PARACOCCIDIOIDOMICOSE: PANORAMA ATUAL, AVANÇOS DIAGNÓSTICOS E PERSPECTIVAS TERAPÊUTICAS
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REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.17329979
Giovanna Lyssa Alves Silva1
RESUMO
A paracoccidioidomicose (PCM) é uma micose sistêmica endêmica da América Latina, especialmente no Brasil, causada por fungos do gênero Paracoccidioides. A doença apresenta formas clínicas aguda/subaguda, predominante em jovens, e crônica, mais comum em adultos, com envolvimento pulmonar, linfonodal e mucocutâneo. Novas espécies cripticas (P. lutzii, P. restrepiensis, P. venezuelensis, P. americana) foram recentemente descritas, impactando epidemiologia, virulência e resposta imunológica. A co-infecção com HIV/AIDS aumenta o risco de formas graves e complexifica o manejo clínico. Foi realizada uma revisão narrativa da literatura, com busca em bases como PubMed e Scopus, identificando inicialmente 21 artigos. Após aplicação de critérios de inclusão — estudos publicados nos últimos 10 anos, revisados por pares e com relevância direta para PCM — foram selecionados 4 artigos. Sete estudos foram excluídos por serem relatos de caso ou não abordarem a PCM de forma exclusiva. Os dados foram organizados em tópicos: epidemiologia, espécies, aspectos clínicos, diagnóstico, tratamento e perspectivas futuras. Os resultados demonstram predominância da PCM crônica em homens adultos, com manifestações pulmonares e mucocutâneas. Pacientes com HIV/AIDS apresentam maior risco de formas disseminadas, embora tratamentos antifúngicos individualizados, principalmente com itraconazol ou sulfametoxazol-trimetoprima, resultem em altas taxas de cura. Diagnósticos moleculares são essenciais para diferenciar espécies cripticas, auxiliando no prognóstico e na escolha terapêutica. A discussão evidencia que fatores genéticos e ambientais influenciam a susceptibilidade à PCM, e que avanços em técnicas diagnósticas e terapêuticas podem melhorar os desfechos clínicos. Estratégias preventivas e políticas de saúde direcionadas são fundamentais para reduzir a morbimortalidade da doença. Conclui-se que a PCM continua sendo um desafio clínico e epidemiológico relevante, exigindo integração de dados clínicos, laboratoriais e epidemiológicos para diagnóstico precoce, manejo adequado e prevenção eficiente.
Palavras-chave: Paracoccidioidomicose. Epidemiologia. Diagnóstico. Tratamento.
ABSTRACT
Paracoccidioidomycosis (PCM) is a systemic mycosis endemic to Latin America, especially Brazil, caused by fungi of the genus Paracoccidioides. The disease presents acute/subacute clinical forms, predominantly in young individuals, and chronic forms, more common in adults, with pulmonary, lymph node, and mucocutaneous involvement. New cryptic species (P. lutzii, P. restrepiensis, P. venezuelensis, P. americana) have recently been described, impacting epidemiology, virulence, and immune response. Co-infection with HIV/AIDS increases the risk of severe forms and complicates clinical management. A narrative review of the literature was conducted, searching databases such as PubMed and Scopus, initially identifying 21 articles. After applying the inclusion criteria—studies published in the last 10 years, peer-reviewed, and directly relevant to PCM—four articles were selected. Seven studies were excluded because they were case reports or did not address PCM exclusively. The data were organized into topics: epidemiology, species, clinical aspects, diagnosis, treatment, and future perspectives. The results demonstrate a predominance of chronic PCM in adult men, with pulmonary and mucocutaneous manifestations. Patients with HIV/AIDS are at higher risk of disseminated forms, although individualized antifungal treatments, primarily with itraconazole or trimethoprim-sulfamethoxazole, result in high cure rates. Molecular diagnostics are essential for differentiating cryptic species, aiding prognosis and therapeutic choice. The discussion highlights that genetic and environmental factors influence susceptibility to PCM, and that advances in diagnostic and therapeutic techniques can improve clinical outcomes. Preventive strategies and targeted health policies are essential to reduce the disease's morbidity and mortality. It is concluded that PCM remains a significant clinical and epidemiological challenge, requiring the integration of clinical, laboratory, and epidemiological data for early diagnosis, appropriate management, and effective prevention.
Keywords: Paracoccidioidomycosis. Epidemiology. Diagnosis. Treatment.
1. INTRODUÇÃO
A PCM é uma micose sistêmica endêmica que afeta principalmente indivíduos que habitam nas áreas rurais da América Latina, sendo o Brasil considerado uma região com alta incidência. Trata-se de uma patologia causada por fungos dimórficos que pertencem ao gênero Paracoccidioides, cuja transmissão ocorre pela inalação de conídios presentes em solos contaminados. Clinicamente, a PCM manifesta-se em duas formas principais (KOHUT; GILBERT; LOOMES, 2021; PEÇANHA et al., 2022):
Aguda/subaguda: mais frequente em crianças e jovens, caracterizada por febre, linfadenopatia generalizada, hepatoesplenomegalia e sintomas constitucionais. É caracterizada por uma resposta imunológica mais frágil, com predomínio de resposta Th1.
Crônica: predominante em adultos, especialmente homens, com envolvimento pulmonar, mucocutâneo e linfonodal. Caracterizada por uma resposta imune com predomínio Th2
A identificação de espécies crípticas, ou seja, espécies fisicamente semelhantes, mas geneticamente distintas, como P. lutzii, P. restrepiensis, P. venezuelensis e P. americana revelou diferenças em tropismo tecidual, virulência e resposta imunológica (PEÇANHA et al., 2022). Fatores genéticos e ambientais, incluindo etnia e distribuição geográfica, são fatores que influenciam na suscetibilidade à PCM, sendo observada maior predisposição em indivíduos brancos (OLIVEIRA et al., 2021). Além disso, a co-infecção com HIV/AIDS apresenta desafios adicionais devido à imunossupressão e risco aumentado de formas graves da doença, sendo que a maioria dos pacientes apresentava carga viral indetectável e CD4+ > 200 células/mm³ no momento do diagnóstico de PCM. (SILVA et al., 2022).
O objetivo deste artigo é, portanto, revisar o estado atual do conhecimento sobre PCM, integrando achados epidemiológicos, clínicos, diagnósticos e terapêuticos, e discutir perspectivas futuras, haja vista a importância epidemiológica desta enfermidade no Brasil.
2. METODOLOGIA
Este estudo configura-se como uma revisão integrativa da literatura na base de dados PubMed. Trata-se de estudo com foco na Paracoccidioidomicose, abordando sua epidemiologia, identificação molecular de espécies, aspectos clínicos, diagnóstico laboratorial, tratamento e comorbidades associadas, como HIV/AIDS. O processo de busca para extrair os dados almejados foi realizado por uma acadêmica de medicina. Para auxiliar na extração, utilizou-se os seguintes descritores: paracoccidioidomicose, tratamento da paracoccidioidomicose e epidemiologia da paracoccidioidomicose. Além de seus correspondentes em língua inglesa, segundo a plataforma DeCS, os quais são Paracoccidioidomycosis, Paracoccidioidomycosis treatment e Paracoccidioidomycosis epidemiology. Os descritores foram combinados durante as buscas por meio do Operador Booleano “AND”. O recorte temporal para filtragem dos artigos foi de 05 anos (2020-2025). A análise dos dados foi balizada pelo método PRISMA, com os seguintes critérios de inclusão: Estudos publicados nos últimos 05 anos Artigos revisados por pares e relevância direta para epidemiologia, diagnóstico, manejo clínico e tratamento da PCM.
Além disso, utilizou-se os seguintes critérios de exclusão: artigos que incluíam relato de casos ou que não abordaram a paracoccidioidomicose de forma exclusiva.
Inicialmente, foram identificados 21 artigos relevantes na base de dados PubMed. Após a análise detalhada do título, resumo e texto completo, 17 artigos foram excluídos e 4 artigos foram selecionados para inclusão nesta revisão por atenderem aos critérios de relevância e qualidade científica.
Na estratégia de análise, os dados extraídos dos artigos selecionados foram organizados em tópicos abordando:
Epidemiologia e espécies de Paracoccidioides
Aspectos clínicos e co-infecção com HIV
Diagnóstico laboratorial e molecular
Terapêutica e desfechos clínicos
Perspectivas futuras
Tabela 01
Número do artigo | Referência | Foco do estudo |
---|---|---|
1 | Kohut TJ, Gilbert MA, Loomes KM, 2021 | Revisão sobre PCM: status atual e tendências futuras |
2 | Peçanha P. et al., 2022 | Avanços em epidemiologia, diagnóstico e tratamento |
3 | Oliveira et al., 2021 | Suscetibilidade e aspectos biogeográficos em indivíduos brancos |
4 | Silva et al., 2022 | PCM em pessoas vivendo com HIV/AIDS |
3. RESULTADOS E DISCUSSÕES OU ANÁLISE DOS DADOS
A paracoccidioidomicose (PCM) é uma micose sistêmica endêmica da América Latina, com maior prevalência no Brasil, responsável por aproximadamente 80% dos casos relatados mundialmente (PEÇANHA et al., 2022). A doença também é registrada em países como Colômbia, Venezuela, Argentina, Paraguai e Peru, porém em menor magnitude. A distribuição geográfica está fortemente associada a condições ambientais favoráveis ao crescimento do fungo, como solo úmido, alta pluviosidade e temperaturas moderadas (PEÇANHA-PIETROBON et al., 2022).
A transmissão ocorre principalmente pela inalação de conídios fúngicos presentes no solo, sendo o homem o hospedeiro acidental. Não há transmissão interpessoal. A infecção inicial geralmente é assintomática e pode permanecer latente por anos, reativando-se sob condições de imunossupressão.
A PCM é prevalente em regiões rurais do Brasil, com predominância de casos em homens adultos, com maior prevalência em indivíduos do sexo masculino em relação ao sexo feminino (≈ 15:1). A diferença de acometimento entre homens e mulheres é atribuída ao efeito protetor promovido pelos estrógenos, os quais inibem a transformação micélio-levedura do fungo, a qual é necessária para que ocorra a infecção (PEÇANHA et al., 2022). A identificação de espécies crípticas alterou a compreensão sobre tropismo tecidual, virulência e resposta imunológica (KOHUT; GILBERT; LOOMES, 2021; PEÇANHA et al., 2022).
Por décadas acreditou-se que a P. brasiliensis era uma entidade única, entretanto, novos estudos moleculares demonstraram um complexo de espécies crípticas geneticamente distintas, com diferenças na virulência, resposta imunológica e distribuição geográfica (PEÇANHA-PIETROBON et al., 2022). Atualmente, reconhecem-se pelo menos cinco espécies geneticamente bem definidas: Paracoccidioides brasiliensis sensu stricto, P. americana, P. restrepiensis, P. venezuelensis e P. lutzii (PEÇANHA et al., 2022).
O P. lutzii destaca-se por sua maior prevalência na região Centro-Oeste e Norte do Brasil, diferindo imunologicamente das demais espécies do complexo P. brasiliensis. Ele exibe antígenos específicos (como o gp43-like) que não reagem com os testes sorológicos tradicionais desenvolvidos para P. brasiliensis, levando a resultados falso-negativos e dificultando o diagnóstico (PEÇANHA-PIETROBON et al., 2022).
Por outro lado, o P. brasiliensis sensu stricto é mais frequentemente vinculado a formas pulmonares crônicas e disseminadas, sendo predominante nas regiões Sudeste e Sul do país, onde há maior densidade de casos (PEÇANHA et al., 2022).
As novas descobertas redefinem a compreensão da patogênese, epidemiologia e resposta terapêutica da PCM, uma vez que as diferenças genéticas entre as espécies podem influenciar tanto a suscetibilidade do hospedeiro quanto a eficácia das drogas antifúngicas.
Tabela 02
Espécie | Distribuição geográfica | Tecidos mais acometida | Clínica |
---|---|---|---|
P. brasiliensis sensu stricto | Sul e Sudeste do Brasil | Pulmonar e mucocutâneo | Forma clássica crônica |
P. americana | Sudeste e Sul | Pulmonar | Similar a P. brasiliensis |
P. restrepiensis | Colômbia Venezuela | Pulmonar | Apresentação variável |
P. venezuelensis
| Venezuela Região Norte do Brasil | Pulmonar | Maior potencial de disseminação |
P. lutzii | Região Centro-Oeste do Brasil | Pulmonar Hepatoesplênica | Resposta sorológica diferente |
Fatores genéticos e biogeográficos influenciam a susceptibilidade, como observado em indivíduos brancos (OLIVEIRA et al., 2021).
Há evidências de mudança no perfil epidemiológico nos últimos anos, com aumento de casos em áreas urbanas e periurbanas, provavelmente devido à expansão agrícola, desmatamento e migração populacional (PEÇANHA et al., 2022). Essas transformações ambientais favorecem o contato com nichos ecológicos do fungo e explicam a emergência de novos focos endêmicos em estados como Rondônia, Tocantins e Mato Grosso.
A forma aguda/subaguda é menos frequente, representando cerca de 5 a 10% dos casos. Ocorre predominantemente em crianças, adolescentes e adultos jovens, caracterizando-se por curso clínico rápido e acometimento do sistema mononuclear fagocítico, resultando em linfadenomegalias generalizadas, hepatoesplenomegalia, febre e perda ponderal acentuada (PEÇANHA et al., 2022). As lesões cutâneas e mucosas são comuns, e pode haver envolvimento ósseo e gastrointestinal, especialmente em pacientes imunossuprimidos (PEÇANHA-PIETROBON et al., 2022).
A forma crônica é a mais prevalente, acometendo cerca de 90% dos pacientes, geralmente adultos do sexo masculino, entre 30 e 60 anos, com histórico de exposição ocupacional ao solo. Manifesta-se principalmente com sintomas respiratórios, como tosse crônica, expectoração e dispneia, que podem evoluir para fibrose pulmonar e insuficiência respiratória irreversível (BARROSO et al., 2021). As lesões mucocutâneas localizam-se preferencialmente na cavidade oral, com úlceras dolorosas de bordas infiltradas e sangramento fácil. Linfonodomegalias cervicais e submandibulares também são frequentes, podendo supurar.
Em pacientes coinfectados com HIV/AIDS, o curso clínico é frequentemente atípico e disseminado, com múltiplos órgãos envolvidos e resposta inflamatória reduzida, mesmo em indivíduos com carga viral controlada (MOREIRA et al., 2022). O estudo de coorte com 42 pacientes com HIV mostrou taxa de cura de 90,5% e recaídas de 9,5%, sem óbitos relacionados à PCM (SILVA et al., 2022).
Em indivíduos imunossuprimidos, particularmente aqueles vivendo com HIV/AIDS, a PCM adquire caráter oportunista, com maior disseminação e gravidade clínica (MOREIRA et al., 2022). Apesar de a incidência geral ser baixa nesse grupo, a morbimortalidade é elevada quando o diagnóstico é tardio.
Estudos recentes destacam ainda a influência das espécies crípticas de Paracoccidioides na apresentação clínica. Infecções por P. lutzii têm sido associadas a manifestações respiratórias mais graves e resposta sorológica menos intensa, dificultando o diagnóstico por testes imunológicos convencionais (PEÇANHA et al., 2022). Essa variação interespécies reforça a importância da identificação molecular precisa, que pode impactar diretamente o prognóstico e a escolha terapêutica.
O diagnóstico da patologia se baseia em métodos clássicos e já utilizados em diversas outras infecções fúngicas. Entre os métodos diagnósticos, inclui-se:
Microscopia direta: identifica leveduras multigemadas em amostras clínicas (KOHUT; GILBERT; LOOMES, 2021). A visualização de leveduras multibrotantes em “roda de leme”, característica morfológica do gênero Paracoccidioides, é considerada patognomônica (PEÇANHA-PIETROBON et al., 2022).
Cultura: confirma a presença de Paracoccidioides, embora se caracterize por um crescimento lento, podendo levar 15 a 30 dias para o diagnóstico.
Sorologia: testes de imunodifusão, ELISA e imunoblot. Detectam anticorpos específicos contra antígenos fúngicos, mas a variabilidade antigênica entre as espécies pode gerar resultados falso-negativos, especialmente em infecções por P. lutzii, cuja resposta humoral é menos robusta (PEÇANHA-PIETROBON et al., 2022).
Técnicas moleculares: PCR e sequenciamento, essenciais para identificação de espécies cripticas (PEÇANHA et al., 2022).
O método de referência continua sendo a identificação direta do fungo em amostras clínicas, especialmente em escarro, lavado broncoalveolar, biópsias de mucosas e fragmentos linfonodais.
Além dos exames laboratoriais, exames de imagem, como a radiografia e tomografia do tórax, podem auxiliar na avaliação de acometimento pulmonar. Embora inespecíficas, as alterações radiológicas mais frequentemente identificadas são os infiltrados reticulonodulares bilaterais, fibrose e cavitações (BARROSO et al., 2021).
Quanto ao tratamento, o mesmo depende da forma clínica e da gravidade da doença, além da condição imunológica do paciente. O objetivo é a erradicação do fungo, melhora dos sintomas e reduzir sequelas (PEÇANHA et al., 2022). As medicações mais utilizadas são o Itraconazol, Sulfametoxazol-trimetoprima e Fluconazol, Entretanto, é necessário que o tratamento seja individualizado e associada à monitorização clínica e laboratorial visando garantir maiores taxas de curas, mesmo em pacientes com HIV/AIDS (SILVA et al., 2022).
O Itraconazol é usado, em especial, nas formas crônicas e o tratamento dura em média de 6 a 12 meses, com acompanhamento clínico e sorológico até negativação dos títulos de anticorpos (PEÇANHA-PIETROBON et al., 2022). Trata-se de um tratamento com alta eficácia e com baixas taxas de efeitos adversos, o que promove uma boa tolerabilidade ao seu uso.
O Sulfametoxazol-trimetropina pode ser utilizado em formas leves a moderadas sendo que o tempo de tratamento fica em torno de 12 a 24 meses. É uma opção principalmente em regiões com menor acesso ao itraconazol. Embora possua boa disponibilidade e baixo custo, é necessário se atentar aos possíveis efeitos adversos da medicação, tais reações cutâneas alérgicas, náuseas, hipercalemia e, em casos prolongados, toxicidade medular, sobretudo em pacientes imunocomprometidos (PEÇANHA-PIETROBON et al., 2022).
O Fluconazol é uma alternativa para aqueles pacientes que não toleram o uso do Itraconazol.
Nos casos graves ou disseminados, especialmente com acometimento de múltiplos órgãos ou co-infecção por HIV/AIDS, recomenda-se o uso inicial de anfotericina B em formulações convencionais ou lipossomais, seguida de terapia de manutenção com itraconazol ou Sulfametoxazol-trimetropina (MOREIRA et al., 2022). Embora altamente eficaz, apresenta nefrotoxicidade como efeito colateral predominante, além de anemia e distúrbios eletrolíticos (hipocalemia e hipomagnesemia), o que requer monitorização laboratorial rigorosa durante o tratamento (PEÇANHA-PIETROBON et al., 2022).
O monitoramento clínico e laboratorial é essencial, pois a recaída ocorre em cerca de 10% dos casos, geralmente associada à interrupção precoce do tratamento. Pacientes com HIV/AIDS requerem terapia prolongada e vigilância contínua, mesmo após resposta clínica satisfatória, devido ao risco elevado de reativação (MOREIRA et al., 2022).
Atualmente, existem desenvolvimento de novos testes diagnósticos mais rápidos e precisos (PEÇANHA et al., 2022). Estudos recentes reforçam o potencial das técnicas moleculares, como a PCR em tempo real e a análise de antígenos específicos, na diferenciação entre Paracoccidioides brasiliensis e Paracoccidioides lutzii, espécies com respostas imunológicas distintas e implicações terapêuticas importantes (PEÇANHA-PIETROBON et al., 2022). A incorporação dessas ferramentas na prática clínica permitiria o diagnóstico precoce e a individualização do tratamento, além de contribuir para o monitoramento epidemiológico em tempo real. Adicionalmente, o uso de biomarcadores séricos está sendo investigado como uma estratégia promissora para avaliar resposta terapêutica e detectar recidivas de forma não invasiva (BARROSO et al., 2021).
Além disso, há pesquisas sobre novos antifúngicos e esquemas terapêuticos menos tóxicos. No campo terapêutico, as perspectivas futuras incluem o desenvolvimento de antifúngicos com menor toxicidade e duração de tratamento reduzida, visando maior adesão e menor ocorrência de efeitos adversos (PEÇANHA et al., 2022). Pesquisas também têm explorado o uso de formulações lipídicas da anfotericina B, que reduzem a nefrotoxicidade sem comprometer a eficácia, e de novos compostos antifúngicos que atuam em alvos específicos da parede celular fúngica (MOREIRA et al., 2022). Além disso, há crescente interesse na imunoterapia adjuvante, que visa modular a resposta inflamatória exacerbada observada em alguns pacientes, especialmente os imunocomprometidos.
A educação em saúde é um dos pilares das estratégias de prevenção e controle ambiental (KOHUT; GILBERT; LOOMES, 2021). Do ponto de vista epidemiológico, a intensificação do monitoramento ambiental e genético do fungo é essencial para compreender a influência das mudanças climáticas e do desmatamento na dispersão do Paracoccidioides em novas áreas endêmicas (PEÇANHA-PIETROBON et al., 2022).
Portanto, o futuro da pesquisa em paracoccidioidomicose está direcionado para uma abordagem multidisciplinar, que integra microbiologia, imunologia, biotecnologia e saúde pública. O avanço dessas linhas de investigação poderá transformar o cenário clínico e epidemiológico da doença, possibilitando diagnóstico precoce, terapias mais seguras e estratégias preventivas eficazes, fundamentais para reduzir o impacto dessa micose negligenciada na América Latina.
4. CONCLUSÃO/CONSIDERAÇÕES FINAIS
A PCM permanece como uma micose sistêmica relevante na América Latina, com complexidade clínica e epidemiológica. Do ponto de vista epidemiológico, a PCM está fortemente associada a condições socioeconômicas desfavoráveis e à exposição ocupacional, acometendo predominantemente homens adultos em idade produtiva, trabalhadores rurais e indivíduos imunossuprimidos, como portadores de HIV/AIDS. Avanços recentes em identificação molecular das espécies, compreensão dos fatores de susceptibilidade genética e ambiental, e manejo clínico em contextos de imunossupressão, como HIV/AIDS, aprimoram o diagnóstico e tratamento da doença. No entanto, os desafios persistem, incluindo a necessidade de métodos diagnósticos rápidos, terapias mais eficazes e estratégias preventivas direcionadas.O tratamento, embora eficaz, é prolongado e pode estar associado a diversos efeitos adversos, que exigem acompanhamento clínico rigoroso.
Dessa forma, conclui-se que a PCM é uma doença multifacetada que exige uma abordagem integrada entre diagnóstico, vigilância epidemiológica e tratamento individualizado. O fortalecimento das estratégias de detecção precoce, o desenvolvimento de terapias menos tóxicas e a ampliação de políticas públicas voltadas para áreas endêmicas são fundamentais para reduzir a morbimortalidade associada à doença. Além disso, a ampliação da pesquisa sobre os determinantes ecológicos e genéticos do fungo pode contribuir para avanços significativos na prevenção e no manejo clínico dessa micose negligenciada.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
KOHUT, T.J.; GILBERT, M.A.; LOOMES, K.M. Paracoccidioidomycosis: Current Status and Future Trends. Semin Liver Dis, v. 41, n. 4, p. 525–537, 2021. doi:10.1055/s-0041-1730951. PMID: 36074014.
PEÇANHA, P.M.; PEÇANHA-PIETROBON, P.M.; GRÃO-VELLOSO, T.R.; et al. Paracoccidioidomycosis: What We Know and What Is New in Epidemiology, Diagnosis, and Treatment. Journal of Fungi, v. 8, n. 10, p. 1098, 2022. DOI: 10.3390/jof8101098. Disponível em: https://doi.org/10.3390/jof8101098. Acesso em: 10 out. 2025. PMID: 36294662.
OLIVEIRA, R. et al. Paracoccidioidomycosis and white individuals: Susceptibility and biogeographic aspects in an important endemic area in Brazil. PLoS Neglected Tropical Diseases, 2021. PMID: 33561154.
SILVA, F. et al. Paracoccidioidomycosis in people living with HIV/AIDS: A historical retrospective cohort study in a national reference center for infectious diseases, Rio de Janeiro, Brazil. PLoS Neglected Tropical Diseases, 2022. PMID: 35704666.
1 Discente do Curso Superior de Medicina do Centro Universitário de Mineiros Campus Trindade. E-mail: [email protected]