criminalização da folha de coca para os povos que mantêm tradições relacionadas ao seu cultivo e fazem uso terapêutico da planta há milhares de anos. Este artigo abordará as propriedades fundamentais da coca, seu uso tradicional, o movimento em defesa da coca, a questão do narcotráfico, suas aplicações terapêuticas e a posição da Organização Mundial da Saúde (OMS) em relação à planta.
A história da folha de coca remonta a milênios antes da chegada dos colonizadores europeus à América do Sul. Evidências arqueológicas indicam que as civilizações pré-colombianas, como os Incas, já cultivavam e utilizavam a coca em suas práticas religiosas, medicinais e sociais. A planta era considerada sagrada e desempenhava um papel central em cerimônias, rituais de cura e interações sociais.
Os povos Andinos cultivavam a folha de coca não apenas por suas propriedades medicinais, mas também como parte integrante de sua identidade cultural. A coca era mastigada, consumida em infusões ou usada em rituais de oferendas aos deuses. Ela era valorizada por suas propriedades energizantes, capazes de combater a fadiga, a fome e os efeitos da altitude, sendo essencial para os Andinos que habitavam as altas montanhas. Além disso, a folha de coca desempenhava um papel social importante, servindo como um meio de comunhão e coesão entre os membros da comunidade. Seu consumo era compartilhado durante reuniões, celebrações e momentos de interação social, fortalecendo os laços entre as pessoas e reforçando sua identidade cultural.
O consumo da folha de coca, prática ancestral entre os povos andinos, remonta à época dos Incas. O costume de mastigar as folhas, geralmente em conjunto com bicarbonato de sódio, proporcionava uma sensação de entorpecimento e, ao mesmo tempo, um impulso de energia e vitalidade. Essa propriedade permitia aos camponeses e agricultores trabalharem longas horas sem sentir cansaço ou frio, devido ao efeito anestésico de seus alcalóides.
Médicos primitivos e sacerdotes incas também prescreviam a mastigação da folha de coca como forma de aliviar dores de dente, de estômago e outras enfermidades físicas. As propriedades analgésicas e anti-inflamatórias da planta eram conhecidas e utilizadas para o tratamento de diversas condições. A folha de coca também era utilizada pelos “amautas”, ou sábios incas, como ferramenta de adivinhação. Através da leitura das folhas, buscavam-se pistas e presságios sobre o futuro. Acreditava-se que a forma como as folhas se assentava no chão após serem jogadas no ar poderia revelar eventos futuros, auxiliar na localização de objetos roubados e identificar seus autores, entre outros usos.
As populações incas realizavam o ritual de "pagamento à terra" no início da estação chuvosa. Um buraco era cavado no solo e diversas oferendas eram depositadas, incluindo as folhas sagradas de coca. Esse ritual visava garantir boas colheitas e um ano próspero, homenageando a Pachamama, ou Mãe Terra.
O "Hallpay", encontro social em torno de uma mesa com folhas de coca, era uma prática comum no mundo andino. Essa reunião tinha como objetivo fortalecer a união entre o homem e os seres espirituais dos Andes, além de reforçar a identidade cultural e os laços sociais entre os membros da comunidade.
As folhas de coca também desempenhavam um papel importante na economia inca. Eram utilizadas como moeda de troca por diversos produtos, como carne, batata, feijão e vegetais. Os "Chaskis", mensageiros que percorriam o império a pé, consumiam folhas de coca para manterem-se alertas e com energia durante suas longas viagens.
A análise dos diversos usos e significados da folha de coca no mundo andino revela sua importância cultural, social e econômica. Mais do que um simples estimulante, a folha de coca era um elemento central da vida das sociedades andinas, permeando seus costumes, crenças e rituais. A compreensão de seus usos e simbolismos nos permite desvendar um pouco mais da complexa e rica cultura dos Andes.
Em junho de 2023, uma equipe liderada pelo arqueólogo Miguel Aguilar, da Universidad Nacional Mayor de San Marcos, fez uma descoberta significativa em Lima, Peru. A equipe encontrou uma múmia enterrada em um ritual pré-hispânico, datada de um período anterior à chegada dos espanhóis (Agência Brasil, 2023). A múmia foi encontrada no bairro Rímac, próximo ao campo de treinamento do clube de futebol Sporting Cristal. A área era conhecida por abrigar uma "huaca", termo quíchua que designa um oráculo ou lugar sagrado. De fato, vestígios de antigas paredes de barro corroboram a importância cultural do local. A múmia estava posicionada de bruços, com as extremidades inferiores amarradas por uma corda trançada de vinhas. O esqueleto estava cercado por pedras e folhas de coca, indicando a realização de um ritual funerário pré-hispânico. A presença de conchas também pode ter significado simbólico dentro do ritual.
A múmia foi enterrada no topo de um templo de barro em forma de U, uma característica comum em construções pré-hispânicas que apontavam para o nascer do sol. O enterro em um local elevado reforça a importância ritual da descoberta.
A datação por radiocarbono até a confecção deste artigo ainda não fora realizada, mas a presença de ovos de mosca junto ao esqueleto sugere que o corpo ficou exposto por alguns dias antes do sepultamento. Essa prática era comum em algumas culturas pré-hispânicas. Pieter Van Dalen, especialista em arqueologia da costa peruana, destaca que a corda utilizada para amarrar a múmia segue um padrão observado em outras cerimônias pré-hispânicas. Isso reforça a natureza ritualística do enterro.
A descoberta da múmia em Lima oferece valiosas informações sobre as práticas funerárias e crenças das sociedades pré-hispânicas da região. A presença de elementos rituais específicos, como a corda, as folhas de coca e o templo em forma de U, contribui para a compreensão da cosmovisão e organização social desses povos. A investigação e análise aprofundadas da múmia e do local de enterro podem fornecer ainda mais detalhes sobre a vida, a morte e os rituais das sociedades pré-hispânicas do Peru.
A descoberta da múmia pré-hispânica envolta em folhas de coca em Lima, Peru, abre um portal para o passado, oferecendo uma oportunidade singular de explorar as complexas práticas rituais e crenças das sociedades pré-hispânicas. A presença das folhas de coca, cuidadosamente depositadas junto à múmia, transcende a mera preservação ritualística. As folhas, imbuídas de significado cultural e religioso, representam uma ponte entre o mundo dos vivos e o dos mortos, servindo como oferenda aos deuses ou como auxílio na jornada do falecido para o além (Barreto, 2013).
Apesar dos séculos de estigma e repressão associados à cocaína, a folha de coca continua a desempenhar um papel significativo nas comunidades Andinas até os dias de hoje. Apesar das pressões para erradicar seu cultivo devido ao seu potencial para a produção de drogas ilícitas, muitos povos Andinos resistem à criminalização de sua planta sagrada e buscam preservar seus usos tradicionais (Henman, 2008).
Atualmente, a folha de coca é valorizada não apenas por suas propriedades medicinais, mas também por seu potencial econômico. Em muitas regiões Andinas, o cultivo e a comercialização da coca pelos “Cocaleiros” representam uma fonte importante de subsistência e sustento para as comunidades locais. Além disso, a planta é cada vez mais reconhecida por suas propriedades nutricionais e benefícios para a saúde, impulsionando sua utilização em produtos alimentícios e cosméticos.
O MOVIMENTO DOS COCALEIROS
Uma das manifestações políticas mais notáveis nas regiões andinas da América do Sul é o Movimento dos Cocaleiros. Este movimento tem raízes profundas na história e na cultura dessas comunidades e surgiu como resposta às políticas de erradicação da coca e à estigmatização dos agricultores envolvidos na sua produção. Para entender melhor as dinâmicas sociais e políticas nessas áreas, este artigo examina as origens, o desenvolvimento e os efeitos desse movimento crucial.
O Movimento dos Cocaleiros começou nas décadas de 1970 e 1980, quando as políticas antidrogas se tornaram mais rígidas, principalmente impulsionadas pelos Estados Unidos (Malheiros, 2021). As comunidades camponesas e indígenas das regiões andinas, cujas tradições agrícolas incluíram o cultivo da coca há séculos, enfrentaram uma pressão cada vez maior para abandonar essas práticas em nome da " guerra contra as drogas".
A partir dessa situação, ativistas e líderes locais começaram a se organizar para defender os direitos dos agricultores de coca e preservar suas tradições culturais. O movimento não é idealizado por um indivíduo; em vez disso, é uma reunião de líderes locais e organizações comunitárias que se uniram para combater as políticas repressivas e promover alternativas viáveis. Ao longo das últimas décadas, o Movimento dos Cocaleiros expandiu-se e diversificou-se, ganhando força principalmente na Bolívia, Peru e Colômbia. Lideranças como Evo Morales[2], da Bolívia, emergiram como líderes destacados, expressando as demandas das comunidades cocaleiras a nível nacional e global (Delgado, 2006).
A resistência ao movimento incluiu protestos pacíficos, greves e negociações políticas. Ao mesmo tempo, as comunidades cocaleiras lutaram para fazer com que a coca fosse reconhecida como parte de sua identidade cultural e econômica, enfatizando seus usos tradicionais da planta além da produção de cocaína.
O Movimento dos Cocaleiros teve um grande impacto na política e na consciência social das andinas. A mobilização dos cocaleiros ajudou a escolher líderes que defendem os direitos das comunidades indígenas e camponesas em países como a Bolívia. Além disso, o movimento levou a uma discussão sobre a eficácia e os efeitos das políticas antidrogas, questionando uma abordagem centrada na repressão e defendendo alternativas baseadas na justiça social e no desenvolvimento sustentável (Delgado, 2006).
A folha de coca é muito mais do que apenas uma planta com conotações negativas. Para os povos Andinos, ela representa uma parte essencial de sua herança cultural, uma fonte de conexão espiritual e comunitária, e uma importante contribuição para sua subsistência e bem-estar. Reconhecer e respeitar a importância da folha de coca na vida dessas comunidades é imprescindível para promover o entendimento intercultural e o desenvolvimento sustentável na região Andina.
ERYTHROXYLUM COCA
A Erythroxylum coca é uma planta perene da família Erythroxylaceae, nativa das regiões tropicais da América do Sul, principalmente encontrada nas áreas montanhosas dos Andes. Esta planta tem sido cultivada e utilizada pelas populações indígenas há milênios por suas propriedades medicinais e efeitos estimulantes. No entanto, é mais conhecida pelo seu papel na produção da cocaína, um dos narcóticos mais amplamente consumidos em todo o mundo (Henman, 2008).
Assim como os Huacas, objetos sagrados na tradição andina, a coca é vista como um presente divino, atribuído a Manco Capac para seus súditos. A planta é conhecida pelo termo quechua "kuka", pertence à família das Erythroxyles, com a espécie mais comum sendo a Erythroxylum coca, nativa da Bolívia e do Peru. O arbusto, frequentemente referido como "ipatú" pelos peruanos, pode atingir entre 1 e 3 metros de altura e é reconhecido por sua casca esbranquiçada, flores amarelas e frutos vermelhos, oblongos e carnudos (Souza, 2010).
As folhas de coca contêm uma série de alcaloides, sendo o mais importante deles a cocaína. A cocaína é um poderoso estimulante do sistema nervoso central e é responsável pelos efeitos energizantes associados ao consumo de folhas de coca. Além da cocaína, as folhas de coca contêm outros alcaloides, como a ecgonina e a benzoilecgonina, bem como vitaminas, minerais e outros compostos vegetais (De Lima, 2022).
Os alcalóides são compostos orgânicos nitrogenados, principalmente vegetais, que possuem propriedades básicas e atividade farmacológica. Ocorrem principalmente em plantas, mas também podem ser encontrados em fungos, bactérias e animais. Eles têm estruturas com nitrogênio, oxigênio, hidrogênio e carbono. Eles formam sais ao reagir com ácidos. Na forma livre, eles não são solúveis em água, mas são solúveis em solventes orgânicos. Os efeitos biológicos dos alcalóides incluem anestésico, analgésico, psicoestimulante, neurodepressor, alucinógeno e tóxico. Cafeína, nicotina, morfina, quinina e atropina são exemplos conhecidos (Oliveira, 2013).
A cocaína é um alcaloide proeminente, caracterizado como anestésico local e estimulante do sistema nervoso central (SNC), notadamente obtido das folhas de diversas espécies pertencentes ao gênero Erytroxylum. Dentro deste gênero, que abrange mais de 250 espécies e variedades, apenas uma minoria produz quantidades significativas dessa substância. Ao contrário de outras plantas com potencial para sintetizar compostos psicoativos, cuja distribuição geográfica é ampla e diversificada, as variedades de Erytroxylum são predominantemente encontradas nas regiões andinas da América do Sul, com destaque para Colômbia, Peru, Bolívia e Equador, além de serem identificadas em regiões específicas da Índia e África (Casale et al., 1993).
Apesar de sua longa história de uso tradicional, a Erythroxylum coca é frequentemente associada ao uso ilegal de drogas devido à sua conexão com a produção de cocaína. No entanto, em algumas regiões da América do Sul, as folhas de coca continuam a ser consumidas de forma legal e culturalmente aceita. Por exemplo, na Bolívia e no Peru, onde a planta é cultivada em grande escala, as folhas são usadas em bebidas, chás e até mesmo em alimentos como um estimulante suave e como um remédio tradicional para diversos problemas de saúde.
O cultivo da Erythroxylum coca tem implicações significativas para as comunidades que dependem dela para sua subsistência. Por um lado, a produção de cocaína ilegal tem alimentado o tráfico de drogas e contribuído para a instabilidade política e social em muitas regiões da América do Sul. Por outro lado, para os agricultores que cultivam a planta de forma legal, especialmente em áreas rurais empobrecidas, a coca pode representar uma fonte importante de renda e sustento (Henman, 2008).
Devido aos seus efeitos psicoativos e potencial para abuso, a cocaína é uma substância controlada em praticamente todos os países do mundo. No entanto, as políticas em relação às folhas de coca variam de país para país. Enquanto em alguns lugares elas são estritamente regulamentadas ou proibidas, em outros são legalmente reconhecidas como parte da cultura e tradição locais (De Lima, 2022).
O aumento do uso abusivo de cocaína nas últimas três décadas é um fenômeno complexo de difícil elucidação. Na década de 1970, havia uma escassez de informações sobre a toxicidade da droga e suas ramificações para a saúde e o comportamento dos usuários. Foi durante esse período que a cocaína ressurgiu como a substância de escolha para um suposto uso recreativo, alimentando a percepção de que era uma droga segura, sem potencial para causar dependência.
No entanto, foi a partir dos anos 1980 que essa percepção começou a mudar, à medida que a oferta de cocaína aumentava nos mercados de diversos países. Esse aumento na disponibilidade da droga foi impulsionado principalmente pela intensificação da produção e pela distribuição mais eficiente conduzida por certos cartéis de traficantes sul-americanos. O resultado foi uma ampliação significativa do uso de cocaína, com uma maior diversificação nos padrões de consumo, devido ao preço mais acessível e à maior disponibilidade do produto no mercado (Ferreira, 2001).
Da folha de coca até o pó branco comercializado pelos cartéis de traficantes, um processo químico complexo precisa ser realizado. Após a colheita manual, as folhas de coca são secas solarmente para concentrar seus compostos químicos. A maceração das folhas secas é a etapa seguinte, que permite a remoção da pasta de coca, que é caracterizada pela presença de alcaloides. Essa remoção geralmente envolve o uso de solventes como querosene, gasolina ou ácido sulfúrico. Após isso, a pasta de coca é iniciada um processo de purificação e refinamento com o objetivo de aumentar a concentração de cocaína, usando métodos como filtração e gerenciamento, que envolvem o uso de produtos químicos perigosos. Posteriormente, a cocaína pura pode ser adulterada com substâncias como talco, lidocaína ou amido de milho para aumentar seu volume ou alterar seus efeitos. Depois disso, a cocaína refinada é embalada e distribuída a traficantes e usuários, alimentando o ciclo vicioso de crime organizado e violência (Casale et al., 1993).
A cocaína é uma das substâncias psicoativas mais fortes e consumidas no mundo. A euforia rápida e intensa causada pela cocaína é seguida por uma série de efeitos negativos. A frequência cardíaca, a pressão arterial elevada, a dilatação das pupilas e a hiperatividade podem surgir no curto prazo. A cocaína também pode causar paranoias, ansiedade, agressividade e até mesmo psicose em alguns casos. A overdose pode causar convulsões, arritmias cardíacas, derrames e até mesmo morte se consumidos em excesso ou em conjunto com outras substâncias (Scheffer, 2010).
Uma variedade de problemas de saúde física e mental estão associados ao consumo prolongado de cocaína. Os efeitos a longo prazo incluem cardiomiopatia, insuficiência cardíaca e infarto do miocárdio. A cocaína também pode prejudicar o sistema imunológico, causando pneumonia, hemorragias pulmonares e danos ao tecido nasal quando consumida por via intranasal. Além disso, o uso prolongado de cocaína pode causar psicose, depressão, ansiedade, distúrbios de personalidade e outros transtornos mentais. Ainda, os usuários podem ter problemas cognitivos, como problemas de memória, atenção e tomada de decisão. O abuso de cocaína pode causar isolamento social, problemas no trabalho, problemas comerciais e conflitos familiares (Scheffer, 2010).
Além de seus efeitos diretos, o consumo de cocaína tem um grande impacto na sociedade e na economia. Os sistemas de saúde pública enfrentam grandes despesas como resultado do tratamento de problemas de saúde relacionados à cocaína. Além disso, o tráfico de drogas e o uso de cocaína sobrecarregam o sistema judicial e desestabilizam as comunidades.
A Erythroxylum coca é uma planta fascinante com uma história rica e complexa, desde os tempos antigos até os dias de hoje, ela tem sido valorizada por suas propriedades medicinais e estimulantes, mas também tem sido objeto de controvérsia devido ao seu papel na produção de cocaína. A compreensão da folha de coca requer uma análise cuidadosa de seus aspectos botânicos, históricos, sociais e legais, reconhecendo tanto seus benefícios quanto seus desafios para as comunidades que dependem dela.
ENTRE O SAGRADO E O PROFANO
A folha de coca, considerada sagrada pelos Incas e utilizada em diversos contextos rituais, como rituais de mumificação, amuleto de sorte e oráculo, tem desempenhado um papel significativo tanto cultural quanto medicinal entre os povos andinos. No entanto, ao longo dos anos, a planta foi alvo de mal-entendidos impostos pela repressão e preconceito por parte dos governos andinos. Compreender adequadamente o lugar da folha de coca na cultura andina requer uma análise cuidadosa de sua importância e uso, especialmente no contexto das altas montanhas da América do Sul.
A presença da coca é abundante nos Andes, especialmente em altitudes de até dois mil metros, refletindo sua importância histórica e cultural entre os povos andinos. Os Incas valorizavam profundamente a planta, utilizando suas folhas como forma de moeda. Em diferentes contextos religiosos e superstições, como na antiga Colômbia, os sacerdotes do Sol mastigavam e queimavam as folhas em honra às divindades. O hábito de mascar folhas de coca era comum entre peruanos, bolivianos e até mesmo entre os habitantes do vale Calchaqui, na Argentina, onde se realizava o "coquear". Este ato, que envolvia a mastigação das folhas misturadas com llicta (massa feita de batatas fervidas), era considerado essencial antes de empreender qualquer trabalho (Souza, 2010).
A coca desempenhava e ainda desempenha um papel significativo em práticas religiosas e superstições entre os povos andinos. Por exemplo, antes de iniciar uma viagem ou negócio, as pessoas recorrem à coca de várias maneiras, como colando uma folha no nariz e observando em qual direção ela cai após ser soprada. A interpretação do resultado, seja como sinal de sorte ou desgraça, influencia as decisões e ações dos indivíduos. Dessa forma, a folha de coca continua a ser uma parte vital do tecido cultural e espiritual dos povos andinos, apesar dos mal-entendidos e estigmas associados a ela ao longo da história (Ferreira, 2001).
Antes de iniciar qualquer empreendimento, os povos andinos praticam rituais de oferenda de coca à Pachamama, divindade associada à natureza e considerada a mãe dos cerros (nevados). Essas oferendas são feitas em diversos contextos, como antes de sair para caçar, onde os caçadores depositam uma oferenda de coca em buracos escavados no chão, à beira do mato, invocando a Pachamama para garantir uma caçada bem-sucedida. Durante viagens pelas montanhas, é comum encontrar montinhos de pedra chamados "Apachetas", nos quais os viajantes depositam folhas de coca que estavam mascando, em um gesto de respeito e reverência.
No decorrer das primeiras décadas do século XXI, observa-se uma crescente expansão dos rituais da Pachamama para além de seus contextos tradicionais, tornando-os compatíveis com espaços sociais cada vez mais abrangentes. Atualmente, um contingente significativo de cidadãos argentinos e turistas, tanto nacionais quanto estrangeiros, participa ativamente dos rituais da Pachamama realizados em Salta, norte da Argentina, os quais consistem em solicitar e expressar gratidão pela saúde de si mesmos e de seus entes queridos. É notável que o momento de celebração da conexão com a Mãe Terra na província de Salta esteja mais associado ao calendário de feriados do trabalho do que aos ciclos astrais, agrícolas e de fertilidade historicamente ligados à Pachamama. Tais rituais, quando realizados em espaços públicos oficiais, transcendem a esfera política reconhecida, reencantando o cenário da distribuição de poderes enquanto negociam uma representação da natureza que não se limita às visões científicas tradicionais do Iluminismo (Flores, 2017).
Além disso, destaca-se um processo de desterritorialização e territorialização de tradições, envolvendo um movimento transfronteiriço não apenas dos rituais, mas também da própria planta da coca, considerada um elemento indispensável para sua realização. Paralelamente, observa-se uma articulação com significados, práticas e redes de conhecimento provenientes das tradições dos centros urbanos mais populares dos Andes, como Lima, Cuzco, La Paz, Potosí e Quito.
A coca é compartilhada como um estímulo à socialização durante o "coqueo" (o hábito de mascar coca), em que cada indivíduo retira da sacola a quantidade de folhas que considera necessária para iniciar o momento coletivo de "coqueo". As folhas são então empilhadas e colocadas entre os dentes e a bochecha, sendo sugadas para extrair o suco. Este suco é gradualmente consumido, formando um bolo de coca cada vez mais compacto, conhecido como "jachu". Além disso, a coca é usada como oferenda individualmente, sendo colocada em um poço na terra juntamente com um cigarro e uma bebida alcoólica, como vinho, aguardente ou cerveja. Se no passado a coca foi protagonista de narrativas míticas sobre a origem humana, no presente desempenha um papel ativo na reprodução dos ciclos de vida comunitária. Sua função é multifacetada, sendo vista como um vegetal, um sujeito, uma irmã, uma ferramenta e uma oferenda. Diferentes interpretações atribuem à coca uma variedade de papéis, desde ser considerada filha da Pachamama até um espírito aliado que facilita a comunicação com a Mãe Terra. Essa relação íntima, fluída e inter-substancial entre o ser humano, a coca e a Pachamama cria paisagens de direitos dinâmicos, não exclusivos e decisivamente transversais (Flores, 2017).
Para os indígenas aymaras e quechuas, a folha de coca possui um caráter sagrado, comparável à hóstia na tradição cristã, sendo utilizada em cerimônias sociais e rituais. Segundo uma lenda, o fundador do Império Inca, Manco Capac, filho do sol, desceu do céu até o lago Titicaca para ensinar aos homens como cultivar a terra, presenteando-os com a planta divina da coca. Esta planta, quando mastigada, proporcionava o reestabelecimento das energias perdidas devido à altitude e ao trabalho árduo do dia a dia.
Durante o período do Tahuantinsuyo (Séculos XV e XVI), que compreendia as quatro regiões do império Inca (altiplano, selva, costa e chaco), a prática do uso da folha de coca estava restrita aos nobres, incluindo os Incas, seus familiares e os Curacas (Chefes políticos e religiosos), que a consideravam um presente divino. Com a expansão do império incaico, o uso da folha de coca se disseminou pelas terras conquistadas, inclusive desempenhando um papel como moeda entre os povos (Casini, 2019).
Muitas histórias contam o surgimento da planta sagrada, e uma delas diz que na aldeia de Collasuyu vivia uma jovem indígena de grande beleza chamada Coca. Coca era vaidosa e egoísta, seduzia os homens com seu corpo atraente e os rejeitava. O imperador inca foi informado dos enganos de Coca. Tristemente, ele ouviu a decisão dos sacerdotes de sacrificá-la. Em seguida, Coca foi assassinado em uma cerimônia solene e os pedaços de seu corpo foram enterrados em todos os cantos do Tahuantinsuyo. Em pouco tempo, descobriu-se que em cada um desses lugares cresceu um arbusto com folhas verdes lindas. Eles chamaram-no de Mama Coca em homenagem à mulher morta (Garcia, 2006).
Durante o período da conquista espanhola, várias lendas foram adaptadas para justificar o consumo ilegal da planta pelos conquistadores europeus. Uma dessas lendas envolve Khana Chuyma, um sacerdote iluminado que vivia em uma ilha no lago Titicaca e era guardião do tesouro do Deus-Sol.
“Após ser capturado pelos espanhóis e resistir às torturas sem revelar a localização do tesouro, Khana Chuyma foi visitado pelo Deus-Sol em agonia. O deus ofereceu-lhe um pedido e, em resposta, Khana Chuyma solicitou algo que ajudasse seu povo a suportar a escravidão e as dificuldades que enfrentavam. O Deus-Sol então apresentou-lhe a planta de coca como uma fonte de alívio e vitalidade para enfrentar os desafios do destino, indicando também que a coca seria uma maldição para os estrangeiros que tentassem explorá-la (Casini, 2019, p.2).”
A vida religiosa, social, médica e cotidiana da sociedade inca foi influenciada pela folha de coca e suas propriedades. Até hoje, as regiões andinas confirmam sua importância histórica e cultural.
AS PRIMEIRAS MENÇÕES À FOLHA DE COCA NA HISTÓRIA MODERNA
Os primeiros registros europeus sobre a folha de coca foram feitos por Américo Vespúcio em 1499 e publicados em 1507, descrevendo a coca sendo mastigada com cinzas. A prática de usar cinzas ou bicarbonato de sódio durante a mastigação persiste até hoje devido à sua absorção pela mucosa da cavidade oral, que só ocorre em um pH alcalino. Quando mastigada, sua ação farmacológica é similar ao estímulo causado pela ingestão de doses elevadas de cafeína, embora não seja acompanhada de euforia.
Os hispânicos não reconheceram seu valor cultural e, em 1551, o Conselho Eclesiástico de Lima a considerou "uma planta enviada pelo demônio para destruir os nativos", argumentando que seria um obstáculo à difusão do cristianismo, explicando os fracassos nas campanhas de conversão. No entanto, a proibição não perdurou muito tempo, já que os espanhóis perceberam que os índios não conseguiam realizar trabalhos pesados sem o uso de coca. Em 1569, o Rei Felipe II da Espanha declarou que mascar coca era um hábito essencial para a saúde do índio.
No final do século XVI, os conquistadores introduziram a coca na Espanha por razões medicinais e como suposto afrodisíaco, mas seu uso não se popularizou nessa época (Ferreira, 2001).
Outra menção registrada da folha de coca na história moderna remonta a 1553, quando a "Crônica Geral do Peru", escrita pelo frade espanhol Pedro Cieza de León, introduziu essa planta ao mundo europeu. Esta obra, amplamente considerada como um marco na historiografia colonial, documenta pela primeira vez a presença da folha de coca e suas aplicações entre os povos indígenas dos Andes (De León, 2005).
Cieza de León oferece uma perspectiva inédita sobre a coca, detalhando sua importância na vida dos Andes. Ele descreve como a planta era empregada em contextos rituais, tanto como oferenda aos deuses quanto como parte de práticas ancestrais. Além disso, destaca seu uso medicinal para aliviar a fome, a fadiga e os efeitos da altitude, além de seu papel como estimulante para aumentar a resistência física durante o trabalho.
A "Crônica" também detalha sobre a interseção entre a coca e a estrutura social dos Andes. Cieza de León observa que o consumo da folha era limitado a determinadas ocasiões e indivíduos, como líderes religiosos e guerreiros, destacando sua distribuição como um símbolo de prestígio e poder, e seu cultivo como uma atividade econômica relevante para a região.
O relato de Cieza de León desempenhou um papel decisivo na compreensão da cultura andina e da importância da folha de coca na vida dos povos indígenas. Apesar da perspectiva eurocêntrica presente na "Crônica", o registro minucioso da planta e suas aplicações inaugurou um diálogo que persiste até os dias de hoje. Além disso, a "Crônica" de Cieza de León representa apenas um dos primeiros registros da história da coca, já que evidências arqueológicas indicam que o uso da planta remonta a milhares de anos.
SURGIMENTO DA COCAÍNA
A cocaína, assim como a heroína, é uma droga de origem vegetal que entrou relativamente tarde no cenário das substâncias psicoativas. Em 1855, o químico alemão Friedrich Gaedecke conseguiu extrair o erythroxylene das folhas de coca, seguido quatro anos mais tarde por Albert Niemann, que isolou a cocaína, o principal alcaloide dessas folhas. Outros alcaloides presentes incluem nicotina, cafeína e morfina, além de quantidades menores de tiamina, riboflavina e ácido ascórbico. Cerca de 100 gramas de folhas podem suprir as necessidades diárias dessas vitaminas. A fórmula exata da estrutura química da cocaína foi descoberta somente em 1898, e em 1902, Willstatt produziu cocaína sintética em laboratório na forma de cloridrato de cocaína, um pó branco cristalino (Ferreira, 2001).
Inicialmente, a cocaína foi aclamada como um remédio milagroso, com os americanos começando a prescrevê-la para doenças difíceis de tratar, inclusive tentando usá-la como antídoto para a morfina. Sua promoção como um tratamento terapêutico foi impulsionada por Freud em 1884 com a publicação de "Uber coca", onde defendeu seu uso para uma variedade de condições médicas. No entanto, suas visões mudaram mais tarde devido aos efeitos adversos, incluindo o potencial de dependência. Alguns argumentam que a cocaína indiretamente influenciou Freud em suas descobertas sobre processos inconscientes, contribuindo assim para o desenvolvimento da psicanálise (Casini, 2019).
No campo da medicina, a cocaína foi utilizada inicialmente para anestesia local, com Karl Koller descobrindo em 1884 sua capacidade de tornar o olho humano insensível à dor. Entretanto, seu uso levou a intensas dependências, como evidenciado por William S Halsted, que pesquisou seu potencial anestésico, mas acabou desenvolvendo uma dependência tanto de cocaína quanto de morfina.
A cocaína também influenciou a cultura ocidental, aparecendo na literatura e na arte, com autores como Stevenson e Conan Doyle, que retrataram os efeitos da droga em seus personagens. Stevenson teria escrito "Dr. Jekyll e Mr. Hyde" sob a influência da cocaína, enquanto Conan Doyle retratou Sherlock Holmes em situações envolvendo a substância.
Ao longo do século XIX, a produção de cocaína se expandiu rapidamente, com várias formas da droga sendo comercializadas em produtos farmacêuticos e de consumo geral. Isso levou a problemas de toxicidade, dependência e até morte, especialmente com a popularização das seringas hipodérmicas. Apesar disso, a cocaína deixou um legado duradouro na cultura ocidental, moldando a literatura, a arte e até mesmo as normas sociais (Cusicanqui, 2011).
Em 1863, o químico francês Ângelo Mariani desenvolveu o vinho Mariani ou Vin Mariani, uma infusão alcoólica potente de folhas de coca, aproveitando o poder extrativo do etanol, ao contrário das infusões à base de água ou chá anteriormente utilizadas. O vinho Mariani ganhou destaque, especialmente após ser apreciado pelo Papa Leão XIII, que inclusive premiou Mariani com uma medalha honorífica (Ferreira, 2001).
Mariani promoveu o Vin Mariani como um remédio de amplo espectro, alegando sua eficácia na cura de diversas enfermidades, incluindo fadiga, anemia, depressão e impotência. Esta bebida conquistou uma base de consumidores distinta, notadamente a classe alta e os intelectuais da época, chegando até mesmo a ser consumida por alguns papas (Smith, 2008).
O destaque do Vin Mariani decorria, em parte, da presença de cocaína em sua composição. Àquela época, a cocaína era considerada uma substância legal e sua inclusão no Vin Mariani era percebida como medicinal e inofensiva. No entanto, à medida que avançava o século XX, a conscientização sobre os perigos associados ao consumo de cocaína se expandiu, levando ao gradual declínio e à posterior retirada do Vin Mariani do mercado (Helfand, 1980).
O Vin Mariani, portanto, representa um interessante capítulo na história da medicina e das substâncias psicoativas. Sua ascensão como um tônico medicinal reverenciado pela elite da sociedade contrasta com seu eventual ostracismo devido à crescente compreensão dos riscos da cocaína. Essa trajetória do Vin Mariani reflete não apenas as mudanças na percepção pública das drogas, mas também as transformações mais amplas na regulação e no entendimento médico ao longo do tempo (Smith, 2008).
A Coca-Cola, um dos refrigerantes mais populares do mundo, tem uma história intrinsecamente ligada ao Vin Mariani. Ambas as bebidas continham extrato de folhas de coca e foram comercializadas como tônicos medicinais. Além do mais, A Coca-Cola foi concebida em parte como uma tentativa de competir com o vinho Mariani importado da Itália pelos comerciantes americanos.
COCA-COLA E A FOLHA DE COCA
A Coca-Cola tem uma história intrinsecamente ligada à folha de coca. A bebida foi criada em 1886 pelo farmacêutico John Stith Pemberton, que se inspirou nas propriedades estimulantes da planta. Pemberton utilizou um extrato das folhas de coca em sua bebida, combinando-o com outros ingredientes como noz-de-cola e cafeína (Allen, 1997).
O nome "Coca-Cola" é uma referência direta à planta, com "coca" derivando do nome Quechua "kuka" e "cola" se referindo à noz-de-cola. A bebida era originalmente comercializada como um tônico medicinal, prometendo benefícios como "revigorar o corpo e a mente" e aliviar dores de cabeça e fadiga. No entanto, a presença de cocaína na Coca-Cola logo se tornou motivo de preocupação. Em 1903, o governo dos Estados Unidos aprovou a Lei Pure Food and Drug Act, que proibia a venda de alimentos e bebidas com substâncias perigosas. A Coca-Cola foi obrigada a remover a cocaína de sua fórmula. Para manter o sabor característico da bebida, a empresa substituiu a cocaína por um extrato de folhas de coca "descocainizado", que ainda continha pequenas quantidades da substância. Esse processo foi utilizado até 1929, quando a Coca-Cola finalmente desenvolveu um método para remover completamente a cocaína das folhas de coca (Cusicanqui, 2011).
A partir de então, a Coca-Cola passou a ser vendida como um simples refrigerante, distanciando-se de sua controversa origem. A empresa nunca divulgou a receita completa da bebida, mas acredita-se que o extrato de folhas de coca "descocainizado" ainda seja um dos ingredientes.
Apesar da remoção da cocaína, a história da Coca-Cola e da folha de coca permanece entrelaçada. A bebida é um símbolo da cultura americana e um dos produtos mais consumidos no mundo, mas sua origem está ligada a uma planta com um passado controverso (Cusicanqui, 2011).
CONSIDERAÇÕES
A folha de coca, parte intrínseca da cultura e história dos povos andinos, tem sido objeto de diversos debates e controvérsias devido à sua associação com a cocaína e o narcotráfico. Ao longo dos séculos, essa planta desempenhou um papel significativo nas práticas culturais e rituais das comunidades andinas, sendo utilizada em cerimônias religiosas e como estimulante natural para combater os efeitos da altitude.
No entanto, a estigmatização da folha de coca devido à sua associação com a cocaína levou a políticas de combate ao narcotráfico que muitas vezes criminalizam seu cultivo e uso legítimo, levando a folha de coca para Lista 1 de substâncias controladas pelas Nações Unidas (ONU, 1961). Isso tem impactado negativamente as comunidades indígenas que dependem da folha de coca para sua subsistência, contribuindo para a pobreza rural e a dependência da monocultura.
A história controversa da folha de coca na Lista 1 da ONU remonta a 1961, quando foi categorizada entre as substâncias controladas. Esta medida, que coloca a folha de coca lado a lado com substâncias como heroína e LSD, impõe severas restrições ao seu uso e pesquisa. As origens dessa criminalização podem ser traçadas até o início do século XX, quando a cocaína, derivada da folha de coca, ganhou popularidade no Ocidente, gerando preocupações. Em 1948, a Convenção Única sobre Entorpecentes da ONU incluiu a folha de coca na Lista 1, apesar de seu longo histórico de uso tradicional e medicinal nas culturas andinas.
Ao longo das décadas seguintes, a guerra contra as drogas intensificou-se, focalizando na erradicação da coca e no combate ao tráfico de cocaína. No entanto, as consequências da criminalização foram significativas. A marginalização e criminalização das comunidades indígenas que tradicionalmente utilizavam a coca, o fortalecimento do narcotráfico devido à proibição e a limitação da pesquisa científica sobre os benefícios medicinais da coca foram alguns dos resultados observados.
Dados adicionais (UNODC, 2023), revelam que o consumo global de cocaína atinge 1400 toneladas por ano, com um mercado global estimado em US$ 100 bilhões anuais. Estima-se que aproximadamente 2,5 milhões de pessoas vivam em áreas de cultivo de coca. Esses números destacam a escala do desafio enfrentado e a necessidade de ações coordenadas e eficazes para lidar com a questão da folha de coca e do narcotráfico.
Nas últimas décadas, países como Bolívia e Peru têm defendido a reclassificação da folha de coca na ONU, argumentando que a abordagem atual falhou em reduzir o tráfico de cocaína e prejudicou as comunidades indígenas. Eles buscam diferenciar entre a folha de coca e a cocaína, reconhecendo os usos tradicionais e medicinais da primeira. No entanto, esse movimento enfrenta obstáculos significativos, especialmente a oposição dos Estados Unidos e a necessidade de consenso internacional para alterar a Convenção da ONU sobre Entorpecentes (ONU, 1961).
Apesar dos desafios, em 2023, a Colômbia e a Bolívia anunciaram planos de apresentar uma proposta conjunta à ONU para remover a folha de coca da Lista 1. Essa iniciativa visa reconhecer os usos tradicionais da coca e promover alternativas à criminalização. O futuro da folha de coca na ONU permanece incerto, mas a discussão em torno de sua reclassificação está ganhando força. A reclassificação da coca poderia representar um avanço importante em direção a políticas de drogas mais equitativas e eficazes.
O dilema da folha de coca representa um desafio complexo que requer uma resposta abrangente e coordenada. Somente por meio de uma abordagem integrada e colaborativa será possível enfrentar eficazmente os desafios associados à folha de coca e ao narcotráfico, promovendo o desenvolvimento sustentável e a segurança das comunidades afetadas. Para lidar com esses desafios, seria necessário adotar uma abordagem dinâmica e colaborativa. O desenvolvimento alternativo, com investimento em diversificação agrícola, acesso a crédito e educação, constituiria uma solução promissora para reduzir a dependência da coca e melhorar as condições de vida das comunidades. Além disso, a regulamentação do mercado legal da coca, para fins medicinais e industriais, poderia desvincular a planta do narcotráfico e gerar renda lícita para os produtores.
No Peru, o governo liderado por Dina Boluarte adota uma postura assertiva contra a produção e o tráfico de drogas, considerando a erradicação da coca como um elemento crucial no combate ao narcotráfico e seus impactos prejudiciais na sociedade. Conforme os dados de 2023 da DEVIDA (Comissão Nacional para o Desenvolvimento e Vida Sem Drogas) indicam, que houve aumento 18% em 1 ano o cultivo ilegal de coca no Peru, totalizando 95.008 hectares. Particularmente preocupante, segundo o relatório, é o aumento de 86,95% na expansão do cultivo em territórios de comunidades indígenas, que passou de 9.989 hectares em 2020 para 18.674 hectares em 2022. (DEVIDA, 2023).
Por outro lado, na Bolívia, o governo de Luis Arce defende a legalização da folha de coca e a promoção do desenvolvimento alternativo como estratégias para combater o narcotráfico. Essa visão boliviana reconhece o valor cultural e medicinal da planta e busca fortalecer a economia dos produtores de coca. De acordo com os dados de 2023 da UNODC (Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime), houve um aumento de 4% na área de cultivo de coca na Bolívia, totalizando 32.000 hectares. A estratégia de industrialização da folha de coca, com ênfase em produtos como chás e suplementos alimentares, ainda enfrenta desafios para se tornar viável em larga escala (UNODC, 2023).
Apesar das abordagens distintas, ambos os governos reconhecem a necessidade de fortalecer a cooperação internacional para enfrentar o narcotráfico. A busca por soluções conjuntas que levem em consideração as realidades socioeconômicas e culturais de cada país é fundamental para alcançar um desenvolvimento sustentável e pacífico na região.
A folha de coca, com sua complexidade, continuará sendo objeto de intenso debate. Encontrar um equilíbrio entre a preservação de sua tradição ancestral e os esforços para combater o narcotráfico é o desafio que os países andinos, em colaboração com a comunidade internacional, precisam enfrentar.
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1 Coordenador e docente do Curso de Especialização (Lato Sensu), MBA e Pós-Graduação em Inteligência Artificial e Gestão do Conhecimento (FESAV-ES). Docente do Curso técnico em Informática e Eletrônica (UNESA-RJ). Mestrando em Educação (UNESA-RJ). MBA em Data Warehouse e Business Intelligence (FI - PR). Pós-Graduado em Antropologia, História, Filosofia e Ciência da Religião (FAVENI-MG). Historiador pela Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU-SP). e-mail: [email protected]
2 Juan Evo Morales Ayma, político boliviano. Foi presidente da Bolívia por três mandatos consecutivos, de 2006 a 2019.