ENTRE A PRESERVAÇÃO E A PRESSÃO HUMANA: ECOSSISTEMAS, VULNERABILIDADES E ESTRATÉGIAS DE GESTÃO DO PARQUE NACIONAL DO ITATIAIA

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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.17381789


Arlem Rudnei Chagas Botelho1


RESUMO
Ao longo dos séculos, a ação humana modificou ecossistemas globais, intensificando-se com a industrialização e resultando em taxas alarmantes de extinção de espécies. A partir do século XIX, surgiu a consciência da necessidade de preservação, simbolizada pela criação do Parque de Yellowstone (1872) e, no Brasil, pelo Parque Nacional de Itatiaia (1937), primeiro parque nacional brasileiro. Classificado como Unidade de Proteção Integral pelo SNUC, o Itatiaia prioriza a preservação estrita de recursos naturais, contrastando com Unidades de Uso Sustentável, que permitem exploração controlada. O parque protege recursos hídricos, biodiversidade, solos e paisagens da Serra da Mantiqueira, abrigando ecossistemas únicos como a Mata Atlântica e campos de altitude. Este estudo visa analisar sua estrutura e desafios, destacando o solo, a vegetação, o clima, a fauna e a hidrografia do parque. A pesquisa também aborda conflitos como turismo desregulado, incêndios associados ao pastoreio e a necessidade de políticas integradas para equilibrar preservação e bem-estar humano. O Itatiaia simboliza, assim, os desafios globais de conservação em áreas protegidas.
Palavras-chave: Unidade de Conservação; Mata Atlântica; erosão do solo; espécies ameaçadas; gestão ambiental.

ABSTRACT
Over the centuries, human activity has modified global ecosystems, intensifying with industrialization and resulting in alarming rates of species extinction. By the 19th century, awareness of the need for preservation emerged, symbolized by the creation of Yellowstone National Park (1872) and, in Brazil, by Itatiaia National Park (1937), the country’s first national park. Classified as a Full Protection Unit under Brazil’s National System of Conservation Units (SNUC), Itatiaia prioritizes strict preservation of natural resources, contrasting with Sustainable Use Units, which allow controlled exploitation. The park protects water resources, biodiversity, soils, and landscapes of the Serra da Mantiqueira mountain range, housing unique ecosystems such as the Atlantic Forest and high-altitude grasslands. This study aims to analyze its structure and challenges, focusing on soil, vegetation, climate, fauna, and hydrology. The research also addresses conflicts such as unregulated tourism, fires linked to livestock grazing, and the need for integrated policies to balance preservation and human well-being. Thus, Itatiaia embodies the global conservation challenges faced by protected areas.
Keywords: Conservation Unit, Atlantic Forest, Soil Erosion, Threatened Species, Environmental Management.

1. INTRODUÇÃO

Durante vários séculos, o homem vem alterando ecossistemas, mudando de maneira significativa ambientes naturais pelo mundo todo. Segundo Albagli (2001), a destruição dos habitats naturais é uma resultante das práticas humanas no ambiente, e ficaram mais fortes com a formação das sociedades industriais modernas. Essas devastações, especialmente das florestas, tem sido causa determinante das atuais e novas taxas de extinção da biodiversidade.

Deste modo, segundo Diegues (1998), na segunda metade do século XIX o homem começa a enxergar a necessidade de proteger e conservar grandes áreas naturais, na criação do parque de Yellowstone em 1872. No Brasil, o primeiro parque nacional criado foi o Parque Nacional de Itatiaia, alvo deste estudo, em 1937.

De acordo com a lei que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), os Parques Nacionais, encontram-se na categoria de Unidades de Proteção Integral. Nesta categoria, somente é permitido a utilização indireta de seus recursos naturais, visto que a preservação da natureza é seu objetivo principal. Ao contrário das Unidades de Uso Sustentável, as quais permitem a harmonia da conservação ambiental com o uso sustentável de parte de seus recursos. (BRASIL, 2000)

O parque é uma área de preservação integral, que segundo Metzger (2010), é definida como uma área protegida, revestida ou não por vegetação natural, com o papel ambiental de proteger os recursos hídricos locais, a paisagem, a manutenção geológica da região, a biodiversidade, a continuidade genética da flora e fauna, proteção do solo e garantir o bem-estar das populações humanas.

Assim sendo, o presente estudo tem como objetivo principal descrever de forma clara dados relevantes do Parque Nacional de Itatiaia, bem como sua história e constituição. Como objetivos específicos, podemos elencar:

  1. A formação do Solo do Parque e o mal-uso e impactos sofridos pelo mesmo;

  2. A vegetação característica e espécies ameaçadas de extinção;

  3. O clima e as alterações climáticas do parque;

  4. A fauna e sua divisão, e espécies ameaçadas de extinção;

  5. A hidrografia, bacias hidrográficas, lagoas e represas do parque.

2. REFERÊNCIAL TEÓRICO

2.1. Parque Nacional do Itatiaia

O Decreto n° 23.793 já previa em seu texto o estabelecimento de parques nacionais, porém o Parque Nacional de Itatiaia, foi criado somente em 1937 pelo decreto nº 1.713 que em seu conteúdo cita que as terras da região de Itatiaia, pertencentes ao patrimônio do Jardim Botânico desde 1914 onde era mantida a Estação Biológica de Itatiaia ocupando uma área de 119.439.432 m², coberta em sua maioria por matas primitivas, com altitude variando de 816 a 2787 metros, cortada por diversos córregos que desaguam nos rios Aiuruoca, Campo Belo e Preto, tem ali suas nascentes, apresentando um flora muito diversa da floras de outras montanhas do Brasil, mesmo de outros locais da serra da Mantiqueira, no qual já foi estudada por diversos geólogos, botânicos e cientistas de todas as espécies nacionais e estrangeiros (BRASIL 1937).

De acordo com o plano de manejo do Parque Nacional de Itatiaia, elaborado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade– ICMBIO, instituto que atualmente gere o parque, sua área foi ampliada em 1982 pelo decreto n°87586 para 30000 ha. O Parque Nacional do Itatiaia (PNI) está situado na serra da Mantiqueira, abrange os municípios de Bocaina de Minas e Itamonte, no Estado de Minas Gerais e os municípios de Itatiaia e Resende, no Estado do Rio de Janeiro (ICMBIO, 2013).

Dentre os objetivos específicos do parque, segundo Guedes (2016), destacam-se proporcionar recreação, turismo ecológico e proteção da diversidade ambiental, assim como fornecer educação ambiental, controle de erosão e conservação dos recursos hídricos, bem como a proteção de amostras de floresta pluvial atlântica, além de proteger amostras de ecossistemas de campos de altitude, espécies raras, ameaçadas ou em perigo de extinção e não menos importante, a proteção das nascentes de duas grandes bacias do sudeste e a possibilidade de realização de estudos científicos visando o manejo da área.

Segundo o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, ICMBIO, o Parque Nacional do Itatiaia é dividido em duas partes, na parte alta do parque o acesso é feito pela BR 116 até o povoado de Engenho passos, após 12 km do município de Itatiaia, seguindo pela BR 354 por 26 km até a Garganta do Registro, subindo por 14km até o posto Marcão e mais 3 km até o Abrigo Rebouças. Como atrações da parte alta, destacam-se o Pico das Agulhas Negras, o Maciço das Prateleiras, O vale do Aiuruoca e a Pedra do Altar. O horário de visitação na parte alta é de 07:00 até às 14:00, com permanência máxima até às 17:00.

Já na parte baixa, o acesso é feito pela BR 116 até o município de Itatiaia/RJ na altura do km 318. Como atrações dessa parte do parque, encontram-se o lago azul, a cachoeira Poranga, a Piscina Natural do Maromba, a Cachoeira Itaporani, A cachoeira Véu da Noiva e os Três Picos. O horário de visitação na parte baixa do parque inicia-se às 08:00, com permanência até às 17:00. Em épocas chuvosas, as cachoeiras podem ser interditadas a qualquer momento, sob risco de cabeças d’agua, oferecendo riscos aos visitantes. De acordo com ICMBIO, os preços para acesso ao parque, tanto na parte baixa quanto na parte alta variam de R$ 3,00 (três reais) até R$ 34,00 (trinta e quatro reais).

2.2. Clima e Mudanças Climáticas Antropogênicas

Segundo ICMBIO (2014), é possível generalizar os climas do Parque em três: o subquente úmido em que as médias variam entre 15º C e 18º C, observado principalmente acima das cotas altimétricas de 1.600m, que seria o predominante no Parque Nacional Itatiaia. O mesotérmico mediano, com temperaturas médias abaixo de 10 ºC na parte mineira da Unidade de Conservação e o mesotérmico brando superúmido, onde as temperaturas médias variam entre 10 ºC e 15 ºC, na região do Alto dos Brejos e Serra Negra.

Há também, de acordo com Nimer (1979), registro de uma média anual de 11,5°C, de acordo com os dados das estações meteorológicas do Alto Itatiaia, localizadas a 2.199 m de altitude, sendo, 13,6 ºC a média compensada nos meses mais quentes, 8,4 °C, com mínimas diárias inferiores a 4 °C, nos meses de inverno. Também havendo registo de temperaturas abaixo de 0 °C entre os meses de maio e novembro, e de mínimas inferiores a 6 °C durante o inverno. Onde as vigorosas geadas são comuns, com média anual superior a 50 dias, podendo apresentar, com frequência, granizo e, excepcionalmente, breves nevadas (FBDS, 2000).

Outro dado importante, determinando para o clima, seria a precipitação. Há registros de média anual de 215mm nas estações Agulhas Negras e 149mm no Parque Itatiaia. Entre o meio do outono e o início da primavera as chuvas ficam mais escassas, tendo sido registrado em junho e agosto as mínimas pluviométricas com médias abaixo de 50 mm. Nos meses de junho e julho, a umidade relativa do ar não ultrapassa a média de 70%. Em junho pode ser observado o nível de umidade mínima absoluta, com 62% e no último mês do ano, a máxima, com 83%, e a média anual observada seria de 75,2 %. Em geral, pode se observar a criação de um microclima montanhoso no Parque Nacional do Itatiaia, considerando sua extensa área cobertura, onde a altitude de 1.600m é excedida, com o Pico das Agulhas Negras possuindo 2.791,55m de atingimento. (ICMBIO, 2014).

De acordo com pesquisas, houveram indicações de tendência de aumento nos valores da temperatura média e mínima no Parque Nacional do Itatiaia, além das variações na precipitação consistentes com as mudanças climáticas globais consideradas pelo IPCC – Painel Intergovernamental on Climate Change. Nesses conteúdos, havia a indicação de que estudos sobre os efeitos das mudanças climáticas mais precisos ainda seriam necessários na região, uma vez que o Parque está sujeito, durante a estação fria-seca, à muitos focos de incêndio e na estação quente-chuvosa às chuvas torrenciais, o que pode inferir em trombas d’água, deslizamentos de terra e enxurradas. (KLACZKO; BATISTA, 2013).

2.3. Formações Vegetais do Parque Nacional do Itatiaia

Predominantemente a vegetação do Parque Nacional do Itatiaia se caracteriza ao bioma de Mata Atlântica, pela grande diversidade de espécies vegetais, de diferentes fitofisionomias. Nele há registros de aproximadamente 1800 espécies vegetais de diversas famílias, espécies e vários hábitos e foram observadas, entre as tipologias do bioma da Mata Atlântica, a presença de: Floresta Ombrófila Densa, caracterizada por fanerófitos, que foi subdividida em três formações florestais: Sub-montana: localizada nas encostas dos planaltos até 500m de altitude; Montana: localizada no alto dos planaltos entre 500m até 1.500m de altitude e Alto-Montana: localizada acima de 1.500m, representando 50,17% do total da vegetação do Parque. (ICMBIO, 2014)

Ainda, de acordo com o instituto, consta a presença de Floresta Ombrófila Mista Montana (Floresta de Araucária), que em seu estrato superior possui grande parte de conífera Araucaria angustifólia, e no inferior, a maior parte é de Mirtáceas, com ocorrência da casca d’anta Drymis brasiliensis e o pinheiro bravo Podocarpus lambertii; a Floresta Estacional Semi Decidual Montana, que é caracterizada pela dupla estacionalidade climática; os Sistemas de Transição ou Tensão Ecológica, que são ecossistemas de vegetação indiferenciada que apresentam penetração mútua de flora entre duas ou mais regiões ecológicas, ou tipo de vegetação, classificados entre Encrave e Ecótono; e o Refúgio Vegetacional ou Campos de Altitude, localizado nas áreas mais acidentadas e elevadas do planalto.

No Parque, há a uma grande quantidade de espécies endêmicas, principalmente na área de Planalto, como: Ferneseea itatiaiae, Piper itatiaianum, Itatiaia cleistopetala, Lycopodium jussiaei são endêmicas do PNI (IBDF, 1982). Várias espécies endêmicas do sul e sudeste, como uma espécie da família Isoetaceae: Isoetes martti; e da família Lycopodiaceae: Huperzia badiniana, Huperzia biformis, Huperzia comans, Huperzia erythrocaulon, Lycopodiella alope-curoide, Lycopodiella bradei e Lycopodium assurgens (Condack, 2006). E raras como Peperomia crinicaulis C.DC. e Peperomia hilariana Miq. (MONTEIRO; GUIMARÃES, 2009).

Existe a presença, também, de espécies ameaçadas de extinção, como: Myracrodruon urundeuva Engl.- Araucaria angustifólia (Bertol.) Kuntze - Euterpe edulis Mart. - Asplenium castaneum Schltdl. & Cham. – Jacaranda crassifolia Morawetz - Blechnum andinum (Baker) C.Chr. - Fernseea itatiaiae Baker - Dicksonia sellowiana Hook. - Dalbergia nigra (Vell.) Allemão ex Bent. - Melanoxylon braúna Schott - Ocotea odorífera (Vellozo) Rohwer - Phyllos- temonodaphne (Mez) Kosterm. - Hindsia glabra K.Schum, reconhecidas pelo Ministério do Meio Ambiente com base em dados publicados pelo Parque Nacional do Itatiaia. A espécie Symplocos neglecta Brand. é definida como presumivelmente extinta. Há também espécies com insuficiência de dados, reconhecido pelo Ministério do Meio Ambiente com base em dados publicados do Parque, que são: Staurogyne itatiaiae (Wawra) Leonard – Tabebuia cassinoides (Lam.) DC. - Nidularium itatiaiae L.B.Sm. - Polystichum bradei Rosenst. - Lycopodiella bradei (Herter) B.Øllg. - Lycopodium jussiaei Poir. - Odontocarya vitis (Vell.) J.M.A.Braga - Siphoneugena kuhlmannii Mattos – Esterhazya caesarea (Cham. & Schltdl.) V.C.Souza - Pla- giogyria fialhoi (Fée & Glaz.) Copel. - Doryopteris itatiaiensis (Fée) Christ. - Doryopteris paradoxa (Fée) Christ. - Eriosorus cheilanthoides (Sw.) A.F.Tryon – Eriosorus insignis (Kuhn) A.F.Tryon - Jamesonia brasiliensis Christ. - Rudgea insignis Müll.Arg. As principais ameaças estão relacionadas ao valor madeireiro, interesse alimentício da juçara Euterpe edulis, e exploração comercial destinada à jardinagem e floricultura, no caso da samambaiaçu Dicksonia sellowiana. (ICMBIO, 2014)

E ainda de acordo com o ICMBIO, existem espécies exóticas, avaliadas no Parque e seu entorno, que são: Pistia stratiotes (pistia), Mangifera indica(mangueira), Chrysanthemum myconis (mal-me-quer), Cirsium vulgare (cardo), Sphagneticola trilobata (Vedélia), Impatien sultanii (maria-sem-vergonha), Tradescantia zebrina, Cyperus rotundus (tiririca), Pteridium arachnoideum (pterídio), Sansevieria trifasciata (Espada de são Jorge), Eucalyptus sp., Psidium guajava (Goiabeira), Melinis minutiflora (capim-gordura), Panicum maximum (capim-colonião), Urochloa decumbens (braquiária), Rubus rosifolius (morango sivestre), Coffea arábica (café), Centella asiática, Hedychium coronarium (lírio-do-brejo).

2.4. Formação de Solos do PNI

Há uma grande variedade de solos no Parque Nacional do Itatiaia, tendo sido divididos em quatro categorias: Cambissolos, Neossolos Litólicos, Argissolos, Nitossolos e Latossolos.

Os Cambissolos podem ser considerados solos rasos, com alta susceptibilidade à erosão, em conjunto com as grandes declividades e o regime pluviométrico do Parque não há a possibilidade de uma intensa utilização desse solo, uma vez que por ação natural, pode ocorrer erosão laminar moderada, ou severa, bem como em sulcos e voçorocas. (OLIVEIRA; JACOMINE; CAMARGO, 1992).

Grande parte dos Cambissolos, são caracterizados por Cambissolos Húmicos e Cambissolos Háplicos, que podem ser encontrados por praticamente toda a extensão do Parque. Os Húmicos têm como característica a abundância em matéria orgânica, resultado de áreas com vegetação preservada e altitudes acima de 1.600m, que proporcionam o acúmulo e a preservação dessa matéria. Os Cambissolos Háplicos apresentam dois horizontes, sendo um com cores mais escuras, espessuras de 20 a 35cm em média e texturas argilosas a argilo-arenosas, normalmente possuem estrutura de grânulos finos a médios, e com alta saturação. O outro, possui espessuras que variam de 40 a 60cm em média, cores amareladas ou amarelo avermelhadas, texturas argilosas a argilo-arenosas e estrutura granular média e em blocos angulosos a subangulosos. (ICMBIO, 2014)

Os Neossolos Litólicos são formados por material orgânico resultante de acumulações de resíduos vegetais depositados superficialmente sob condições de excesso de água por longos períodos, bem como materiais depositados em condições de drenagem livre, sem estagnação permanente de água, condicionados pelo clima úmido, como em ambiente altimontano (EMBRAPA, 2006).

Portanto, são solos minerais não hidromórficos, pouco evoluídos e rasos, comuns no Parque Nacional Itatiaia nas áreas mais elevadas, nas unidades geomorfológicas Montanhas Rochosas e Montanhas, sendo que nesta última predominam em relevos sustentados por rochas alcalinas do Maciço de Itatiaia. Em raras porções planas nas áreas mais elevadas e centrais do Parque, ocorrem locais com deficiência de drenagem, associadas ao afloramento do nível freático ou ao solo muito rés, com a rocha bastante próxima a superfície, agindo como uma camada impermeável. (ICMBIO, 2014)

Os Neossolos Litólicos, por serem muito curtos, com substrato resistente, dificultam o romper do sistema radicular das plantas. A água de percolação, ao alcançar a rocha, tem seu fluxo totalmente ou quase totalmente interrompido, fazendo com que esses solos fiquem expostos aos efeitos das enxurradas. Esse fator é mais sério em área acidentadas e desprovidas da vegetação natural. Assim, são solos extremamente suscetíveis a erosão, e de modo geral suas áreas são indicadas para a preservação da fauna e flora. (OLIVEIRA; JACOMINE; CAMARGO, 1992)

Os Argissolos e Nitossolos presentes no Parque ocorrem em áreas de acúmulo de material coluvionar e, por isso, é frequente que apresentem cascalhos. A principal característica dos Argissolos e Nitossolos é a diferença textural, entre um e outro há acúmulo de argila tornando essas classes de solos menos permeáveis. Consequentemente, o fluxo da água logo abaixo da superfície, paralela a encosta, e a saturação do horizonte superior, favorecem o desenvolvimento de enxurradas. (ICMBIO, 2014)

De acordo com o plano de manejo do PNI, os solos com estes gradientes texturais são mais suscetíveis à erosão hídrica e as texturas cascalhentas, em áreas de relevo acidentado, tornam esses solos ainda mais suscetíveis à erosão. Além disso, estruturas angulosas, como é o caso dos blocos presentes nesses solos, são mais compactas que estruturas arredondadas, e restringem a atividade biológica, principalmente animal. A água e o ar circulam mais facilmente nas fissuras entre os agregados. Em períodos úmidos, essa circulação de água é restrita, em função da expansão dos minerais de argila e do consequente fechamento das fissuras, acarretando um impedimento à circulação vertical da água, podendo promover o aparecimento de sinais erosivos.

A classe dos Latossolos compreende solos minerais e são solos muito evoluídos em avançado estágio de intemperização. Variam de fortemente a bem drenados e são normalmente muito profundos, raramente possuindo espessura inferior a 1m. Têm seus horizontes geralmente constituídos de variáveis de óxidos de ferro e de alumínio, argilominerais do tipo 1:1, quartzo e outros minerais mais resistentes ao intemperismo. Podem apresentar cerosidade pouca e fraca. A estrutura pode ser fortemente desenvolvida, quando os elementos de estrutura forem granulares, de tamanho muito pequeno e pequeno, ou fraca e mais raramente de desenvolvimento moderado, quando se tratar de estrutura em blocos subangulares. (EMBRAPA, 2006)

No Parque, os Latossolos, assim como os Argissolos e Nitossolos, ocorrem em áreas de depósitos de colúvios, ou seja, em áreas relativamente mais planas. Apresentam perfis profundos e estruturas granulares, possuem alta porcentagem de poros, e consequentemente alta permeabilidade e baixa capacidade de troca catiônica. Ocorre a predominância de óxidos de ferro, de alumínio e caulinita, que é uma argila de baixa atividade. Esta combinação química, juntamente com matéria orgânica e alta permeabilidade e aeração, confere ao latossolo uma estrutura fina, muito estável, e moderada a baixa susceptibilidade à erosão. Assim, não é uma classe de solos que apresenta muitas restrições quanto ao uso. (OLIVEIRA; JACOMINE; CAMARGO, 1992).

2.5. Fauna do Parque Nacional do Itatiaia

De acordo com o ICMBIO (2014), a fauna do PNI se divide em 4 grupos principais, tais como a Entomofauna, classe dos insetos, onde se registrou mais de 50 mil espécies, sendo 90 especificamente das áreas mais altas do parque, tendo os besouros como a classe mais registrada e estudada. Pertencente ao grupo dos artrópodes, a Entomofauna constitui o grupo mais representativo.

Ainda de acordo com o instituto, a Herpetofauna, classe dos anfíbios, conta com 87 espécies registradas, a respeito de espécies raras, endêmicas ou ameaçadas de extinção, não há registros, mas após outros levantamentos de dados descobriu-se duas espécies endêmicas ameaçadas o paratelmatobius lutzii e holoaden bradei desaparecidas na natureza desde 1970, acredita-se que essas espécies possam estar extintas, o sapo Flamenguinho, espécie também endêmica, que de acordo com a IUCN( instituto de unidade de conservação nacional) está ameaçado de extinção, vale ressaltar que além de ser um símbolo do PNI, ele também é primordial para o equilíbrio do ecossistema, pois é uma espécie chave, o Flamenguinho só é encontrado nas partes altas do parque. Não há registros de espécies exóticas nesse grupo, mas há relatos de invasões de porcos ferais, que trazem riscos aos anfíbios.

Outro grupo presente no parque, a Avifauna tem aproximadamente 319 espécies de aves, por não ter sido estudada uma área maior, apenas um ponto específico do parque, a quantidade de espécies registradas pode ser alterada, levando-se em conta determinadas estações do ano e mudanças no clima. As espécies endêmicas desse grupo somam um total de 143, o Garrincha-chorona, visto com abundância no Itatiaia, sendo ele também uma espécie bandeira da região, as aves ameaçadas de extinção no Itatiaia totalizam cerca de 60, na Avifauna foi registrado apenas uma espécie invasora, a garça-vaqueira, esse nome é dado a essa ave por ela está sempre em áreas com pouca circulação de gados. O gavião-real, a maria-leque, a jacutinga, o beija-flor de topete, o araçari e a murucututu são espécies ameaçadas de extinção. (ICMBIO, 2014)

Por fim a Mastofauna, grupo dos mamíferos, foram registradas 111 espécies, sendo os quirópteros a classe mais representada. A Catita-terrestre-de-tres-listras e o tamanduá-bandeira são espécies não mais encontradas no PNI, sendo consideradas extintas no parque. A Mastofauna representa a classe com mais espécies ameaçadas de extinção no parque, tais como a onça-parda, jaguatirica, o macaco muriqui, a preguiça, o tamanduá-colete, o búguio, o gatomaracajá e o sauá

2.6. Bacias hidrográficas, rios e riachos do PNI

O Itatiaia conta com 2 principais bacias hidrográficas, a do rio grande e rio Paraíba do Sul, as águas que correm nos limites do parque, apresentam padrão dendrítico, e se distribuem pelos vales em direção das duas bacias hidrográficas mencionadas acima. (ICMBIO, 2013)

Destacam-se no Sistema do PNI o Ribeirão água branca, e o rio campo Belo que corta o parque e abastece a cidade de Itatiaia/RJ, o Ribeirão do Pinhal, Ribeirão palmital e o córrego do Itatiaia desaguam no rio salto. Já área E-SE as principais fontes de água que drenam a área são os rios bonito, alambari e Pirapetinga. Cortam a cidade de Resende e desaguam no rio Paraíba do sul.

No sul do parque, onde as altitudes variam de 500 a 1.100m é ideal para atividades voltadas ao público no geral, com belas cachoeiras como o véu da noiva, itaporani, do pitu, do Poranga e rio bonito e também o lago azul. Nas partes mais rochosas do PNI o potencial hídrico é baixo, não sendo recomendável para visitantes, tendo em vista suas temperaturas baixíssimas, devido a altitude alta.

Outro grande rio importante é o Rio grande que nasce no nordeste do parque, no município de Bocaina-mg. Os principais cursos d’água que fluem desde a região N-NW do Maciço do Itatiaia rumo à Bacia do Rio Grande são os rios Aiuruoca e Capivari. O Rio Capivari drena grande parte do esporão da Capelinha e dirige-se para o Rio Verde, formador do Rio Grande. O Rio Aiuruoca nasce na várzea de mesmo nome, no município de Itamonte-MG e dirige-se para o Rio Turvo, outro afluente do Rio Grande. (FBDS, 2000a)

2.7. Lagoas, Reservatórios e Aquíferos Subterrâneos do PNI

Existem várias lagoas no planalto do Itatiaia, isoladas ou ligadas às nascentes de riachos. São normalmente rasas, com profundidade média de um 1m. As depressões planas, charcos e lagoas têm gênese ligada à drenagem subterrânea, através de juntas e falhas, como as pequenas lagoas ao sul da Pedra do Altar, que estão praticamente isoladas em um núcleo rochoso muito fraturado (Penalva, 1967).

O PNI possui na parte alta uma represa desativada, chamada Represa do Abrigo Rebouças. Ela foi projetada para fazer parte de um pequeno sistema elétrico para o abrigo, porém, ela funcionou por pouco tempo, pois os cálculos da mesma estavam errados, no qual nas épocas de inverno, ela não conseguia produzir energia suficiente para o abrigo. Com isso foi desativada na década de 60, deixando o abrigo funcionando apenas com lampião a gás até a década de 70 (ICMBIO, 2014). Nas épocas de inverno, a represa costuma formar gelo em sua superfície, e segundo as regras do parque, as práticas de banho, natação ou atividades congêneres são proibidas para grupos acima de 20 pessoas.

Com relação às águas subterrâneas do parque, pouco se sabe sobre suas características físicas, e se faz necessário um estudo mais aprofundado utilizando-se de poços de monitoramento ou piezométricos em ensaios e levantamentos, para determinar os parâmetros dos aquíferos locais. Contudo, é possível observar que as águas sub-superficiais, em regra, estão abrigadas em sistemas fraturados, ligados às rochas ígneas e metamórficas do local. A capacidade dessas rochas em acumularem águas, estão relacionadas às fraturas e suas aberturas e interligações. (ICMBIO, 2014)

Ainda de acordo com o manual de manejo do parque, o sistema poroso ocorre em rochas sedimentares consolidadas, em sedimentos inconsolidados e solos, por onde a água circula em meio aos poros de natureza primária ou secundária. No PNI este sistema é muito restrito e pouco expressivo, uma vez que os solos locais são rasos e com laterais de pequenas amplitudes.

2.8. Uso do Solo e Impactos Antropogênicos

O solo do PNI é muito prejudicado através do pisoteio com o excesso de visitantes. Com o pisoteio, cinco componentes são prejudicados: a água, os minerais, o ar, os húmus e os organismos vivos. Desses componentes, o mais prejudicado são os húmus, que ao afeta-los através do pisoteio, afeta a sustentação do solo, e sua importância se deve a manutenção da saúde do solo, pelo papel que ele exerce em sua atividade biológica, ao aumento de capacidade de retenção de água, e um dos principais nutrientes das plantas.

Outro fator importante sobre os impactos sofridos pelo parque é a relação uso-impacto que significa a variação em tolerância entre diferentes ambientes e grupos de usuários. Nem todos ambientes respondem da mesma forma ao encontro com visitantes também alguns tipos de atividades geram impactos maiores que outras.

Outro fator que contribui para os impactos antropogênicos do parque é o fato de que o PNI é referência e área de treinamento de pessoas e grupos com excelência na prática de montanhismo e alta montanha, porém a grande parte do público é inexperiente, mal equipada e recebe pouca orientação sobre como se proceder em uma área que oferece re riscos de vida a pessoas despreparadas, além de ser frágil frente a uma visitação predatória. Já ocorreram muitas mortes em função do frio e, atualmente, a grande intensidade de visitação ameaça também a vegetação no entorno das trilhas. (TOMZHINSKI et. al 2012)

Na Parte Alta do PNI ainda é mantida algumas das características rurais ligadas à pecuária extensiva, atuando como indutora do desmatamento e dos incêndios florestais, especialmente por utilizar o fogo no manejo das pastagens ou campos nativos (HERRMANN, 2011). Os criadores do entorno do Parque estão acostumados a levar o gado para os campos de altitude, situados na parte mais elevadas para engordar, criando um ciclo de pastoreio e fogo que impede a regeneração da vegetação arbórea nessas áreas, que diferem dos campos de altitude acima dos 2.000, onde estas espécies são naturalmente mais restritas. (TOMZHINSKI et. al 2012)

Ainda de acordo com os autores, a grande maioria dos incêndios são propositalmente causados para manejo de áreas de pastagem, por conflitos com a unidade de conservação ou simples vandalismo, embora também existem registros de ocorrências originadas por caçadores, apicultores e turistas, possivelmente de forma acidental, além de um causado por curto na rede elétrica.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Parque Nacional de Itatiaia representa o marco inicial para a instalação de parques nacionais que visam preservação da biodiversidade brasileira. Sua importância vai além de seus limites territoriais. As águas ali nascidas abastecem milhões e o Rio Grande além de gerar energia elétrica atravessa a região sul-sudeste brasileira, são muitas nascentes, fazendo com que o parque seja conhecido também como Castelo das Aguas.

Sua riqueza não se resume apenas em suas características aquáticas, o parque abriga uma incrível diversidade de flora e fauna, no qual muitas espécies dependem do parque para sobreviver. A abundância de sua biodiversidade faz com que o parque se torne um patrimônio cultural natural.

Suas paisagens naturais, picos, quedas d’agua e demais atrativos fazem com que o parque se torne roteiro de estudos e principalmente de turístico ecológico. As regras de visitação do parque são bem definidas, e o órgão que administra o parque, O Instituto Chico Mendes de Biodiversidade, possui planos de manejos do parque atualizados.

Porém, o parque tem recebido um número crescente de visitantes, no qual aliado a praticas pastoreias em seu entorno, fazem com que o parque sofra com queimadas, desgastes do solo através do pisoteio de visitantes e gados de áreas vizinhas. Isso representa um risco, pois os impactos antropogênicos sofridos pelo parque a longo prazo podem se tornar irreversíveis, fazendo com que muitas espécies endêmicas sejam extintas.

Portanto, se faz necessário a conscientização dos produtores rurais no entorno do parque referente a um manejo ambiental mais sustentável, respeitando os limites do parque. Outra ação necessária seria a redução de visitantes ao parque através da estipulação de carga máxima suportada pelo mesmo após estudos concretos dos impactos ambientais sofridos pelo parque através do turismo. E por fim, ao poder público competente ações efetivas através de leis e decretos visando proteger nossos recursos ambientais.

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1 Discente do Curso Superior de Geografia Universidade Federal de São João Del Rei. E-mail: [email protected]